sábado, 28 de janeiro de 2012

Guiné 63/74 - P9412: Da Suécia com saudade (34): A doce nostalgia de uma terra… que já não existe (José Belo)



1.   O nosso Camarada José Belo, ex Alf Mil Inf da CCAÇ 2381,Ingoré, Buba, Aldeia Formosa, Mampatá e Empada, 1968/70, enviou-nos a seguinte mensagem com data do dia  25 do corrente mês.


Caros Amigos e Camaradas:

Em quase todos nós, e com o passar das décadas, vai havendo uma subtil substituição das recordações dos momentos violentos da guerra por nostalgias bem mais saudáveis.

As proximidades várias que ainda hoje sentimos com aquele país terão muito a ver com o "privilégio" que muitos de nós tiveram de viver longos períodos de tempo em Destacamentos isolados, em Tabancas perdidas no mato, o que criou a oportunidade única de viver o dia-a-dia (verdadeiro) de muitas daquelas gentes.

Os que têm tido a oportunidade de revisitar a Guiné-Bissau acabarão por lá "reencontrar" o que os seus corações querem sentir (*) Viagens em busca "do que era" com uma menor atenção para o país... que é!

O país que hoje é a Guiné não poderá ser descrito com o grito do coração:"A má reputação da Guiné-Bissau fora de portas nada tem a ver com a realidade guineense". (Não sendo no entanto difícil de se concordar quanto à afabilidade e hospitalidade do seu povo).

A Suécia, a ser suspeita na sua Política de Estado para com a África, o será por uma parcialidade (quase até à data!) para com a Guiné-Bissau. Aquando da guerra, os apoios em material escolar, sanitário, propaganda na rádio, TV e jornais, a somarem-se a uma acção contínua por parte de todo o aparelho Diplomático da neutral Suécia nas Nações Unidas e na maioria das organizações internacionais, não encontra correspondência em qualquer outro país ocidental.

Depois da independência as verbas enviadas para auxílios vários à Guiné ultrapassaram em muito qualquer outro auxílio internacional. Actualmente tudo tem sido revisto à luz de este país se ter tornado, como descrito pelas Nações Unidas, "em uma das maiores plataformas no transporte de drogas para a Europa tendo-se deixado corromper a todos os níveis sociais e instituições, sejam elas governamentais, aparelho de justiça, forcas armadas ou funcionalismo. (Para os mais interessados numa perspectiva mais profunda das realidades actuais guineenses recomenda-se a leitura do "Plano-Quadro das Nações Unidas de Apoio e Desenvolvimento-PNUAD-Guiné-Bissau/2008-2012).

Serão também importantes as leituras dos relatórios do UNODC-"Escritório da Nações Unidas contra a Droga e Crime” que é um Plano de Acção Regional na abordagem ao problema crescente do tráfego ilícito de drogas na África Ocidental 2008-2011.Assim como o "Plano-Quadro das Nações Unidas sobre a África como centro da rede de narcóticos ilegais da América do Sul para a Europa.

A UNODC forneceu verba avultada para auxiliar a criação de um plano nacional antinarcóticos, e para a reforma de todo o sector de segurança da Guiné-Bissau e Costa Ocidental Africana. Estabeleceram-se também parcerias, e união de esforços, entre a UNODC e o Escritório das Nações Unidas Contra a Droga e Crime (DPKO), assim como o DPKO-Departamento das Nações Unidas para Assuntos Políticos, e com o UNOWA-Escritório das Nações Unidas para a África Ocidental, e a ECOWAS-Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental.

A INTERPOL está também ligada a todo este esforço regional. Infelizmente para os que - como eu - têm trabalhado décadas junto dos apoios estatais suecos à Guiné Bissau assim como nas Nações Unidas, a extensão do problema tem vindo a afastar muitos dos apoios importantíssimos para uma continuidade de auxílios tão necessários. Tudo demonstrando que..."a reputação da Guiné fora de portas..."

J.Belo/Estocolmo 25 Jan.12.
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Nota de MR:



7 comentários:

Luís Graça disse...

