terça-feira, 10 de janeiro de 2017

Guiné 61/74 - P16940: Recortes de imprensa (83): Na morte de Fidel Castro, o apoio de Cuba ao PAIGC é relembrado pro Fernando Delfim Silva e Oscar Oramas ("Nô Pin«tcha", Bissau, 1 de dezembro de 2016) - Parte I




1. Um dos nossos amigos da Guiné-Bissau chamou-nos a atenção para um artigo de homenagem à memória de Fidel Castro (1926-2016), por ocasião da sua morte, no passado 25 de novembro, publicado no jornal "Nô Pintcha", e que seria da autoria de Fernando Delfim Silva, conhecido ex-governante, professor universitário e analista político. 

Recorde-se que esta publicação (primeiro semanário e agora bissemanário)  tem hoje mais de 40 anos, tendo sido criado em 1975. Tem um sítio na Net desde 2010. É considerado um jornal oficial ou oficioso [não percebo muito bem qual é o seu estatuto editorial atual...].

Foi-nos inclusive remetido um recorte (parcial) desse artigo, digitalizado, mas com fraca resolução. O artigo foi reproduzido no portal do jornal "Nô Pintcha", de 1 de dezembro de 2016, mas sem indicação de autor. Pode ser lido aqui na íntegra: título: "Morrel El Comandante".

Com a devidas vénia, e para conhecimento de uma comunidade de leitores lusófonos mais vasta do que a dos leitores habituais do "Nô Pintcha", vamos reproduzir aqui, em duas partes, alguns excertos desse extenso artigo...

O nosso destaque vai em particular para a "ajuda internaciionalista" cubana ao PAIGC, sobre a qual temos publicado aqui vários postes nos últimos tempos.  É um tema ainda muito pouco conhecido dos antigos combatentes portugueses que estiveram no TO da Guiné. A principal fonte citada ainda é a cubana, neste caso o livro do antigo embaixador de Cuba na Guiné-Conacri,  Oscar Oramas. Pode ser que, entretanto, surjam outras fontes. De r4esto, tanto em Cuba como na Guiné-Bissau é que, só muito lenta e tardiamente, e nalguns casos muita tardiamente de mais, é que se começa a recolher, tratar e divulgar informação até há pouco classificada...

Os subtítulos e os negritos são da responsabilidade do autor [, Fernando Delfim Silva],  bem, como os parênteses curvos. Os parênteses retos da nossa responsabilidade (LG).


2. Recortes de imprensa > O apoio de Cuba à luta de guerrilha do PAIGC > Parte I


Excertos de: "Nô Pintcha", Bissau, de 1 de dezembro de 2016 >  "Morrel El Comandante". [com a devida vénia...]


[...] Fidel, Amílcar e nós

[...] Fidel “descobriu” Cabral através do Comandante Che, que em 1965 andou pela África “espalhando” generosamente a solidariedade do povo cubano para com os povos africanos, incluindo nessa onda solidária, os combatentes guineenses e cabo-verdianos unidos no PAIGC. Che encontrou-se com Cabral, e, claro, contou a Fidel. Só no ano seguinte (1966), Fidel e Cabral se vão encontrar, em Havana, na Conferência internacional -chamada “Tricontinental – de solidariedade com os povos em luta, da África, Ásia e América Latina.Da empatia, nasceu a amizade, a admiração, o respeito entre os dois homens, dois líderes.

O Comandante Che Guevara primeiro; o Comandante Fidel a seguir, ambos cristalizama mesma imagem valorativa: Amílcar Cabral era, já em 1966, o mais impressionante dos líderes africanos; alguém que transmitia confiança, um homem em quem se podia confiar: sério, inteligente, responsável, competente nas coisas que fazia, carismático. [...]

