segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Guiné 63/74 - P3682: Os Combatentes e a responsabilidade do Estado. (Jorge Teixeira)


O Estado e os Combatentes das Guerras em África
Texto de Mário Crespo no JN de 28/12 (?), enviado pelo Jorge Teixeira





Foi notável o apelo que o Presidente da República se sentiu obrigado a fazer ao Governo para que cumpra com as responsabilidades que o Estado tem com os que sofrem as consequências das guerras coloniais.

A assistência aos deficientes das Forças Armadas tem sido considerada questão menor. Sucessivos governos têm aguardado que o problema dos antigos combatentes em geral e dos deficientes em particular se resolva por si.

Na realidade é isso que tem acontecido. A morte prematura resolve com arquivamentos definitivos, um a um, processos protelados em burocracias complicativas, diligentemente alinhavadas para satisfazer expectativas orçamentais. Têm-se inventado redefinições dos graus de invalidez. Reavaliado o que são situações de guerra e de combate. Tudo para conseguir roubar na assistência aos veteranos. Burocratas que não imaginam o que foram as décadas de desumanidade que gerações de jovens dos anos 60 tiveram que enfrentar decidem agora em termos de custo-benefício se vale a pena rubricar nos orçamentos as verbas necessárias, ou se é de aguardar mais uns anos até que os problemas naturalmente se apaguem.

Não se trata só de acudir às deficiências fisicamente mais óbvias, que infelizmente têm sido descuradas ou insuficientemente assistidas. Há graves consequências clínicas da guerra que estão a ser mantidas discretamente afastadas do foco mediático.

O elevado número de antigos combatentes que padece hoje de uma forma particularmente virulenta de Hepatite C é uma dessas situações. São as vítimas directas das vacinações em massa sem seringas descartáveis, que eram norma nas Forças Armadas até bem dentro da década de 70.

Centenas de milhar de jovens foram injectados nas piores condições sanitárias possíveis. Era usada a mesma seringa colossal de uns para os outros. Apenas substituíam as agulhas que depois de fervidas voltavam a ser reutilizadas. As hipóteses de contágio eram máximas. A Hepatite C é assintomática durante dezenas de anos até os danos no fígado serem irreversíveis e, numa alta percentagem, fatais. Nunca houve um programa de rastreio sistemático dos antigos combatentes. Mas já houve muitas mortes.

Sei de várias e de casos em que, face a diagnósticos positivos em militares de carreira, não foram recomendadas medidas terapêuticas no próprio Hospital Militar. Porquê?

Pode haver várias respostas. Que o tratamento é difícil e muito penoso. Que pode ser falível. Tudo verdade, como também é verdade que a despistagem e o tratamento são caríssimos e seria impensável nos actuais orçamentos da defesa torná-los extensivos aos sobreviventes da guerra colonial. Este é só um exemplo de consequências ignoradas da guerra que são responsabilidade do Estado.

Haverá milhares de vítimas mortais se se mantiver a ligeireza fútil e desumana como o problema tem sido encarado em democracia. Atitude que em nada se distingue da bestialidade com que, em ditadura, se enviaram gerações sucessivas de jovens para conflitos absurdos.

Um pormenor mais. O mesmo governo que disponibiliza verbas significativas para assistir drogados contaminados em trocas de seringas descartáveis, já pagas pelo Estado, não considera prioritário destinar pelo menos o mesmo montante para assistir em hospitais militares antigos combatentes que padecem dos males que involuntariamente contraíram, sem se drogarem.

Jorge/Portojo

Meus espaços

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http://portojo.multiply.com/



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Notas de vb:
1. Título da responsabilidade do editor.
2. Último artigo do Jorge Teixeira em

16 de Dezembro de 2008 >
Guiné 63/74 - P3636: O meu Natal no mato (15): Salsichas com arroz na messe de Sargentos, na Consoada de 1968... (Jorge Teixeira)

10 comentários:

Carvalho disse...

Força amigo Jorge. Este é um tema muitíssimo pertinente, tratado há bem pouco tempo, por esse jornalista de grande categoria chamado Mário Crespo, numa edição do JN. Efectivamente , só num país de governantes miseráveis é que se gasta mais dinheiro com drogados, que escolheram o seu caminho, do que com aqueles que mais deram de si,num caminho que não escolheram.

Anónimo disse...

Caro Jorge,

É uma intervenção oportuna e lúcida. Os nossos Camaradas deficientes devem apreciar que, pelo menos, os que com eles passaram as passas das guerras de África, os lembrem.
vb

Anónimo disse...

Convem que o "ex-combatente do ultramar", fique na memória como que "o soldado desconhecido".

Até já há tentativas de se escrever a guerra por quem nunca lá pôs os pés.

Já ouvimos nestes trinta e tal anos, vezes demais, a coerência de quem nunca lá esteve, e a incoerência de quem lá andou.

Antº Rosinha

Anónimo disse...

Enviei há pouco o texto do Mário Crespo para a nossa Tabanca, força amigo, já vamos restando poucos, mas sintamos o orgulho do melhor que à Pátria ainda resta!
Um abraço do tamanho do Cumbijã

Mário Fitas

Anónimo disse...

