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terça-feira, 1 de abril de 2025

Guiné 61/74 - P26639: Agenda cultural (880): Lançamento do livro "Quatro Personagens À Procura De Abril", da autoria de Luís Reis Torgal, a levar a efeito no próximo dia 8 de Abril de 2025, às 18h00, na Casa Municipal de Cultura, em Coimbra. O livro será apresentado no dia 10 de Abril, pelas 18h00, na Sede da Associação 25 de Abril

1. Mensagem do Professor Luís Reis Torgal, enviada hoje, 1 de Abril de 2025, ao nosso Editor:

Caro Amigo, Colega e Camarada

O meu livro "Quatro personagens à procura de Abril" tem como origem a minha mobilização para a Guiné em 1968-1969 e, entre essas duas "personagens" (como lhe chamo, num título pirandelliano), estão o Padre Mário de Oliveira e o então Major Carlos Fabião. Estou certo que lhe interessa e ao seu blogue. Por isso lhe envio os dois convites para a apresentação do livro.

Grande abraço
Luís Reis Torgal





SINOPSE

As personagens a que se refere o título deste livro são pessoas reais com que o autor contactou como leitor, cidadão ou militar na «Metrópole» e na Guiné: Luís de Sttau Monteiro, do domínio da literatura e também da política; Santos Simões, da política mas também da cultura; Mário de Oliveira, da religião mas também da política; e Carlos Fabião, da área militar e política, que o autor seguiu nos caminhos infindáveis da Descolonização e da construção da Democracia.

São personalidades por vezes esquecidas ou só episodicamente lembradas, porque acompanharam a vitória de Abril, mas também foram, de modo diferente em cada caso, vencidas, pelos princípios que assumiram, pelo seu carácter e temperamento, pelas circunstâncias e pelo tempo.



SOBRE O AUTOR

Luís Reis Torgal
Professor catedrático aposentado da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, foi fundador do Centro de Estudos Interdisciplinares da Universidade de Coimbra – CEIS20. É Sócio Honorário da Academia Portuguesa da História.
Foi professor convidado de várias universidades, escolas superiores e instituições de cultura, entre outras: em França, onde foi directeur d'études invite da École des Hautes Études en Sciences Sociales, de Paris; na Inglaterra, em que foi visiting professor da British Academy na University of Birmingham; no Japão, na University of Foreign Studies de Quioto; e no Brasil, em que é doutor honoris causa pela Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Tem-se dedicado a diversos temas desde o século XVII ao século XX, especialmente no âmbito da História Política e das Ideias, da História da Universidade, da História da História e da Teoria da História. Recebeu vários prémios e foi-lhe concedida, em 2016, a medalha de Mérito em Ciência pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
Na Temas e Debates, publicou:
- O Liberalismo (coord.), vol. 5 da História de Portugal, dirigida por José Mattoso;
- História da História em Portugal (em colaboração);
- António José de Almeida e a República (em colaboração);
- O Cinema sob o Olhar de Salazar (coord.);
- História… Que História?;
- Essa Palavra Liberdade… Revolução liberal e contrarrevolução absolutista (1820-1834);
- Brandos Costumes…. O Estado Novo, a PIDE e os Intelectuais (coord.); e
- Vigias da Inquisição, distinguido em 2024 com o Prémio Joaquim Veríssimo Serrão, da Academia Portuguesa da História – Fundação Eng.º António de Almeida.


(Textos com a devida vénia a WOOK)
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Nota do editor

Último post da série de 1 de abril de 2025 > Guiné 61/74 - P26638: Agenda cultural (879): Congresso Internacional "Das Guerras ao Pós-25 de Abril - Os Militares em Territórios em Conflito", que decorrerá no Anfiteatro III da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa de 2 a 4 de Abril de 2025 (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P26638: Agenda cultural (879): Congresso Internacional "Das Guerras ao Pós-25 de Abril - Os Militares em Territórios em Conflito", que decorrerá no Anfiteatro III da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa de 2 a 4 de Abril de 2025 (Mário Beja Santos)

Congresso Internacional Das Guerras ao Pós-25 de Abril

Os Militares em Territórios em Conflito

O evento decorrerá no Anfiteatro III da FLUL

2 a 4 de Abril de 2025






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Nota do editor

Último post da série de 17 de fevereiro de 2025 > Guiné 61/74 - P26505: Agenda cultural (878): Convite para o lançamento do livro "Liberdade ou Evasão", da autoria do Major Piloto-Aviador António Lobato (1938-2024), dia 28 de fevereiro de 2025, às 16h30, no Salão Nobre da Liga dos Combatentes - Rua João Pereira da Rosa, 18 - Lisboa

Guiné 61/74 - P26637: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (34): Tavira... Nem bom cavalo, nem bom soldado! (Mário Fitas)



Tavira > CISMI > 2014 > Escola de virtudes... ou de "malandragem" ?... Tavira, terra de loucuras e de prazer!

Foto: © Luís Graça (2014). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Capa do livro (inédito) "Do Alentejo à Guiné: putos, gandulos e guerra", da autoria de Mário Vicente [Fitas Ralhete], o nosso querido camarada Mário Fitas, ex-fur mil inf op esp, CCAÇ 763, "Os Lassas", Cufar, 1965/67, e cofundador e "homem grande" da Magnífica Tabanca da Linha, escritor, artesão, artista, além de nosso grã-tabanqueiro da primeira hora, alentejano de Vila Fernando, concelho de Elvas, reformado da TAP, pai de duas filhas e avô.

Esta edição é uma segunda versão, reformulada, aumentada e melhorada, do livro "Putos, gandulos e guerra" (edição de autor, Estoril, Cascais, 2000, com apop da Junta de Freguesia de Vila Fernando, 174 pp.,). 

