sexta-feira, 2 de fevereiro de 2018

Guiné 61/74 - P18278: José Matos: O F-86F Sabre em combate no CTIG: da Op Atlas em agosto de 1961 ao seu regresso a Portugal, por pressão do "amigo americano" e sua substituição, em 1966, pelo nosso familiar Fiat G-91, cedido pelo "amigo alemão" (Artigo original publicado na prestigiada Revista Militar, nº 2584, maio de 2017)


Figura 1 – Operação Atlas >  De 8 a 15 de agosto de 1961 > A rota dos caças F-86 de Portugal para a Guiné.Ilustração – Paulo Alegria


Figura 2 – O North American F-86F 5313, um dos caças destacados na Guiné. Ilustração – Paulo Alegria




I. Mensagem do nosso amigo e grã-tabanqueiro Jose Matos com data de 21 de dezembro último:

Olá, Luís

Vinha desejar a todos os camaradas da Guiné Bom Natal e pedir-te para divulgares no blogue mais um artigo meu da Revista Militar exclusivamente sobre a Guiné. Que passem pelo site da revista para ver.

https://www.revistamilitar.pt/artigo/1244

Ab

José Matos


PS - Podes reproduzir o texto na totalidade mas mete sempre o link para a Revista Militar pois tenho interesse que as pessoas também vejam lá....


II. O F-86 SABRE EM COMBATE NA GUINÉ


por José Matos (*)


[Investigador independente em História Militar; tem feito investigação sobre as operações da Força Aérea na Guerra Colonial, principalmente na Guiné; é colaborador da Revista Mais Alto, da Força Aérea Portuguesa; tem publicado também o seu trabalho em revistas europeias de aviação militar, em França, Inglaterra e Itália; é membro da nossa Tabanca Grande desde 7 de setembro de 2015, tendo  mais de 25 referências no nosso blogue]


Revista Militar, nº 2584, maio de 2017 (com a devida vénia...)


No contexto do antigo império colonial português, os territórios da Guiné e de Cabo Verde desempenhavam um papel relevante nas rotas marítimas e aéreas de ligação à África Austral, onde Portugal tinha duas colónias importantes: Angola e Moçambique. 

disso, na ilha do Sal, em Cabo Verde, a Força Aérea tinha um aeródromo (AM1) que podia usar para missões de patrulhamento marítimo permitindo um controlo sobre o Atlântico. Desta forma, a manutenção da Guiné e de Cabo Verde sob o domínio português era essencial na estratégia global de manutenção do império colonial. 

Daí a pronta reacção do Governo de Salazar, quando, em Julho de 1961, ocorreram os primeiros ataques no norte da Guiné, protagonizados pelo Movimento de Libertação da Guiné (MLG) com sede no Senegal. Este movimento nacionalista desencadeia as primeiras acções armadas na colónia portuguesa, em meados de Julho de 1961, atacando algumas povoações no norte, junto à fronteira com o Senegal. 

Estes primeiros ataques levam o Governo em Bissau a destacar efectivos militares para as zonas atingidas, o que parece ter dissuadido novos ataques por parte do MLG (1). Contudo, estes primeiros ataques são um sinal de que a guerra de guerrilha está prestes a começar na Guiné, o que leva a Força Aérea Portuguesa (FAP) a destacar da base de Monte Real, oito caças North American F-86F Sabre para aquele território ultramarino. Durante os anos de permanência na Guiné, os F-86 vão ser o principal avião de combate da FAP, desempenhando vários tipos de missões por todo o território.

Antes dos ataques do MLG, a Força Aérea não tinha ainda meios aéreos na Guiné, nem qualquer tipo de estrutura de apoio no aeródromo de Bissalanca (AB2), situado a uma dezena de quilómetros a noroeste de Bissau. Em 1961, esta pequena infraestrutura aeronáutica tinha, além da aerogare civil, um hangar em acabamento, não tendo meios aéreos próprios atribuídos. O único avião militar que passava, uma vez por semana, pela capital guineense, era um P2V-5 Neptune de patrulha marítima, habitualmente estacionado a mais de 500 milhas de distância, na ilha do Sal, em Cabo Verde. Porém, as acções do MLG no norte da colónia levam a FAP a tomar medidas e a reforçar o dispositivo aéreo na Guiné, sendo o destacamento dos F-86 a medida mais significativa.

Já no princípio de 1961, se falava com insistência, em Monte Real, na possibilidade de caças F-86 fazerem uma deslocação às ilhas de Cabo Verde (2) Perante o agravamento da situação, é então decidido enviar os caças para Bissau. Foram escolhidos os aviões da linha da frente que apresentavam menor probabilidade de avarias graves e também os que tinham maior potencial de horas de voo antes da próxima grande inspecção, para que se mantivesse a sua operacionalidade pelo máximo período de tempo (3).

Os F-86 não tinham sido a primeira escolha do comando da 1ª Região Aérea (1ª RA), que englobava a Guiné. O comandante da 1ª RA, General Machado de Barros, tinha inicialmente escolhido o F-84G para ser enviado para o AB2. Os aviões estavam sedeados na base aérea da Ota e a intenção das chefias da 1ª RA era enviar oito caças para Bissalanca. A ordem é recebida na Ota pelo Capitão Gomes do Amaral, que começa a preparar os aviões para um voo directo entre Portugal continental e a Guiné (4) . Porém, com o início da guerra em Angola, os F-84 são enviados para Luanda, sendo então decidido pelas chefias da 1ª RA o envio de um destacamento de F-86F para a Guiné.


Operação Atlas

Em Monte Real começam então os preparativos para uma longa viagem de duas mil milhas náuticas, sob o nome de código “Operação Atlas”. Por ordem do Estado-Maior da Força Aérea (EMFA), é decidido que os caças devem partir da base aérea do Montijo, fazendo depois escala na base de Gando, nas Canárias, e na ilha do Sal, em Cabo Verde (Figura 1). Na linha da frente, em Monte Real, são então preparados dez caças (oito, mais dois de reserva) para a primeira parte da viagem entre Monte Real e o Montijo.

