domingo, 31 de março de 2019

Guiné 61/74 - P19635: (In)citações (128): Honra ao cap pqd Tinoco de Faria (1927-1966), com quem estive na BA 12, em Bissalanca, a tomar café, uns dias antes da sua morte, no corredor de Guileje (Virgínio Briote, 1x-alf mil, CCAV 489, Cuntima e alf mil 'comando', cmdt Grupo Diabólicos, Brá; 1965/67; nosso coeditor, jubilado)


Guiné > Região de Tombali > Mapa de Guileje (1956) > Escala 1/50 mil > Posição relativa de Guileje, Mejo o rio Tenhege, a nordeste de Mejo, em pleno "corredor da morte" ou "corredor de Guileje", onde perdeu a vida o cap pqd Tinoco de Faria.

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2010)




1. Comentário de Virgínio Briote (ex-alf mil, CCAV 489, Cuntima e alf mil 'comando', cmdt Grupo Diabólicos, Brá ; 1965/67 [, foto à esquerda, 1965]; nosso coeditor, jubilado; vive em Lisboa)



Conheci uma das irmãs do cap pqd Tinoco de Faria, foi ela que preparou a minha admissão ao liceu Sá de Miranda,  em Braga. 

Na Guiné mantive contacto com o capitão em Bissau e, uns dias antes da sua morte,  tomámos café na base aérea [,em Bissalanca].

Soube da sua morte no dia a seguir ao acontecimento por um médico que nos tratava da saúde em Brá e contou alguns pormenores que agora, tantos anos decorridos, não tenho vontade de falar.

Mas posso transcrever um resumo de um documento então em poder da 3ª Rep.:



(...) Guileje, capitão pára-quedista Tinoco de Faria. 28 de Abril, operação "Grifo", “corredor” de Guileje. Às 00H30 saíu do aquartelamento do Mejo o pelotão de pára-quedistas comandado pelo alferes Ferreira da Silva, seguindo nele o capitão Tinoco de Faria. 

A corta-mato progrediram até um local onde montaram uma emboscada. Às 05H00 o dispositivo ficou armado num terreno ligeiramente inclinado e que oferecia boas possibilidades de defesa. 

Às 10H00 ouviram-se disparos de armas automáticas, a uma distância considerável. Como os disparos se repetiram e pareciam mais próximos, os páras calcularam que o IN estava a fazer fogo de reconhecimento e que vinham no trilho onde o pelotão estava emboscado. Uma dezena de guerrilheiros armados e fardados de calção e camisa amarela começou a entrar na “zona de morte”, enquanto mais atrás foi avistado um grupo mais numeroso. 

Aconteceu tudo em poucos segundos. Um cão ladrou, os guerrilheiros da frente recuaram, os páras abriram fogo de imediato sobre o IN e destes, os que puderam não perderam tempo a reagir. O capitão foi atingido gravemente. Todos os guerrilheiros que abriam a coluna acabaram por ser mortos. 

Estabelecido contacto rádio com um avião DO-27, o pelotão de páras ficou a aguardar indicações com vista à recuperação e transporte para Bissau do comandante de companhia. 

Entretanto, o grupo IN aproximou-se da mata ocupada pelos páras e abriu fogo sobre estes com metralhadoras pesadas, armas ligeiras e morteiros. Durante cerca de 30 a 40 minutos o pelotão respondeu, obrigando o IN a mudar de posições, aproveitando os páras para levar o ferido para um local mais adequado à evacuação. 

O inimigo perseguiu-os,  flagelando-os à distância enquanto os páras iam ripostando enquanto progrediam na direcção do rio Tenhege. A ideia dos páras era passar o rio, depois o risco seria menor e mais facilmente evacuariam o seu capitão, cuja situação se agravava a todo o momento.

Às 12H00, atingida a orla da mata do rio Tenhege, novo ataque do IN. Cerca de 20 elementos emboscados numa mata próxima abriram fogo e, de novo, os páras responderam com fogo da MG-42 e do lança-roquetes. 

Apesar de todos os esforços, por volta das 12h00, a hemorragia interna acabou por matar o capitão Tinoco de Faria. Às 12h10 os páras retomaram a marcha. O contacto rádio com o aquartelamento de Mejo nunca se conseguiu estabelecer, talvez devido à distância e à densa arborização. O corpo do capitão Tinoco de Faria foi evacuado para Mejo de helicóptero, apenas por volta das 18h00, junto a uma das margens do rio Lijol. O pelotão dos páras, completamente esgotado, entrou em Mejo às 19h30".