A nova versão  (2010, 99 pp.) já foi reproduzida no nosso blogue. Tem prefácio do nosso camarada António Graça de Abreu:

(...) "No seu livro 'Pami na Dondo' (2005) a partir de uma história verídica Mário Vicente ficciona as agruras, desventuras e algumas alegrias de uma jovem guerrilheira do PAIGC, capturada pelas tropas portuguesas em meados das décadas de sessenta. 

Pami na Dondo, o nome da guerrilheira, acabaria por gradualmente se inserir no seio da população africana na aldeia controlada pelos portugueses e por ter um relacionamento singular e extremado com alguns militares estacionados no pequeno mas importante aquartelamento de Cufar.

O outro título saído da inteligência e da pena de Mário Vicente é 'Putos, Gandulos e Guerra' (2000). Reformulou, aumentou e melhorou esse texto e publica-o agora como 'Do Alentejo à Guiné, Putos, Gandulos e Guerra'.

"Com laivos e tintas biográficas, este livro fala-nos de um menino nado e criado na aldeia de Vila Fernando, no Alentejo profundo, Calças de Palanco – este o original nome do puto – que será o gandulo e o homem na esteira e por dentro da guerra na Guiné. 

Eram as malhas que o então estertor do Império entretecia. Na preparação como militar, o rapaz faz o curso de sargentos milicianos em Tavira e depois conclui a especialidade de Ranger em Lamego. A aprendizagem para a guerra é impiedosa e dura. Mas necessária, em África o conflito agudiza-se." (...)

A pré-publicação desta versão, no nosso blogue, em formato digital, foi devidamente autorizada, na altura,  pelo autor.  No cap VI,  ele, o Vagabundo, seu "alter ego",  revisita as terras de Portugal por onde passou, na tropa, antes de ser mobilizado para o TO da Guiné: 

  • Tavira, 
  • Elvas, 
  • Lamego, 
  • Amadora
  • Oeiras... 

É prosa pícaresca, da melhor. E este capítulo fica muito bem na série "A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG"...

Recorde-se,  por outro lado, que o nosso Vagabundo é natural de Vila Fernando, Elvas. A Colónia a que ele se refere no texto a seguir,  a Colónia Correcional de Vila Fernando (instituição de internamento de jovens delinquentes que ali funcionou entre 1895 e 2007). Era também uma herdade agrícola com mais de mil hectares de superfície (em 1967). No período de 1955 a 1976 foi seu diretor o engº Manuel Joaquim da Silva Rente.

É membro da nossa Tabanca Grande desde 26/6/2007. Tem 164 referências no nosso blogue.

Texto e foto: © Mário Fitas (2016). Todos os direitos reservados Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


ÍNDICE > I Putos | II Putos, Gandulos e o Padre | III Metamorfose | IV Cepa do Zé de Varche  | V Vagabundo | VI Por Terras de Portugal | VII Guerra 1 | VIII Brincadeira no Mato | IX Guerra 2 | X Miriam | XI Como se Constrói uma Capela | XII Guerra 3 | XIII Mamadu em Férias no Hospital Militar | XIV Regresso à Guerra | XV Adeus à Guerra | Glossário


Do Alentejo à Guiné: putos, gandulos e guerra > VI - Por Terras de Portugal: Tavira, Elvas, Lamego, Oeiras...

Tavira (pp. 27-28)

por Mário Vicente 


Tavira!... Oh!, doce Tavira! Terra linda!... Montes cobertos de amendoeiras, de figueiras e alfarrobeiras, com os teus belos vales enfeitados de laranjais, és mesmo um encanto!... Apenas um senão te rouba a encantadora beleza, terra de lindas capelas e igrejas: o nauseabundo cheiro expelido pelos esgotos do teu belo e sinuoso rio Gilão, quando a maré vazante os deixa a descoberto.

A tua bela ilha de fina areia branca, afagada por salgadas ondas transparentes, onde nas dunas se espreguiçam lindas mulheres de tez escura, sangue mourisco e olhos amendoados, como moiras encantadas que de quando em vez se transformam em sedutoras sereias, deixando presos incautos marinheiros, melhor dizendo militares, atirados para a escola do CISMI, onde se perde a vergo­nha e se aprende a vivência no "Canil da Vida". 

Tavira, terra de loucuras e de prazer!

Chegou aqui criança, menino de coro virgem para a safadice! Daqui saiu sem vergonha e malandro, perfeitamente enquadrado com a vida militar, como Vagabundo. Confirmando, em pouco tempo, aquilo que o professor da Colónia lhe tinha aconselhado:

– Rapaz, olha e tem calma! Nem bom cavalo, nem bom soldado!... Se és bom cavalo, todos te querem montar. Se és bom soldado, todos te querem mandar.

Verdade matematicamente confirmada: dois mais dois, igual a quatro. A arte de como aprender a roubar foi facílima! Primeira revista à companhia de instrução. O protector de boca, da Mauser, tinha-se misteriosamente evaporado: foi ao ar. Para além de o pagar e comprar outro na Feira da Ladra, levou um corte de fim-de-semana. 

Nunca mais voltou a acontecer. Como os gatos, um olho aberto outro fechado o militar aprendeu a caçar. Protector de boca sempre no bolso, só na hora da revista apare­cia na espingarda. Mas, mesmo assim numa ida aos balneários quase em cima da revista, ficou pela segunda vez sem o famige­rado protector. Meus amigos, paciência, outro terá de arder!... Vagabundo roubou o que mais a jeito estava e na revista, a sua arma estava completa. Resultado: tudo mais fácil, limpo, sem grande trabalho e nada dispendioso!...

Aprendeu nas salinas a mergulhar na lama! Desgraçados do cabo Baidalo, do Churro, e outros, já homens de certa idade, cabos aprovados que para singrarem na Guarda [Nacional] Republicana ou no Exército tinham de tirar a especiali­dade, assim eram integrados no Curso, juntos àquela malandragem toda. Coitados, já não tinham idade para entrar naquilo!

– O quê?

– Os gajos não querem? Malta,  a eles!  
–  incitava o Suiças, acabadinho de sair do tirocínio em Mafra. 