Os dez caças descolam de Monte Real, na manhã de 8 de Agosto, transportando sob as asas, nos suportes externos, dois depósitos de 200 galões e, nos suportes internos, dois outros de 120 galões, o que confere ao avião a máxima capacidade de transporte de combustível. 

Os F-86 passam um dia no Montijo, sendo visitados, na manhã de 9 de Agosto, pelo Secretário de Estado da Aeronáutica, Coronel Kaúlza de Arriaga, acompanhado pelo comandante da base, Coronel Rodrigues Frutuoso. Nessa mesma manhã, os oitos caças destacados para a missão na Guiné descolam do Montijo para uma viagem de 722 milhas náuticas até às Canárias, chegando nesse mesmo dia a Gando. 

Os pilotos passam a noite na base espanhola, partindo no dia seguinte, para a segunda etapa da viagem até à ilha do Sal, o que representa mais 800 milhas náuticas de voo sobre o oceano. Mantendo o mesmo regime de velocidade e de altitude usado na viagem para Gando, os caças atingem a pista do Sal ao fim de 2h27min de voo. Os F-86 chegam sem problemas aquele aeródromo, sendo então preparados para a última etapa da viagem até Bissau, num trajeto de 526 milhas náuticas. 

No entanto, a saída para Bissau é condicionada por um súbito mau tempo em Cabo Verde (já não chovia há sete anos), o que impede a partida dos caças e da equipa de apoio aos aviões. Finalmente, as condições meteorológicas melhoram no dia 15 de Agosto e os caças iniciam a última parte da viagem chegando à Guiné ao fim de 1h17min de voo. 

Toda a viagem, desde Portugal, decorre sem incidentes, sendo à época, uma deslocação digna de registo, devido à distância percorrida (5). Para este primeiro destacamento são escolhidos oito pilotos: quatro oficiais e quatro sargentos, sob o comando do Capitão Ramiro de Almeida Santos. Além deste oficial, estão neste destacamento o Capitão José Almeida Brito, os Tenentes Aníbal Pinho Freire e Alcides Teixeira Lopo e os Sargentos José Pombo Rodrigues [, mais tarde, conhecido no TO da Guiné como comandante Pombo],  Rui Salvado da Cunha, António Rodrigues Pereira e Humberto Cartaxo da Silva (6). 

Os pilotos de F-86 fazem destacamentos de três meses na Guiné, sendo substituídos no final desse tempo. Esta rotação de pessoal vai proporcionar aos pilotos de Monte Real uma experiência importante num teatro de operações africano até então desconhecido para os pilotos portugueses. Em termos operacionais, os caças portugueses podiam desempenhar vários tipos de missões, que passavam pela defesa área do território, apoio aéreo às forças de superfície e missões de reconhecimento visual, além da presença dissuasora que exerciam em função do poder do fogo disponível e da rapidez com que podiam chegar a qualquer ponto do território (Figura 2).


Os primeiros tempos na Guiné

Os primeiros tempos do F-86 na Guiné são relativamente pacíficos com os aviões a desempenharem missões de reconhecimento visual (RVIS) e armado (RECA) sobre a colónia. Os grandes problemas que os caças portugueses enfrentam são, na verdade, a falta de condições do AB2, ainda em fase de consolidação para receber os novos meios aéreos. 

Bissalanca apresentava, nessa altura, grandes carências, como infra-estruturas militares. Podemos ver isso nos primeiros relatórios que o comandante do destacamento envia para Lisboa. Ramiro Santos refere que a pista de rodagem se encontrava muito suja e com muitas pedras, não sendo fácil limpá-la devido à ausência de uma vassoura mecânica. A placa de estacionamento não suportava a acção corrosiva do JP-4 usado pelos F-86 e o abastecimento dos aviões era feito por bidons, o que tornava a operação muito demorada (7). Os equipamentos UHF de comunicações, que existiam na torre de controlo, não satisfaziam as necessidades e a gestão do tráfego aéreo era muito incipiente, não existia serviço meteorológico e a pista apresentava vários problemas de segurança com pessoas e animais a atravessarem a zona de rodagem (8).

Os primeiros voos de F-86 na Guiné ocorrem no dia 19 de Agosto e, logo numa das primeiras saídas, a cargo do Tenente Teixeira Lopo e do Sargento-ajudante Cartaxo da Silva, o F-86 “5361” do primeiro sofre um “birdstrike” com um jagali, ficando o “cannopy” manchado de sangue e sofrendo também danos no estabilizador do leme de profundidade do caça. 

Este primeiro acidente deixaria o “5361” fora de serviço por várias semanas, até à chegada ao AB2 de uma cauda nova pedida a Monte Real (9).  No dia seguinte, dois F-86 pilotados pelo Capitão Almeida Brito e pelo Sargento-ajudante Rodrigues Pereira sobrevoam a cidade de Bolama, a baixa altitude, durante uma visita do Governador e Comandante-Chefe da Guiné, Comandante Peixoto Correia, isto depois do avião do Capitão Brito ter falhado três tentativas de arranque (10). 

Durante os meses seguintes, os caças portugueses vão fazendo vários voos de reconhecimento, principalmente na região norte da Guiné, embora com o recurso a um mapa de estradas deficiente, o que dificultava os voos na zona de fronteira, devido ao risco de violação do espaço aéreo do Senegal.

