1. Mensagem de José Borrego (*), Ten Cor na Reserva, que pertenceu ao Grupo de Artilharia n.º 7 de Bissau e ao 9.º Pel Art, Bajocunda (Guiné, 1970/72), com data de 12 de Julho de 2009:
Caríssimo Carlos Vinhal,
Sem querer abusar da tua paciência e amizade envio-te para publicação, se assim o entenderes, mais este contributo antes das férias. Com os meus agradecimentos deixo a estética do trabalho ao teu altíssimo critério.
No Poste 4653 do camarada Álvaro Basto vi, pela primeira vez, os majores Pereira da Silva, Raul Passos Ramos, Osório e o alferes Mosca do Estado-Maior do CAOP1 em Teixeira Pinto, assassinados, na Guiné, na estrada que liga Pelunto a Jolmete (**).
Quando, em Julho de 1970, cheguei à Guiné não se falava de outra coisa!
As mortes tinham sido em Abril e ainda me lembra de ver o Senhor General Spínola de luto, fita preta, no braço (***).
Dizia-se em Bissau que tinha desaparecido, ingloriamente, a fina flor do Exército Português!
Estou muito grato ao blogue por publicar as fotografias e ao camarada Álvaro Basto por as ter arranjado, desfazendo equívocos, as quais me serviram de inspiração para escrever estas palavras sobre pessoas que foram brutalmente mortas numa missão muito arriscada… (receber a rendição de dois bigrupos na região de Canchungo ), como infelizmente se veio a verificar.
Segundo o irmão de Amílcar Cabral (Luís Cabral) que foi Presidente da Guiné-Bissau, o plano consistia em apanhar à mão o Governador (General Spínola) e os seus companheiros, mas este foi desencorajado pelo excelso e avisado Tenente-coronel Pedro Cardoso, que na altura era o Secretário-Geral da Guiné, que numa carta enviada ao Sr. General Spínola lhe terá dito que era perigoso envolver-se em contactos pessoais com os dirigentes sob controlo inimigo, propondo-lhe que, de futuro, os contactos se passassem a fazer em Bissau, no Palácio. Isto porque em data anterior (primeiros dias de Abril) o Comandante-chefe ter-se-á encontrado, secretamente, com André Pedro Gomes, chefe guerrilheiro da região Caboiana-Churo, para negociações de paz, na estrada entre Teixeira-Pinto/Cacheu.
As circunstâncias da morte dos militares em apreço, já foram relatadas por camaradas que viveram de perto a situação e publicadas no blogue.
Apenas falarei de algumas qualidades do major Raul Passos Ramos, porque conheço o seu irmão, general Fernando Passos Ramos, de quem sou amigo há muitos anos. Aliás, quando soube do falecimento do seu irmão Raul, voou do Leste de Angola para a Guiné para se inteirar da situação.
Nunca tive o privilégio de conhecer pessoalmente o major Passos Ramos, mas conheço testemunhas credíveis de camaradas do QP que serviram sob o seu comando, dos quais guardo na memória algumas qualidades humanas e militares do major Passos Ramos, relatadas por eles, e que passo a descrever:
Na década de 60, ainda capitão, o major Passos Ramos esteve a prestar serviço na Escola Prática de Artilharia em Vendas Novas;
Era um oficial distintíssimo, muito respeitado pelo seu constante exemplo (era um exemplo a seguir);
Era de uma dedicação e competência inexcedíveis, surpreendendo os mais dedicados e competentes!
Como comandante de Bateria (equivalente a Companhia na Infantaria) preocupava-se com os seus soldados, principalmente com os mais necessitados; conhecia-os a todos pelo nome e não pelo número... conversava com eles e sabia das dificuldades por que passavam. Alguns eram casados com filhos e o Capitão Ramos para lhes minimizar o sofrimento mandava-os entrar de licença para poderem trabalhar e contribuir para o sustento das suas famílias;
Todos os militares, principalmente oficiais, o queriam imitar…;
Oferecia-se para missões em lugar de outros camaradas que estivessem em dificuldades;
Quando entrava de Oficial de Dia à Escola Prática de Artilharia a população de Vendas Novas comparecia em peso para assistir à cerimónia do Render da Parada num gesto de profunda homenagem e consideração ao capitão Passos Ramos!
Enfim, era um Homem bom que do meu ponto de vista, merece ser recordado com todo o respeito e admiração!
Ao major Passos Ramos e aos restantes militares que faleceram com ele no cumprimento de uma missão, rogo a Deus para que as suas almas descansem em paz.
Despeço-me, desejando a todos as camaradas da Tabanca Grande e respectivas famílias, umas boas férias.
Abraços do
JOSÉ BORREGO
Nota: - Na construção dos parágrafos cinco e seis, apoiei-me no livro do Tenente-coronel Infª Francisco Proença Garcia (Mestre em Relações Internacionais pela Universidade Portucalense Infante Henrique)
Linda-a-Velha, 12 de Julho de 2009
Na foto: Majores Joaquim Pereira da Silva e Raul Passos Ramos, Alf Mil Fernando Giesteira Gonçalves e Major Magalhães Osório
__________
Notas de CV:
(*) Vd. poste de 2 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4628: Estórias avulsas (38): Histórias passadas na Guiné (José Borrego)
(**) Vd. poste de 7 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4653: Dando a mão à palmatória (21): A verdadeira fotografia do Alf Mil Cav Mosca, assassinado no dia 21 de Abril de 1970 (Os Editores)
(***) Vd. postes de:
8 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1503: Dossiê: O Massacre do Chão Manjaco (Afonso M. F. Sousa) (6): Fotografia dos três majores (Sousa de Castro)
9 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1510: Os heróis do Chão Manjaco e o Alferes Giesteira (Paulo Raposo)
27 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P2004: Dossiê O Massacre do Chão Manjaco (Afonso M.F. Sousa) (Anexo A): Depoimento de Fur Mil Lino, CCAÇ 2585 (Jolmete, 1970)
30 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P2008: Dando a mão à palmatória (1): A fotografia dos saudosos majores Pereira da Silva, Passos Ramos e Osório (João Tunes / Editores)
1 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2320: Relatórios Secretos (1): Massacre do Chão Manjaco: O resgate dos corpos (Virgínio Briote)
Vd. último poste da série de 6 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4645: In Memoriam (25): Maria da Glória Revez Allen Beja Santos (1976-2009): Missa do 7º dia, 4ª feira, 19h, Igreja do Campo Grande
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
terça-feira, 14 de julho de 2009
Guiné 63/74 - P4685: In Memoriam (27): Recordando o Major Raul Passos Ramos (TCor José Francisco Robalo Borrego)
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