Imagens: Cortesia da Fundação Mário Soares.
Nesse espaço de tempo, entre a primeira (28/8/1972) e a última crónica (31/8/1972), dois militares (metropolitanos), do Exército, morreram noTO da Guiné: Francisco José Pacheco Marques, soldado, a 29, por acidente; e António João Carreiras das Neves, alferes, a 30, em combate. O primeiro era do Alandroal, e pertencia à CCAV 3366 / BCAV 3846. O segundo, alf mil art, era natural de Aviz e pertencia à 2ª CART / BART 6520/72.
(Preciosas e detalhadas informações retiradas, com a devida vénia, do portal Ultramar Terraweb [Dos Veteranos da Guerra do Ultramar, Angola, Guiné, Moçambique, 1959-1975], a quem saudamos fraternalmente, na pessoa do seu fundador e principal editor António Pires, e demais colaboradores, pelo seu gigantesco e exaustivo trabalho de pesquisa, registo e divulgação, nomeadamente sobre os mortos da guerra do ultramar).
1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de hoje (há outras notas de leitura, anteriores, que aguardam entretanto publicação; a decisão é sempre do editor de serviço, em função de critérios de interesse e oportunidade editoriais):
Queridos amigos,
Há pontos surpreendentes nesta reportagem: guerra assumida, sem ambiguidades; a ênfase no desenvolvimento e no reordenamento; a imagem de Spínola como um pacificador, veja-se a captura de Balantas na região de Ponta Varela que serão devolvidos à precedência depois de visitarem o Xime, receberem rádios, roupas e dinheiro; a noção de que a africanização da guerra é uma realidade; o chão Manjaco mostrado como a região modelo de acordo com o projeto de Spínola.
A despedida da reportagem é cabalística, como consta: o pior será quando a guerra acabar. Para juntar a todas as peças que devem fazer parte da História da Guiné. Um abraço do Mário
2. Reportagem do jornalista Avelino Rodrigues na Guiné, Agosto de 1972
por Beja Santos [, foto à esquerda, 2006]
A reportagem publicada por Avelino Rodrigues nos dias 28, 29, 30 e 31 de Agosto de 1972, no vespertino Diário de Lisboa, está disponível no site da Fundação Mário Soares [, cicar aqui.]
Spínola, em meados de 1972, “namora” a imprensa de oposição, estabelece relações formais com Ruella Ramos e Raul Rego, responsáveis respetivamente pelos jornais Diário de Lisboa e República.
por Beja Santos [, foto à esquerda, 2006]
A reportagem publicada por Avelino Rodrigues nos dias 28, 29, 30 e 31 de Agosto de 1972, no vespertino Diário de Lisboa, está disponível no site da Fundação Mário Soares [, cicar aqui.]
Spínola, em meados de 1972, “namora” a imprensa de oposição, estabelece relações formais com Ruella Ramos e Raul Rego, responsáveis respetivamente pelos jornais Diário de Lisboa e República.
Avelino Rodrigues é convidado a deslocar-se à Guiné, são lhe dadas garantias de ver o que é preciso ver da região em guerra. O jornalista enceta as suas crónicas dizendo:
“Chega-se a Bissau e logo os canhões do aeroporto, o arame farpado e os postos de sentinela nos dizem que a guerra é a sério”.
Será uma digressão de nove dias por terras da Guiné. Ouvirá o comandante-chefe dizer: “Infelizmente, ainda tenho que dar tiros”, ao jornalista é dado ver que a ênfase é posta nos reordenamentos e no progresso, a contraguerrilha parece ser um epifenómeno. Nunca se fala em policiamento, é sempre em guerra. Desembarca e sobre Bissau comenta:
“Tem-se a impressão que a cidade se transformou num grande campo militar e, todavia, os quarteis não se impõem à vista e é preciso procurá-los para os encontrar”.
É alojado no Grande Hotel, sairá de lá com poucas saudades e nenhumas recomendações.