A malta lançava-se sobre os desgraçados como alcateia de lobos sobre a presa, e eram obrigados pela matula a chafurdarem tam­bém na lama das salinas.

Na Atalaia muitas coisas aprendeu para além da ordem unida e armamento. Aprendeu vendo! Como se destrói um ho­mem, despersonalizando-o e transformando-o em farrapo. O tripeiro Pintainho com fobia das alturas, ser obrigado a subir ao muro alto, mão direita erguendo os restos de velha vassoura transformada em facho, lágrimas de raiva contida rolando pela face ser obrigado a gritar:

– Eu sou o Maior, eu sou o Melhor!

Degradante!... Vergonhoso, não só por ver um miúdo homem bom, sincero e honesto ser obrigado a descer tão fundo, anulação completa da sensibilidade humana!

– Não!

Com o ex-seminarista Clemente, frequentou nos primeiros tempos as belas igrejas de Tavira aos domingos. Entretanto, viu o Doutor, vindo do Instituto de Reeducação (onde esteve internado) metido nisto, fazendo leituras na missa misturado com a alta sociedade da terra. Achou demais para tal figurão e infelizmente acertou. Pouco tempo depois falou com o Doutor pelas grades da prisão e verificou que estaria com graves problemas. Só que ali já não seria a transferência para Leiria, mas sim o Forte da Graça em Elvas, ou outro presídio militar, o que seria bem mais complica­do. Vagabundo teve pena do Doutor.

Na sua metamorfose constante, Vagabundo transforma-se em abutre. Monte Gordo! Marie Luise! Filha de mãe france­sa e de pai emigrante português. Treinou um pouco o francês e não só. Momentos de loucura! A menina de Lyon, em férias e o militar Vagabundo, rolaram nas areias finas da praia e mergulharam nas quentes águas do Atlântico, influenciadas pelo Mediterrâneo. A sensibilidade de Marie Luise transformou Vagabundo, aprendeu comme il faut, doucement. L´étalon! Pourquoi être mâle latin!? [, Como mandava a puta da sapatilha, na maior... O garanhão ! Porquê ser macho latino ?!].

Em pouco tempo as reservas que tinha levado, evapora­ram-se. Houve que mandar um SOS para os velhotes, solicitando papel. Neste espaço de pede e recebe, é apanhado por um fim-de-semana, completamente limpo. Com Abledu, saiu dando umas voltinhas pelos cafés junto ao jardim e um saltinho ao outro lado do Gilão, para visitar uns familiares do camarada e amigo elvense. Sábado à noite regressa sem dispensa de fim de semana e de recolher à sua caserna.

Conversa com Clemente, vai aos balneários e vê uma banca de batota montada. Lá estavam os amigos madeirenses doidos pelo jogo. Completamente limpo, volta para o beliche, e tenta cravar o ex-seminarista. Este adivinha do que se trata. Nega e dá-lhe um sermão. Insiste!

 Bondoso, Clemente acede e passa-lhe cinco “croas”. Vai direito aos balneários e troca a massa para durar mais tempo. Atira cinquenta centavos para um montinho. O banqueiro vira as cartas, debaixo dos cinquenta centavos estava um rei. Negoceia a banca por vinte paus. Já dá para fazer umas jogadas e passar o tempo. Agora arrisca cinco coroas e perde três vezes seguidas, mais cinco coroas e novo rei. Aqui faz bluff, cem paus pela banca ou fica banqueiro. Jogo de alto risco. Ele sabe que não tem dinheiro no bolso para suportar a banca. Arrisca mas pode dar bronca e pancadaria. Fica banqueiro e as coisas começam a correr bem. Vai ganhando e perdendo a banca. Meia noite, já à luz da vela, levanta-se e diz que para ele termina. 

Conta o dinheiro. Tem no bolso mil quatrocentos e cinquenta escudos, mais uns trocados. Vai-se deitar. Acorda Clemente e dá-lhe um rolo de cinco notas de vinte.

– Toma lá as cinco “croas”. Amanhã vamos almoçar a Vila Real
 [de Santo António], O.K.?

Universidade Aberta, vai aprendendo a sobreviver, no mundo cão. Razão tinha Niotetos (in "Pássaro fora da Gaiola"):

– Eu não devo nada ao cabrão do meu pai! Se sou o que sou, foi porque estudei. O gajo limitou-se a fazer-me numa noite de gozo.

Aula de táctica, mesmo com o estômago vazio, Vagabundo sentiu vómitos e uma forte dor no estômago. As entranhas embrulharam-se-lhe todas. Nunca tinha ouvido tal. Seria possível um indivíduo falar assim do próprio pai? Mais!... passeando com a mulher pela rua, virava-se para trás e, directamente para a malta, dizia:

– É boa, não é!?,,, Mas é minha!

Assim, com estes professores, ia sendo formado um futuro furriel miliciano do Exército Português, em África. Quando em Dezembro de 1963 o já cabo miliciano Va­gabundo recebeu a guia de marcha para se apresentar no Bata­lhão de Caçadores n.º 8 em Elvas, onde tinha sido colocado, não ficava com muitas saudades do CISMI, antes pelo contrário criou uma certa alergia ao próprio Algarve.

