sexta-feira, 29 de novembro de 2024

Guiné 61/74 - P26212: (Ex)citações (431): Ainda o caso do nosso saudoso António da Silva Baptista (1950-2016), o "morto-vivo": nas vésperas do "verão quente de 1975" era herói da literatura de cordel nas feiras e romarias do Norte



Fotogranma de vídeo da RTP Arquivos  > Programa: Memórias da Revolução: Soldado António Silva Baptista (passou na RTP, em 2 de junho de 2015; duração: 1'13''). Foto: LG (2024)
 

1. Em junho de 1975, nas vésperas do "verão quente de 1975", nas feiras e romarias do Norte,  o nosso querido António da Silva Baptista (1950-2016), o "soldado morto-vivo", era herói da literatura de cordel... 

Em junho de 1975, nas romarias, a sua história, ao lado de outros dramalhões,  era vendida em folha de jornal. de grande formato, com o título "Dor, Lágrimas e Alegria", ao preço de 5 escudos (o equivalente, a preços de hoje, a 1 euro; no vídeo, que é de 2015, a 69 cêntimos)...Com direito a lágrimas de dor e alegria,  à mistura com  a música de acordeão...

Sabemos como foi o princípio,  meio e fim (*)... Menos de um ano depois, em junho de 1975 ele já era uma lenda: feito prisioneiro do PAIGC em 17 de abril de 1972, e trocada a sua identidade com outro canarada (o António Ferreira, 1950-1972,  que esse, sim, foi efetivamente umas das vítimas mortais da brutal emboscada do Quirafo), só foi libertado em setembro de 1974  (por troca de prisioneiros entre as NT eo PAIGC)... 

Em junho de 1975 a sua história, memso mitificada, já era conmhecida e os cantadores ambulantes de feiras e romarias já ganhavam uns cobres com ela, narrando o seu drama: prisioneiro, incomiunicável,  sem ninguém saber que  estava vivo, fez parte das partilhas do que sobrou da Guiné... Entretant0o, já tinha  sido enterrado em 1972 (por troca de identidade com o António Ferreira) ...Voltaria à sua terra, Moreira da Maia, para espanto dos vivos, e iria visitar a sua própria campa em 18 de setembro de 1974. 

Eu próprio me emocionei,. quando há dias descubri este vídeo da RTP (**)...que merece ser partilhado com os nossos leitores.

2. Sinopse e ficha técnica do vídeo (que pode ser visto acima, no sitío da RTP > Arquivos, e conteúdo está sujeito a licenciamento razão por que não o podemos pôr aqui diretamente):

Programa de caráter histórico que assinala as comemorações dos 40 anos do Processo Revolucionário em Curso (PREC), que ocorreu entre 11 de março e 25 de novembro de 1975, com destaque para a história de António Silva Baptista, o soldado "morto-vivo", dado como morto na Guiné em abril de 1972, quando na verdade tinha sido feito prisioneiro pelo PAIGC.

Ficha técnica:

Nome do Programa: Memórias da Revolução: Soldado António Silva Baptista

Nome da série: Memórias da Revolução

Locais: Lisboa

Temas: História, Política

Canal: RTP 1

Data: 2015-06-23

Duração: 00:01:13

Menções de responsabilidade:

Autoria: Instituto de História Contemporânea e RTP - Série promovida pelo Instituto de História Contemporânea (IHC) da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da UNL em parceria com diversas instituições.

Tipo de conteúdo: Programa

Cor: Cor

Som: Stereo

Relação do aspeto: 16:9 PAL


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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 25 de março de 2016 > Guiné 63/74 - P15899: Recortes de imprensa (79): Uma "histórica" entrevista dada, em 18/9/1974, pelo António da Silva Batista (1950-2016) ao extinto "Comércio do Porto", quando regressou ao "mundo dos vivos" (Mário Miguéis da Silva, ex-fur mil rec Inf, Bissau, Bambadinca e Saltinho, 1970/72; vive hoje em Esposende)

(**) Último poste da série > 12 de novembro de 2024 > Guiné 61/74 – P26146: (Ex)citações (430): Habitações palacianas de Gabu (José Saúde)

Guiné 61/74 - P26211: S(C)em Comentários (53): O drama dos felupes, que estão a perder o seu chão e a sua identidade, afetados pelas alterações climáticas (Cherno Baldé)... E que agora perderam uma grande amiga, a antropólogia Lúcia Bayan , falecida no passado dia 26

1. A propósito do drama dos felupes, os primeiros refugiados ecológicos da Guiné-Bissau, vítimas das alterações climáticas, e da morte,  inesperada, da sua amiga portuguesa, a antropóloga Lúcia Bayan (*), vamos repescar este comentário do nosso Cherno Baldé (**):

A minha primeira visita ao Chão Felupe foi em maio de 1997, por ocasião do dia internacional dos trabalhadores, tendo feito o percurso de Bissau - Varela, passando por S. Domingos. 

Nessa ocasião constatei que, contrariamente ao que acontece no Chão Fula (Zona Leste), os Felupes e seus irmãos Baiotes, não tinham aldeias plantadas junto da estrada principal que atravessava o seu Chão,  indo de S. Domingos para Varela, preferindo ficar afastados, em zonas escondidas e de difícil acesso,  facto que, também, tinha verificado no Chão Balanta,  logo após o fim da guerra colonial e em Biombo nos anos 80 quando trabalhei como professor nesta região do litoral guineense.

A conclusão lógica a que cheguei, na altura,  é que, sendo povos indígenas de longa data,tendo sofrido várias invasões e agressões de povos conquistadores vindos do interior do continente, como nos explica o Amílcar  Cabral no livro sobre a história da Guiné e as Ilhas de Cabo-Verde (PAIGC 1974), estes povos foram obrigados, cada vez mais, a se refugiar e adaptar-se em zonas muito inóspitas e de difícil acesso como foi o caso dos Nalus que foram habitar as ilhas e zonas baixas de Cubucaré e Quitáfine, ou o caso extremo dos Bijagós que vivem no arquipélado de mesmo nome. 