[...] Cabral e a revolução cubana

Cabral, por sua vez, não só admirava Fidel: a revolução cubana foi para ele uma das suas fontes de inspiração; ficaria definitivamente impressionado com a ética dos seus dirigentes, a começar pela do seu líder, Fidel. Na sua muito discutida tese de “suicídio da pequena burguesia”, o pano de fundo que está lá é o peso, digamos assim, do fator subjetivo, a importância da qualidade politica e moral dos dirigentes e quadros, o papel primordial do líder. Alias, Cabral, disse-o, explicitamente: tomem o exemplo de Cuba, o compromisso ético, a atitude moral da liderança cubana. O exemplo pessoal que os dirigentes devem transmitir à sociedade – de abnegação, do espirito de sacrifício, de entrega total ao bem comum -, sob pena de trair a confiança do povo, trair os objetivos progressistas da revolução, romper o contrato social [...]

Cuba > Havana > Janeiro de 1966 > Amílcar Cabral com Fidel Castro, em Cuba por ocasião da Conferência Tricontinental.

Fonte: Fundação Mário Soares > Portal Casa Comum > Arquivo Amílcar Cabral. (Com a devida vénia...)

Citação: (1966), "Amílcar Cabral com Fidel Castro", CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_43973 (2016-10-11)



[...] O fator cubano

Agora passo a palavra a Óscar Oramas, discípulo de Fidel, companheiro de Cabral, logo, um amigo do povo guineense. Faço-o à intenção da juventude guineense, que precisa de conhecer o que se fez no passado, de um passado de orgulho nacional, de um passado de dignidade que outrora se construiu com a solidariedade dos cubanos, com sangue cubano, com a valentia dos soldados de Fidel.

As palavras, como já o disse, são de Óscar Oramas; a sua seleção e arrumação bem como os subtítulos – dos excertosdo seu livro Amílcar Cabral, Para além do seu tempo– já são da minha responsabilidade.[...]


[,,,] Che e Amílcar


[,,,] Entre os compromissos estabelecidos por Che em África figura o apoio material e politico ao PAIGC. Como consequência disso, no mês de abril de 1965 parte do porto de Matanzas o barco cubano “Uvero” com um considerável carregamento de alimentos, medicamentos e utensílios médicos, uniformes, alfaias agrícolas e armas com destino a esta organização, assim como a outros movimentos revolucionários africanos. (...)


O Comandante Jorge Serguera, então Embaixador de Cuba em Argélia, cumprindo as orientações de Che, a quem havia acompanhado no périplo africano, espera o cargueiro em Conakri (aonde que chega a 11 de maio), e faz a entrega da primeira ajuda solidária cubana ao PAIGC.


Paralelamente, intensifica-se a preparação de militares cubanos (…) que, voluntariamente se oferecem para apoiar os movimentos de libertação africanos (...)


(...) Em dezembro desse mesmo ano, viaja para Havana uma delegação do PAIGC, conduzida por Amílcar Cabral e integrada (…) por Domingos Ramos, Pedro Pires, Joaquim Pedro Silva (Baró) e Vasco Cabral, para participar na I Conferência de Solidariedade com os Povos da África, Ásia e América Latina (Conferência Tricontinental) que se celebra de 3 a 9 de janeiro de 1966.


Convidado por Fidel, Amílcar Cabral percorre com ele a Sierra del Escambray, situada a sul do centro da Ilha, onde conhece “in situ” passagens importantes da guerra revolucionária cubana (…) Óscar Oramas que acompanha Fidel no percurso com Amílcar, é designado Embaixador de Cuba na República da Guiné, com o objetivo central de manter relações bilaterais com o PAIGC.


Amílcar explica a Fidel das necessidades materiais que o PAIGC enfrenta para desenvolver a gesta libertadora e o Chefe da revolução cubana promete-lhe ajuda em assessoria e equipamento militar, assim como pessoal de saúde.,


.Março de 1966 – O Comandante em Chefe informa o Presidente Sékou Touré, por intermédio do Embaixador Oramas, da decisão cubana de ajudar o PAIGC e solicita autorização para encaminhar essa ajuda através do território guineense. O Presidente aceita o pedido de Fidel Castro.