Em Outubro de 1961, dois F-86 fazem uma deslocação à ilha do Sal, de grande importância estratégica para a Força Aérea. Como sublinhava Ramiro Santos, no seu primeiro relatório sobre a viagem dos F-86 para Bissau, Cabo Verde tinha uma importância estratégica extraordinária no controle do Atlântico (11). No entanto, a deslocação ao Sal visava, sobretudo, resolver um problema administrativo que era a renovação da diligência dos pilotos no AB2. Como estavam em serviço fora da sua base de origem, que era Monte Real, os pilotos deslocados tinham direito a ajudas de custo, que podiam ser canceladas caso os pilotos estivessem mais de um mês no AB2. Para contornar este problema, os pilotos faziam um voo à ilha do Sal, o que lhes permitia renovar a diligência.

Ainda em Outubro[de 1961], os pilotos do primeiro turno do Destacamento 52 fazem a sua despedida sobre Bissau com uma exibição acrobática em formação de seis caças, tendo o F-86 “5322” pilotado pelo Tenente Lopo ultrapassado a barreira do som sobre a cidade (12). Em finais desse mês, chegavam a Bissalanca os pilotos do segundo turno, prosseguindo assim a missão dos F-86 num território onde a guerra ainda não tinha chegado.

Durante o ano seguinte [1962], os chamados voos de soberania ocuparão a maior parte das missões dos F-86, ao mesmo tempo que se sucedem as rotações de pilotos vindos de Monte Real. No entanto, a 17 de Agosto de 1962, um acidente envolvendo um F-86 provoca a perda total do avião. O acidente acontece no regresso a Bissalanca, quando o Capitão Gomes do Amaral e o Tenente Amílcar Barbosa são surpreendidos por um forte aguaceiro sobre o AB2. Devido à fraca visibilidade, o Tenente Barbosa efectua várias aproximações à pista e acaba por aterrar no terço final da faixa de aterragem. O piloto acaba por sair fora da pista, embatendo nuns montes de terra enlameados ficando o F-86 voltado de lado. Quando chegam os primeiros socorros encontram o avião sem o piloto, que já tinha abandonado o F-86 apenas com ligeiras escoriações (13).

Entretanto, na Guiné-Conakry, o PAIGC (Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde), liderado por Amílcar Cabral, vai-se preparando para a luta armada, que terá início a 23 de Janeiro de 1963, com um ataque ao aquartelamento de Tite, muito perto de Bissau.


O começo da guerra

A partir de Janeiro de 1963, a guerra na Guiné é protagonizada pelo partido nacionalista de Amílcar Cabral, o PAIGC, que faz o seu primeiro ataque contra o quartel de Tite. Este ataque é protagonizado por 15 a 20 elementos do PAIGC que atacam o quartel de madrugada, provocando um morto e dois feridos entre as tropas portuguesas. Os guerrilheiros mantêm o quartel sob fogo intenso durante meia hora e, na escaramuça, sofrem três baixas (14).

O ataque, no entanto, assinala simbolicamente o início da guerra na Guiné, embora a actividade subversiva do PAIGC fosse já anterior a esta data. Nessa mesma noite, as forças portuguesas sofrem uma emboscada na região de Fulacunda (área de Buba) perdendo dois soldados (15). Quatro dias depois, um novo ataque da guerrilha na mesma região provoca mais duas baixas e quatro feridos nas tropas portuguesas (16).

Ainda no mês de Janeiro[de 1963], as forças portuguesas registaram as primeiras emboscadas na região de Bedanda, no sul da Guiné, e as acções da guerrilha continuam nos meses seguintes aumentando de intensidade (17) Enquanto o PAIGC ataca no sul da província, o MLG ataca a norte efectuando várias acções contra povoações e emboscadas a viaturas militares (18).

Quanto à Força Aérea, não sabemos exactamente quando terá sido efectuada a primeira acção ofensiva, mas, a 4 de Abril de 1963, um avião de observação Auster é alvejado com armas ligeiras a partir da tabanca de Darsalame, o que leva a FAP, no dia seguinte, a desencadear uma acção de demonstração de força sobre a povoação em questão, usando para o efeito oito caças F-86F, que bombardeiam as imediações da aldeia (19).

Os caças portugueses estavam equipados com seis metralhadoras Browning Colt TM3, calibre 12,7 mm, e podiam transportar vários tipos de armamento, como os foguetes de 2,75”, bombas GP de 50 e 250 kg e tanques de napalm de 350 l. Em Portugal, usavam também os mísseis ar-ar Sidewinder AIM-9B, em missões de defesa aérea, mas que nunca foram usados na Guiné.



Figura 3 – Armamento do F-86F da Força Aérea Portuguesa. lustração Paulo Alegria


O pretenso bombardeamento do Senegal

A 9 de Abril, o Governador da Guiné, Vasco Rodrigues, recebe uma informação do cônsul do Senegal em Bissau, segundo a qual a emissora de Dakar noticiara que quatro aviões da Força Aérea teriam bombardeado, na manhã desse dia, uma aldeia senegalesa perto da fronteira com a Guiné.

 No seguimento da notícia, o comandante da Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné (ZACVG), Tenente-coronel Durval Serrano de Almeida, informa o comandante militar da Guiné, Brigadeiro Louro de Sousa, que, no dia 9, não descolara qualquer avião da FAP para missões de fogo. Porém, no dia anterior, quatro aviões, sendo dois F-86F e dois T-6, tinham bombardeado as tabancas Bunhaque, muito perto da fronteira com o Senegal.

 Para apurar o que se passou, o comando da ZACVG envia um oficial ao local, juntamente com os oficiais envolvidos no ataque, chegando à conclusão que o ataque dos aviões portugueses tinha ocorrido de facto do lado português e não do lado senegalês (20).  No entanto, o Governo de Dakar solicita uma reunião urgente do Conselho de Segurança (CS) da ONU, onde apresenta queixa contra Portugal, o que dará a origem a uma moção no CS de condenação de qualquer incursão de forças militares portuguesas em território senegalês.