No caso dos Felupes e Baiotes esta localização geográfica teria sido muito importante durante o periodo da ocupação colonial, já que lhes permitia oferecer uma notável resistência e prática da guerrilha num espaço reduzido mas semeado de obstáculos naturais.

Mas, vivendo o pais hoje num contexto de completa liberdade, onde se desenvolve pouco a pouco uma interação e concorrência apertada com as outras regiões e grupos étnicos em diferentes domínios da vida social e económica, estes povos fazem a constatação lógica e normal das dificuldades e desvantagens da sua inadequada situação habitacional, para a qual procuram encontrar uma saída razoável para viver e expandir-se como os outros povos,  seus vizinhos. 

As mudanças climáticas vêm juntar-se e complicar ainda mais esta situação que já em si era insustentável há muito tempo, pelo menos desde que a monocultura de caju se tornou no principal produto de renda e de subsistência social e económica. 

De resto, os conflitos sobre a posse da terra são extensivos ao resto do país e nos diferentes Chãos tradicionais sem deixar de lado outros problemas transversais como o género e os direitos humanos, hoje muito em voga nos países do terceiro mundo.

Com um abraço amigo,

Cherno Baldé

2020 jan 16 12:17 (***)

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(***) Último poste da série > 8 de novembro de 2024 > Guiné 61/74 - P26127: S(C)em Comentários (52): General António Spínola 'versus' general Bettencourt Rodrigues (Morais da Silva, cor art ref, e 'capitão de Abril')

quinta-feira, 28 de novembro de 2024

Guiné 61/74 - P26210: Lembrete (49): Tabanqueiros/as do Centro, que não vos falte o fôlego para apagar amanhã as 100 velas do bolo!



Logo da Tabanca do Centro, que vai fazer amanhã o seu 100º encontro, como de resto já tínhamos anunciado no poste P26132 (*)...  



1. Na Ortigosa, concelho de Leiria, na nossa já conhecida Quinta do Paul (fizemos lá dois Encontros Nacionais da Tanca Grande, o III e o IV, em 2008 e 2009, respetivamente), amanhã há festa.  

As inscrições já fecharam, mas o nosso lembrete vem a propósito, porque amanhã é dia de "ronco" para os tabanqueiros do Centro. E  Tabanca Grande, que é, a bem dizer, ... "a mãe de todas as tabancas", vem regozijar-se e desejar, a todos e a todas, bom almoço e bom convívio. Que não lhes falte o fôlego para apagar as 100 velas do bolo... 

Hoje, no Centro Comercial Alegro, em Alfragide, encontrei o meu vizinho, e bom amigo,  Juvenal Amado e ouvi-o combinar com o Miguel Pessoa, que mora em Benfica, a hora e o local para apanhar a boleia do costume até à Ortigosa... 

Recorde-se que foi, em dezembro de 2009, que  o Juvenal Amado (na altura a viver em Alcobaça, e hoje na Reboleira, Amadora) , o Vasco da Gama (Figueira da Foz) e o Manuel Reis (Aveiro) tiveram a ideia de criar a Tabanca do Centro. 

Aos pais-fundadores juntaram-se o Joaquim Mexia Alves (Marinha Grande e Monte Real) e o Miguel Pessoa (Lisboa). E tudo começou regularmente à volta da mesa e do famoso "cozida à Portuguesa", servido às 4ªs feiras na Pensão Montanha, em Monte Real. E tão famoso que chegou a vir gente da Suécia para provar a iguaria da "chef" Dona Preciosa...

Depois o mundo deu muitas voltas, mas a Tabanca do Centro nunca perdeu o seu lugar de equidistância "geodésica" entre todas as tabancas da Tabanca Grande... Pois ela fica, rigorosamente, ao Centro, entre o Norte e o Sul, o Oeste e o Leste... Quem não acreditar, que vá lá medir...

100 encontros é mais do que uma "marca", é um "marco"... E no dia 27 de janeiro de 2025 haverá outro bolo, com 15 velas para soprar, comemorativo do 15º aniversário do primeiro (e histórico) encontro. 

Tenho pena de lá não poder estar amanhã. Mas daqui vão os meus xicorações, alfabravos, quebra-costelas, mantenhas e beijinhos para todos/as os/as tabanqueiros/as do Centro (que esse é do género...neutro). 

A Tabanca Grande também está bem representada na lista dos inscritos para o 100º convívio da Tabana do Centro (contámos pelo menos 15 grãos-tabanqueiros, que vão com links com as suas referências no nosso blogue).

A Tabanca Grande sente-se também  orgulhosa por estar na génese de todas as congéneres espalhadas pelo País, a começar, historicamente, pela Tabanca de Matosinhos, a Tabanca do Centro e, mais tarde, a Tabanca da Linha, dos Melros (Fânzeres, Gondomar), etc.
 
Estas, e outras Tabancas mais pequenas (da Maia, do Algarve, da Diáspora Lusófona, etc.), são um caso de estudo, surgidas quase espontaneamente, com o fim de manter o convívio entre velhos camaradas da Guerra do Ultramar / Guerra Colonial, que agora têm mais tempo disponível e perderam todo o tipo de complexos, por ventura imputados ao seu passado como combatentes nos territórios africanos de então.

Desejamos à Tabanca do Centro uma vida longa e activa, salientando o fundamental papel que têm mantido os  seus mentores, com destaque para o Joaquim Mexia Alves e o  Miguel Pessoa, sem esquecer os outros pais-fundadores. (LG)



29Nov2024 | Inscritos: 45
(Revisão / fixação de texto, links: LG)
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Guiné 61/74 - P26209: Ser solidário (275): Quatro anos como médico cooperante (1980-1984), em Fulacunda e em Bissau (Henk Eggens, neerlandês, consultor internacional em saúde pública, reformado, a viver em Santa Comba Dão)



Foto nº 1 > Guiné-Bissau > Região de Quínara > Fulacunda > 1980 > "Eu,  Henk Eggens, médico  neerlandês, cooperante"... Esteve dois anos em Fulacunda (1980-82) e depois em Bissau (1982-84)


Foto nº 2 > Antiga Guiné Portuguesa > Região de Quínara > Fulacunda > s/d > "
Casa no quartel onde depois fiquei, em 1980".  