(Continua)

(Revisão / fixação de texto para publicvação deste poste no blogue: LG)

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Nota do editor:

Último poste da série > 29 de junho de 2020 > Guiné 61/74 - P21119: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (33): Beja, antiga Pax Júlia, cidade por onde vi passar muitos camaradas de armas (José Saúde)

Guiné 61/74 - P26636: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (5): Jogos de futebol e voleibol - Natal e Fim de Ano de 1969 e Hotel Miramar e Pensão Xantra

CCAV 2483 / BCAV 2867 - CAVALEIROS DE NOVA SINTRA
GUINÉ, 1969/70


VIVÊNCIAS EM NOVA SINTRA

POR ANÍBAL JOSÉ DA SILVA


11 - JOGOS DE FUTEBOL E VOLEIBOL

Equipa dos graduados
Alinhados perante a tribuna
Bandeirola fiscal linha feita ramo capim
Entrada em campo dos graduados
Fase do jogo na área dos graduados

Sempre que a actividade operacional permitia, bem como as tarefas diárias dentro do quartel jogávamos à bola. Equipa de oficiais e furriéis contra soldados, pelotão contra pelotão, os do Porto contra os de Lisboa era pretexto para um joguinho. Recordo bons jogadores, o Aníbal Oliveira, o Cardoso , o Brito e furriel David Moreira que fora guarda redes do Tirsense. Nos primeiros três meses de comissão, enquanto tivemos a companhia do Pelotão de Caçadores Nativos, os jogos eram arbitrados por um dos seus elementos, o José Pedro da Silva que tinha o sonho de ser arbitro oficial. Como eu também era conhecido por Silva, o Zé Pedro conjugando os Silvas, dizia que era meu primo. O certo é que a minha equipa era normalmente favorecida. Eu era conhecido por Nóbrega, à época jogador do FCP e o Jardim por Humberto Coelho pois era benfiquista.
Menos vezes, porque havia menos aderentes, também jogávamos voleibol. Numa das vezes em pleno jogo foi iniciada uma flagelação ao quartel. Estávamos em campo aberto e a reação imediata foi correr e aterrar dentro dum abrigo de morteiro que estava desativado.
Resultado, cabeça contra cabeça, hematoma aqui e ferida acolá, mas nada de grave.
Voltando atrás, também no futebol por três vezes o jogo foi interrompido. De futebol passou a atletismo ao correr para as valas.

Fase dum jogo de voleibol. É só estilo
Equipa de graduados


12 - NATAL E FIM DE ANO 1969
Noite de consoada 1969
Convívio pós ceia
As morteiradas da meia noite 31/12/69

Ao jantar de Natal não podia faltar o bacalhau com batatas, mas sem legumes. Bolo rei, rabanadas e outras guloseimas nem vê-las, a não ser para aqueles que receberam encomendas da família. Tivemos pessoal em patrulha noturna. Dentro do quartel estivemos vigilantes e a jogar às cartas, sendo a lerpa o jogo dominante. Nesta noite a saudade da terra e da família é mais forte.
Na passagem do ano pouco há a referir a não ser que ao bater da meia noite mandamos para o ar na direção da bolanha três morteiradas.



13 - HOTEL MIRAMAR E PENSÃO XANTRA

Quando ia a Bissau, para não ficar a fazer serviços da guarda no quartel de Brá, ficava alojado no hotel Miramar ou na pensão Xantra. O primeiro ficava próximo da marginal do rio Geba. Hotel só de nome, nem pensão era, era sim uma espelunca. Mas como o nome Miramar me era afeto, por ser o nome duma localidade da minha freguesia natal, habitualmente ficava lá. As refeições fazia-as na mesa de um civil, que fora tropa lá e que se estabeleceu com uma oficina de automóveis. O empregado que servia às mesas era lento muito lento. Dizia o civil: “este gajo só tem três velocidades, devagar, devagarinho e parado “. Os quartos eram uma desgraça, havia a cama, duas cadeiras para pendurar a roupa e mais nada. O quarto de banho, melhor dizendo a retrete era única. As portas não tinham chaves. Uma das vezes fui para entregar documentos e dinheiro na Intendência. Levava uma pasta de cabedal embrulhada em jornais e amarrada com fios para desviar atenções. A repartição onde devia fazer a entrega já estava fechada.
Tive que a levar para a espelunca. Sem chaves na porta do quarto e com medo de ser assaltado, tive uma ideia. Retirei as notas da mala, meti-as num saco de plástico, esvaziei o autoclismo da sanita e coloquei lá dentro o saco. Tive o cuidado de colocar um papel dizendo “avariada”. Dormi com alguma preocupação. Na manhã seguinte refiz o embrulho e lá fui fazer a entrega.
Na pensão Xantra, estive lá duas vezes, ambas acompanhado pelo inseparável furriel Lima, quando chegamos a Bissau para ir de férias à metrópole.
Numa delas chegamos à hora do almoço esfomeados. Comemos que nem uns alarves. Tal como as cobras, depois de saciada a fome, fomos dormir uma valente sesta. No final da tarde com a digestão feita e descansados, prepararmo-nos para ir à baixa da cidade. Fomos impedidos de o fazer. A dona da pensão, a dona Xantra convidou-nos para a banquete de casamento duma das filhas que horas antes dera o nó com um alferes aviador. Convite imediatamente aceite e sem qualquer reserva. Voltamos a encher o bandulho e depois sim fomos até à baixa caminhando para fazer a digestão. Na manhã seguinte fizemos a viagem para Lisboa e depois para o Porto.


(continua)
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Nota do editor

Último post da série de 25 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26615: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (4): Cantina - Encontros em Bissau e Entretenimento

Guiné 61/74 - P26635: Mi querido blog, por qué no te callas ? (10): Vinte anos a blogar, o fim da picada...

Epitáfio para um blogue que chega ao fim


Aqui jaz um blogue, testemunha de um tempo que já não volta, 
Onde camaradas se encontravam, memórias a partilhar.
Luís Graça e seus companheiros, na Guiné a lutar,
Ergueram este espaço, para a história não se apagar.

Vinte anos de histórias, de dores e de alegrias,
De combates, de amizades, de perdas e nostalgias.
A guerra acabou, a vida seguiu o seu rumo,
Mas as memórias, essas, teimavam em ficar no escuro.

Agora, o silêncio paira, como um véu sobre a tabanca,
Os camaradas partem, um a um, na derradeira arrancada.
A Inteligência Artificial, nova arma na contenda,
Anuncia o fim da picada, onde a guerra não finda.

