segunda-feira, 10 de julho de 2017

Guiné 61/74 - P17565: Inquérito 'on line' (120): Mesmo com ficha na PIDE/DGS, nunca me inibi de escrever cartas e aerogramas, sem autocensura nem receio de represálias... E foram mais de 300!... Contei, a quem gostava, tudo o que acontecia no CTIG no meu tempo (António Graça de Abreu, ex-alf mil, CAOP 1, Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar, 1972/74)



Guiné >Região de Tombali > Cufar> CAOP 1 > O António Graça de Abreu, no aeroporto de Cufar, em dezembro de 1973, posando junto a um heli, Allouette III. No mês anterior, o aquartelamento de Cufar tinha sofrido uma flagelação com foguetões 122, e um ataque com RPG [lança-granadas foguete] e armas automáticas, nas proximidades dos arame farpado... Dezete meses depois do início da comissão, o António recebia finalmente o tão desejado quanto temido baptismo de fogo. Recorde-se que o António Graça de Abreu foi Alf Mil, CAOP 1,Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar (1972/74)

Foto: © António Graça de Abreu (2008). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné


Capa do livro do António Graça de Abreu,
 "Diário da Guiné: lama, sangue água pura"
 (Lisboa,  Guerra & Paz, 2007)
1. Comentário do António Graça de Abreu ao 
poste P17558 (*):

Cada um fala do que sabe. No meu caso, CAOP 1, Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar, 1972/1974, com aviões e helis a chegar todos os dias aos nossos aquartelamentos (sei do que falo), algumas vezes com o meu major de Operações, outras vezes sozinho, habituei-me, guiando os jeeps, a ir buscar o piloto e o correio à pista.

Eu era o alferes miliciano da pequena logística do CAOP 1. O correio não falhava. Era eu quem, muitas vezes, abria os sacos com o correio e juntava uma multidão à minha volta ansiosa pelas cartas e aerogramas que eu, carteiro de circunstância, distribuía aos meus soldados.

No que me diz respeito escrevi mais de trezentos aerogramas, sem autocensura, contando, a quem gostava, tudo o que nos acontecia na Guiné. A PIDE/DGS, que havia dado por mim antes da Guiné, nos tempos de Faculdade de Letras (tenho um lindo processo que consultei e fotocopiei, no Arquivo Nacional da Torre do Tombo), desde que fui promovido a aspirante parece que me perdeu o rasto.

Tudo o que escrevi então chegou ao destinatário. Em 1972/1974 garanto que o correio, desde Lisboa, chegava a Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar, quase todo, em menos de 24 horas.

Abraço,
António Graça de Abreu
_______________

Nota do editor:

16 comentários:

Carlos Vinhal disse...

Julgava que era proibido a pessoas não credenciadas pelo SPM abrir os sacos de correio. Lembro-me de em Mansabá os sacos serem abertos numa dependência própria para o efeito, pelo Cabo Escriturário, credenciado pelo SPM, a quem incumbia em exclusividade, separar o correio oficial e distribuir a almejada correspondência pelos militares. Os sacos vinham lacrados e acompanhados de protocolo.
Ainda bem que nos locais onde o camarada Graça de Abreu esteve, o correio demorava menos de 24 horas a chegar ao destino. A Mansabá (1970/72), demorava dois a três dias, e quando a demora era demasiada, púnhamos rodas ao caminho e íamos buscá-lo a Mansoa. O camarada Graça de Abreu lembrar-se-á de quão perigoso era aquele itinerário, principalmente a partir de Cutia para norte, não sei se teve a oportunidade de alguma vez ir a Farim por estrada, uma verdadeira aventura. O único dia da semana com distribuição de correio era à quarta-feira, dia de reabastecimento de frescos por DO 27.
Carlos Vinhal

Carlos Vinhal disse...

Já agora, para efeitos estatísticos.
Da minha namorada recebi 573 cartas e aerogramas, e para ela escrevi 577. Nem eu nem ela alguma vez detectámos qualquer violação na correspondência. Numerávamos a correspondência para controlar qualquer extravio.
Recebi algumas encomendas de casa, até um fio de ouro com uma "medalha", enviados na bainha de uma camisola interior para não se perder.
Recebi muitos valores declarados porque ficava com o mínimo na Província, e o dinheiro nunca chegava ao fim do mês.
Carlos Vinhal

antonio graça de abreu disse...

O CAOP 1 era o Comando de Operações. Estávamos acima dos batalhões e companhias. E tínhamos um comandante, coronel de cavalaria,também coronel pára-quedista,um dos braços direitos do Spínola, chamado Rafael Ferreira Durão. Eu era um pequeno alferes, oficial miliciano. Ia de jeep, sobretudo em Teixeira Pinto, buscar o piloto,ou pilotos, e ocorreio, à pista,ou com o meu coronel ou com o major de Operações, major Pimentel da Fonseca. É verdade que depois eu abria os sacos de correio que eram destinados ao CAOP 1, de uma espécie de sarapilheira, meio lacrados, e logo o distribuia ao nosso pessoal do CAOP 1.