Fonte: https://rumoafulacunda.wordpress.com/fulacunda/ (com a devida vénia).



Foto nº 4 > Guiné-Bissau > Região de Quínara > Fulacunda > 
"Farmácia da Tabanca" .  



 Foto nº 5 > 
Guiné-Bissau > Região de Quínara > Fulacunda > 1980 > *Ilustração: parto",.   Fonte: Livro Formação das matronas, 1978, MINSAS, Guiné-Bissau.




Foto nº 6 > Guiné-Bissau > Região de Quínara > Fulacunda > 1980 > "Ilustração: rede mosquiteira para crianças*,  Fonte: Livro Formação das matronas, 1978, MINSAS, Guiné-Bissau. 



Foto nº 7 > Guiné-Bissau > Região de Quínara > Fulacunda > 1980 > "Ilustração: 
   Cinco doenças a tratar pelos Agente de Saúde de Base",  Fonte:  Fonte: Livro Formação das matronas e dos agentes de saúde de base (A.S.B.) nas tabancas, 1980, CESAS, Guiné-Bissau.



Foto nº 8 > Guiné-Bissau > Região de Quínara > Fulacunda > 1980 > "Ilustração:  latrina".  Fonte: Livro Formação das matronas e dos agentes de saúde de base (A.S.B.) nas tabancas, 1980, CESAS, Guiné-Bissau.



Foto nº 9 > Antiga Guiné Portuguesa > Região de Quínara > Fulacunda > s/d >  "
Fulacunda no tempo colonial com campo de vólei". Fonte desconhecida




 Foto nº 10> Guiné-Bissau > Região de Quínara > Fulacunda > 1980 >   "Casa do médico, Land Rover do projeto,  mota da noiva e carro 404 privado".



Foto nº 1 > Guiné-Bissau > Região de Quínara > Buba > 1980 > "Bomba da água,  do projeto de Buba". 


1.  Já troquei alguns mails, com o meu colega holandês (ou neerlandês), Henk Eggens, especialista em medicina tropical e saúde pública, que vive, aposentado, em Portugal, em Santa Comba Dão, e é o administrador e editor de Portugal Portal (em neerlandês ou holandês) (*).

No passado dia 9 de setembro último, ele escreveu-me o seguinte, em resposta a um email que lhe tinha mandado:

 (...) Bom dia, Luís!
Foi bom ver o teu e-mail. Temos algumas coisas em comum, isto foi claro para mim.

Primeiramente o nosso primeiro ano nesta terra: 1947!

Segundo, a paixão para conhecer outras terras: Conheceste o mundo académico do TNO na Holanda (que conheço só por nome), além do teu passado na Guiné, e provavelmente outros países.
Trabalhei 20 anos no Royal Tropical Institute (**), Amesterdão,  como consultor de saúde pública (lepra, tuberculose, cuidados primários de saúde). O que me levou a todos continentes no Sul. A minha vida nunca foi monótona... A nossa vida atual na aldeia,  perto de Santa Comba Dão,  é mais tranquila (...).
Terceiro, a paixão de comunicar algo de substancial para um público (nos blogues, no ensino). Tua carreira académica, o blogue 'Tabanca Grande' que admiro.
Durante a minha vida profissional desenvolvi cursos de saúde tropical, também 'online', e dei muitas aulas. Com muita satisfação. Gosto de ser editor de Portugal Portal e partilhar com o público neerlandófono (como se diz isso, mesmo?) sobre Portugal, a sua história, cultura, pequenas histórias da vida.(...)
 Mantenhas!
(Na altura na Guiné, aprendi bem a conversar em crioulo, não havia outra hipótese de comunicar com o povo lá. Agora perdi já muito a fluidez)

Henk
2. Nova mensagem do nosso leitor Henk Eggens, médico, especialista em medicina tropical, reformado, a viver em Portugal.
Data - sexta, 1/11/2024, 13:03


Boa tarde, Luís.

Espero que estejas  bem, já de volta da vindima no Norte no mês passado.

Vi a mensagem recente do bloguista Patrício Ribeiro no blogue (...) e decidi escrever-te.

(i) Recebeste o meu e-mail de 12 de setembro 2024 com a apresentação dum amigo meu, intitulado 'Amílcar Cabral e os cuidados de saúde durante a luta de libertação' ? Achas apto para publicar no teu blogue?

(ii) Acabei de escrever algumas das minhas aventuras na Guiné-Bissau nos anos 1980-1984. Me pediste para contar as minhas experiências durante minha estadia como médico na região de Quínara. Segue o texto e as fotografias em anexo.

Se achas oportuno,  podes publicar no teu blogue.

Um abraço desde Santa Comba Dão,

Henk



3. Comentário do editor LG:

Obrigado, Henk. Já vi que tens página no Facebook.   Fazes parte do grupo público Santa Comba Dão - Luagres, Factos e a Nossa Gente.  E do teu CV, no Linkedin, respiguei o seguinte:

"Consultor internacional em saúde públiva, aposentou-se após quarenta e cinco anos de experiência na prestação de cuidados de saúde em países com poucos recursos em três continentes. Amplas relações de trabalho entre governos e ONG internacionais.. Missões de longo prazo em Angola, Guiné Bissau, Tanzânia e Indonésia. Missões de curto prazo  em mais de 15 países. 

"Idiomas: Inglês, Português: excelente. Francês: bom. Espanhol, Kiswahili, Indonésio: básico. Holandês: língua materna.  Competências curriculares: : monitoização e avaliação, controle da tuberculose, controle da hanseníase (doença de Hansen ou lepra), desenvolvimento curricular, e-learning".  Fonte: Linkedin > Henk Eggens.

Espero que esta seja a primeira de muitas colaborações tuas no nosso blogue (***), onde cabem todos os amigos da Guiné-Bissau com tudo o  que os une e até com aquilo que nos pode separar. O teu portuguê é muito bom. Dei apenas um retoque numa palavra ou outra (e nomeadamente no tempo dos verbos)...