Obrigado a todos vós, autores, leitores e amigos,
Que aqui deixaram a sua marca, os seus gritos e gemidos.
Que a memória deste blogue, como um farol na noite escura,
Ilumine os caminhos, para que a paz perdure.

Encontramo-nos na próxima guerra, camaradas,
Onde a esperança renascerá, das cinzas das emboscadas.
Que a paz seja a nossa bandeira, a nossa arma mais forte,
E que a memória dos que partiram, nos guie até à morte.
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Nota do editor LG:

Guiné 61/74 - P26634: Facebook...ando (73): O aerograma-circular que o Movimento Nacional Feminino distribuia no embarque dos militares mobilizados para o Ultramar, explicando o que era e para que servia o "bate-estrada" (António Tavares, ex-fur mil SAM, CCS/BCAÇ 2912, Galomaro, 1970/72)

 



Aerograma-circular, sem data, distribuído pelo Movimento Nacional Feminino aos militares que embarcavam para o Ultramar.  



Fonte: Esta cópia foi reproduzida na página do Facebook da Tabanca Grande, com data de hoje, 31 de março de 2025, 00:42 pelo António Tavares (ex-fur mil SAM, CCS/BCAÇ 2912, Galomaro, 1970/72). (O António vive na Foz do Douro, Porto, tem 75 referências no nosso blogue; é membro da Tabanca Grande desde 24 de junho de 2009.) (*)

A data do documento supra  deve ser de 1972: sabemos que o aerograma azul era vendido a familiares e madrinhas de guerra, ao preço unitário de 20 centavos (até 1971), e de 30 centavos (a partir de 1971) (a preços de hoje, e na moeda em vigor, seriam 6 e 8 cêntimos, respetivamente).

1. Sabemos que até essa altura (1971/72) o MNF mandara imprimir e distribuir 300 milhões de aerogramas... Até ao final da guerra, calculamos que esse número tenha chegado aos 376 milhões. (**)

O conteúdo deste aerograma-circular (chamemos-lhe assim) é interessante:

(i) era dirigido ao "militar amigo";

(ii) o tratamento era por você (o destinatário tanto podia ser um soldado, como um sargento ou um oficial);

(iii) era o 1º aerograma que o militar recebia;

(iv) pedia-se a atenção para a leitura do impresso, de interesse para o próprio;

(v) havia um parágrafo sobre a criação deste "impresso 'poupa-selos' " (sic) (o Zé Soldado irá chamar-lhe "bate-estradas" mas também, na Guiné, "corta-capim");

(vi) explicava-se a diferença de cor do impresso: o azul tinha um preço de venda; o amarelo era gratuito;

(vii) o encargo com a impressão dos aerogramas era ent6áo de 3 mil contos por ano: "grosso modo",  3 milhóes de escudos a dividir por 30 milhões de aerogramas por ano, dava 10 centavos (0,1 escudo) por unidade;

(viii) 3 mil contos em 1971 seriam, a preços de hoje, 928,6 mil euros; 

(ix) deconhecemos o orçamento do MNF, que reecebia um subsídio de 10 mil contos do Ministério da Defesa;

(x) o MNF estimava, em mais de um milhão de contos (!), a poupança que o aerograma representava para os militares e seus familiares (papel, porte correio): a preços de hoje, seria qualquer coisa como 310 milhões de euros;

(xi) ficamos a saber que o produto da venda dos aerogramas azuis "suporta(va) todas as despesas incluindo a produção dos amarelos" (de distribuição gratuita aos militares);

(xii) o "bate-estrada" era, pois,  um bom negócio para o MNF (que não tinha as despesas do transporte aéreo,  oferecido pela TAP, bem a sua distribuição pelos destinários no terreno, a cargo do Serviço Postal Militar);

(xiii) parece-nos que ser inútil lembrar que dentro do aerograma não se podia incluir "qualquer objeto ou simples papéis": com 10 toneladas de correio diário, o Serviço Postal Militar (SPM) não tinha meios técnicos nem humanos para detetar as fraudes;

(xiv) pormenor que às vezes descuramos: o aerograma (amarelo ou azul) não podia ser, para evitar a sua utilização "fraudulenta", depositado no marco do correio, tinha que ser entregue por mão própria na estação de correios (ou no serviço postal da unidade); 

(xv) outro pormenor interessante: a dotação individual (de impressos amarelos) era de 12 aerogramas / mês... (Só em 1973, quando o número de homens nos 3 teatros de operações ascendeu aos 163 mil, a dotação de impressos amarelos terá sido de 23,5 milhões: 163 mil x 12 meses x 12 aerogramas por mês.)


2. Admitamos que em 22 / 24 meses de comissão, um militar tivesse escrito em média 300 aerogramas (o que é muito, havia quem náo escrevesse nenhum, e havia quem escrevesse 3 vezes mais),  teríamos no final da guerra 240/250 milhões de aerogramas... (fora as cartas, postais, encomendas).

  As contas sáo simples de fazer: 800 mil mobilizados (um terço dos quais do recrutamento local, Angola, Guiné, Moçambique, etc., mas que também escreviam às famílias, a multiplicar por 300 dá os tais 240/250 milhões...

Bate certo com a minha estimativa: 376 milhões de impressos, um terço dos quais não se terão usado (nalguns casos, eram rascunhos, noutros casos seguia um aerograma em duplicado ou até triplicado, quando o militar não parava de escrever; na maior parte dos caso, iam para o lixo, os rascunhos, já que eram à borla..)

Não final terão circulado 250 milhões de aerogramas do Minho a Timor e de Timor ao Minho... É uma estimativa realista... e que nos ajuda a ter uma ideia de grandeza da logística que esta guerra, a milhares de quilómetros de casa, implicou para as nossas Forças Armadas.