Abraço,

António Graça de Abreu

Anónimo disse...


O perigoso e agressivo patrulhamento de combate conhecido como o :Abrir dos Sacos!

Santos Silva

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Recorde-se o que aqui já foi dito sobre o SPM... Em todo o caso, convirá sempre lembrar que uma coisa são as regras e normas instituídas e outra coisa são as práticas (sociais, orgnanizacionais, porfissionais...) muitas vezes "violando" ou "contornando" as regras e normas... De facto, e em princípio, era o 1º cabo escriturário que era o nosso carteiro (no caso da CCAÇ 12, o saudoso Eduardo Veríssimo de Sousa Tavares, que vivia em Miranda do Douro, e faleceu há dois anos em 29 de agosto de 2015);


(...) "A organização geral do SPM consistia numa Chefia em Lisboa, pelo menos uma Estação Postal Principal em cada território, e dentro destes tantas Estações Postais Secundárias quantas as que se revelaram necessárias face ao respectivo movimento postal, e ao número de PMC (Postos Militares de Correio), cada um destes apoiando até 2500 homens.

"No fim da cadeia, havia em cada unidade um Encarregado da Delegação Postal da Unidade (EDPU) normalmente o(s) cabo(s) escriturário(s) da(s) unidade(s), que recebiam formação específica para essas funções."(...)


27 DE JUNHO DE 2017
Guiné 61/74 - P17518: Antologia (76): "O Correio durante a guerra colonial", por José Aparício (cor inf ref, ex-cmdt da CART 1790, Madina do Boé, 1967/69)... Homenagem ao SPM - Serviço Postal Militar, criado em 1961 e extinto em 1981.

https://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/2017/06/guine-6174-p17518-antologia-76-o.html

Anónimo disse...

Caro G.de Abreu

Quando escreves:"A PIDE/DGS...desde que fiu promovido a Aspirante parece que me perdeu o rasto"

As minhas ignoräncias "político-semänticas" seräo profundas mas...a referida perda de rasto näo estaria ligada ao facto de alguns dos grupelhos maoístas universitários serem de tal modo inofensivos (na vida real) para o poder político vigente que estes acabavam por prioritar outras gentes mais efectivas em "resultados"?

Um grande abraco do José Belo




antonio graça de abreu disse...

Meu caro Zé Belo

Eu não pertencia a nenhum grupelho maoista nos tempos de faculdade e de Guiné. A Pide andava na minha esteira desde 1968, quando na Faculdade de Letras laborava na Pró-Associação de Estudantes, depois estive na CDE, nas eleições de 1969, bem mais perto clandestino Partido Comunista.
Só em finais de1975, depois de regressar da Guiné em 20 de Abril de 1974, me aproximei do PCP (m-l)onde também não fiquei muito tempo, porque, como o mais maoista dos maoistas, o mais consequente, acabei por ir parar à China. Em Pequim, face à realidade, ao socialismo a sério, ao desabar da utopia, à mesquinhez humana, o maoismo passou-me depressa.

Abraço,

António Graça de Abreu

António J. P. Costa disse...

Kum Karakas!

Nunca tinha ouvido falar daquele partido - o PCP (éme menos um)! Parece mais uma expressão algébrica.
Aquela coisa da China era, de facto, uma chatice... e ninguém sabia.
Cá no Ocidente não se sabia de nada. Claro que havia a Revolução Cultural e os guardas vermelhos e etc., mas o Nove SetUm era o maior, mesmo quando já mijava para as botas!
Aquela da Campanha "que mil flores (muito poético!) se abram, que mil escolas rivalizem" era genial! Deve ter sido inventada quando o grande Ti-Moleiro acordou bem disposto...

Enfim, outros tempos!

Um ab.
António J. P. Costa

José Botelho Colaço disse...

Do S.P.M. pessoalmente não tive motivos de queixas e eu nunca ocultei nada à minha família e quando estava na ilha do Como recordo dizer frases como esta. Mãe se se sair daqui com vida será uma grande sorte, também quando estava em Bafatá dizia maravilhas do local com a excepção das saídas ao mato em que chegava com os pés todos feridos devido a ser o tempo das chuvas e do meu conhecimento só o rolo de fotografias do Dr. Leitão se extraviou.
Do SPM um dia no Cachil que me deixou grande surpresa a mim e aos colegas que estavam presentes eu tinha enviado o meu nome para uma revista espanhola de nome Lectures para secção de pedidos de correspondentes, não é que eu nessa semana recebo cerca de vinte a trinta cartas de espanholas a acusar a recepção ao pedido, seleccionei duas e as outras distribui por colegas que se mostraram interessados, uma delas a Paquita em 1969 ainda me encontrei com ela várias vezes na cidade de Maiz Na Alemanha.

Nota:Para esta correspondência havia um contra tinha que ser carta que chamava-mos de avião e a respectiva franquia o SPM só dava para Portugal. Um abraço.

Hélder Valério disse...

E pronto, também já votei!