E a teu pedido, acrescento mais duas linhas sobre o período em que estiveste na Guiné: (...) 

"Trabalhei apenas dois anos em Fulacunda (1980-1982). Depois, fui coordenador do Projeto de Saúde de Base no Ministério da Saúde em Bissau (1982-1984)."



Esta é a história dum médico holandês que foi trabalhar na província rural de Quínara, Guiné-Bissau, de 1980-1984, quando o país se tornou independente havia poucos anos.

Por Henk Eggens 
 

Em abril de 1980, desembarquei no aeroporto de Bissalanca. Estava bem preparado. Já durante pos meus estudos de medicina, eu tinha decidido que queria trabalhar em África. 

Após cinco anos de estudos teóricos, tirei um ano sabático. Viajei pela África Ocidental através do Saara e pelo Congo até a África Oriental. Durante sete meses, conheci muitas Áfricas. No final dos meus estudos de medicina, fiz um curso de três meses sobre doenças tropicais, o que me preparou melhor para reconhecer e tratar essas doenças.

O meu primeiro emprego foi em Angola. Em 1976, quatro meses após a declaração de independência (****), viajei para Cabinda e trabalhei lá durante  dois anos na ala pediátrica do hospital provincial. Lá, aprendi muito: a falar português, e palavrões cubanos dos meus colegas médicos. Aprendi na prática a tratar a patologia tropical. Perdi também a ilusão da viabilidade e desejabilidade duma sociedade comunista.

Em 1980, tive a oportunidade de trabalhar na Guiné-Bissau. Consegui um emprego no Ministério da Saúde da Guiné-Bissau e fui colocado na região de Quínara, no sul da Guiné-Bissau. A província tinha cerca de 40.000 habitantes. Ninguém sabia exatamente quantos. Já fazia parte da área libertadada durante a guerra colonial, com exceção dos quarteis do exército português e as tabancas. 


Excerto da carta de Fulacunda  (1955) (Escala 1/50 mil)
  Fonte: Cortesia  do Blogue Luís Graça
& Camaradas da Guiné
Fui morar em Fulacunda, uma vila de mil habitantes onde existiu um quartel militar (Vd. fotos nº 1  e 3).

 O que encontrei quando cheguei em Fulacunda? 

Não havia hospital. Um posto de saúde em Fulacunda consistia em uma cabana, parte do antigo quartel
 e havia uma cadeira ginecológica enferrujada. E uma caixa de medicamentos enviada pelo ministério. 

Outros lugares na região de Quínara tinham cabanas semelhantes com um mínimo básico de recursos.

Havia mais pessoal de saúde. Em Tite, morava Augusto, um enfermeiro treinado na época colonial que sabia de tudo e me explicou muitas coisas, me tornando mais sábio sobre como as coisas aconteciam na região. 

Em Fulacunda e Empada, trabalhavam dois ‘meio-médicos’ guineenses. Digo ‘meio-médicos’ porque eram jovens que foram treinados na União Soviética como feldshers, um tipo de treinamento prático para atuação médica (*****). 

Além disso, havia alguns socorristas presentes nas tabancas. Em Nhala, que também era um antigo quartel do exército colonial português, havia um centro de treinamento onde os socorristas, muitas vezes analfabetos e que haviam trabalhados na guerra de libertação, recebiam treinamento formal como auxiliares de enfermagem. 

No início, eu viajava muito por todas as vilas e postos de saúde para ver o que estava acontecendo. Era muito pouco. Sempre faltavam medicamentos.

As pessoas moravam longe dos postos de saúde e a medicina tradicional era a principal fonte de cuidados de saúde. Logo comecei a organizar cuidados materno-infantis. Sob a mangueira (ou o poilão), reuníamos regularmente as grávidas e as crianças e administrávamos as vacinas necessárias, contra tuberculose, sarampo, difteria, tétano, poliomielite e coqueluche.  
Providenciávamos medicamentos (foto nº 4) e conselhos ás grávidas. Com um cartão onde os pesos das crianças eram anotados e que eu mesmo havia mimeografado, acompanhávamos o crescimento e desenvolvimento das crianças pequenas. 

Eram passeios populares. Mães e crianças vinham de longe para receber as vacinas e ouvir nossas palestras.

Parte do meu trabalho era treinar os voluntários (Agentes de Saúde de Base) nas tabancas para reconhecer e tratar cinco doenças (fotos nºs 5, 6 e 7).

Também treinámos as parteiras tradicionais (matronas). Elas recebiam um pequeno kit, uma caixinha com uma faca esterilizada e fios esterilizados  para cortar e amarrar o cordão umbilical depois do parto. Além disso, eram instruídas sobre a importância de um comportamento antisséptico durante o parto (foto nº 5).

A ideia era que os voluntários na tabanca recebessem uma caixa de medicamentos com os quais pudessem tratar cinco doenças (foto nº 7). Essas eram:

  • paludismo (corpo quente), 
  • conjuntivite (dor di udjo), 
  • dor de cabeça,
  • diarreia (panga barriga), 
  • tosse e feridas. 

Posteriormente à formação,  a tabanca recebia uma caixa de medicamentos. Depois, a própria tabanca, por meio de contribuições voluntárias (abota), arrecadava dinheiro para comprar novos medicamentos no Depósito Central de Medicamentos em Bissau. 

Havia muita hesitação na tabanca para juntar dinheiro, pois nem todos confiavam que seria bem utilizado. Foi necessária muita persuasão para convencer as pessoas a contribuir, e, eventualmente, isso funcionou em algumas tabancas.

Além de poder tratar estas doenças,  os Agentes foram ensinados sobre medidas preventivas da higiene nas tabancas  (fotos nº 7 e 8).

Este Projeto de Saúde de Base ocorreu em vários lugares da Guiné-Bissau, sob a inspiradora liderança do vice-ministro da saúde, Dr. Manuel Boal. Havia projetos no Oio, na ilha de Canhabaque, em Tombali e no extremo leste, em Lugadjol, no setor de Madina do Boé, e em Quínara, onde eu trabalhava. 

