quarta-feira, 10 de janeiro de 2024

Guiné 61/74 - P25055: In Memoriam (492): Fernando Peixinho de Cristo (1947-2004), ex-cap mil inf, cmdt, CCAÇ 3545 / BCAÇ 3883 (Canquelifá, 1972/74); natural de Coimbra, e reputado hidrogeólogo a nível nacional e internacional


Capa do livro de homenagem a 
"Fernando Peixinho de Cristo: Vida e Obra" 
(2009, edição de AIH-GP, Grupo Português 
da Associação Internacional de Hidrogeólogos)


1. Muitos dos homens (e algumas mulheres, as enfermeiras paraquedistas) que fizeram a guer da Guiné, entre 1961 e 1974, têm vindo a desaparecer por doença, acidente, ou  "lei natural da vida"... De um ou outro, sobretudo se teve visibilidde mediática, vamos "sabendo pelos jornais" (como se dizia antigamente). Da maior parte, só por notícia dada por email ou telemóvel de camaradas, amigos ou familiares. Noutros casos, só vimos a saber tardiamente, às vezes muitos anos mais tarde. 

Foi o caso do ex-cap mil inf Fernando Peixinho de Cristo, comandante da CCAÇ 3545 (Canquelifá, 1972/74), condecorado com a Cruz de Guerra de 3ª classe em 1974. A CCAÇ 3545, que pertencia ao BCAÇ 3883, sediado em Nova Lamego, embarcou de avião para o CTIG em 22mar72 e regressou a 21jun74.

No poste de apresentação à Tabanca Grande, o nosso grão-tabanqueiro José Peixoto, que vive V. N. de Famalicão, e foi 1.º cabo radiotelegrafista da CCAÇ 3545/BCAÇ 3883 (Canquelifá, 1972/74), faz referência ao seu "saudoso" comandante nestes termos (**):

(...( No dia 5 de janeiro de 1974, por volta das 14h00, toda a malta da companhia (CCAÇ 3545) aproveitando o que parecia ser um tempo de acalmia, apenas aparente, após a análise de tudo o que se encontrava à sua volta, decidiu abandonar os abrigos, cada um acompanhado da sua arma mais os parcos haveres. No grupo estavam incluídos os artilheiros, apresentando-se no abrigo de Transmissões no qual se encontrava o nosso comandante capitão Peixinho Cristo.
 
Perante tal situação, todo o pessoal que se encontrava na área das transmissões, ficou aturdido, sem saber o que se estava a passar, facto estar ali toda a companhia reunida! Após alguns minutos de conversa com o capitão, logo se ficou a saber a sua  intenção era de abandonar Canquelifá.(***)

A intenção não passou disso mesmo pelo facto de o capitão ter pedido alguma calma, descendo ao posto de transmissões no qual estabeleceu contacto com Nova Lamego e desta creio a Bissau. Com quem falou não me apercebi, apesar de estar junto, a resposta que lhe foi dada também não sei, apenas sei que na posse do que lhe foi dito/prometido, subiu ao cimo do abrigo de transmissões onde aguardava toda a companhia e disse:

- Rapazes, é uma virtude confiar nos chefes. Vamos todos para os abrigos mais uns dias.

E assim foi, pois toda a companhia recolheu aos seus abrigos de armas e bagagens. reconhecendo a Liderança e Motivação de um chefe. Honra lhe seja feita.(..)

2. Comunicado da direção do Grupo Português da Associação Internacional de Hidrogeólogos (AIH-GP)

Hidrogeólogo (Sócio n.º 90762)

É com enorme pesar que informamos que faleceu no dia 26 de março 2004 o nosso colega Fernando Peixinho de Cristo, Presidente Fundador do Grupo Português da AIH (AIH-GP) (A.

Tinha 57 anos, e nasceu na cidade de Coimbra, em cuja Faculdade de Ciências e Tecnologia se graduou em Geologia em 1977 com alta classificação. 

Em 1983 fez a especialização em Hidrogeologia em Barcelona (Espanha) no curso de pós-graduação da Universidade Politécnica da Catalunha (Curso Internacional de Hidrologia Subterrânea).

A carreira profissional de Peixinho de Cristo começou em 1978, na então chamada Direcção-Geral de Recursos e Aproveitamentos Hidráulicos (DGRAH), organismo da Administração Pública que está na origem do actual INAG (Instituto da Água), a "autoridade da água" em Portugal.