Mais uma perda

No mês seguinte, a 31 de Maio, a FAP perde outro F-86, quando o avião “5322”, pilotado pelo Capitão Fausto Valla, é atingido por estilhaços de uma bomba de 250 kg, que acabava de largar, na zona de Bedanda, no sul da Guiné, perto do rio Cumbijã. Este piloto efectuava, juntamente com outro F-86 “5356”, pilotado pelo 2.º Sargento Manuel Pereira Clemente, um bombardeamento rasante (BOR), quando ambos os aviões são atingidos pelos estilhaços das próprias bombas.

 Com vários furos na fuselagem, os pilotos tentam regressar ao AB2, transportando ainda cada avião uma bomba na asa. Ao cruzar o rio Geba, o F-86 de Fausto Valla sofre um flame-out no motor e o piloto é obrigado a ejectar-se sob o olhar atento de Pereira Clemente. O avião explode no solo, embora a bomba que trazia permaneça intacta, tendo sido desarmada mais tarde. Quanto a Pereira Clemente consegue aterrar em Bissalanca depois de largar a bomba que transportava, no rio Geba (21).


O relatório Deslandes

Em meados de Maio de 1963, uma missão de avaliação, liderada pelo Secretário-Geral da Defesa Nacional, General Venâncio Deslandes, visita a Guiné durante uma semana e analisa a situação militar no terreno, produzindo um relatório para o ministro da tutela. Juntamente com o relatório principal há também um relatório do Tenente-coronel Augusto Brito e Melo, que identifica os principais problemas que as forças portuguesas enfrentam na Guiné e que nos ajuda a compreender a situação dos F-86 em Bissalanca. Por este relatório anexo podemos ver que a Força Aérea tinha no AB2, em Maio de 1963, os seguintes meios: sete F-86F, oito T-6, oito Auster, três DC-3, um Broussard e um P2-V5 em diligência.

Quanto aos F-86, a operação dos Sabre é a que apresentava mais problemas. Os aviões voavam muito pouco, com 8 a 23 saídas operacionais por mês, carecendo todos de urgente substituição devido a terem ultrapassado o período de Inspect and Repair as Necessary (IRAN), em mais de um ano. Tinham também problemas de comunicação rádio com as forças terrestres, pois só podiam comunicar em UHF, o que tornava inviável a comunicação com as tropas no solo equipadas com rádios PRC-10. Desta forma, os F-86 só podiam efectuar missões pré-planeadas, ficando o apoio próximo a cargo dos T-6 com fraco poder de fogo e muito vulneráveis a fogo antiaéreo (22).

 As células dos aviões encontravam-se muito mal tratadas, em virtude das irregularidades na pista e no estacionamento. A pista estava a ser reparada, mas o estacionamento, em virtude de ser de alcatrão, quando devia ser de cimento, não tinha solução, pois seria sempre corroído pelo combustível dos aviões (JP-4). 

Brito e Melo salientava ainda que os pilotos de F-86 eram bem preparados, mas não tinha dúvidas que, se o ritmo de voos aumentasse, provocaria, provavelmente, a ruptura do sistema de manutenção do AB2 (23).  Convém referir que, nesta altura, os F-86 que estavam na Guiné ainda não tinham sido substituídos por novos aviões, mas, finalmente, em Julho de 1963, chegam a Bissalanca, por via marítima, oito caças novos (24).


A visita de Krus Abecasis


Três meses depois da visita de Deslandes, o Chefe do Estado-Maior da 1ª Região Aérea, Coronel Krus Abecasis, decide também visitar a Guiné, em particular a Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné (ZACVG), produzindo depois um relatório para o Estado-Maior sobre a situação dos meios aéreos do AB2 e a sua actividade operacional, no mês de Julho.

 Este relatório é entregue, a 14 de Setembro de 1963, e dá-nos uma boa perspectiva sobre o estado de prontidão dos F-86 (25). Os oito caças destacados em Bissalanca estavam na generalidade prontos, embora um estivesse prestes a atingir o prazo do IRAN e apenas quatro estivessem equipados com rádio VHF, o que limitava a capacidade de contactar as tropas no terreno apenas a metade das unidades disponíveis.

 Apesar de as condições serem boas, na generalidade, já se começavam a detectar problemas relacionadas com o armamento interno dos aviões, que se encontrava “em situação precária falta de diversas origens, desde utilização imprópria por parte de alguns pilotos até menos cuidada manutenção” (26). As inspecções das 25, 50 e 100 horas eram realizadas localmente e a manutenção era de bom nível. Tinham sido voadas 51,4 horas/avião pronto, em Julho, e o destacamento contava com catorze pilotos aptos a voar o F-86.


As pressões norte-americanas

Por essa altura, a presença dos F-86 na Guiné já suscitava preocupações no Departamento de Estado norte-americano, que não queria ver equipamento militar cedido no âmbito do Military Assistance Program (MAP) desviado para África.

 A questão dos F-86 era das mais relevantes neste domínio e começam a surgir pressões para que os aviões regressem a Portugal. O assunto vai-se arrastando ao longo de 1963, sem que o Governo Português acate as exigências norte-americanas. O próprio Ministro dos Negócios Estrangeiros português, Franco Nogueira, tem uma longa conversa, em Junho de 1964, com o embaixador americano em Lisboa, George Anderson, em que o problema é novamente abordado. Nogueira argumenta que os F-86 não estavam na Guiné em operações, mas que serviam apenas como factor dissuasor contra possíveis ataques aéreos vindos dos países vizinhos. Anderson concorda com o argumento, mas considera que não era de prever qualquer ataque aéreo estrangeiro e que, “no caso de tal ataque, criar-se-ia uma situação política nova que alterava os dados do problema, mesmo para os Estados Unidos”.