Se o primeiro texto foi intitulado “Paradoxos da guerra camuflada” [28/8/1972], o segundo, para leitor desacautelado, é enigmático: “A simpatia como arma de guerra” [29/8/1972]. Assim, de chofre, ouvem-se rebentar granadas em Ponta Varela, do outro lado do rio Corubal, quando o comandante-chefe está a impor os galões de capitão nos ombros de um alferes em Gampará. O moço é oficial miliciano e comanda um pelotão da companhia instalada na Península, depois que em Novembro passado numa operação de fuzileiros apoiados pela Força Aérea foi possível abrir a primeira cunha apontada ao território Beafada.
Se o primeiro texto foi intitulado “Paradoxos da guerra camuflada” [28/8/1972], o segundo, para leitor desacautelado, é enigmático: “A simpatia como arma de guerra” [29/8/1972]. Assim, de chofre, ouvem-se rebentar granadas em Ponta Varela, do outro lado do rio Corubal, quando o comandante-chefe está a impor os galões de capitão nos ombros de um alferes em Gampará. O moço é oficial miliciano e comanda um pelotão da companhia instalada na Península, depois que em Novembro passado numa operação de fuzileiros apoiados pela Força Aérea foi possível abrir a primeira cunha apontada ao território Beafada.
Gampará, na descrição do jornalista, intimida:
“À sombra das metralhadoras vivem em Gampará cerca de 900 Beafadas atraídos pelas melhores condições de habitação, de fomento agrícola e de assistência sanitária".
Como se os tempos estivessem sincronizados, os helicópteros põem-se em movimento e atravessam o Corubal, vem em direção a Ponta Varela, está-se no rescaldo de uma operação, destruíram-se cerca de uma dezena de celeiros. E anota:
Como se os tempos estivessem sincronizados, os helicópteros põem-se em movimento e atravessam o Corubal, vem em direção a Ponta Varela, está-se no rescaldo de uma operação, destruíram-se cerca de uma dezena de celeiros. E anota:
“Despojos não houve nenhuns, além de uma carta de Havana estampilhada com selos de Fidel e contendo retratos de família de um possível instrutor cubano”.
Apareceram entretanto Balantas capturados, Spínola tranquiliza-os, não lhes irá acontecer mal algum, serão levados ao Xime, para verem as obras do Governo e depois serão conduzidos de helicóptero ao mesmo lugar onde tinham sido encontrados. Não será exatamente assim que as coisas irão acontecer, os Balantas capturados serão recebidos dois dias depois no gabinete do Governador antes de serem devolvidos ao mato. Levarão rádios, apresentaram-se de indumentária afiambrada e levaram dinheiro não se sabe bem para que compras. De Ponta Varela partiram para Ingoré, onde Spínola visitou população vinda do Senegal, na região de Tandé, 400 pessoas voltaram para as suas antigas tabancas, eram Balantas Bravos, que meses antes estavam ainda na órbita da guerrilha.
Passamos agora para o terceiro texto de “Guiné, crónica imperfeita” [30/8/1972], a cargo do enviado especial do Diário de Lisboa. Alguém informou mal o jornalista [, foto à direita, disponível aqui] e este vazou dados imprecisos, assim:
Passamos agora para o terceiro texto de “Guiné, crónica imperfeita” [30/8/1972], a cargo do enviado especial do Diário de Lisboa. Alguém informou mal o jornalista [, foto à direita, disponível aqui] e este vazou dados imprecisos, assim:
“A guerra eclodiu em 1963, logo depois de Amílcar Cabral, então funcionário dos Serviços de Agricultura de Bissau, ter acabado o trabalho de recenseamento agrícola”.
A realidade Balanta interessou o jornalista, que escreve:
“A etnia Balanta continua a fornecer ao PAIGC a maioria dos seus combatentes”.
No Congresso do Povo, em finais de Julho de 1972, Spínola dirigiu-se a esta etnia dizendo-lhes: “Vocês já tiveram oportunidade de verificar de que lado está a justiça, a felicidade da raça Balanta”. E, coisa curiosa como é que a censura deixou passar na íntegra a observação do jornalista:
“O fruto do trabalho dos Balantas era absorvido pelas duas grandes casas comerciais de Bissau, cujos entrepostos recebiam o arroz e a mancarra por preços irrisórios, para venderem depois a preços especulativos”.
