Amigos e camaradas: Não é todos os dias que aparece um de nós a dizer, em público, a assumir em público, que a Guiné, a experiência de 'Guerra & Paz' que foi a Guiné, também representou alguns dos melhores dias, semanas, meses e até anos das nossas vidas... Politicamente incorrecto ? No nosso blogue, não conhecemos esse advérbio de modo... Leiam e comentem. LG
No seu primeiro texto, o José Eduardo Oliveira, que foi Fur Mil Enfermeiro, dá-nos conta de que a sua passagem pela Guiné, e em especial por Binta, na região do Cacheu, não teve só aspectos negativos (e traumatizantes), associados à guerra; também teve o outro lado, positivo, o apoio material e psicossocial às populações locais, o convívio, a camaradagem, a solidariedade.... Nesse texto, que não é de modo algum saudosista, ele faz o contraponto do melhor das suas vivências em Binta com o pior do day-after, com as agruras do regresso à normalidade...
2. Comentário do João Bonifácio (ou John Bonifácio) que vive no Canadá. Recorde-se que ele foi Fur Mil SAM (vulgo vagomestre), na CCAÇ 2402 (Có, Mansabá e Olossato, 1968/70) (**)...
A esta subunidade também pertence o nosso camara Raul Albino, ex-Alf Mil. Foi seu comandante o Cap Inf Mário José Vargas Cardoso. Pertencia ao BCAÇ 2851 (a cuja CCS pertenciam os nossos camaradas António Pimentel, da Figeira da Foz, mas a viver no Porto, e o Hernâni Figueiredo, de Ovar: um abraço especial, para estes dois camaradas do BCAÇ 2851, com quem estive recentemente no nosso IV Encontro, bem como ao João e ao Raul).
Olá, caro Luís:
Em relação às actividades da CCAÇ 675 em Binta, apenas posso louvá-los por tudo o que fizeram pelas populações. Alias, penso que todas as guerras que passaram pela Guiné, fossem do exército, marinha ou força aérea, fizeram o seu melhor para minimizar a dor e a saudade que sentíamos pelos nossos, que nem sabíamos se algum dia seria possível rever de novo.
Fazer statements [declarações] àcerca do facto de "terem sido os melhores dias..." , eu aí já desconfio, pois devido à minha especialização, posso afirmar que a CCAÇ 2402 fez quase tudo o que a CCAÇ 675 fez, durante a nossa estadia no teatro operacional de CÓ e OLOSSATO. Tambem nós fizemos muito, também nós fomos reconhecidos pela chamada accao psicológica, junto das populaçõs.
Também gostavam muito de mim, pois estando a cargo dos comes e bebes, as festas na aldeia não se faziam sem a chamada água de Lisboa, que embora com uma mistura de água e tinto na base dos 50/50, ainda os fazia dançar e cantar até às tantas.
Também porque era eu que ajudava as mães mais necessitadas, quando não davam leite suficiente para alimentar os seus babies [bebés]. Tambem a Companhia ajudou no campo da saúde, e até tínhamos um médico.
Tambem se fizeram casas novas, com a ajuda obrigada dos balantas, que não queriam nada com o trabalho.
Também se deu instrução escolar. Tivemos uma estação de rádio. Enfim, fizemos o que, penso todos fizeram. No meu caso pessoal, eu até fiquei muito feliz, porque assim teria tanto em que ocupar o tempo, que a minha comissão iria passar depressa.
Posso dizer que organizei o meu tempo muito bem, e apenas houve um inconveniente, é que a minha esposa ficou doente e teve de ser internada, o meu filho por razões que nunca se souberam, contraiu um problema no fígado e eu apanhei o paludismo.
Não posso dizer que foi o melhor tempo da minha vida. Não foi e por razões mais que claras. Talvez se eu estivesse na Guiné por minha vontade, então eu poderia dizer ou não do meu agrado. Nas nossas situações, vidas interrompidas em plena subida, famílias deixadas na incerteza, e a nossa propria dúvida de como acabaria. Sim, porque os soldados não faziam ideia nenhuma do que os esperava. Até nós, em certos momentos, não compreendíamos nada acerca desta guerra. Eu, mais ligado ao comando e como graduado mais antigo, estive sempre informado.
Nunca poderei dizer que foi uma estadia em que fomos muito felizes. A noite em que saí de Bissau, ficou lembrada por uma tempestada enorme e que continuou até Cabo Verde. De recordar o carinho do Antonio Sala ao dedicar-nos a cancao de despedida Adeus, Guiné. Fiquei emocionado. A estadia teve os seus altos e baixos, mas nunca poderei afirmar que foram os melhores dias da minha vida.