Meu caro José Belo:

De alguma maneira, estamos aqui a fazer o luto por uma terra que, de facto, já não existe... A "Guiné portuguesa" não existe mais. Também é verdade que o imaginário colonial nunca foi o nosso!... (Pelo menos no tempo em que eu lá estive).

Quero conservar algumas doces recordações daquela terra, verde e vermelha, os poilões, os bissilões, a floresta-galeria, as belas futas-fulas, as belas fulas, as belas mandingas, as tabancas onde dormi, a música afromandinga, os nossos camaradas guineenses que foram valentes e leais, o Corubal, o Geba, o macaréu, os rápidos do Saltinho, Contuboel, Bafatá, as chuvas tropiciais, o pôr do sol, as pontas onde íamos comprar o abacaxi, os palmeirais bordejando as bolanhas, os djubis à noite à volta da fogueira, as tabancas ribeirinhas dos balantas, o mar verde dos arrozais, os amigos que lá fiz e que continuo a fazer...

Respeito os povos, mas nem sempre as suas elites, muito menos as elites que não são dignas dos seus povos... Custa-me ver aqui escrito, em letra de forma, que a Guiné-Bissau é hoje um "narco-estado" e que cada vez menos portugueses se interessam pela sorte da aquele povo, gentil e acolhedor...

Que ao menos o nosso blogue rume contra a maré da indiferença e do cinismo, e nos ajude a separar o povo e o seu regime político... Amílcar Cabral, no passado, fez o mesmo connosco!

Antº Rosinha disse...

J. Belo, com a curiosidade que leio o que dizes, nunca me tinha apercebido que tenhas anteriormente referido a essa tua ligação na cooperação com a Guiné.

E eu que tive muitas vezes trabalhos que se interligaram com a actividade sueca na Guiné.

Principalmente em 91,92,93 do outro século.

Mas eu já tinha conhecido a actividade de Suecos na fronteira de Angola, em Matadi quando em 1960 se deu a independência do Congo e eu era cabo milº em Noqui.

Sou testemunha viva da cooperação sueca no Congo Belga e na Guiné Bissau.

J. Belo, sem estatísticas, só do que vi, é de supôr que Portugal nunca investiu em 500 anos o que a Suécia investiu na Guiné.

Educação, energia (geradores), agricultura, madeiras, estradas e sei lá o que mais.

Eu condeno a maneira como a suécia ajudou o congo e a Guiné, tal como os suecos condenam a colonização portuguesa.

Os suecos já desistiram, os portugueses ainda insistem, até mesmo no ex-Congo Belga.

J. Belo, se não fôr possível um post, enviar-te-ei pessoalmente um retrato do que vi e até cooperei com os suecos em certas actividades.

Claro que será um ponto de vista só meu.

Um abraço

Anónimo disse...

Caro Luís, (se me permite aqui o insert, o JBelo)
a distinção entre um povo e os seus governantes foi sempre uma falácia, mesmo que prefigurasse uma intenção.
Raramente se poderá falar em voluntário, espontâneo e consciente alinhamento de um povo, amálgama de intuitos e vontades, com os seus governantes o que, por conseguinte, leva a que se deva tomar a acção de um povo pelo que resultar das acções institucionais do Estado em que se integra, uma vez que, assim, a vontade expressa raramente será então a manifesta, de um povo.
Em Portugal, um País onde as diferenças sociais sempre foram acentuadas, o povo não terá estado com os governantes senão por força da integração institucional, pelo que aquela distinção não seria pertinente ou reconhecível, por força desta condição característica - foi uma falácia eficaz.

