quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

Guiné 63/74 - P2477: História do BCAÇ 2879, 1969/71: De Abrantes a Farim: O Batalhão dos Cobras (3) (Carlos Silva)

Continuamos a transcrever a História do BCaç 2879. Depois da formação do Batalhão e da viagem rumo à Guiné, publicamos hoje a chegada a Bissau, com as impressões que a cidade deixou ao nosso Camarada Carlos Silva, ex-Furr Mil do Batalhão e hoje um ilustre advogado, há mais de vinte anos a defender causas de ex-combatentes brancos e negros.
 vb
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Bissau - Breve descrição Durante a estadia que foram de alguns dias na Amura e no Quartel dos Adidos, sediado nos arredores da cidade e a caminho do aeroporto de Bissalanca, sempre que surgia uma oportunidade e tínhamos possibilidade, apanhávamos boleia nas viaturas militares e lá íamos dar uma passeata até à baixa, onde éramos matraqueados com o célebre cantarolar de pelos mais velhos de “salta periquito, salta periquito, a velhice vai no metrópole”…

1969 – Vista aérea de Bissau e do ilhéu do Rei 

Podemos caracterizar Bissau como uma cidade bastante bonita, simpática e alegre, plantada à beira mar, praticamente plana, com declives pouco acentuados, aliás, na Guiné o relevo é pouco acentuado.

Dotada de boas avenidas e ruas transversais, bastante arborizada com mangueiros, cajueiros, a ponciana, espécie de acácia que embeleza a urbe na época da floração, etc.

É de salientar a avenida principal, Av. da República, que parte da zona ribeirinha do Cais do Pidjiguiti até à Praça do Império, onde se situa o Palácio do Governador da Província. A avenida marginal, lindíssima, repleta de palmeiras e coqueiros, passando pelo jardim junto à Fortaleza de S. José da Amura.

As ruas perpendiculares umas às outras, tem uma extensão enorme, como por exemplo a célebre Estrada de Sta. Luzia que parte da Fortaleza da Amura, e vai até onde ficava situado o Quartel-general. Nesta estrada situa-se o Hospital Civil Central.

As casas térreas, com a sua traça típica da época colonial e rodeadas de lindíssimos jardins, sempre bem tratados. Apenas se via um ou outro prédio de dois ou três andares, tal como aquele onde estavam instalados os serviços da TAP. Portanto, não destoavam do restante casario, enquadrando-se na cidade de forma harmoniosa. Praticamente, com o início, por trás do Palácio do Governador, estendia-se até ao Quartel-General o célebre bairro designado por Pilum ou Pilão.

A cidade estava dotada de boas infra-estruturas escolares, Liceu Honório Barreto, hospitalares, Hospital Central – após a independência da Guiné passou a designar-se por Hospital Simão Mendes em homenagem a um combatente responsável pela área da saúde do PAIGC e que morreu em combate (1) e Hospital Militar, considerado um dos melhores hospitais da África Ocidental, desportivas, tais como o Estádio do Sport e Benfica de Bissau e outras, o Hotel Portugal e o Grande Hotel, pensões etc.

Infelizmente devido à guerra, havia muito movimento na cidade, pelo facto de ali se concentrarem milhares de militares. Os que ali estavam colocados, cumprindo a sua comissão até ao fim e os que estavam por lá em trânsito, ora aquando da sua chegada à Guiné, ali teriam de aguardar por transporte a fim de serem colocados nas suas respectivas zonas de intervenção no interior, ora quando aguardavam pela hora do embarque de regresso para a Metrópole.

Havia muito movimento devido à circulação constante das viaturas militares, na cidade, e, entre esta e as Unidades instaladas na periferia, a caminho do aeroporto, assim como se via uma grande circulação de viaturas civis.

Existia muita actividade comercial e de restauração. Na baixa, as lojas estavam completamente cheias; Casa Gouveia, Ultramarina, Pinto, Taufik Saad, Mercado Central etc. Os militares compravam tudo e mais alguma coisa. Desde roncos (2) para levarem para as suas famílias, namoradas e amigos, passando pela compra de máquinas fotográficas, aparelhagem, gravadores Akai, gira-discos, ventoinhas Termozeta, whisky, tapetes com motivos orientais, carpetes, arcas de cânfora, enfim, um mundo de objectos.

Nos restaurantes e cervejarias verificava-se um ambiente de frenesim constante, essencialmente com os militares. Os clientes não deixavam os empregados de mesa descansarem um minuto. Ora pedindo mariscada com aquele molho picante, gindungo, que sabor! Ora pedindo ostras, quentinhas a sair do forno, que maravilha! Bem regadas com cerveja grande bazucas, fantas, coca-cola, whisky, gin, etc., pois o calor apertava e a sede também, pelo que, havia uma grande necessidade de refrescar as gargantas sequiosas.

Deste modo, quer durante o dia, quer à noite, a rapaziada passava o tempo de lazer na cervejaria Sol Mar ou na esplanada do Bento, mais conhecida pelo Q.G, onde se saboreava o cair violáceo da tarde sob as acácias, numa amena cavaqueira, bebendo umas bazucas, apreciando a passagem de modelos multicoloridos das guineenses e de algumas europeias, ou ainda na mais recente e mais moderna cervejaria O Pelicano (3), situado na marginal, mais cosmopolita, onde à noite se podia desfrutar duma esplêndida vista para o cais e para o Ilhéu do Rei, experimentando os sabores, quer da comida guineense, ostras ou camarão com gindungo, chabéu, moqueca, caldo de mancarra, acompanhado dumas imperiais, bebendo um bom whisky, um refrescante gin tónico ou misturas destas bebidas alcoólicas com coca-cola que ainda não era conhecida na Metrópole e onde também se podia comer um bom bife com ovo a cavalo.

Os mais atrevidos davam uma saltada até ao Pilão (Cupilão ou Pilum) ver o desfile da moda feminina, aproveitando para satisfazer os prazeres da carne, não descurando a segurança, mantendo sempre um camarada de sentinela, ou então iam até à boite, designada pomposamente por Chez Toi, onde paravam as meninas da Metrópole.

Bissau, 1969 > Praça do Império e Palácio do Governador

Bissau, 1969 > Avenida da República: Casa Gouveia (à esquerda); Palácio da Justiça (à direita)

Bissau, Praça do Império,1969 > Monumento ao Esforço da Raça.

Bissau, 1969 > Praça do Império: Monumento ao Esforço da Raça, Palácio ao fundo

Bissau, 1969 > Ponte Cais e Ihéu do Rei no Estuário do Rio Geba.

Bissau, 1969 > Av Marginal, com os seus belos coqueiros, Ponte Cais e Ihéu do Rei.

Bissau, 1969 > Av Marginal

Fotos: Carlos Silva

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Notas de Carlos Silva: (1) Cabral, Luís, Crónica da Libertação – Edição “ O Jornal “ 1984, pág.

(2) Roncos -Objectos de missanga, amuletos etc. A palavra poderia também significar êxitos ou triunfos.

(3) O postal pode ver-se in Loureiro, João – Livro de Postais Antigos da Guiné, postal 102, pág. 66

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Nota de vb: Fotos da responsabilidade de Carlos Silva e postal in Loureiro, João – Livro de Postais Antigos da Guiné, postal 102, pág. 66. vd artigos de 20 de Janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2464: História do BCAÇ 2879, 1969/71: De Abrantes a Farim: O Batalhão dos Cobras (2) (Carlos Silva) 15 de Janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2440: História do BCAÇ 2879, 1969/71: De Abrantes para Farim : O Batalhão dos Cobras (1) (Carlos Silva)

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