sábado, 6 de março de 2021

Guiné 61/74 - P21974: Álbum fotográfico de António Marreiros, ex-alf mil, CCaç 3544, "Os Roncos", Buruntuma, 1972, e CCaç 3, Bigene e Guidage, 1973/74 - Parte VI: O Ramadão (2/3)

 

Foto nº 6 > Um cego é conduzido ao local da cerimónia por um familiar ou vizinho


Foto nº 7 > O grupo dos homens



Foto nº 8 > O grupo das mulheres


Foto nº 9 > O almami conduz as orações (1)


Foto nº 10 > O almami conduz as orações (2)


Foto nº 11 > O almami conduz as orações (3)


Foto nº 12 > Fim da cerimónia ? Ao fundo, os rapazes que dispersam


Guiné > Região de Gabu > Buruntuma > CCAÇ 3544, "Os Roncos de Buruntuma" > 1972 > O Ramadão (2 e 3)

Fotos: © António Marreiros (2021). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Continuação da publicação do álbum do  camarada António Marreiros [ a viver há quase meio século no Canadá (Victoria, BC, British Columbia).  ex- alferes miliciano em rendição individual na CCaç 3544, "Os Roncos", Buruntuma, 1972, e, meses depois, transferido para Bigene, CCaç 3, até Agosto 1974]... 

A sequência é relativa à festa do Ramadão, em Buruntuma, em 1972, e as cimco primeiras fotos já foram legendadas e comentads pelo Cherno Baldé, o nosso assessor guineense, que vive em Bissau, para as questões etnolinguísticas.

2. Legendagem do Cherno Baldé ao poste P21971 (*)

Caros amigos,

O António Marreiros postou mais uma série de excelentes fotos falantes sobre a comunidade de Buruntuma no ano de 1972, por ocasião da celebração do fim do mês sagrado do Ramadão.

A seu pedido, aqui vão os meus comentários [às fotos nºs 1, 2, 3, 4 e 5]



Foto nº 1

Um homem grande no seu traze de festa a caminho do local da celebração que normalmente se realiza no centro da aldeia debaixo de uma árvore, a mais importante, que tradicionalmente recebe este acto de submissão a Alá,  o criador, o benevolente e misericordioso, simbolizando a união e conc+ordia entre os habitantes da aldeia.

Em segundo plano e do lado direito vê-se um abrigo (bunker) contra flagelações e bombardeamentos de artilharia. Este tipo de abrigos feitos para protecção das populações civís existiam nas (fronteiras) zonas mais expostas as flagelações inimigas. Eram relativamente frescas durante o dia e insuportáveis durante a noite. Deviam ser limpos regularmente e bem resguardados sob pena de servir de covíl de cobras e outros répteis que abundam nas regiões tropicais. 

A parte de cima do bunker foi aproveitado para servir de celeiro para stock das reservas de alimentaçao (milho miúdo e sacos de arroz com casca ?) da familia.



Foto nº 2

A árvore da Manjanja (ou Mandjandja) em Crioulo, Tabâ(i) em mandinga e fula, foi o local escolhido para a realização da cerimónia. Os homens estão sentados debaixo da árvore e relaxados, esperando a hora da chegada do Almami (Chefe religioso) e o início da cerimónia que se realiza uma vez por ano após o periodo do Ramadâo (jejum de 30 dias consecutivos, das 5h00 as 7h30). 

A organização da mesma está hierarquizada, tendo na frente os homens, depois o grupo das dos rapazes e criançasem,  seguindo-se as mulheres à uma certa distância, As crianças às vezes misturam-se com o grupo das mulheres.



Foto nº 3 

O Almami (à  frente) e o grupo dos seus auxiliares (seguindo atrás),  a caminho do local da realizaçao da cerimónia, passam pelo grupo dos rapazes que estão sentados não atrás mas à frente das mulheres na ordem hierárquica da cerimónia de reza muçulmana que requer silêncio, calma e grande concentração.




Foto nº 4 

Duas mulheres grandes da aldeia em trajes de festa, aproveitam para os habituais cumprimentos e uma breve troca de palavras antes do início da cerimónia.