Agora, então... caro JBelo,
o apoio da Suécia aos 'movimentos de libertação', além de financiar a compra de armamento e equipament ocom que nos-a mim e a si- 'tratavam da saúde', servia também para miles de finalidades, incluindo estadias de formação (entenda-se arregimentamento político-ideológico) dos denodados militantes -que às vezes ficavam lá- e para favorecimentos vários, incluindo a venda de equipamentos e instalação de unidades fabris.
À guiza de referência avulsa, a Suécia, em 1973, contribuiu com 5 milhões de Coroas para a luta da Frelimo. O valor da 'ajuda' a Angola é obscuro, devido à existênccia de três Forças de Libertação que por acaso se combatiam ferozmente entre si -coisa que algumas vezes me deu jeito, diga-se, apesar da pequenez da minha acção.
É uma discussão longa e sinuosa, mesmo em meio próprio e por isso, não entendo que o meu breve comentário deva ser considerado baliza.
Assim, aqui fica, para consulta, esta referência imediatamente acessível
http://www.liberationafrica.se/publications/978-91-7106-612-1.pdf

SNogueira

Anónimo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Torcato Mendonca disse...

Custa-me muito mas não vou comentar.

Em tempo e com tempo.Só fora do blogue. De facto a Guiné do nosso tempo não existe mais.
É bom que saibamos não confundir passado e presente.É bom que saibamos ouvir quem sabe o que foi a ajuda de outros Países ao Paigc ou quem, após a dita libertação assistiu á aplicação de "ajudas externas. Ler, ter conhecimento vindo de outras fontes...

Vou tentar ler aquele PDF enviado pelo S. Nogueira. Necessito de o ler, pouco vi ao rolar do rato, mas interessa-me.Ob. por ele.

Abraço do T.

Hélder Valério disse...

Caros camarigos

Esta intervenção do José Belo é como que um abanar, uma chamada de atenção para o perigo de estarmos a querer ver uma coisa que já não existe.
Acho que tem como motivo uma reacção à forma como o José Borrego descreveu o que viu na sua recente viagem à Guiné.
É possível que o Borrego 'tivesse querido ver o que viu' mas, atenção, também há um 'vício de leitura' que nos 'mostra' a Guiné como uma coisa sem futuro, um perfeito caos, um laxismo militante, uma corrupção desbragada, semelhante à nossa mas potenciada pelas características africanas.

Seja o que for, e nisso tenho que concordar com o rol de citações que o Luís Graça indica das inúmeras coisas que o nosso imaginário guineense tem como referências (deixa que diga, Luís, que está longe de ser exaustivo), que só posso pedir que já que nos vão tirando cada vez mais coisas, que não nos tirem o sonho, a memória, a recordação.

E penso também que o Luís está certo quando formula o desejo que "ao menos o nosso blogue rume contra a maré da indiferença e do cinismo, e nos ajude a separar o povo e o seu regime político... Amílcar Cabral, no passado, fez o mesmo connosco!". É que há por aí muita atitude 'pouco saudável' no que respeita a solidariedade e que se 'fundamenta' no que se vai dizendo e escrevendo com as mais negras cores com que se vão pintando a Guiné.

Abraço
Hélder S.

J,Eduardo Aves disse...

camarada J. Belo
li com atenção texto. e os comentários. eu fui e sou um cooperante. porque há varias formas de cooperar uma das formas de cooperar pode ser remunerada, outa pode ser como trabalho humanitário, outro com apoio financeiro, ou com bens, eu desde Angola, Congo Francês, Costa do Marfim, Venezuela, Espanha, Suiça, dei o meu contributo com o meu trabalho para o desenvolvimento, na Guiné Portuguesa estou ainda ajudar com trablho Humanitário e oferta de bens, mas questão é se esiste a Guiné Portuguesa sim esiste dizem os Guineenses só não é colonizada por portugal, assim como esiste a Guiné Francesa o Congo Belga, o Congo Francês, quando á quatro anos entrei em Pirada e deixei escapar da boca já cheguei á Guiné Portuguesa um Guinneense, disse sim estás na Guiné Portuguesa, tenho uma carta de agradecimento da Guiné onde dis nós que sentimos o sangue Português e já esta transmitido aos nossos filhos, no proximo mês de março vou estar pelos lados de Quebo, Mampatá, Buba, e depois Varela, um Abraço a todos amigos