sábado, 16 de janeiro de 2010

Guiné 63/74 – P5659: Estórias do Tomás Carneiro (1): De Binta a Jugudul


1. Mensagem de Tomás Carneiro, ex-1.º Cabo Condutor da CCAÇ 4745/73 - Águias de Binta, (Binta, Cumeré e Farim – 1973/74), nosso Camarada que vive nos Açores, com data de 13 de Janeiro:

Olá saudosos Amigos e Camaradas,

Oxalá estejam todos bem é o que eu espero. Por cá vou-me safando, a ler alguma coisa da nossa passagem pela guerra na Guine.

Hoje vou escrever uma estoriazinha sobre o que por lá passei.


De Binta a Jugudul


Fiz parte da CCaç 4745, que esteve sediada em Binta, desde 21de Agosto a 27 de Outubro de 1973. Naqueles 3 meses passamos algumas situações de risco.

Eu como condutor só as passei pelo perigo nas “auto-estradas”, mas os meus camaradas “de mato”, podem contar muitas outras bem mais terríveis, que eu, felizmente, não passei.

A CCaç 4745 fez algumas colunas Binta/Farim/Binta, para efectuar reabastecimentos e fomos, várias vezes, ao encontro de colunas que vinham de Guidage, também para reabastecer.

Estas operações eram bastante problemáticas, porque para conduzir no meio da lama toda, atolados aqui, atolados acolá, obrigando-nos a passar os guinchos de uns carros para os outros para nos safarmos, além de moroso, era extremamente exaustivo.

Lembro-me que da 1ª vez que fomos fazer um reabastecimento a Guidage e passámos no Cufeu, eu fiquei doido com o que lá vi, nomeadamente a terra esburacada, a vegetação queimada e o estranho cheiro correspondente entre vários destroços de viaturas emboscadas por fogo IN.

Eu não sabia o que se tinha ali passado antes de chegarmos a Binta, mas jamais esquecerei que, no momento, pensei: ”Esta merda é mesmo guerra!”

Depois de passado este local, ficámos a aguardar a chegada dos nossos Camaradas de Guidage, fazendo segurança à “auto-estrada” Binta/Guidage e, passado algum tempo, apareceu-nos o Alf Mil Ávila (que penso ser natural de S. Jorge).

Quando ele chegou eu estava junto de um atirador e junto dele, no chão, estava uma granada de morteiro 60 mm.
Pergunta-me o alferes: - Oh Sousa quem é que deixou esta p... aqui no chão?

Respondi-lhe: - Não fui eu, porque nem sei isso o que é (brinquei com ele).
Disse-me ele novamente: “Isso é serio.”

Depois chegou-se a uma conclusão que era uma granada não deflagrada, do célebre ataque a Guidage em Maio de 1973.

Uma parte do que queria escrever sobre a estadia em Binta, já o fiz em anteriores postes, logo a seguir ao formidável encontro da Tabanca Grande, em Junho de 2009 na Ortigosa.

No poste P5490, está a foto do meu inesquecível e grande Amigo, o 1º Cabo Condutor Jacinto Custódio falecido devido a ferimentos causados por uma mina A/C, no dia 24 de Setembro quando seguíamos de Binta para Farim e que jamais esquecerei.

Em fins de Outubro, princípios de Novembro de 1973, fomos transferidos para um quartel novo, que se situava entre o Jugudul e Porto Gole, numa altura em que estava a ser construída uma estrada entre Jugudul e Bambadinca e a cujas obras fizemos segurança. Nesta mudança, esperámos por alguém que nos viria acompanhar e quem devia ser esse algiuém? Nada mais, nada menos, do que os-meus companheiros e amigos “Os Gringos do Guileje”.

Foi uma alegria tão grande encontrá-los 3 meses depois de partimos de Binta. Eles, os Gringos, diziam que a estrada entre o K3 e Mansoa, era bastante perigosa, submetida a inúmeras emboscadas e golpes de mão sobre as NT, que tinham sofrido várias baixas e algumas perdas de militares (apanhados pelo IN “à mão”).

A partir daí viajamos sempre com o credo na boca, não fosse o diabo tecê-las, mas, felizmente, nada de anormal ocorreu durante aquela mudança e chegamos a Jugudul ao fim da tarde, sem qualquer problema.

Passamos a primeira noite dentro do quartel, mas tivemos que preparar os nossos aposentos recorrendo ao habitual “desenrascanço” individual. Nós, os da “ferrugem”, safámo-nos da melhor maneira possível com as cobertas das viaturas e deu certo.

Por hoje é tudo. Brevemente, contarei mais algumas estórias, mas tenho que vasculhar o meu “disco rígido”.

Um Abraço desde o meio do Atlântico,
Tomás Carneiro
1º Cabo Cond CCAÇ 4745

Foto: © Tomás Carneiro (2009). Direitos reservados.
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Nota de M.R.:

Este é o primeiro poste desta série.

1 comentário:

Anónimo disse...

Tomás,
Não consegues convencer algum dos teus amigos dos "Gringos" a escrever para o blogue? Seria muito importante.
Um abraço amigo
Carlos Cordeiro