Na DGRAH, e organismos que lhe sucederam, desenvolveu intenso trabalho no domínio das águas subterrâneas, sobretudo em sistemas aquíferos da orla sedimentar pós-Paleozóico do território português, tendo chegado a altos níveis de chefia de serviços.

Sua competência profissional associada à capacidade de diálogo e facilidade de gerir situações conflituantes, levaram Peixinho de Cristo ao lugar de Director do Ambiente da região central de Portugal, vasta região extremamente habitada e com actividades difíceis de compatibilizar.

Além de hidrogeólogo teve intervenção relevante como professor convidado em escolas superiores, na área das geociências, dando aulas e orientando estágios científicos,  nomeadamente nas universidades de Coimbra e do Algarve.

Foi membro do Conselho Nacional da Água e, mais recentemente, em representação da AIH-GP, pertenceu à Comissão de Acompanhamento da próxima Lei-Quadro da Água, que faz a transposição da Directiva 2000/60/CE para a legislação portuguesa.

Para além da grande competência profissional, as qualidades humanas e cívicas do colega Peixinho de Cristo tornam a sua morte num acontecimento muito doloroso para os hidrogeólogos portugueses.


3. Simlis de luto com morte de Peixinho de Cristo 
 
Fernando Peixinho de Cristo, administrador-delegado da SIMLIS - Saneamento Integrado dos Municípios do Lis, morreu ontem [26 de março de 2004]   num acidente de viação no IP5, ao quilómetro 137 do Itinerário Principal (IP) 5, junto à ponte de Muxagata, entre Celorico da Beira e Fornos de Algodres. 

Especialista em questões ligadas aos recursos hídricos, Peixinho de Cristo, de 57 anos, era desde há dois anos administrador-delegado da empresa multimunicipal que está a gerir todo o projecto de saneamento dos concelhos de Leiria, Porto de Mós, Batalha, Ourém e Marinha Grande e foi responsável por um estudo para o tratamento dos efluentes das suiniculturas da região. 

Antigo director regional do Ambiente do Centro, ocupou este cargo durante o último governo socialista, entre 1997 e 2002, e foi também presidente do grupo português da Associação Internacional de Hidrogeólogos. 

De acordo com a Brigada de Trânsito da Guarda, o veículo despistou-se no sentido Este-Oeste no IP5 e as causas do acidente ainda não estão esclarecidas. No acidente ficou ainda ferido com alguma gravidade José Luís Caseiro, quadro superior da Direcção Regional do Ambiente e Ordenamento do Território (DRAOT) do Centro, que seguia com Peixinho Cristo.

4. Comentário do editor LG:

Não o conhecemos pessoalmente. Todavia, pelo que já lemos da sua atuação no TO da Guiné, foi um sereno mas  bravo comandante da CCAÇ 3545, a sua atuação na heroica defesa de Canquelifá, desde agosto de 1973 e sobretudo no primeiro trimestre de 1974, valeu-lhe a Cruz de Guerra de 3ª Classe.

Outro oficial que se distinguiu nesta companhia foi também outro Fernando, o Fernando de Sousa Henriques, também escritor (tem, de resto, 15 referências no nosso blogue). 

Ambos morream de acidente. É justo recordá-los e honrar a sua memória. Nenhum deles inegra(va) a Tabanca Grande.
___________

Notas do editor:

(*) Último poste da série > 31 de dezembro de 2023 > Guiné 61/74 - P25019: In Memoriam (491): O Nuno Rubim (1938-2023) que eu conheci nos Comandos do CTIG, de junho a dezembro de 1965 (Virgínio Briote)

(**) Vd. poste de 30 de outubro de 2016 > Guiné 63/74 - P16656: Tabanca Grande (497): José Peixoto, ex-1.º Cabo Radiotelegrafista da CCAÇ 3545/BCAÇ 3883 (Canquelifá, 1972/74), nosso 731.º Grã-Tabanqueiro

(***) Vd. tabém poste de 10 de janeiro de  2024 > Guiné 61/74 - P25053: Recordando o Amadu Bailo Djaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015), um luso-guineense com duas pátrias amadas, um valoroso combatente, um homem sábio, um bom muçulmano - Parte XLI: Canquelifá, a ferro e fogo, no 1º trimestre de 1974

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