 Nogueira pergunta então se “Washington tomaria uma posição de activa reacção contra uma agressão aérea provinda de fora”, ao que o embaixador americano responde que “não podia prever como reagiria o seu Governo, e muito menos assumir compromissos”. Anderson insistiu que o problema dos F-86 na Guiné “se tratava de uma questão de princípio” e que era um tema muito explorado pelos inimigos de Portugal, ao que Nogueira comentou que deviam de existir muitos no Departamento de Estado, “porque todos pareciam aferir a política dos Estados Unidos para com Portugal pelo que sucedesse aos F-86” (27).

Pouco tempo depois deste encontro, a pressão americana aumenta de tal forma, ao ponto de Washington se recusar a fornecer sobresselentes para a Força Aérea, caso os portugueses não retirassem os caças da Guiné (28).  Lisboa acaba por ceder, o que provoca grande preocupação no novo Comandante-Chefe da Guiné, Brigadeiro Arnaldo Schulz (29).

 Em carta ao Ministro da Defesa, General Gomes de Araújo, Schulz salienta a importância deste meio aéreo na guerra da Guiné e a falta que ia fazer no apoio às tropas terrestres, que ficariam assim completamente dependentes dos T-6, “que se manifestam cada vez mais vulneráveis em face da melhoria constante dos meios antiaéreos do inimigo e mesmo assim em número insuficiente” (cinco aparelhos operacionais).

 Constrangido, Gomes de Araújo, explica a Schulz (30) a verdadeira razão da retirada ao dizer que “os americanos recusam-se agora a venderem-nos as peças sobressalentes para estes aviões (F-84 e PV2) e ainda todo e qualquer outro material. Recusam mesmo qualquer espécie de negociações enquanto nós mantivermos os F-86 na Guiné”. Face a isto, o ministro só via duas soluções: “a primeira consistiria em mantermos aí os F-86, pois certamente eles não iriam aí buscá-los; mas esta situação elimina qualquer espécie de entendimento em relação a todos os outros materiais, em especial quanto ao F-84, PV2 e DC-6, que em breve estariam imobilizados; a segunda consiste na retirada dos F-86 da Guiné, atitude que abre portas a negociações (…)”.


Em busca de uma alternativa

Para compensar a falta dos Sabre, o ministro propunha várias medidas alternativas. Uma delas era reforçar o dispositivo na Guiné com aviões T-6 e alguns PV2 provenientes de Angola, a outra, era procurar rapidamente no mercado mais aviões F-86 e, caso isso não fosse possível, transferir alguns F-84 de Angola para a Guiné. 

Neste sentido, escreve ao Comandante-Chefe de Angola, dando conta da decisão do ministério de transferir para a Guiné os aviões F-84 de reforço em Angola. A decisão do ministro é analisada no comando da 2ª Região Aérea em Luanda, que emite um parecer desfavorável quanto a um possível envio de caças F-84 para a Guiné (31).

 Em alternativa, o Governo Português tenta comprar um lote de caças canadianos F-86 Sabre 6 ao serviço da Luftwaffe, mas o negócio é vetado pelo Canadá por influência dos EUA (32).  Perante a recusa canadiana, a Alemanha Ocidental oferece então um lote de caças Fiat G.91 R/4, que se revelaram mais adequados ao tipo de guerra subversiva que se desenrolava em África (33).

 Contudo, a retirada dos F-86 reflectiu-se no rendimento dos meios aéreos em Bissalanca. Enquanto, em 1964, se registaram 13 820 horas de voo no AB2, esse número decresceu para 13 417 horas, em 1965 (34).  A falta só seria compensada em 1966, com a chegada dos primeiros Fiat G.91 à Guiné.


Comentário final


Num balanço final, podemos dizer que o destacamento dos F-86F, de Monte Real para a Guiné, foi uma operação bem-sucedida, apesar das dificuldades iniciais de operação num aeródromo ainda em fase de consolidação. O objectivo inicial caracterizava-se por uma acção dissuasora sobre os movimentos insurgentes que os F-86 exerceram por toda a colónia, passando depois a desempenhar missões de combate com o início da guerra.

 Ao longo dos três anos de permanência destes caças na Guiné, os pilotos e mecânicos dos diversos destacamentos ganharam experiência num ambiente de guerra africano, que foi útil para a operação de outros meios de combate nos teatros de guerra das antigas províncias ultramarinas. Muitos destes pilotos e técnicos seriam depois mobilizados para outros cenários de guerra, onde aplicariam os conhecimentos obtidos na Guiné.

Em termos operacionais, os aviões realizaram inúmeras missões de combate em apoio às forças terrestres, usando vários tipos de armamento à disposição do caça da North American. Embora fosse um avião concebido para missões de defesa e combate aéreo, o F-86 tinha alguma capacidade de ataque ao solo, que foi usada intensamente na Guiné.

 Durante a atividade operacional perderam-se apenas dois aviões: um, devido a um acidente durante uma aterragem em condições meteorológicas adversas, mas em que o piloto escapou apenas com pequenas escoriações, e outro, devido a um bombardeamento mal calculado, em 1963, que levou à ejecção do piloto e consequente perda da aeronave.

 No entanto, a utilização de meios OTAN fora dos limites geográficos da Aliança Atlântica continha elevados riscos políticos, que acabaram por se manifestar na intransigência norte-americana dos caças regressarem à metrópole, o que levou Portugal a procurar outras alternativas porventura mais adequadas à guerra subversiva que se desenrolava em África.


Arquivos consultados

1 – Arquivo da Defesa Nacional (ADN)

2 – Arquivo Histórico da Força Aérea (AHFA).

[Revisão / adaptação e fixação de texto / edição para o blogue: LG] (**)
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Notas do autor:

(1) FELGAS, Hélio, Guerra na Guiné, 1ª Edição, Serviço de Publicações do Estado-Maior do Exército, SPEME, Lisboa, 1967, p. 61.