Foto nº 5 [em baixo, ao centro] :

Mostra a primeira fila do grupo das mulheres sentadas debaixo do sol e algo impacientes, à espera do inicio da cerimónia, aqui o sol fustiga e não há sombra. 

Em primeiro plano, uma mulher sentada numa pele de carneiro. As esteiras de bambu e as peles de carneiro eram largamente utilizadas antes do aparecimento das esteiras feitas de material polietileno.



Foto nº 5


Melhores cumprimentos,

Cherno Baldé


PS - Fizemos uma pequena correcção à legenda das Fotos nº 2 e nº 3: O grupo dos rapazes vem a seguir ao dos homens adultos e não atrás das mulheres...


2. Legendas complementares do Cherno Baldé às fotos deste poste (Ramadão, 2/3)


As legendas estão perfeitas, gostaria de acrescentar alguns elementos sobre as fotos nºs 10/11 e 12.

Nas fotos nº 10/11 podemos ver do lado direito do Almami, no chão, uma pedra e o bastão que ele trazia na mão que têm significado histórico e que evoca a ligação e herança cultural e religiosa dos Hebreus/Judeus. 

A pedra, na sua forma, simboliza o púlpito e no seu conteúdo sacramental invoca o tabernáculo ou Arca da aliança da religião hebraica e que na religião muçulmana é substituída pela mesquita como lugar sagrado. O bastão por sua vez simboliza o mesmo que Moisés recebeu do Deus no Egipto e graças ao qual conduziu o seu povo atravessando o Mar Vermelho para o Sinai.

No fundo o Ramadão é a repetição ritual e simbólica de uma tradição judaica. Logo a seguir a esta cerimónia vão realizar uma recitação de algumas horas, lendo e traduzindo na lingua local a história resumida da história e da tradição da religião desde os primórdios com Abraão até ao legado (Sunna) do Profeta Mohamed, revisitando outros Profetas importantes como o Moisés (Annab Mússa) e Jesus (Annab Issa, na versão islâmica).

Na foto nº 12, o grupo das crianças já se dispersou, pois a eles não interessa a parte litúrgica da recitação que demora algumas horas, hoje é dia de festa e é esse o espírito que os anima. Em casa vão tomar o pequeno almoço e preparar o carneiro que será sacrificado logo que a cerimónia é finda e que vai juntar toda a família.
_____________


2 comentários:

Cherno Baldé disse...

Caro amigo Luís,

As legendas estão perfeitas, gostaria de acrescentar alguns elementos sobre as fotos 10/11 e 12.

Nas fotos 10/11 podemos ver do lado direito do Almami, no chão, uma pedra e o bastão que ele trazia na mão que têm significado histórico e que evoca a ligação e herança cultural e religiosa dos Hebreus/Judeus. A pedra, na sua forma, simboliza o púlpito e no seu conteúdo sacramental invoca o tabernáculo ou Arca da aliança da religião hebraica e que na religião muçulmana é substituída pela mesquita como lugar sagrado. O bastão por sua vez simbologia o mesmo que Moisés recebeu do Deus no Egipto e graças ao qual conduziu o seu povo atravessando o mar vermelho para o Sinai.

No fundo o Ramadão é a repetição ritual e simbólica de uma tradição judaica. Logo a seguir a esta cerimónia vão realizar uma recitação de algumas horas, lendo e traduzindo na lingua local a história resumida da história e da tradição da religião desde os primórdios com Abrão até ao legado (Sunna) do Profeta Mohamed, revisitando outros Profetas importantes como o Moisés (Annab Mússa) e Jesus (Annab Issa na versão islâmica).

Na foto 12, o grupo das crianças já se dispersou, pois a eles não interessa a parte litúrgica da recitação que demora algumas horas, pois hoje é dia de festa e é esse o espírito que os anima. Em casa vão tomar o pequeno almoço e preparar o carneiro que será sacrificado logo que a cerimónia é finda e que vai juntar toda a família.

Cordiais saudações,

Cherno AB

Valdemar Silva disse...

É muito interessante, o encerramento das principais cerimónias religiosas ser festejado com grandes refeições especiais.

Valdemar Queiroz