O projeto teve bastante sucesso nos primeiros anos, graças à liderança entusiástica dos coordenadores guineenses e dos cooperantes estrangeiros. Depois de algum tempo, a confiança dos aldeões foi conquistada e eles contribuíram voluntariamente com dinheiro, e isso era muito pouco dinheiro, para comprar medicamentos para serem usados na tabanca. No entanto, ficou claro que este projeto nunca seria completamente autossuficiente, pois sempre havia preços que eram altos demais para o que os aldeões podiam pagar.

As minhas atividades curativas (ou mais propriamente clínicas) eram bastante limitadas porque eu não tinha muitos recursos. Poucos medicamentos e nenhum instrumento para realizar qualquer procedimento terapêutico mesmo simples. 

Um dos eventos mais impressionantes foi quando, numa manhã, uma jovem mulher chegou a Fulacunda dizendo que havia sido mordida por uma cobra enquanto pegava água no rio. Ela não sabia exatamente que tipo de cobra era, mas foi mordida na perna. 

O que podíamos fazer? Tínhamos soro antiofídico, mas não sabíamos há quanto tempo estava fora da geladeira, então não sabíamos se ainda era eficaz, mas usámo-lo mesmo assim. Injetámos na esperança de que ajudasse. 

Observávamos a jovem mulher e, após algumas horas, os seus dedos de pé começaram a paralisar. As suas pernas começaram a enfraquecer e paralisar, e em seis horas, ela acabou por faleceu porque os seus músculos respiratórios também paralisaram. 

Tentámos de tudo: respiração artificial, administração de oxigênio que tínhamos por acaso. Mas nada ajudou. Nunca esquecerei os olhos assustados e suplicantes da jovem mulher que morreu de uma picada de cobra.

Outro evento que me marcou foi ajudar no chamado fanado

O fanado é um ritual realizado pelo grupo étnico Beafada, onde eu morava. Uma vez a cada poucos anos, jovens homens e meninos de 7 a 12 anos eram isolados na floresta por meses, onde aprendiam os segredos da tribo e como sobreviver e cumprir seu papel nas comunidades da tabanca. 

Durante o período colonial, esses fanados eram realizados em segredo, e agora, com a independência, os líderes decidiram que os serviços de saúde poderiam contribuir. No final dos meses de isolamento, os jovens eram circuncidados. Meu assistente e fiel colaborador Sanquinho, o auxiliar médico, foi convidado a ir à floresta para desinfetar os pénis recém-circuncidados. Eu não podia ir porque era branco, um estrangeiro. 

Ele foi. No dia seguinte, ele voltou dizendo que não conseguiu. Ele levou iodo como desinfetante, que é à base de álcool, mas o primeiro menino que foi desinfetado começou a gritar tão alto que desistiram dessa ajuda. O que fazer?

Felizmente, tínhamos outro desinfetante, a violeta genciana, que era à base de água. Sugeri usá-lo, mas com a condição de que eu mesmo fosse à floresta para observar e aplicar. Após alguma discussão, isso foi permitido e viajámos para a floresta. Em um determinado momento, chegámos a uma árvore caída, que era o limite absoluto até onde podíamos ir. Dali para a frente, a área era proibida para nós e, atrás da árvore caída, havia uma fila de meninos. Meninos com rostos assustados, com as mãos cobrindo suas partes íntimas, esperando para desinfetar os seus pénis recém-circuncidados.

Um por um, eles levantavam os panos sujos que cobriam suas partes íntimas e podíamos aplicar o desinfetante. Como era à base de água, não era irritante e foi bem tolerado pelos meninos. Ganhei uma experiência valiosa e os meninos, espero, foram desinfetados após uma circuncisão que não foi feita completamente de acordo com as normas antissépticas.

A minha vida em Fulacunda não era tão fácil. A sra. Maria cuidava de mim, preparava as comidas e limpava a casa. Tinha algumas galinhas para ter um ovo no mata-bicho. Importei legumes desidratadas de Holanda e, de vez em quando, conseguíamos uns tomatinhos. Os pescadores traziam-me de vez em quando uma barracuda, peixe grande e deliciosa.

Na frente da minha casa havia um campo de jogos (antigamente para jogar vólei?) (foto nº 9).  Às vezes eu instalava o meu gravador lá à noite e os moradores e nós dançávamos ao som de uma música animada.

Antes de viajar para Guiné-Bissau, comprei na Bélgica uma caixa de cartuchos (calibre 12). Provou ser muito útil. Não sabia caçar, mas o meu amigo Manuel sabia. Levou de noite um ou dois cartuchos para o mato e voltou de manhã com um antílope. Dividimos a carcaça e havia carne para umas semanas. 

Raramente era  abatida uma vaca na tabanca. Costumavam-me chamar para inspecionar o estado de saúde da carne. Tinha um livro de medicina veterinária, assim podia verificar os pulmões, o fígado e se a carne oferecia as condições mínimas de salubridade. Levava  uma balde grande para  inspeção: depois de autorizar a venda da carne, era o primeiro a poder escolher a minha parte da vaca.

 A minha noiva (holandesa) vivia em Bissau. Tanto quando possível viajávamos para nos encontrarmo-nos (foto nº 10). Ela tinha uma mota Honda 125 cc off-the-road. Com um barco tradicional ou um barco dum projeto holandês costumávamos travessar o rio Geba. Nem sempre havia águas tranquilas.

Em Buba havia na altura um grande projeto de abastecimento de água (foto nº 11). No antigo quartel foi estabelecido o centro do projeto, que incluiu também uns 5 a 7 técnicos holandeses. No Catió era o centro duma empresa holandesa Stenaks, que construiu centros de saúde na região de Tombali e Quínara. 
Foi uma grande ajuda ter estes compatriotas relativamente perto. 

No tempo da chuva era praticamente impossível viajar, pois as estradas eram intransitáveis, mesmo com meu carro de trabalho, o formidável Land Rover (foto nº 10).