(2) LOPO, Alcides Teixeira, Viagem dos Falcões, Kiak-Revista dos Pilotos de Caça da Esquadra 51, Base Aérea nº 5, Junho de 1968, p. 13.

(3) LOPO, op. cit., p. 15

(4) Informação prestada ao autor pelo Coronel Gomes do Amaral, em 2 de Julho de 2013.
(5) Missão Atlas, Relatório sobre a viagem dos F-86F para Bissau, 17 de Agosto de 1961, Arquivo Histórico da Força Aérea (AHFA) ZACVG Cx. 91.

(6)  LOPO, op. cit., p. 16.

(7) Missão Atlas, Relatório sobre a viagem dos F-86F para Bissau, 17 de Agosto de 1961, AHFA, ZACVG Cx. 91.

(8) Relatório mensal do Destacamento de F-86, Bissau, 1 de Setembro de 1961, AHFA, ZACVG Cx.91.

(9) Ibidem.

(10) Ibidem

(11) Missão Atlas, Relatório sobre a viagem dos F-86F para Bissau, 17 de Agosto de 1961, AHFA, ZACVG Cx. 91.

(12) Informação prestada ao autor pelo Dr. Alcides Lopo, em 19 de Agosto de 2014.

(13) Informação prestada ao autor pelo Coronel Gomes do Amaral, em 22 de Setembro de 2014.

(14) Telegrama do Governador da Guiné para o Ministério do Ultramar, Bissau, 23 de Janeiro de 1963, ADN F2/102/324/4.
(15) Comunicado do Secretariado-Geral da Defesa Nacional, Serviço de Informação Pública das Forças Armadas, Lisboa, 24 de Janeiro de 1964, ADN F2/102/324/4.

(16) Telegrama do Governador da Guiné para o Ministério do Ultramar, Bissau, 27 de Janeiro de 1963, ADN F2/102/324/4.

(17) FELGAS, op. cit., pp. 66-68.

(18) FELGAS, op. cit., pp. 61-64.

(19) BISPO, António de Jesus, Guiné, algumas notas sobre o teatro de operações, Revista Mais Alto n.º 406, Nov/Dez 2013, p. 22.

(20) Comando-Chefe das Forças Armadas da Guiné, Relatório respeitante a uma pretensa violação do espaço aéreo e ataque ao solo da República do Senegal, Bissau, 4 de Abril de 1963, ADN F2/105/345/1.

(21) Informação prestada pelo Comandante Manuel Pereira Clemente, em 19 de Agosto de 2014.

(22) Ibidem.

(23) Ibidem.

(24) CORREIA, José Manuel, Rotina de Guerra – Os F-86F Sabre na Guiné, Revista Mais Alto n.º 358, Nov/Dez 2005, p. 37.

(25) Relatório da missão do CEM do Comando da 1ªRA à Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné, 3 a 23 Agosto 1963. ADN/FG/SGDN Cx. 6093.2.

(26) Ibidem.

(27) NOGUEIRA, Franco, Diálogos Interditos, Volume II, 1ª Edição, Editorial Intervenção, Braga, 1979, pp. 58-60.

(28) MATOS, José, A saga do Sabre Mk.6, 1ª parte, Revista Mais Alto nº 394, Novembro/Dezembro de 2011, pp. 37-38.

(29) Carta do Comando-Chefe da Guiné para o Secretariado Geral da Defesa Nacional, 4 de Julho de 1964, ADN F1/07/31/21.

(30) Carta do Ministro da Defesa Nacional para o Comando-Chefe da Guiné, 10 de Julho de 1964, ADN F1/07/31/21.

(31) Carta do Comando-Chefe das Forças Armadas de Angola para o Chefe do Estado Maior General das Forças Armadas, Assunto: Transferência de aviões F-84 para a Guiné, Luanda, 1 de Agosto de 1964, ADN/FG/Cx. 6093.2.

(32) MATOS, José, A Saga do Sabre 6, Revista Mais Alto nº 394 e 395, Nov/Dez 2011 e Jan/Fev 2012.

(33) MATOS, José, Projecto Feierabend, Revista Mais Alto nº 396 e 397, Mar/Abri e Mai/Jun 2012.

(34) ABECASSIS, Krus José, Bordo de Ataque. Memórias de uma caderneta de voo e um contributo para a História, 2º volume., 1ª Edição, Coimbra Editora, 1985, p. 514.

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Notas do editor:

15 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

José Matos: Aqui tens com um título mais "atrativo" no nosso blogue, e ainda no Facebook da Tabanca Grande e no G+

Continuas a ter o link para a Revista Militar. O texto foi adaptado para uma leitura (mais "amigável") no blogue...

Dou-te os parabéns por mais este artigo... Só conhecia a Op Atlas, não a atividade operacional dos F-86F...

O Comandante Pombo (1934-2017) foi um dos bravos desta aventura da nossa Força Aérea... É nosso grã-tabanqueiro, a título póstumo. Teve uma vida atribulada, o último sítio onde viveu foi o Brasil e depois Portugal (aonde veio para morrer).. Teve um fim triste, segundo me contou um camarada e seu amigo no último convívio da Tabanca da LInha... Terá morrido de cancro e de abandono...

Um bom ano para ti. Luis

PS - O meu/nosso obrigado, a ti e à Revista Militar

Jose Matos disse...

Obrigado Luís....

Já agora se alguém tiver fotos da época em Bissalanca faça favor de mandar..

Ab

José Matos

Tabanca Grande Luís Graça disse...