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Notas do editor:

(*) Último poste da série > 31 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26633: Facebook...ando (72): Timor-Leste: 1º ministro Kay Rala Xanana Gusmão faz visita surpresa à ESFA - Escola São Francisco de Assis, nas montanhas de Liquiçá, em 22 de março - III (e última) Parte

(**) Vd. poste de 28 de março de 2022 > Guiné 61/74 - P23119: Bibliografia (50): Movimento Nacional Feminino: Área de apoio material: secção de aerogramas (Sílvia Espírito-Santo, excerto de artigo em preparação, cortesia da autora)

segunda-feira, 31 de março de 2025

Guiné 61/74 - P26633: Facebook...ando (72): Timor-Leste: 1º ministro Kay Rala Xanana Gusmão faz visita surpresa à ESFA - Escola São Francisco de Assis, nas montanhas de Liquiçá, em 22 de março - III (e última) Parte



Fotos nº 15 e 16










Fotos nºs 17, 18, 19, 2o, 21 e 22

  O 1º ministro da República Democrática de Timor-Leste, Kay Rala Xanana Gusmão faz uma visita-surpresa â Escola de São Franscisco de Assis (ESFA), em Manati Boebau, Liquiçá, na festa da celebração do 7º aniversário.   E deixa uma mensagem de esperança com vista à resolução dos problemas pendentes (o mais grave, a falta de professores diplomados, fornecidos e pagos pelo governo da RDTL: ao fim de 7 anos, continua a funcionar com 5 professores voluntários, sem as habilitações exigidas por lei; a escola, privada,   é frequentada por 102 alunos, 54 meninas e 48 rapazes, que vivem no suco de Leotela,  sem acesso à esc0la pública).

Legendas: 

(i) o primeiro ministro ladeado pelo "Eustáquio", coordenador da ESFA e pelo nosso Rui Chamusco, reepresentante da ASTIL - Associação dos Amigos Solidários com Timor Leste, a quem se deve a fundação da Escola (que também possui casa para professores) (15); 

(ii) recorde-se que o Eustáquio (16), irmão (mais novo) do Gaspar Sobral (cofundador da ASTIL, que vive em Coimbra, e foi topógrafo em Angola, antes da independència), andou, com a irmã mais nova, a mãe e mais duas pessoas amigas da família, durante três anos e meio, refugiado nas montanhas de Liquiçá, logo a seguir à invasão e ocupação do território pelas tropas indonésias (em 7 de dezembro de 1975) (tinha "apenas" 14 anos);

(iii) embora a paisagem seja deslumbrante,  e a região tenha "potencialidades turísticas", o isolamento da aldeia de Manati / Boebau, suco de Leotela, posto administrativo de Liquiçá, município de Liquiçá, a 50 km a leste de Díli,  é ainda muito grande (17, 18, 19, 2o, 21 e 22);  

(iv) está em construção uma estrada rural, no valor de perto de meio milhão de dólares (moeda de Timor Leste); prevê-se a sua conclusão no final de agosto de 2025 (23).


Créditos fotográficos: Média - GPM / RDTL (República Democrática de Timor-Leste, com a devida vénia)... Fonte: Página do Facebook do 1º Ministro da RDTL, Kay Rala Xanana Gusmão



1. Aqui vai o discurso do Coordenador da ESFAMB, Escola de S. Francisco de Assis, Manati Boebau, "Eustáquio"
 (João de Araújo Moniz Sobral),  na receção ao Primeiro Ministro de Timor-Leste,  Kay Rala Xanana Gusmão, que fez uma visita de surpresa! 

O texto traduzido obedece rigorosamente ao que foi dito em tétum. Há frases que mostram falta de contexto, principalmente frases soltas, e com alguma dificuldade de compreensão, depois de traduzido.

Segue-se o discurso traduzido (, reproduzido coma  devida vénia da página do Facebook da ASTIL, 27 de março de 2025, 23:23):

Uma grande surpresa para todos nós, povo rural, onde falta quase tudo. Estamos muito contentes. 

Como coordenador da escola, desta escola, tenho um respeito muito especial pelo fundador da escola, que, com os seus 78 anos, vem de tão longe, e ainda está a dar o seu contributo para erigir esta escola, servindo o povo desta terra... 

Porque aqui, a maior dificuldade que nós enfrentamos durante tantos anos,  são as crianças da aldeia e deste suco, principalmente nesta aldeia em se encontra a escola: estas crianças frequentam o primeiro e o segundo ano do ensino básico... E, nalguns casos, por aqui ficam, porque a distância que vai desta escola para a outra (para poderem continuar os estudos no secundário) fica muito grande; têm que atravessar ribeiras, mato, caminhos difíceis durante o inverno, (encostas íngremes). 

Por isso, com esta escola queremos encurtar caminho para as nossas crianças, porque nós, como filhos de Timor, o que é que temos para oferecer ao nosso país ? Fazer coisas boas.

As nossas autoridades estão mais preocupadas com as coisas da nação; nós,. povo, na nossa pequenez, podemos levantar as nossas forças e ajudar; mas acreditamos no apoio das nossas autoridades para nos ajudar a chegar onde queremos atingir... As nossas forças têm um limite e já as atingimos; queremos continuar mas já nos faltam forças! 

Assim, esta oportunidade, o nosso pai, a raiz da nossa terra, que apareceu perante nós, e sentimo-nos muito contentes, porque estamos com dificuldades para avançar e assim poder ajudar este povo. 

Porém enfrentamos neste momento dificuldades de toda a espécie; com o nosso pai, o nosso irmão, a raiz da nossa terra, sentimos que, talvez possamos ter alguma esperança. Porque nós aqui, como professores, sem esconder nada, apenas temos o ensino básico, o pré-secundário, o secundário, e estamos a ensinar. 

Somos voluntários, com um grande coração, queremos mesmo desenvolver esta terra no tocante à educação, principalmente na área rural; porque o povo da cidade tem possibilidades de ter muitas coisas boas, mas aqui, o povo, para ter uma formação elementar,  torna-se muito difícil, e por isso estamos aqui. 