Foram alguns anos de muitas experiências. Foi a base para minha futura carreira na área de saúde tropical. 

Obrigado, Guiné, obrigado,  guineenses!

(Revisão / fixação de texto, edição de fotos: LG)

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Notas do editor:


(**) Equivalente ao nosso Instituto de Higiene e Medicina Tropical / NOVA, Lisboa

(***) Último poste da série > 25 de setembro de 2024 > Guiné 61/74 - P25981: Ser solidário (274): Bilhete-postal que vai dando notícias sobre a "viagem" da campanha de recolha de fundos para construir uma escola na aldeia de Sincha Alfa - Guiné-Bissau (10): O mel da Guiné-Bissau (Renato Brito)

(****) 11 de novembro de 1975

(*****) Na China e em Moçambique eram chamados "médicos de pé descalço"... Prestadores de cuidados de saúde, sem qualificações formais, atuando sobretudo na áreas da prevenção da doença e da promoção da saúde.

Guiné 61/74 - P26208: Tabanca Grande (565): Jorge Fernando Ferreira Pedro, ex-1.º Cabo Radiotelegrafista da CART 6251/72 (Catió e Cabedú, 1972/74), que se senta no lugar 896 do nosso poilão

1. Mensagem de Jorge Fernando Ferreira Pedro, dirigida em 23 de Fevereiro passado ao nosso Blogue através do Formulário de Contacto do Blogger:

Quero fazer parte do vosso blog.

Fui combatente na Guiné. 72/74. Cart 6251.

Eu pessoalmente fiz toda a comissão em Cabedú, Especialidade de radiotelegrafista, 1.º Cabo.

Cumprimentos,
Jorge Pedro


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2. No dia 7 de Março foi enviada mensagem ao camarada Jorge Pedro:

Caro camarada Jorge Pedro:

Muito obrigado pelo teu contacto e por quereres fazer parte da tertúlia do nosso Blogue.

A fim de que sejas apresentado com o maior número de dados possível, por favor manda-nos uma foto actual e outra, fardado, do tempo de Guiné. Se não foste com a tua Companhia, diz-nos em que data foste e vieste da Guiné.

Se quiseres, podes contar-nos uma pequena história passada contigo ou a que tenhas assistido, na Guiné, acompanhada de algumas fotos que tenhas aí por casa.

Sabemos que te chamas Jorge Pedro, que foste 1.º Cabo Radiotelegrafista da CART 6251 e que estiveste em Cabedú. Se quiseres fala mais de ti na vida civil, onde vives (só a localidade, claro) a tua ocupação, etc.

Ficamos à espera do teu contacto para te apresentarmos à tertúlia.

Recebe um abraço do teu camarada e amigo
Carlos


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3. Mensagem do nosso camarada e novo tertuliano Jorge Fernando Ferreira Pedro que foi 1.º Cabo Radiotelegrafista da CART 6251/72 (Catió e Cabedú, 1972/74), com data de 24 de Novembro de 2024:

Boa tarde caros amigos,

Por algum desmazelo da minha parte só agora respondo ao vosso email que me foi enviado após o meu contacto. Vou enviar duas fotos do tempo da Guiné e outra atual.

Agora sou reformado.

Depois do regresso da Guiné comecei a estudar como Estudante/Trabalhador e frequentei a Universidade de Coimbra, em Direito, tendo feito várias cadeiras mas não acabei a licenciatura.

Fiz um Mini MBA na Universidade Católica do Porto, Leadership Challenge - Liderança de Grupos com excelente aproveitamento.

Trabalhei no setor Bancário durante 35 anos, sendo 25 como gerente e 3 como Director de Departamento.

Tenho várias "estórias de guerra", algumas que me envergonho só de pensar que tal aconteceu.
Um dia destes vou tentar escrever as mesmas e enviarei para o blog.

Algumas atividades que fui exercendo:

- Treinador de Futebol entre várias equipas a de maior destaque foi o Lourosa na 3.ª e 2.ª Divisão Nacional.

- Fui Deputado Municipal na Assembleia Municipal de Santa Maria da Feira durante 8 anos.

- Fui Representante da Câmara Municipal de Santa Maria da Feira na CPCJ de Santa Maria da Feira onde exerci a função de comissário durante 8 anos e gestor de processos durante 5 anos, estes já depois de reformado.

- Dedico-me à fotografia e já fiz várias exposições, sendo que vou expor novamente a partir de 7 de dezembro, na casa da cultura de Avintes integrada nas propostas fotográficas da Associação Instantes.

- Pinto a Óleo e tenho vários trabalhos em diversas instituições de carácter Social.

- Toco Guitarra, Saxofone e Clarinete.

- Sou membro do Grupo Coral da Universidade Sénior de Espinho, onde resido atualmente.

Por hoje chega. Apenas atividades após o regresso da Guiné.

O antes da Guiné é tão rico como o pós Guiné.

Abraço.
Jorge Pedro


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4. Comentário do editor:

Caro Jorge Pedro,

Bem-vindo à tertúlia da nossa Tabanca Grande, um blogue onde os antigos Combatentes da Guiné, e não só, convivem em sã camaradagem, quer publicando as suas memórias escritas e em fotos, quer comentando os postes publicados por terceiros.

Os nossos propósitos, enquando depositório da história contada na primeira pessoa pelos combatentes da Guiné, estão patentes na aba lateral da nossa página. Contamos por isso com a tua colaboração, sendo que pelo que referes, tens muito para nos contar. Os antigos militares que por aqui convivem há largos anos, assim o podemos afirmar já que o blogue tem a bonita idade de quase 25 anos, disseram praticamente tudo o que tinham para dizer. Os camaradas que chegam de novo são, por isso, a esperança de novas estórias, experiências e fotografias.

O tempo que lá viveste foi já o do "fim do império", em contraponto com a maioria da tertúlia, composta por combatentes dos anos 60.