José Matos:

Seria de facto interessante encontrar fotos dessa época que pudessem documentar o que tu escreves sobre o AB2:

(...) Bissalanca apresentava, nessa altura, grandes carências, como infra-estruturas militares. Podemos ver isso nos primeiros relatórios que o comandante do destacamento envia para Lisboa. Ramiro Santos refere que a pista de rodagem se encontrava muito suja e com muitas pedras, não sendo fácil limpá-la devido à ausência de uma vassoura mecânica. A placa de estacionamento não suportava a acção corrosiva do JP-4 usado pelos F-86 e o abastecimento dos aviões era feito por bidons, o que tornava a operação muito demorada (...). Os equipamentos UHF de comunicações, que existiam na torre de controlo, não satisfaziam as necessidades e a gestão do tráfego aéreo era muito incipiente, não existia serviço meteorológico e a pista apresentava vários problemas de segurança com pessoas e animais a atravessarem a zona de rodagem (...)

Vou fazer um apelo, mas procura também no blogue dos Especialistas da BA 12 Guiné 65/74, fundado pelo nosso camarada Victor Barata:

http://especialistasdaba12.blogspot.pt/

José Marcelino Martins disse...

Li a aventura da colocação dos F84 no "chão da Guiné", através do escrito do CAP TMMA - José Cabeleira.
Para ler, colocar num motor de busca «Trajecto de uma vida entre o mar e o ar – Memórias»

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Li na Wikepedia, em inglês, sobre o "North American F-86 Sabre" o seguinte (que carece de fonte bibliográfica ou documental credível):


https://en.wikipedia.org/wiki/North_American_F-86_Sabre#Guinea-Bissau_War_of_Independence


Guinea-Bissau War of Independence

In 1958, the Forca Aerea Portuguesa (FAP) received 50 F-86Fs from ex-USAF stocks. A small number of former Norwegian Air Force F-86Fs were also purchased as spares in 1968–69.
The Portuguese Air Force (FAP) deployed some of its F-86F Sabres to Portuguese Guinea in 1961, being based at AB2 – Bissalanca Air Base, Bissau. These aircraft formed "Detachment 52", initially equipped with eight F-86Fs (serials: 5307, 5314, 5322, 5326, 5354, 5356, 5361 and 5362) from the Esquadra 51, based at the BA5 – Monte Real Air Base. These aircraft were used in the Guinea-Bissau War of Independence, in ground attack and close support operations against the insurgent forces.

In August 1962, 5314 overshot the runway during emergency landing with bombs still attached on underwing hardpoints and burned out. F-86F 5322 was shot down by enemy ground fire on 31 May 1963; the pilot ejected safely and was recovered. Several other aircraft suffered combat damage, but were repaired.

In 1964, 16 F-86Fs based at Bissalanca returned to mainland Portugal due to U.S. pressure. They had flown 577 combat sorties, of which 430 were ground attack and close air support missions. (...)


Aqui se diz que o F.886 F 5322 foi abatido por fogo inimio em 31 de maio de 1963, tendo-se ejectado o piloto em seguramça... Outros F-86F teriam sido também atingidos, mas sem gravidade de maior...

Isto parece contradizer as fontes usadas pelo José Matos... Releia-se aqui a sua versão (que deve ser a versão "oficiosa" da FAP):


(...) No mês seguinte, a 31 de Maio, a FAP perde outro F-86, quando o avião “5322”, pilotado pelo Capitão Fausto Valla, é atingido por estilhaços de uma bomba de 250 kg, que acabava de largar, na zona de Bedanda, no sul da Guiné, perto do rio Cumbijã. Este piloto efectuava, juntamente com outro F-86 “5356”, pilotado pelo 2.º Sargento Manuel Pereira Clemente, um bombardeamento rasante (BOR), quando ambos os aviões são atingidos pelos estilhaços das próprias bombas.

Com vários furos na fuselagem, os pilotos tentam regressar ao AB2, transportando ainda cada avião uma bomba na asa. Ao cruzar o rio Geba, o F-86 de Fausto Valla sofre um flame-out no motor e o piloto é obrigado a ejectar-se sob o olhar atento de Pereira Clemente. O avião explode no solo, embora a bomba que trazia permaneça intacta, tendo sido desarmada mais tarde. Quanto a Pereira Clemente consegue aterrar em Bissalanca depois de largar a bomba que transportava, no rio Geba (...)

Estes aviões eram supersónicos, o que era uma vantagem e uma desvantagem ao mesmo tempo num pequeno território como o da Guiné... Como é que um avião destes é "atingido pelos estilhaços" da bomba (de 250 kg.) que acaba de largar ?...

O José Matos deve ter mais detalhes sobre este "acidente"...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

José Matos:

Queres comentar esta versão da Wikipedia sobre o F_86F Sabre "5322"... "abatido por fogo IN" em 31 de maio de 1963 ?

A tua versão é da FAP: o avião é atingido por estilhaços da bomba que acabara de lançar... É tecnicamente possível ? A versão da Wikipedia baseia-se na propaganda do PAIGC, muito provavelmente.. Ou qual será a fonte ? Não encontrei nada, aparentemente, sobre esta história, no Arquivo Amílcar Cabral... Abater um avião da NATO, logo no início da guerra, era um "grande ronco"...

Deves ter mais detalhes sobre este "acidente"... Um abraço, Luis

Tabanca Grande Luís Graça disse...

José: já encontrei a fonte: Aviation Safety Network:

http://aviation-safety.net/wikibase/wiki.php?id=63225

Diz o seguinte sobre o F-86F Sabre "5322":

(...) "Shot down by anti aircraft fire. Pilot Cap Duarte ejected safely and was recovered."...

Mas a fonte é portuguesa!

Sources:

Scramble

http://especialistasdaba12.blogspot.de/2016_11_01_archive.html

Diário de Lisboa 1 June 1963, p16


Fui ver o Diário de Lisboa desse dia, p. 16... Aqui tens, são 8 linhas... Diz que o avião despenhou-se por avaria... Em suma, quwem conta um conto, acrescenta-lhe um ponto...

http://casacomum.org/cc/visualizador?pasta=06549.087.18340#!16


Abraço, Luís


PS - O Diário de Lisboa, citando as agências oficiosas (ANI...), diz que foi "acidente"... Os blogue do Victor Barata diz que foi abatido por fogo IN...