Caro Jorge
Eis um bom registo da indignação pela injustiça a que foram votados os deficientes das F.A., mas também aqueles muitos, que sendo-o, não lhes reconhecem o estatuto, ou não têem a lucidez para o requerer. e podíamos ser nós. Tudo porque esta pseudo-democracia em que vivemos, tem apenas servido para, pelos votos, legitimar esses abutres gananciosos, em poleiros de troca de influências e favores materiais, em aleivosa concupisciência de partidos,nas tintas para servir com dignidade e equidade. É que os drogados têem que ser apoiados para a preservação do negócio. Os DFA, ao contrário, só causam despesa. Não servam para branquear.
Permite-me que junte aqui a minha indignação, por estarmos subjugados a um regime que se preocupa urgentemente em repor os níveis de fortuna recentemente afectados, e descura as funções principais de garantir a justiça, a saúde, a educação, as boas soluções laborais e de produção de riqueza. Perdoem-me sinto-me uma besta, mas muito incomodado.
Um abraço fraterno para aTabanca.
José Dinis

Unknown disse...

Malta
Este texto não meu. É do Mário Crespo na opinião do JN, creio que do dia 28.
Tenho de alertar os editores. Deveria lá estar devidamente mencionado.
Um abraço para a Tabanca e Bom Ano

Cesar Dias disse...

Camarada Jorge Teixeira

Parabens pelo tema pertinente que é o problema dos Deficientes das Forças Armadas, pois na nossa tabanca não tem sido muito focado, esperemos que não caia em saco roto o abanão que Cavaco Silva deu ao Governo nesse aspecto.
Bem Hajas por este post

César Dias
Ex Furriel milic
BCAÇ 2885

Anónimo disse...

Concordando com todos os que se expressaram sobre este assunto, também admirei o Mário Crespo pelo seu artigo de opinião quando o li.
Claro que todos nós nos sentimos defraudados com a forma com que tratam os numerosos camaradas que sofrem as consequências de actos sofridos na Guerra do Ultramar. Mas que podemos esperarar de quem nunca lá andou? Estes o que querem é tratar da sua vidinha, explorando-nos logo que nos caçam os votos.
Mas que dizer dos que lá andaram e também se esquecem dos que sofrem? E que ocupando ou tendo ocupado cargos com poder nada resolveram? Enfim, são os governantes, são os funcionários do MNEstrangeiros,todos a maltratar este Pobre Povo que os sustenta...
Como ex-combatente sinto-me ofendido, mas como aposentado da função pública começo a sentir vergonha de dizer qual a minha antiga profissão...
Abraços
Jorge Picado

Anónimo disse...

Li o artigo do jornalista Mário Crespo no JN que agora o camarada Jorge Teixeira em boa hora trouxe à tabanca e dificilmente posso deixar de responsabilizar, a corja insensível, que ao longo dos anos num posicionamento de desrespeito pela vida dos combatentes e total ignorância do que foram aqueles dois anos que tantos portugueses ali sofremos, procuram com silêncios e,ou,ardis e mentiras, fazer passar o tempo esperançados que os poucos que de entre nós restarem daqui a uns anos,se possam prestar- medalha de latão ao peito- às romagens de saudade que eles promoverão à guiza do que víamos acontecer com os combatentes de La LYS...

Sempre ficará quase de borla e poderão dar uma imagem de preocupação que até então ninguém tivera...

Camaradas é mais que tempo de darmos a conhecer a essa corja a massa de que somos feitos.

Sei bem que a caserna não se envolve em questões políticas.

Trata-se de um pressuposto editorial que todos temos consciência da necessidade de ser preservado, no entanto,se pensarmos que ainda somos perto de meio milhão vivos e que com o óbvio apoio dos familiares directos
facilmente atingiríamos uma cifra de mais de dois milhões de votantes, talvez pudessemos pôr à consideração de cada um, para, usando blogs próprios, disseminarmos a ideia de combatermos o poder por dentro,ou seja,acedermos a ele através da constituição de um movimento congregador de vontades suficientemente capaz - já provamos que temos força para isso ao aguentarmos estoicamente todas as adversidades inseridos numa guerra noutras latitudes, sujeitos a climas impiedosos,vivendo em condições sub-humanas com lacunas de toda a ordem mas de peito firme - de fazer reconhecer a nossa posição de outros tempos em que a solidariedade era o traço de união entre todos.

A causa é comum!

É tempo de dizermos a esta gentalha do que somos capazes!

Há camaradas a viver (?) miseravelmente,com menos de oito euros/dia enquanto a clique que nos nega tudo continua como pode constatar-se na comunicação social,a delapidar sugando da teta da porca de Bordalo que de gorda passou a tísica...

É tempo de dizer-lhes que estamos acordados antes que nos adormeçam de vez!

É urgente fazer uma manifestação onde possamos mostrar-lhes que, mau grado sexagenários, somos ainda seres activos e pensantes capazes do que necessário for para darmos finalmente o grito de Ipiranga deste colete de forças em que nos colocaram...

Se entenderes que abusei o escrito/desabafo não virá mal nenhum ao mundo mas creio que seria tempo de acordar as consciências adormecidas pelos grosseiros anestésicos de que somos alvo diariamente...

Um abraço a toda a tabanca.
Manuel Maia.

Anónimo disse...

Comentários para quê?
ass.:UM COMBATENTE ferido em combate/duas peritagens psic(diagnóstico:evolução crónica de stress pós-traumático de guerra) sem-abrigo.
Esta é......a ditosa Pátria minha amada!?!?!?!?!?