Honra ao Capitão Tinoco de Faria e à CCP.(**)

V. Briote, Guiné 1965/1967
30 de março de 2019 às 19:20 


________________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 30 de março de 2019  > Guiné 61/74 - P19634: In Memoriam: Os 47 oficiais oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar mortos na guerra do ultramar (1961-75) (cor art ref António Carlos Morais da Silva) - Parte XIX: cap pqt Luís António Sampaio Tinoco Faria (Braga, 1927 - Mejo, Guiné, 1966)

7 comentários:

Gil disse...

Obs: O cap. Tinoco de Faria estava, interinamente, no comando da CªCaçPáraquedistas da Base Aérea nº 12.
V Briote

Anónimo disse...

Presto a minha homenagem ao Cap. Tinoco de Faria e a todos que caíram em guerras. Conheci o Cap. Tinoco, como era conhecido nas TP, no posto de tenente, desde 1962 data em que ingressei nas TP, se não estou em erro existia no átrio de uma Companhia em Tancos um quadro com um poema de sua autoria.
Fui aumentado à Base Aérea 12 em novembro de 1966, na Companhia a que ele pertenceu, só quando o BCP 12 foi criado fui aumentado ao efetivo desta Unidade.
De acordo com O "jornal da Caserna". O Pelotão foi de castigo para a Operação e o CAP. Tinoco por não concordar, fez questão de acompanhar os seus homens.
Depois de ter feito 3 comissões na Guiné, ter passado pelos infernos de guilege, guidage e Gadamael, penso que não fez sendo mandar só um pelotão para aquele vespeiro.
Um abraço A DÂmasç

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Dâmaso, obrigado pelo teu esclarecimento. Continua a haver muitas histórias "mal contadas" ou "não contadas de todo" do nosso tempo de Guiné. A do cap pqd Tinoco e da Op Grifo pode der uma delas... Mas, pelo que sei, é uma figura muito amada e lembrada entre as tropas paraquedistas. Foi-me comfirmado pelo9 meu amigo Jaime Bonifácio Marques da Silva, do BCP 21 (Angola, 1970/72), hoje, à hora do almoço, na sua casa. Luís

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Fiquei a saber, através do meu amigo Jaime, que há uma associação de paraquedistas, que tem, como patrono o major pqd Luís António Sampaio Tinoco de Faria (1927-1966),e que tem como nome os "Grifos" (da Op Grifo em que o nosso camarada morreu em combate, no sul da Guiné, no corredor de Guileje):


(...) "É uma Associação, sem fins lucrativos, que adota a denominação “Associação de Pára-Quedistas da Ordem dos Grifos63”, designada abreviadamente por “Ordem dos Grifos63”, é uma associação cultural, recreativa e social, sem carácter político, partidário ou religioso, que se rege pelas disposições legais aplicáveis, pelos seus estatutos e por regulamento interno, aprovados em Assembleia Geral

A Ordem dos Grifos63 tem a sua sede na Rua Pedro Álvares Cabral, 4, na vila, freguesia e concelho de Vila Nova da Barquinha- (...)

Ler mais: https://osgrifos63.webnode.pt/

Não conseguimos aceder à sua página no Facebook:

https://www.facebook.com/grifossessentatres

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Ficamos a saber que, aquando da Op Grifo, em 28 de abril de 1966, ainda não existia o BCP 12...

Recorde-se:

1961 - Criação do Regimento de Caçadores Pára-quedistas (RCP) com sede no BCP em Tancos que então é extinto (Portaria 18462, de 5 de Maio). Fazem parte integrante do novo Regimento, o Batalhão de Instrução (BI) e o Batalhão de Caçadores Pára-quedistas nº11 (BCP 11)

1966 - Formação do Batalhão de Caçadores Pára-quedistas nº12 (BCP 12) em Bissau - Guiné (Portaria 22260, de 20 de Outubro). O Batalhão será activado a 14 de Outubro de 1966 incluindo a Companhia de Pára-quedistas do AB2.

1968 - O BCP 12 é condecorado com a Medalha de Cruz de Guerra de 1ª classe.

1974 - Outubro, 15 - É extinto o BCP 12 na Guiné (Decreto-Lei 765/74).