Aproveito esta oportunidade para também lembrar que durante e desde o funcionamento da escola, a conclusão da construção em 2017 e a inauguração em 2018, tenho trabalhado como voluntário, porque pensei para mim, o meu nome é filho de Timor, o que é que devo contribuir para a minha nação, talvez não tenha dado o melhor do meu contribuo para melhorar a educação, mas dedico-me de corpo e alma naquilo que faço, principalmente nas áreas rurais, pensando no futuro...

Na eventualidade de perdermos os que hoje nos governam, talvez com a graça e ajuda de Deus eles (as crianças) possam avançar (nos seus estudos) e poder substituí-los no lugar que hoje é exercido pelos mais velhos, dando a possibilidade às pessoas dos povos mais pequenos poderem também exercer os cargos das actuais autoridades. 

Enfrentamos agora desde a entrada em funcionamento da escola um grande problema: no início começamos com o pré-escolar; entretanto a escola evoluiu e avançamos para o 1º ciclo; nós, professores, não temos formação adequada. 

Já refleti sobre o problema e pergunto se é mesmo importante, no nosso caso concreto, se é mesmo importante esta formalidade de ter um diploma. Em vez de olharmos para o diploma, talvez olhássemos mais para estas pessoas que se dedicam mesmo de alma e coração, no sentido de levar as coisas por diante; eu e os professores somos voluntários desde o início. 

Neste momento não auferimos qualquer vencimento. Também eles se entregam totalmente à causa, com grande coração; alguma compensação no sentido de comprarem os cigarros e nada mais, e já lá vão 7 anos.

 
(Revisão / fixação de texto para publicação no blogue: LG)

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Nota do editor:

Postes anteriores da série > 

31 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26631: Facebook...ando (71): Timor-Leste: 1º ministro Kay Rala Xanana Gusmão faz visita surpresa à ESFA - Escola São Francisco de Assis, nas montanhas de Liquiçá, em 22 de março - Parte II

Guiné 61/74 - P26632: Notas de leitura (1785): "Futuros Criativos"; edição da Associação para a Cooperação Entre os Povos, Fundação Portugal-África e Instituto Camões, 2019 (2) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 11 de Dezembro de 2023:

Queridos amigos,
Aqui passamos em revista, no âmbito de um conjunto de atividades desenvolvidas pela cooperação portuguesa em países lusófonos o que especificamente se passa na Guiné-Bissau em artes performativas, artes visuais e plásticas, design de artefactos, casas editoriais, formação de jovens para iniciativas, projetos de televisão, produtos da terra orientados pela sustentabilidade, jovens formados a pensar na inteligência artificial e na robótica e até linguagem do riso ao serviço da economia e do entretenimento. São aspetos francamente positivos que espelham a resiliência e a vontade de progredir a despeito de uma atmosfera política que não deixa de ser deprimente. São futuros criativos que nos fazem confiar que a Guiné-Bissau não está de mãos atadas.

Um abraço do
Mário



Futuros criativos da Guiné-Bissau (2)

Mário Beja Santos

Futuros Criativos tem a ver com economia e criatividade em Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, S. Tomé e Príncipe, e Timor-Leste, acolhe um conjunto de atividades desenvolvidas pela ACEP – Associação para a Cooperação Entre os Povos, edição da ACEP, Fundação Portugal-África e Instituto Camões, 2019. Aqui são repertoriadas atividades em parceria com organizações e pessoas destes países de língua portuguesa ao longo dos últimos quatro anos, com o objetivo de conhecer e valorizar a inovação e a criatividade como fatores de desenvolvimento. Dando continuidade ao texto anterior, vamos ver duas editoras guineenses, Corubal e Ku Si Mon, a Escola de Artes e Ofícios da Guiné-Bissau, a Cobiana Records, a TV Klele, a Tiniguena, a Innova Lab e Mister Paul.


Corubal Edições

Fundada em 2012, a Corubal surge da inspiração empreendedora de jovens e é impulsionada pela necessidade de “promover coisas boas em maus momentos” (Golpe de Estado de 12 de abril de 2012) e contribuir para a dinamização de uma massa crítica nacional através da produção, animação e divulgação de conhecimentos. A editora tem como objetivo levar junto ao público pensamentos e práticas de diferentes autores. Tem uma equipa que trabalha na edição e conta com uma bolsa de colaboradores em função da natureza dos conteúdos. É responsável pela edição da Agenda Cultural de Bissau, em parceria com o município, publicação que tem tido um papel de destaque na divulgação de iniciativas e de criativos da cidade.
Trabalho da Corubal
Obra publicada da Corubal

Ku Si Mon Editora

É a primeira editora privada guineense. Foi criada em Bissau, em 1994, por Abdulai Sila (escritor guineense), Teresa Montenegro (investigadora chilena) e Fafali Koudawo (investigador togolês). A Ku Si Mon (do crioulo guineense Com As Próprias Mãos) é fundamentalmente, uma aposta na independência, no futuro, no desenvolvimento, em África. A editora tem como principais domínios de intervenção a literatura, a tradição e a linguística. Tem publicados textos em português e edições bilingues crioulo-francês e crioulo-francês. No seu catálogo encontram-se obras e escritores de referência da Guiné-Bissau, com reconhecimento além-fronteiras, e uma importante coleção de contos orais, que são parte do património literário do país. A Ku Si Mon tem funcionado com base no trabalho não renumerado dos seus membros, que executam todas as fases da edição prévias à impressão, As despesas de funcionamento são geralmente suportadas pelos seus membros que a aplicam as receitas na edição dos seus livros. Durante a guerra de 1998-99, a sua sede foi bombardeada, tendo-se perdido boa parte do seu património. A Ku Si Mon Editora está integrada em redes internacionais e é membro fundador da “Aliança dos Editores Independentes”, uma associação internacional que congrega 75 editores de 42 países.
Capa de obra de Abdulai Sila, o criador da Ku Si Mon Editora
Outra edição da Ku Si Mon

