quinta-feira, 3 de dezembro de 2020

Guiné 61/74 - P21605: Os nossos capelães (14): João Baltar da Silva (Santo Tirso, 1944 - Moçambique, 2011): fez duas comissões no CTIG, de 16/9/1971 (Joaquim L. Fernandes, ex-alf mil, CCAÇ 3461/BCAÇ 3863, Teixeira Pinto, 1973 e Depósito de Adidos, Brá, 1974)



Pe. João Baltar da Silva (1944-2011)

Foto: Cortesia do blogue Aviagens, de Armando Cabreira



IX Encontro Nacional da Tabanca Grande > Palace Hotel Monte Real > 
14 de junho de 2014 > Missa na igreja paroquial de Monte Real > 
O Joaquim Luís Fernandes (Maceira / Leiria). 
Tem 15 referências no nosso blogue.É o autor da série "Acordar Memórias"

Foto: © Manuel Resende (2014). Todos os direitos reservados. 
[Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Comentário de Joaquim Luís Fernandes [ex-alf mil, CCAÇ 3461/BCAÇ 3863, Teixeira Pinto, 1973 e Depósito de Adidos, Brá, 1974], ao poste P21594  (*):


Caro Luís Graça, quando em 2013, quase 40 anos volvidos do meu regresso da Guiné, iniciei o processo de acordar as minhas memórias desse tempo, uma das personagens que se ergueu foi a do capelão P. João Baltar. 

Tinha sido meu amigo, confidente e confessor. Muitas foram as conversas que travamos, não tanto no bar, onde nem sempre havia ambiente para tal, mas mais nas nossas passeatas, ao fim da tarde, avenida acima, avenida abaixo, da pacata vila/cidade de Teixeira Pinto [, hoje Canchungo].

Nas minhas pesquisas na Net para o encontrar, foi com profunda mágoa que li a notícia do seu falecimento em Malema, diocese de Nampula-Moçambique, em 5 de Dezembro de 2011, depois de ter sofrido um AVC que o debilitou e levou à morte.

João Baltar da Silva nasceu em Burgães, Santo Tirso, a 15 de Agosto de 1944. Foi ordenado sacerdote no Seminário de Cucujães a 28 de Julho de 1968.

Integrado na Sociedade Missionária da Boa Nova [, fundada em 1930 como "Sociedade Missionária Portuguesa"], partiu em Missão para Porto Amélia [, hoje Penha,] em Outubro de 1969.

Regressou em 1971 para ser incorporado no exército como capelão militar, tendo partido para a Guiné em 16/9/71 e regressado em 23/6/74. Duas comissões.

Depois da tropa, ainda em 1974, regressou como Missionário a Porto Amélia [, hoje Penha].

De regresso a Portugal, é em 1982 nomeado para a equipa formadora no Seminário de Valadares. Também exerceu as suas funções como sacerdote e professor, com elevado prestígio e reconhecimento, em outras localidades, entre elas Cucujães e Cernache.

Em 1987 parte novamente para as Missões em Moçambique, tendo ministrado em Pemba, Maputo, Chibuto, Matola e Malema.

Em 1994 pediu a nacionalidade Moçambicana.

No testemunho dos que com ele conviveram, se depreende ter sido um Missionário dedicado na sua Missão de evangelizador, mas que não ignorava as realidades humanas daqueles a quem se dirigia, estudando as suas culturas, o que eu já me tinha apercebido quando convivi com ele em Teixeira Pinto. 

Era um profundo conhecedor da cultura Manjaca e chegara a presenciar alguns dos seus ritos animistas.
Consta que ao longo da sua vida, nomeadamente em Moçambique, se referia às suas experiências e amizades de capelão na Guiné.

E é tudo por agora.
Votos de boa saúde e um Natal fraterno, mesmo que confinados.

Um abraço

Joaquim L. Fernandes

______________

Notas do editor:



(**) Vd. poste de 17 de setembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19023: Os nossos capelães militares (9): segundo os dados disponíveis, serviram no CTIG 113 capelães, 90% pertenciam ao Exército, e eram na sua grande maioria oriundos do clero secular ou diocesano. Houve ainda 7 franciscanos, 3 jesuitas, 2 salesianos e 1 dominicano.

2 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Há um testemunho interessante do Padre Jerónimo Nunes, sobre a vida e a pessoa do Padre João Baltar. na revista "Boa Nova", Janeiro 2012.