Umas semanas depois de concluída a Conferência Tricontinental, parte para Conacri uma pequena delegação militar encarregada de conhecer no terreno a situação da luta armada, para determinar o apoio militar que Cuba poderá dispensar, contribuindo para o desenvolvimento da luta.


Maio de 1966 – partem para a República da Guiné os primeiros grupos de assessores militares e médicos cubanos que colaborarão como PAIGC. Um grupo de sete companheiros fá-lo por via aérea, e outro de duas dezenas, fá-lo no navio Lídia Doce, levando, ainda, uma nova remessa de material para apoiar a guerra de libertação. (…)


Os primeiros cubanos que haviam chegado, anteriormente, para explorar as condições existentes na guerra pela independência nacional guineense e que haviam sido enviados para a região de Boé, na Guiné-Bissau, são chamados no mês de junho à República da Guiné para uma reunião com Amílcar Cabral, na Escola do PAIGC na zona de Ratoma, onde são apresentados aos dirigentes da organização que ali se encontram. O ambiente é de alegria e com o decorrer do tempo estabelece-se uma grande confiança entre uns e outros, baseado no respeito mútuo.Durante a estada dos primeiros instrutores cubanos na zona de operações de guerrilha de Boé, observam-se algumas deficiências no “modus operandii” da guerrilha (…)


Uma vez distribuídos os assessores cubanos pelas diferentes frentes de guerrilha com base nas decisões de Amílcar a vida diária vai demonstrando a impossibilidade de assessorar e corrigir a tática da luta sem a participação direta nas ações.A primeira operação de envergadura que se realiza com a participação dos assessores cubanos é a efetuada contra o quartel português de Madina de Boé, em 10 de novembro de 1966 [em que morre Domingos Ramos, LG]

[...] O Comandante Victor Dreke (, Moja, o “Moia”, para os guineenses, ) assume o comando da missão militar cubana (Fevereiro de 1967)


Amílcar Cabral decide então que um grupo de assessores militares cubanos, que se encontra no Sul, seja transferido para Frente Norte, juntamente com alguns médicos. (…) Com o objetivo de as Frentes Norte, Leste e Sul ficarem, assim, cobertas com a assessoria militar e médicos cubanos.

A experiência no Sul havia sido muito satisfatória tanto com o Chefe da Frente João Bernardo Vieira (Nino), como com Úmaro Djaló, Arafan Mané e outros chefes e combatentes. Na verdade, no Norte havia algum receio e inclusive alguns chefes militares manifestaram o seu desacordo com a presença cubana nessa região. A atitude do segundo Comandante da frente Norte, Chico Mendes, difere por completo da dos outros chefes, como Inocêncio Kani (…)

A presença miliar cubana é acompanhada de uma importante ajuda em armamentos que a União Soviética fornece ao PAIGC. Em muitos casos os soviéticos forneciam novos armamentos, que nem sequer eram do conhecimento dos assessores cubanos, e que são testados nos campos de combate na Guiné-Bissau. 
Assim, o PAIGC recebe lança-roquetes GRAD [, e não GRAP, também conhecidos como o "jato do povo", LG], canhões sem recuo de 82 mm, e roquetes portáteis Strela 2 que só tinham sido usados pelos soviéticos em manobras internas, mas cuja eficácia real em combate ainda não conheciam. Os soviéticos solicitam aos assessores cubanos informações sobre a eficiência de tais armamentos em combate real.
Não se pode negar a importante contribuição que significou a ajuda soviética, mas deve ficar claro que jamais um soviético passou para além de Boké, na República da Guiné, e que os únicos estrangeiros que participaram, diretamente, nas ações da luta de libertação, ombro a ombro com os guerrilheiros guineenses, foram os cubanos. [...]

(Continua)

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Nota do editor:

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