Segue-se um curto historial da guerra, o jornalista observa:
Segue-se um curto historial da guerra, o jornalista observa:
“Ao contrário do que aconteceu noutros territórios ultramarinos, o movimento separatista da Guiné surgiu desde logo organizado politicamente e provido de estrutura militar eficaz. A ocupação portuguesa limitava-se a pouco mais de três mil brancos, quase todos funcionários administrativos ou comerciantes. Os chefes militares de Bissau reconhecem hoje que o avanço do PAIGC parecia imbatível nos primeiros anos, atingindo o ponto forte em 1968” (Spínola e o seu círculo sempre insistiram em comunicar com o exterior que o ponto de inversão era 1968, por acaso o ano em que chegou à Guiné”.
Avelino Rodrigues teve acesso aos elementos fornecidos pelo comando-chefe, escreve que 2000 combatentes do PAIGC manobram a partir das zonas de “duplo controlo” e a reportagem mostra o mapa da Guiné polvilhado na fronteira de 31 bases onde estariam sete mil combatentes, dos quais cerca de dois mil se internariam no território para espalhar o terror. Outros dados, a força africana era composta por cerca de cinco sodados regulares, cerca de seis mil milícias, mais de seis mil autodefesas, doze companhias de caçadores são comandadas por graduados nativos e diz-se algo de surpreendente:
Avelino Rodrigues teve acesso aos elementos fornecidos pelo comando-chefe, escreve que 2000 combatentes do PAIGC manobram a partir das zonas de “duplo controlo” e a reportagem mostra o mapa da Guiné polvilhado na fronteira de 31 bases onde estariam sete mil combatentes, dos quais cerca de dois mil se internariam no território para espalhar o terror. Outros dados, a força africana era composta por cerca de cinco sodados regulares, cerca de seis mil milícias, mais de seis mil autodefesas, doze companhias de caçadores são comandadas por graduados nativos e diz-se algo de surpreendente:
“Os milícias são militares em part-time só em circunstâncias especiais participam em operações”.
A última reportagem [31/8/1972] passa-se em chão Manjaco, é aí, essencialmente, que se está a desarmar a subversão. O repórter escreve:
A última reportagem [31/8/1972] passa-se em chão Manjaco, é aí, essencialmente, que se está a desarmar a subversão. O repórter escreve:
“Não vi guerrilheiros nas estradas que percorri de jipe sem a proteção de qualquer arma desde Teixeira Pinto ao Pelundo e a Churobrique, onde fui encontrar no reordenamento de Zinco lado Demba que há três anos se apresentou com um grupo de 30 homens”.
Informa o jornalista que ali está assegurado do domínio militar, aqui é o campo de ensaio da política de Spínola, um exemplo de que foi possível fazer em menos de quatro anos o trabalho de quatro séculos.
Noutra incursão, conversa com Augusto, chefe de tabanca de Bissássema, antigo carregador do PAIGC. O repórter interroga-se sobre os nervos de aço e a temperança indispensáveis para aguentar uma comissão militar tão violenta. Um comandante de um quartel, a tal propósito, fez-lhe o seguinte comentário:
Noutra incursão, conversa com Augusto, chefe de tabanca de Bissássema, antigo carregador do PAIGC. O repórter interroga-se sobre os nervos de aço e a temperança indispensáveis para aguentar uma comissão militar tão violenta. Um comandante de um quartel, a tal propósito, fez-lhe o seguinte comentário:
“Mentalizei os rapazes para aguentaram os dois anos de guerra como pagamento do direito de continuarem a viver em paz na Metrópole. O que é preciso é não morrer, safarmo-nos como podermos”.
As últimas deambulações decorrem à volta dos reordenamentos. É aqui que Spínola lhe diz que a guerra não se pode ganhar aos tiros, é por isso que os militares trabalham pelo progresso da província. E a reportagem termina de um modo cismático:
“Mas quando acabar a guerra, quem poderá mobilizar os técnicos para o serviço civil na paz? Parece paradoxal mas é verdade: o pior será quando a guerra acabar”.
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Nota do editor:
Último poste da série > 27 de setembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12092: Notas de leitura (523): "Missão na Guiné", publicação do Estado-Maior do Exército e "Histórias de Guerra, Índia, Angola e Guiné, Anos 60", por José Pais (Mário Beja Santos)