De qualquer modo, eu agradeco-te, Luis, o envio deste e-mail. Prova, afinal, que cada um de nós escolhe os melhores dias da vida a seu belo prazer e em conta com os seus próprios ideais e sonhos.
Obrigado e um GRANDE ABRAÇO.
João G. Bonifácio
Oshawa, Ontario, Canadá
CCAÇ 2402 Guiné
Ex-Fur Mil SAM
____________
Notas de L.G.:
(*) Vd. poste de 15 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4690: Depois da guerra, o stresse... da paz (1): Em Binta, vivi uma experiência única (José Eduardo Oliveira)
(**) Vd. poste de 1 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1331: Blogoterapia (9): Quando a Pátria não é Mátria para ti (João Bonifácio, Canadá, antigo vagomestre da CCAÇ 2402)
Olá, caro Luís:
Em relação às actividades da CCAÇ 675 em Binta, apenas posso louvá-los por tudo o que fizeram pelas populações. Alias, penso que todas as guerras que passaram pela Guiné, fossem do exército, marinha ou força aérea, fizeram o seu melhor para minimizar a dor e a saudade que sentíamos pelos nossos, que nem sabíamos se algum dia seria possível rever de novo.
Fazer statements [declarações] àcerca do facto de "terem sido os melhores dias..." , eu aí já desconfio, pois devido à minha especialização, posso afirmar que a CCAÇ 2402 fez quase tudo o que a CCAÇ 675 fez, durante a nossa estadia no teatro operacional de CÓ e OLOSSATO. Tambem nós fizemos muito, também nós fomos reconhecidos pela chamada accao psicológica, junto das populaçõs.
Também gostavam muito de mim, pois estando a cargo dos comes e bebes, as festas na aldeia não se faziam sem a chamada água de Lisboa, que embora com uma mistura de água e tinto na base dos 50/50, ainda os fazia dançar e cantar até às tantas.
Também porque era eu que ajudava as mães mais necessitadas, quando não davam leite suficiente para alimentar os seus babies [bebés]. Tambem a Companhia ajudou no campo da saúde, e até tínhamos um médico.
Tambem se fizeram casas novas, com a ajuda obrigada dos balantas, que não queriam nada com o trabalho.
Também se deu instrução escolar. Tivemos uma estação de rádio. Enfim, fizemos o que, penso todos fizeram. No meu caso pessoal, eu até fiquei muito feliz, porque assim teria tanto em que ocupar o tempo, que a minha comissão iria passar depressa.
Posso dizer que organizei o meu tempo muito bem, e apenas houve um inconveniente, é que a minha esposa ficou doente e teve de ser internada, o meu filho por razões que nunca se souberam, contraiu um problema no fígado e eu apanhei o paludismo.
Não posso dizer que foi o melhor tempo da minha vida. Não foi e por razões mais que claras. Talvez se eu estivesse na Guiné por minha vontade, então eu poderia dizer ou não do meu agrado. Nas nossas situações, vidas interrompidas em plena subida, famílias deixadas na incerteza, e a nossa propria dúvida de como acabaria. Sim, porque os soldados não faziam ideia nenhuma do que os esperava. Até nós, em certos momentos, não compreendíamos nada acerca desta guerra. Eu, mais ligado ao comando e como graduado mais antigo, estive sempre informado.
Nunca poderei dizer que foi uma estadia em que fomos muito felizes. A noite em que saí de Bissau, ficou lembrada por uma tempestada enorme e que continuou até Cabo Verde. De recordar o carinho do Antonio Sala ao dedicar-nos a cancao de despedida Adeus, Guiné. Fiquei emocionado. A estadia teve os seus altos e baixos, mas nunca poderei afirmar que foram os melhores dias da minha vida.
De qualquer modo, eu agradeco-te, Luis, o envio deste e-mail. Prova, afinal, que cada um de nós escolhe os melhores dias da vida a seu belo prazer e em conta com os seus próprios ideais e sonhos.
Obrigado e um GRANDE ABRAÇO.
João G. Bonifácio
Oshawa, Ontario, Canadá
CCAÇ 2402 Guiné
Ex-Fur Mil SAM
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Notas de L.G.:
(*) Vd. poste de 15 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4690: Depois da guerra, o stresse... da paz (1): Em Binta, vivi uma experiência única (José Eduardo Oliveira)
(**) Vd. poste de 1 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1331: Blogoterapia (9): Quando a Pátria não é Mátria para ti (João Bonifácio, Canadá, antigo vagomestre da CCAÇ 2402)
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