Não conseguimos ir à fonte primária. O testemunho é reproduzido em AViagens, blogue de Armando Cabreira. Aqui fica um excerto:

(..) Missionário de corpo e coração inteiros. Por onde passou fez estudos a sério sobre a cultura ads pessoas que encontrou: Guiné, Pemba, Maputo, Chibuto e Malema. Tudo metodicamente organizado na estante que hoje nos lega. Nos tempos em que a Igreja estava mais preocupada com a inculturação (Pemba e Chibuto), os conhecimentos culturais permitiram-lhe trabalhar com padres diocesanos em estudos sobre adaptações litúrgicas. Em todo o lugar, as suas informações sobre as comunidades eram precioso auxílio para o pároco.

Como capelão militar na Guiné, não viveu só para soldados. Ajudou as missões por onde passava, fez amigos entre a população local. Chegou a ser acusado de conviver com inimigos. Mas essa convivência local salvou vidas de companheiros. [Negrito do editor, LG]

Em Pemba foi o Pároco que conseguiu unir Macondes e Macuas na mesma paróquia. Foi o homem dos jovens, foi o superior regional do tempo dos julgamentos e expulsões de missionários. No meio da perseguição, viajava de noite para socorrer os aflitos, ajudar na sua defesa e encaminhamento. (...)

Fonte: http://armando-cabreira.blogspot.com/2011/12/p-baltar.html

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Imagino que não tenha sido fácil o "papel" dos capelães militares, com formação e/ou experiência prévia como missionários... Afinal, o "rebanho de Deus" estava divido, alguns cristãos combatendo-se entre si, em lados opostos...ou apoiando um lado ou outro. Aconteceu cm cristãos manjacos, balantas, papéis, cabo-verdianos...

Também não é por acaso que alguns missionários, nomeadamnente os italianos do PIME, como Lino Bacari que já aqui falou do drama (interior) de capelães militares como o Arsénio Puim, membro da nossa Tabanca Grande, e de missionários cristãos como ele,Limno Bacari.

Reproduz-se aqui parte do seu testemunho:

(...)" O outro inesquecível encontro com o amigo Arsénio deu-se no inicio de 1971, no quartel militar de Bambadinca a 30 km de Bafatá. Após a missa dominical na Missão desta localidade, a convite do Arsénio, no seu quarto, voltei a ouvir e desta vez também a ver, através de fotografias, os horrores da guerra, o que me permitiu compreender melhor o seu drama interior.

Ele, pensei, deve ter lido e ouvido inúmeras vezes o que estava resumido numa frase do Boletim dos Capitães militares e que aqui vou citar:

“O capelão militar é um dos elementos mais importantes do nosso exército porque, pregando a doutrina do amor cristão, ajuda grandemente a obra de pacificação e de reunião de todos os povos das províncias ultramarinas sob a única bandeira portuguesa”.

Para mim, foram esta mistura e esta instrumentalização politico-bélica com a mensagem evangélica que levaram o drama interior do amigo a explodir em desabafo durante a homilia dominical no inicio de Maio de 1971, que teve como consequência a sua expulsão do exército.

Eu também, nessa altura, estava a viver , de forma menos dramática, esta mesma contradição que iria durar oito anos, de 1966 a 1974, resumida no artigo 2 do Estatuto Missionário português, aprovado por Salazar e Cerejeira, na lógica da Concordata de 1939. Esse artigo refere textualmente:

“As Missões católicas portuguesas são Instituições de utilidade imperial e de sentido eminentemente civilizador”.

Aquilo que criou a amizade entre mim e o Arsénio não foi o facto de sermos coetâneos (hoje oitentões) ou ambos padres cumpridores da missão incumbida, mas sim o termos vivido e sofrido a mesma contradição numa realidade que nos obrigou, cada um de sua maneira, a uma reviravolta na vida.

Completámos desta forma, a nossa missão comum, a de colocar a nossa pedrinha na construção da paz e da liberdade dos povos português e guineense." (...)

8 DE MAIO DE 2020
Guiné 61/74 - P20954: (In)citações (148): Homenagem ao ex-alf mil capelão, Arsénio Puim, CCS / BART 2917 (Bambadinca, 1970/72), no seu 84º aniversário - Parte IV: o termos vivido e sofrido a mesma contradição numa realidade que nos obrigou, cada um de sua maneira, a uma reviravolta na vida (Lino Bicari)