Muito obrigado pela tua apresentação "civil", muito completa, que transparece uma personalidade multifacetada. És um homem dos sete instrumentos, embora só toques três musicais, porque fizeste e fazes de tudo, como profissional e nas artes. A propósito, ficamos ao teu dispor para publicitar as tuas actividades culturais.

O nosso editor vai com certeza dedicar-te algumas palavras de boas-vindas, eu serei o teu "padrinho" já que te recebi.

"Administrativamente" ficas com o lugar nº 96 da nossa tertúlia, como os anteriores, também à sombra deste frondoso poilão.

Ficamos por aqui, nos endereços que te indiquei, para qualquer dúvida que te possa surgir. Os teus trabalhos para publicação devem ser enviados simultaneamente para o editor Luis Graça e para mim, para que tenhas a certeza de que um de nós te vai ler.

Aproveito para te pedir, que dentro dos possíveis, as tuas fotos venham com um pouco mais de resolação para que as possamos editar com a melhor qualidade possível. E também pedir para não te esqueceres de mandar à parte as legendas para as mesmas, indicando, pelo menos, o local, a data, a circunstância e os retratados

Termino, enviando-te um abraço colectivo de toda a tertúlia, incluindo os editores.

Guiné 61/74 - P26207: Álbum fotográfico de João Moreira (ex-Fur Mil Cav da CCAV 2721 - Olossato e Nhacra, 1970/72) (4)

Foto 27 > Olossato > Maio de 1970 > João Moreira
Foto 28 > Olossato > Maio de 1970 > Graduados do 4.º Grupo de combate da CCAV 2721: Furriéis Justino, Ramalho e Moreira, e Alferes Silva. 
Foto 29 > Olossato > Maio de 1970 > Furriéis Justino, Moreira e alferes Silva do 4.º grupo de combate
Foto 30 > Olossato > Maio de 1970 > Furriel Moreira
Foto 31 > OLOSSATO > Junho de 1970 > Furriel Moreira junto da obra duma companhia que esteve nesta zona
Foto 32 > Junho de 1970 > Destacamento do Maqué
Foto 33 > Destacamento do Maqué, para proteger uma ponte em madeira
Foto 34 > Destacamento do Maqué > Furriel Moreira

(continua)
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Nota do editor

Último post da série de 21 de novembro de 2024 > Guiné 61/74 - P26177: Álbum fotográfico de João Moreira (ex-Fur Mil Cav da CCAV 2721 - Olossato e Nhacra, 1970/72) (3)

Guiné 61/74 - P26206: (De) Caras (225): Duas fotografias, girândola e fastígio das recordações (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 26 de Novembro de 2024:

Queridos amigos,
Há manhãs de sorte, falo por mim, comprei na D. Amélia da Feira da Ladra estas duas fotografias que irão depois para um arquivo. A primeira levou-me à minha chegada à Guiné, o barco da mancarra que me levou a Bambadinca parou exatamente naquele ponto onde está a embarcação que veio recolher esta unidade, bem curioso é o contraste entre o caminhar destes homens e a ondulação dos arrozais; na segunda fotografia quem captou a imagem terá sido um homem com muita sorte, apanhar o rebentamento de uma granada enquanto desfilam militares num curso de água, segundo o que vem no reverso a caminho do Sambuiá, santuário que veio a revelar-se quase inexpugnável, outras lembranças me ocorreram, de leituras e conversas, mas o mais importante é deixar esta imagem no nosso blogue.

Um abraço do
Mário



Duas fotografias, girândola e fastígio das recordações

Mário Beja Santos

Chego à Feira da Ladra ao despertar do dia, o meu fornecedor de livros, quando aparece, é imediatamente procurado por gente que vive da venda de livros em segunda mão, eu apareço ali como um outsider, olhado um tanto de viés. Antes de ele chegar, vou conversar com a D. Amélia, uma senhora que já me vendeu um lote de fotografias que devem ter pertencido ao capitão de uma das duas companhias que estavam na Guiné entre 1959 e 1961 e que mais recentemente me vendeu um lote de correspondência dos irmãos Barbieri Cardoso. Regra geral, só encontro correspondência ou fotografias de Angola e Moçambique, mas naquela manhã havia um lote bem gordinho de fotografias em que se escrevia no reverso Porto Gole, 1971, indiscutivelmente fora pertença de um jovem de bigodaça farta que por ali viveu um bom tempo, posiciona-se à porta de todos os edifícios, em viaturas, no abrigo, no refeitório, são imagens com que ele seguramente contou dar sossego à família, não há para ali nenhum sinal de guerra declarada.

Passei os olhos por todo o monte de imagens e de repente surgiu esta, a mente levou-me até ao princípio da tarde do dia 2 de agosto de 1968, o barco da mancarra que me levou até Bambadinca aqui atracou, lembro-me, como se fosse hoje daquele caminho que se palmilhava até chegar a terra firme, orlado por terrenos cultivados, guardo a lembrança de tudo, mas quem entrava e saía era população civil, com sacos e animais, gente de todas as idades. Imagem esmaecida, o Geba perdeu cor, e lá ao fundo vê-se o Quínara, que sempre sonhei visitar, e que nunca aconteceu. Coisa curiosa, deixara-se de circular por terra entre Jugudul e Porto Gole, as minas anticarro eram muitas, as emboscadas também, morrera a circulação naquela estrada que passava perto do Enxalé, S. Belchior, Mato de Cão, subia até Missirá, e pela ponte do Gambiel podia-se viajar até Bafatá. Enfim, o Geba era a estrada por onde se ia até Porto Gole, Enxalé, Xime e Bambadinca. Tudo mudará em novembro de 1969, com a inauguração do porto do Xime. Mas a circulação pelo Geba era vital para todos estes aquartelamentos, incluindo os do Leste, de Bafatá para cima.

Não mais voltei a Porto Gole, em 1990, 1991 e 2010 fui até Missirá por aquela estrada, com o alcatroamento já muito danificado, regressei a Enxalé e percorri todo o regulado do Cuor. Mas lembro-me que da estrada se via perfeitamente o monumento comemorativo à passagem de Diogo Gomes, em 1456. Deu-me pare recordar Porto Gole, acho que a fotografia tem o seu encanto com aquelas ondulações do arrozal e aqueles grupos de combate que não sabemos se vêm de uma operação ou para ela partem.