Escola de Artes e Ofícios

É uma iniciativa da organização não-governamental Ação para o Desenvolvimento (AD), que surge em 2009, que surge com o apoio da União Europeia e da Cooperação Portuguesa. A Escola tem por objetivo a capacitação dos seus formandos com instrumentos técnicos e práticos que lhes permitam desenvolver as suas próprias iniciativas de emprego.
A Escola oferece um programa de formação técnica diversificado: produção de sal solar, tricotagem, cursos de eletrónica, transformação e conservação de produtos locais, montagem e reparação de painéis solares, tinturaria de panos, etc. Desde a sua criação, é responsável pela formação de mais de mil alunos jovens e mulheres.
Atividades da Escola de Artes e Ofícios

A TV Klele: para comunicar e formar

Foi fundada no ano 2000 pela Ação para o Desenvolvimento, a TV Klele é uma televisão comunitária, produz conteúdos audiovisuais orientados para os moradores do bairro do Klele, sendo uma ferramenta de comunicação para o desenvolvimento. Com a experiência acumulada ao longo dos anos, e dispondo dos equipamentos e tos técnicos especializados, a TV Klele passou a prestar serviços na área da produção audiovisual: fazem a cobertura de eventos, produzem documentários, filmes e videoclips. Têm como clientes instituições nacionais e internacionais, outras ONGs e cidadãos privados. É igualmente um espaço formativo para jovens, que aí adquirem competências especializadas e têm acesso a emprego na área dos media.
A TV Klele em ação

Cobiana Records: estimular a indústria cultural do país

É uma produtora musical guineense fundada na primeira metade dos anos 2000, por Zé Manel, músico do grupo Super Mama Djombo. A ideia de colocar a experiência acumulada ao serviço do seu país, surgiu quando ainda vivia nos EUA e produzia para músicos guineenses, incluindo para a sua banda. O objetivo da Cobiana Records é gravar músicos nacionais, com elevada qualidade, com proximidade à diáspora guineense e estimular a indústria cultural do país. Dispõe de um espaço físico projetado por um engenheiro de som profissional, instrumentos de captação e tratamento de som de alta qualidade (microfones, guitarras, pianos, mesa de mistura, colunas e software de edição). Oferece serviços como aulas de música, consultadoria no domínio cultural, organização de eventos, captação e tratamento de som. Zé Manel quer continuar a gravar música da Guiné-Bissau com qualidade e participar na dinâmica de internacionalização da cultura nacional, usando Senegal e Portugal como mercados de apoio.
É assim que se grava para a Guiné e para o mundo
Homenagem a um cantor mitológico

Tiniguena: produtos da terra e do mar Bijagó

É uma organização não-governamental que atua na proteção e valorização dos recursos naturais e dos saberes associados à gastronomia e à cultura das várias etnias da Guiné-Bissau. Para dinamizar o mercado e mostrar a riqueza e qualidade dos produtos nacionais, a organização traz para Bissau o que de melhor se encontra pelas diversas regiões do país. São exemplos dessa atividade os produtos das ilhas Bijagós, Urok, produzidos com base em princípios de agricultura sustentada. No âmbito das comemorações do Dia do Consumo Nacional, a Tiniguena organiza eventos em nome do património gastronómico nacional, caso da festa do peixe. Com o propósito de promover a introdução gradual nas ementas escolares e hoteleiras, de valores como o uso de produtos não artificiais, a importância dos valores nutricionais e a preferência por pratos e ingredientes locais, estes eventos são considerados muito importantes para a promoção da gastronomia e dos produtos guineenses.
Tiniguena, os produtos da terra e do mar Bijagó

Innova Lab, a ambição de formar mil jovens em inteligência artificial

O Innova Lab surgiu em 2015, o seu objetivo era o de criar um ambiente favorável às novas tecnologias na Guiné-Bissau. Foi fundado por jovens guineenses na área da gestão, engenharia e finanças.
Procura potenciar a inovação no país. O laboratório atua em várias vertentes, nomeadamente através da dinamização de espaços de coworking e de workshops, pitches e conferências relacionadas com os temas do empreendedorismo, novas tecnologias e ciência. Simultaneamente disponibiliza serviços de mentoria a start-ups guineenses, oferecendo-lhe aconselhamento por parte de técnicos e especialistas nestas áreas. O laboratório permitiu desde 2015, incubar mais de 10 projetos, 5 dos quais já se encontram em funcionamento. O laboratório pretende formar mil jovens nas áreas da inteligência artificial, blockchain e robótica, de forma a desenvolver as suas competências para solucionar os problemas que o país enfrenta.
Innova Lab

Mister Paul e a linguagem do riso

Eugeménio Mendes descobriu o seu talento para a criação de serviços publicitários quando ainda era animador da rádio. Acreditando na sua capacidade de influência e persuasão, Mr. Paul começou a desenvolver os seus próprios conteúdos para a promoção de produtos alimentares, introduzindo aspetos relacionados com o quotidiano do público-alvo e as especificidades socioculturais das diferentes comunidades guineenses. Recorre ao crioulo e a um conjunto de línguas, tornou-se no mais cobiçado “artista da publicidade”. Segundo Mr. Paul é preciso que as pessoas se relacionem com o produto, afirmando que isto só é possível através da “linguagem do riso” que considera universal, aliada à língua que as pessoas considerem como sua. Tem a sua própria rádio, a Tropical FM.
Mister Paul, porque fazer rir é uma arte sublime
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Notas do editor:

Vd. post de 24 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26611: Notas de leitura (1783): "Futuros Criativos"; edição da Associação para a Cooperação Entre os Povos, Fundação Portugal-África e Instituto Camões, 2019 (1) (Mário Beja Santos)

Último post da série de 28 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26626: Notas de leitura (1784): Philip J. Havik, um devotado historiador da Guiné: Na Terra do Novo Deus: O general Henrique Dias de Carvalho na Guiné (1898-1899) (5) – 1 (Mário Beja Santos)