Jose Matos disse...

Olá Luís

Fazendo então um comentário à perda do F-86, a 31 de maio, uma novidade que o meu artigo traz é justamente uma nova abordagem a esse episódio…
Eu quando investiguei a questão falei com o Manuel Pereira Clemente, que era o asa do Fausto Valla nessa missão e o relato que ele me fez pareceu-me credível e vai contra a versão oficial da FAP. Ao que tudo indica, o Capitão Fausto Valla foi mesmo atingido por estilhaços de uma bomba de 250 kg, que acabava de largar, na zona de Bedanda, no sul da Guiné, perto do rio Cumbijã. Ou seja, o bombardeamento foi mal executado.
Como o F-86 de Fausto Valla sofreu depois um flame-out no motor antes de chegar a Bissalanca, a versão que ficou foi a do fogo antiaéreo e para o Fausto Valla não ficar mal visto e como o avião se perdeu, nunca ninguém confirmou se foi isso ou não. Isto foi o que me contou o Pereira Clemente e parece-me um relato credível…

Ab

José Matos

Cherno Balde disse...

Caros amigos,

Uma coisa pareceu extraordinaria e incompreensivel. Porque razao a forca aerea e as autoridades coloniais em geral permitiam que se largassem bombas de 250Kg sobre aldeias indefesas e aspirantes a guerrilheiros ainda de pes descalcos ??!!! Nao foi isso que de facto incendiou a guerra??? Sem falar das bombas de Napalm...!!!

Com um abraco amigo,

Cherno AB

Tabanca Grande Luís Graça disse...

José Matos, obrigado pelo teu esclarecimento. Mas continuo intrigado com a explicação dada pelo asa do Fausto Valla nessa missão... Para um leigo como eu custa a aceitar essa versão, a de um avião "mítico" como o F-86F Sabre, supersónico, ter-se "deixado apanhar" pelos estilhaços da bomba de 250 kg que acabava de largar... A que altura essas bombas eram lançadas ? E contra que alvos militares ?

Em maio de 1973, a guerrilha era ainda incipiente, os "turras" eram mesmo uns "pés-descalços", como diz o Cherno Baldé... e os alvos só podiam ser tabancas... indefesas! … Não teriam ainda armas automáticas, muito menos anti-aéreas, capazes de pôr em perigo a vida dos nossos pilotos…

Não estou a pôr em causa a explicação dada pelo nosso camaradas da FAP, Manuel Pereira Clemente, e muito menos a sua honestidade intelectual...Gostava, sim, era de saber mais detalhes sobre essa missão, na região de Bedanda, da qual originou a queda do avião em 1 de maio de 1963...

Nesta época, meados de 1963, há um perfeito desnorte das autoridades portuguesas, tanto em Lisboa como em Bissau. Salazar não soube prevenir o conflito nem muito menos antecipar-se a ele, reforçando o dispositivo militar no CTIG… E cometeu o erro de manter um governador, oriundo da armada, Vasco Rodrigues, e um comandante chefe, brigadeiro, do exército, Fernando Louro de Sousa, que parece não se entendiam…

A história os julgará, mas a verdade é que foi preciso muita violência e sangue, com a escalada da guerra, para os dois serem substituídos pelo Schulz, que passa a acumular os dois cargos (governador e comandante-chefe), em 4 de maio de 1964… O “desnorte” terá atingido, em maior ou menor grau, os 3 ramos das forças armadas…

José, obrigado pelo teu saber e paciência. E que seja tudo em memória do teu pai, que foi nosso camarada na Guiné. LG

Anónimo disse...

Meus senhores a treta continua e não há volta a dar.Pasmo com tantos historiados e sociólogos a opinar.Mas eu que até nem sou intelectual dou por mim a pensar!Ainda ninguém percebeu que náo é possível julgar à luz de hoje o que aconteceu no passado?
J.Dias

Anónimo disse...

Se eh assim, Sr. Anonimo, entao traga a luz do passado para podermos julgar.

Jose Matos disse...

Olá Luís
A reposta é fácil, o bombardeamento foi mal executado, ou seja, a altitude de largada com esse tipo de bombas foi mal calculada e daí ter acontecido o que aconteceu…
São erros que se cometem na guerra…

Ab Zé

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Aceito a tua explicação, Zé... O avião, em velocidade abaixo mach 1 (barreira do som), faz um bombardeamento, tecnicamente mal executado... Os estilhaços da bomba, projectados a velocidade supersónica (como a chicotada do Apatossauro, há 150 milhões de anos atrás), acabam por atingir o F-86F...(recorde-se que o homem só conseguiu ultrapssar a barreir do som... em 1947!).

Escreves tu:

"Como o F-86 de Fausto Valla sofreu depois um flame-out no motor antes de chegar a Bissalanca, a versão que ficou foi a do fogo antiaéreo e para o Fausto Valla não ficar mal visto e como o avião se perdeu, nunca ninguém confirmou se foi isso ou não. Isto foi o que me contou o Pereira Clemente e parece-me um relato credível"...

As agências noticiosas (ANI e Lusitânia) deram depois a notícia, com data de 1 de junho de 1963, a partir de Bissau, mas trocaram os nomes (cap Duarte, em vez de Fausto Valla...).

Trocas e baldrocas, como convinha na época, que era para não assustar muito o Zé Pagode...

Anónimo disse...

Pois é não posso trazer a luz do passado porque hoje ela não é a mesma.Mas tb não interessa.Já percebi que o meu comentário não interessa, mas ainda pensei que fosse
bem interpretado.Mas é o costume não interessa a quem tem a mania que é o dono da verdade.Mas eu como anónimo ainda deixei o meu nome.E tu quem és tu que te escondes
atrás da tua verdade para quereres julgar.
José Dias