Porto Gole, 1971
Monumento alusivo à passagem de Diogo Gomes em 1456

Continuo a remexer nos maços de imagens que a D. Amélia tem na banca. Há mais fotografias da Guiné, são triviais, estou absolutamente convicto que na generalidade dos casos serviram para sossegar famílias, metem gente sorridente com cobras mortas, refeições e exibem-se cervejas, gente a ler aerogramas. É nisto que pego nesta segunda fotografia, diz enigmaticamente a caminho do Sambuiá, posso estar equivocado, mas iniludivelmente uma boa imagem com o rebentamento de uma morteirada, nunca vira até agora nada de parecido, um instantâneo tão violento. Enquanto olho demoradamente a fotografia, lembro as conversas que tenho tido com o Belmiro Tavares, que por ali andou, e que refere mesmo que numa operação a Sambuiá houve um desastre com uma equipa de morteiros, um acidente estúpido. Mais recentemente, numa carta do tenente Barbieri para o irmão ele refere uma operação no Sambuiá em tom perfeitamente crítico. Por ali passou Gérard Chaliand, um historiador das revoluções, em 1964, na companhia de Amílcar Cabral, passaram depois por Dugal e internaram-se no Morés. Acho que esta imagem nos faltava, valeu a pena ter começado a manhã de compras com estas duas imagens e a gratificação das recordações quem em mim as acompanha.
A caminho do Sambuiá, sem data
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Nota do editor

Último post da série de 24 de outubro de 2024 > Guiné 61/74 - P26074: (De) Caras (224): Maurício Saraiva, cofundador e instrutor dos Comandos do CTIG, cmdt do Gr Cmds Fantasmas - Parte II: Um dos momentos mais dramáticos que vivi, na sequência da terrível emboscada com mina A/C, em 28 de novembro de 1964, na estrada de Madina do Boé para Contabane, perto de Gobije (Antóno Pinto, ex-alf mil, Pirada, Madina do Boé e Béli, 1963/65)

Guiné 61/74 - P26205: (In)citações (269): Hoje, Dia de Acção de Graças, o Thanksgiving Day, nos EUA: que haja paz entre os homens (José Câmara)



1. Mensagem de ontem, quarta, 27/11/2024, 23:38, do nosso amigo e camarada José Câmara, daTabanca da Diáspora Lusófona:


Familiares, amigos, companheiros,

Amanhã, 5a. Feira, os EUA celebram a sua grande festa familiar, o Dia de Acção de Graças, o Thanksgiving Day. 

Se me permintem, convido-vos a participar comigo esta tradição que aprendi a viver e a repeitar. Tal como então haja Paz entre os Homens. Abraço do tamanho do mundo.

Haja saúde para todos vós e familiares.
Abraços e beijinhos.
JC


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Nota do editor:

Guiné 61/74 - P26204: Cem pesos, manga de patacão, pessoal ! (10): paguei o mesmo que o Carlos Vinhal, na viagem de férias, ao Porto, em meados de 1971 (Esc. 6430$00, o equivalente, a preços de hoje, a 1944 euros), mas... em três prestações (António Tavares, ex-fur mil, CCS/BCAÇ 2912, Galomaro, 1970/72)




O miraculoso bilhete da TAP que dava "direito" ao tão almejado mês de férias na metrópole...Bilhete de avião Bissau - Lisboa - Porto - Lisboa - Bissau, 1971

Foto (e legenda): © António Tavares (2015). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1.  Ainda a propósito do nosso sagrado mês de férias na metrópole (luxo que era só para alguns),  o nosso camarada António Tavares (ex-fur mil, CCS/BCAÇ 2912, Galomaro, 1970/72; vive na Foz, no Porto, e tem 74 referências no nosso blogue, estando cá desde 24/6/2009) já aqui lembrou (*) que:

(i) em 3 de agosto de 1971 levantou, na  conhecida Agência Correia, de Bissau, o bilhete de viagem na TAP que lhe custou a exorbitância de  6430$80, que era então o custo da  viagem Bissau-Lisboa - Porto -. Lisboa - Bissau (a mesma importância foi já aqui reportada pelo  nosso coeditor Carlos Vinha, equivalente a 1944 euros, a preços de hoje) (**);.

(ii) essa importància, vá lá, foi paga  em três prestações ("suaves"):
  • 4.430$80,  em 3 de agosto de 1971; 
  • 500$00,  em 22 de setembro de 1971;
  • 1.500$00, em 21 de outubro de 1971,
(iii) na cópia do bilhete (vd. imagem acima) consta uma taxa de aeroporto de 110$80;

(iv)  o escudo, na época,  era trocado, em Bissau, "com uma agiotagem de 10%.";

(vi) viajou a 4 de agosto de 1971 e regressou no dia 7 de setembro de 1971;

(vii) e ainda teve direito a um "saco de pernoita" (!);

(ix) ... "os camaradas mais atentos verificarão que acabei de pagar a totalidade das prestações depois da minha chegada de regresso ao CTIGuiné; porque o 'patacão'  não transbordava das algibeiras,  tinha de aproveitar todas as facilidades de pagamento autorizadas"

 (Ssleção, revisão / fixação de texto: LG)
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Notas do editor:

(*) Último poste da série > 7 de outubro de 2015 > Guiné 63/74 - P15216: O nosso querido mês de férias (18): Viagem Bissau-Lisboa-Porto-Lisboa-Bissau paga a prestações porque o patacão não transbordava das algibeiras (António Tavares)

(**) Último poste da série > 24 de novembro de 2024 > Guiné 61/74 - P26188: Cem pesos, manga de patacão, pessoal ! (9): uma viagem na TAP, de Bissau a Lisboa, em finais de 1970, custaria hoje c. 1450 euros (Valdemar Queiroz); uma viagem de férias (ida e volta), c. 1900 euros, em fevereiro de 1971 (Carlos Vinhal)