1. Mensagem do nosso camarada Manuel Luís Lomba (ex-Fur Mil Cav da CCAV 703/BCAV 705, Bissau, Cufar e Buruntuma, 1964/66), com data de 30 de Agosto de 2023, onde nos fala do posto militar mais barato que o Exército Português tinha, o furriel miliciano, dado que enquanto cabo (miliciano) fazia de sargento e enquando furriel fazia de oficial. Quantos e quantos camaradas nossos durante a suas comissões em África completaram o tempo de promoção a segundos sargentos milicianos e só se lambravam disso no momento da passagem à disponibilidade.
Os Furriéis – De Explorados da República a Ícones da Guerra da Guiné
O P24586 é o generativo deste escrito, a gratificação do Cherno Baldé aos furriéis, evocando as vivências na Guiné, e a foto do furriel Carlos Cunha, do furriel Abílio Duarte com criança guineense ao seu colo.
Recorrendo à Wikipédia, o termo furriel é modificação fonética do francês “fourrier”, derivado de “fourrage”, forragem em português, – era o vagomestre responsável das forragens e da palha do passadio dos muares das Companhias de Cavalaria.
O posto de furriel foi introduzido nas Companhias de Ordenanças por D. Manuel I, introduzido por D. João IV nas Tropas de Linha e extinto em 1884, pelo famigerado ministro e capitão de Engenharia Fontes Pereira de Melo.
Das conversas quando jovem com o meu conterrâneo Joaquim Luís de Faria, soldado condutor de ambulâncias na Frente da Flandres, condecorado, promovido por distinção a cabo miliciano e passado à disponibilidade como furriel, guardo a memória oral que estes postos terão sido reintroduzidos pelo general Norton de Matos, no contexto da nossa participação na I Guerra Mundial. Sem recurso a fontes, a reintrodução do posto furriel pertencerá a esse nosso vulto histórico, salvo erro ou omissão.
Relembrando que a classe dos praças - os básicos e os cabos -, foram os mais explorados do Exército Português, deixo a dimensão da exploração militar e laboral de cada um ao juízo dos meus camaradas. As matérias e metodologias da instrução, a capacitação, eram comuns aos cursos e instrução de sargentos e oficiais milicianos – os dois volumes do Manual do Oficial Miliciano o seu livro único – a escolaridade formal era a sua discriminação: o 2.º ciclo dos liceus e equivalentes alçava a soldado instruendo do CSM, o 3.º ciclo dos liceus alçava a cadete do COM.
Os soldados instruendos do CSM saíam promovidos a cabos milicianos, passavam a desempenhar todos os serviços de sargentos e até dos oficiais subalternos, mas o pré de praças a sua remuneração, as ementas da messe de sargentos a sua única regalia; os cadetes instruendos do COM saíam promovidos a aspirantes a oficiais, remunerados com soldo de oficiais e as mesmas sinecuras.
A tropa ou não tinha ou o elevador social não funcionava, em matéria de serviço, a nivelação feita por cima. Os cabos milicianos eram investidos nos desempenhos dos praças, dos sargentos e até dos oficiais subalternos, eram pau para toda a obra, os aspirantes e alferes milicianos eram elitizados, longe de investidos no desempenho dos praças e dos sargentos…
Saí do CISMI promovido a cabo miliciano, fui colocado no RI 13, Vila Real, até à chegada do seu comandante, um reprovado da Academia Militar e passado a aspirante miliciano, comandei todo o mês de janeiro de 1964 um pelotão de cerca de 90 recrutas e a sua instrução, maioritariamente analfabetos, coadjuvado por outro cabo miliciano de Lamego e por dois cabos RD – um deles paciente do stress pós-traumático, sofrera as agruras de Nambuangongo -, estudava e cumpria as respetivas fichas e respondia ante o comandante da Companhia, capitão Carrapatoso – eu ganhava 90$00/mês, o aspirante veio ganhar 1.800$00/mês.
Mobilizado para a Guiné, era o ”mais antigo” da Companhia – diferença de duas décimas do saudoso Manuel Simas – substituí os outros furriéis operacionais e os alferes nos seus impedimentos - começara por substituir o vagomestre logo que chegamos e acabei a comissão a substituir o comandante do destacamento da Ponte de Camajabá, entre Buruntuma e Piche.
Em Buruntuma havia um grupo de milícia nativa com o efetivo de pelotão, comandado por um alferes de 2.ª linha fula, fui nomeado comandante dele, fui selecionador de outro grupo de igual efetivo e seu instrutor, o Manuel Simas foi mandado para meu adjunto – dois militares brancos com as divisas de furriel, comandavam dois alferes fulas de 2.ª linha, com galões de alferes…
A burro que muito anda, nunca falta quem o tanja. Como já abordei a relação histórica do posto furriel-cavalo, acrescento o provérbio popular da revolta do burro, analógico à nossa prestação militar: “burro para a azenha, burro para a lenha, burro para a eira, burro para a jeira e burro para a feira – irra de tão burro!”
Para terminar registo um nosso camarada histórico – o Zé do Telhado! E que os furriéis foram as vértebras da “coluna” do 25A74.
Honra aos Furriéis!...
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Nota do editor
Último post da série de 13 DE AGOSTO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24553: (Ex)citações (421): Vivendo na Suécia há já quase meio século, com família sueca, há muito que compreendi não existirem paraísos... Mas, atenção!, os suecos estão longe de serem ingénuos caçadores... de borboletas (José Belo, Suécia)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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4 comentários:
Luís Lomba, bem apanhado.
Mas na tropa só sendo promovido (ou graduado?) é que muda de vencimento.
Não sei se um Major for o Cmdt de um Batalhão por substituição temporária passa a auferir o vencimento de um Coronel por esse período.
Aquilo é que foi poupar com os milicianos.
Saúde da boa
Valdemar Queiroz
Excelente trabalho camarada Luís Lomba.
Uma vez que está na moda as petições, porque não, dos poucos que já restamos, avançar com uma solicitando à Assembleia da Republica, que obrigue o estado a ressarcir, este corpo do exército que era pau para toda a colher e como bem disse o camarada “Zé do Telhado” as vértebras da coluna do 25A. No meu caso, que comandei um pelotão ⅔ da comissão na Guiné, mais a artimanha da criação do posto de Cabo Miliciano para fugir ao vencimento de sargento, durante 6 meses, com os juros de mora ainda cumpro o sonho de uma vida: umas férias na Costa da Caparica!!!
Um grande abraço camarada Lomba e outro para o grande amigo Valdemar que está sempre de sentinela.
Joaquim Costa
Manuel Luís, estás de volta e em boa forma!...
O nosso exército era classista, como tudo o resto... Nobreza, clero e povo...Ab, LG
Caro Manuel Lomba,
Se os Furiéis foram as "vértebras" da coluna do 25A74, parece que os Cabos Milicianos foram os mais beneficiados com o golpe, pois segundo a Wikipedia, o posto de segundo-furriel foi introduzido em 1974, substituindo o anterior posto de primeiro-cabo miliciano.
Também, outra informaçao que me surpreendeu, e que, certamente, nao vos surpreendera foi saber que os Sargentos (primeiro e segundo ?) tinham um salario superior ao Capitao (Miliciano?) de uma companhia e que so era comparavel a de um Tenente Coronel. Assim, nao admira que fosse pouco apreciado pela malta em geral dentro das companhias de Milicianos.
Cdte,
Cherno Baldé
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