Desta vez não me apercebi das habituais objecções/sugestões do nosso António José mas realmente fiquei um pouco sem saber exactamente como responder.
É que, como por aqui já foi referido, é possível ter todas as opiniões.
"Era seguro e rápido"....
Pois teria sido seguro a maior parte das vezes e para a maior parte das pessoas, nalgumas outras situações nem tanto. Quanto a rápido, pois também está visto que 'variou' embora, dadas as circunstâncias, também se possa considerar rápido.
"Era seguro mas não rápido"...
É tudo uma questão de relativização. A 'segurança' é a mesma da primeira questão, já a rapidez deve aqui entrar em linha de conta com o facto onde se estava. Em Bissau ou sede de Batalhão era seguramente mais rápido do que num Destacamento qualquer.
"Era rápido mas não seguro"....
Sobre a 'rapidez' os pontos acima mostram que o conceito depende então de onde se estava. Quanto à 'segurança' aqui podemos dividir em dois campos principais: o da violação da correspondência para verificação do conteúdo escrito, fosse lá motivado porque motivo fosse, ou para 'apropriação indevida' de qualquer conteúdo extra. Sobre isto acho que se pode considerar que, na generalidade, não houve assim tantas razões de queixa, pelo menos de extravio, embora isso não seja garantia de que a correspondência não tivesse sido lida por pessoas além do destinatário.
"Não era nem seguro nem rápido"....
Trata-se de considerar negativamente qualquer das situações e sobre isso a minha opinião é que "depende". Algumas vezes, sim, a maior parte das vezes, não.
"Não sei / já não me lembro"....
A questão mais fácil. Ao responder aqui, cumprimos o dever de participar no inquérito e descarregamos considerações.

Ora bem, a minha experiência foi de que não tive razões de queixa.
Escrevi e recebi aerogramas. Escrevi e recebi cartas. Com fotos. E chegaram todos e todas. Mais ou menos rápido, dependendo de estar em Bissau ou em Piche mas sem grandes razões de queixa.
Logo em Novembro, resolvi escrever um aerograma com uma série de observações que poderiam ser tomadas em conta como "subversão" dirigido a uma jovem "católica progressista" e chegou sem problemas.
De um modo geral também não me alongava em grandes considerandos, apenas a superficialidade das circunstâncias: calor, bom tempo, muita chuva, saúde... etc.

Já agora.... sem querer alimentar qualquer tipo de polémica ou coisa parecida, tenho a ideia que um camarada que esteve comigo no CSM em Santarém e depois teve uma 'especialidade' diferente da minha, estava colocado na Repartição de Sargentos e Praças e na véspera da minha partida para a Guiné me esclareceu (vou 'vender' pelo mesmo preço, tanto quanto me recordo) que a "prestimosa polícia política" classificava os mancebos que tinha "debaixo de olho" como "suspeitos", "activistas", "comunistas" e "anarquistas" e que tinha visto a minha ficha de mobilização e lá figurava uma determinada 'categoria'.
Nunca quis confirmar isto. Embora na altura me interrogasse pela ordem da escala de 'perigosidade'.

Hélder Sousa

José Botelho Colaço disse...

A cidade chama-se Mainz e não Maiz como por erro aparece escrito.

António J. P. Costa disse...

Olá Hélder

Neste caso tive dificuldade em apresentar argumentos. Confesso.
Estava mesmo certo de que não poderia ser constituído um dos tais inquéritos sobre este tema.
E os resultados aí estão. Mas valeu o esforço dos nossos queridos "leaders".
Segura, só conheço a Lianor do Camões e mesmo essa, sabe Deus como acabou...
Mas fez falta a opção "Não sei/Não me lembro ou ainda "Não sei", "Não tive lá".

Um Ab.
António J. P. Costa

Anónimo disse...

Caro G.de Abreu.

Grato pelos esclarecimentos factuais.

Terei também sido menos correto quando escrevi:Grupelhos maoistas universitários de tal modo inofensivos.

Inofensivos?

Como terá sido possível esquecer ter um deles procriado um Dr.Duräo Barroso?

As nossas idades...as nossas idades!

Um abraco do José Belo



alma disse...

Embora não fosse de nenhuma organização, também eu, como constatei depois do 25 de Abril. tinha ficha na PIDE.Creio , que no meu caso, tal se deveu principalmente, a ser muito amigo, do Toni, António Manuel Mascarenhas Monteiro, futuro Presidente de Cabo Verde, que no meio do curso, fugiu para a Bélgica. Quando estava na Guiné, estava já ele no PAIGC, na Guiné-Conacri. Gabarola gabei-me desta amizade, em Babandinca, bem como de ter conhecido o meu Colega Turra, Corca Só, Comandante da base de Madina, num choro na Tabanca de Mero. Tanto bastou...para espalhar a minha fama de "Amigo dos Turras" Abraço J.Cabral

alma disse...

É Bambadinca....J.Cabral

Anónimo disse...

Alô António Graça de Abreu apraz~me ouvir ou seja ler, que até para entregar o correio a Força Aérea voava.
Carlos Gaspar