Fonte:
Amigos Pára-Quedistas
25 de março de 2012

https://www.facebook.com/AmigosParaQuedistas/



Tabanca Grande Luís Graça disse...

Recupero, com revisão de texto, o o comentário supra, do nosso camarada António Dâmaso, sargento mor na reforma extraordinária:

(...) "Presto a minha homenagem ao Cap Tinoco de Faria e a todos que caíram em guerras. Conheci o Cap Tinoco, como era conhecido nas TP, no posto de tenente, desde 1962, data em que ingressei nas TP. Se não estou em erro existia no átrio de uma Companhia em Tancos um quadro com um poema de sua autoria.

Fui aumentado à Base Aérea 12 em novembro de 1966, na Companhia a que ele pertenceu, só quando o BCP 12 foi criado fui aumentado ao efetivo desta Unidade.

De acordo com O "jornal da Caserna", o Pelotão foi de castigo para a Operação [Grifo] e o cap Tinoco, por não concordar, fez questão de acompanhar os seus homens.

Depois de ter feito 3 comissões na Guiné, ter passado pelos infernos de Guilege, Guidage e Gadamael, penso que não fez sentido mandar só um pelotão para aquele vespeiro. " (...)

Pergunta ao António Dâmaso:

- Camarada e greã-tabanqueiro, obrigado pleo teu precioso comentário. Se souberes (e puderes...) diz-nos o motivo da punição e o seu autor... Acho que temos o direito de saber quem foi o autor dessa "enormidade". Mandar um grupo de combate de elite, de castigo, para o corredor de Guileje, em abril de 1966...Percebe-se agora melhor por é que o cap Tinoco decide acompanhae o pelotão, que era comandando pelo alf pqd Ferreira da Silva, pro discordar da punição...

Passados mais de 50 anos, não há razões para quaisquer melindres, e muito menos para manter o "silêncio de chumbo" que ainda rodeia muita da história dos nossos bravos paraqudistas que atuaram no TO da Guiné...

Saudações do Luís Graça

Tabanca Grande Luís Graça disse...

OPERAÇÃO GRIFO

O portal Guerra Colonial (1961/1974) destaca esta operação em que morreu o bravo cap Tinoco... A versão é a mesma usada pelo Virgínio Briote:

(...) Operação Grifo
A morte do capitão no «Corredor do Guileje»

Os guerrilheiros do PAIGC demonstraram, desde o início da guerra, elevada preparação para o combate e, em Abril de 1966, no «Corredor de Guileje», uma força de pára-quedistas e outra da guerrilha defrontaram-se numa situação reveladora do nível de violência a que os confrontos já se desenrolavam.

A Operação Grifo previa a realização de emboscadas por um pelotão de pára-quedistas no Sul da Guiné, para impedir a penetração de guerrilheiros vindos da Guiné-Conacri. Essa força montou uma emboscada de madrugada, em terreno que oferecia bons abrigos, ficando a aguardar. Cerca das dez horas aproximou-se um grupo de guerrilheiros. Já muito perto dos pára-quedistas, os primeiros homens fizeram fogo de reconhecimento, lentamente foram entrando na «zona de morte» da emboscada, mas logo recuaram por terem detectado a presença dos páras, que abriram fogo e causaram algumas baixas. Ocorreram, a partir de então, factos reveladores do grau de preparação dos guerrilheiros e da capacidade dos páras. Segundo o relatório da operação, «a reacção do inimigo foi incrivelmente rápida e com grande potencial de fogo em tiro rasante».

Um dos três guerrilheiros sobreviventes da «zona de morte» abriu fogo, atingindo o capitão Tinoco de Faria, que, ao sentir-se alvejado, tentou mudar de posição, sendo novamente baleado com gravidade. Alguns segundos depois, foram abatidos os três guerrilheiros que tentavam fugir, mas os restantes tinham-se instalado junto à mata ocupada pelas forças portuguesas, desencadeando violento ataque com metralhadoras pesadas.

Numa pausa, o pelotão tentou transportar o ferido para local onde fosse possível a sua evacuação, pois inspirava sérios cuidados. O inimigo mudou de táctica, seguindo as tropas e flagelando-as à distância. Ao chegar à margem do rio Tenhege, o pelotão sofreu novo ataque de elementos emboscados no interior da mata. Entretanto, o estado de saúde do capitão agravou-se de forma irrecuperável, tendo morrido cerca do meio-dia. (...)

http://www.guerracolonial.org/index.php?content=395