(...) "O livro tem como título principal No Ocaso da Guerra do Ultramar, e como subtítulos Uma Derrota Pressentida,. Notícias de um Correspondente de Guerra, Combatente na Guiné e é da autoria de Fernando de Sousa Henriques.
"Obtive-o num encontro de camaradas que pertenceram à CCS do BCAV 2922, sediada em Piche, sendo esse Batalhão (e as suas Companhias colocadas em Buruntuma e Canquelifá) substituído pelo BCAÇ 3883, ao qual o autor do livro pertencia, mais propriamente integrando a CCAÇ 3545. Como o autor retrata os mesmos locais e até faz largas referências à fase de 'passagem de testemunho' entre esses dois Batalhões, foi natural ter aparecido nesse convívio.
"Da ficha técnica pode-se retirar que a impressão e acabamentos pertenceram a Coingra, Lda, mas não tem mais indicações a não ser os contactos com o autor que sabemos ser Fernando de Sousa Henriques, ter o telemóvel 919534059 e o endereço de mail
fernando.sousa.henriques@gmail.com , para o caso de algum camarada o quiser contactar.
"O autor foi Alferes Miliciano de Operações Especiais e encontrou-se na Zona Leste no período de 1972-74 sendo que foi testemunha directa do final do conflito pois o regresso só ocorreu em Julho de 1974. É natural do concelho de Estarreja e encontra-se radicado na Ilha de S. Miguel (Açores) onde desenvolve a sua actividade profissional (na Administração Portuária do Porto de Ponta Delgada), colaborando activamente com a ADFA-Açores" (*).
1. Mensagem do Hélder Sousa, ex-Fur Mil de Transmissões TSF (Bissau e Piche, 1970/72)(*):
Caros Editor e Co-Editores
Procurando responder ao apelo feito pelo Luís Graça no sentido de se obterem mais elementos sobre os acontecimentos do Destacamento de Copà(*), aqui envio alguma coisa sobre o que está no tal livro que em tempos comentei, da autoria de Fernando de Sousa Henriques, intitulado No Ocaso da Guerra do Ultramar.
O autor dedica algumas páginas a esse Destacamento (pág 330 a 334), aos seus últimos dias, Destacamento esse que pertencia à Companhia de Pirada e não à sua Companhia, de Canquelifá, mas estava naquela zona entre os limites de acção de uns e outros. Vejamos o que ele conta. Trata-se sem dúvida de relato muito curioso, no mínimo, e que certamente trará mais algumas interrogações, mas está lá no livro!
Copà - Localização geográfica nas coordenadas: 12º 30' Latitude Norte; 13º 55' Longitude Oeste
"A partir da terceira semana de Janeiro de 1974, o IN começou a flagelar, igualmente, um Destacamento que se localizava em Copà, aproximadamente a Noroeste (NW) do nosso aquartelamento, sujeitando-o a fortes bombardeamentos. Esse Destacamento pertencia à Companhia sediada em Pirada, aquele e esta localizadas próximo da fronteira com o Senegal e, respectivamente, nas imediações dos marcos fronteiriços 63 e 68. Devido à sua proximidade do nsso aquartelamento, consideravamo-lo como se de um nosso 'enteado' se tratasse, já que filho não podia ser atendendo à sua cadeia de comando.
"Se com os obuses 14 podíamos e fazíamos o batimento da zona em redor de todo o destacamento de Copà, com os obuses 10,5 só conseguíamos atingir as imediações daquele Destacamento e apenas do lado que ficava mais próximo de nós.
"No dia 31 de Janeiro, como atrás se referiu, dois pelotões da nossa Companhia efectuaram um patrulhamento em direcção ao Marco 61, que envolvia o reconhecimento das imediações da Copà. Assim, seguimos até Cantire, onde inflectimos para Oré Maundé e Orèodé, duas Tabancas recentemente abandonadas, tendo as suas populações sido levadas pelo IN, como denunciavam os vestígios, bem visíoveis, dos roddos das viaturas utilizadas 'nessa limpeza' e que se dirigiam em direcção ao Senegal, detectados num patrulhamento efectuado dias antes. Dali fomos até às imediações de Copà, aproximando-nos daquele aquartelamento por Leste. Voltou a detectar-se, também ali, a existência de múltiplos rodados de diversas viaturas pesadas, bem como o estabelecimento de pequenas trincheiras e, para espanto geral, o abandono de inúmeros cunhetes vazios. Ficámos estupefactos perante tais imagens, pois não contávamos com aquele 'estendal todo' no meio da mata. O IN estivera ali em força, estabelecendo os seus morteiros (82 e 120) a Noroeste daquele e a uma distância de uns 3 km do mesmo, sem ter a mínima preocupação de eliminar vestígios da sua presença no local. Após termos procedido a um reconhecimento daquela área onde o IN estivera instalado, precisamente fora do alcance dos obuses 10,5, rumámos em direcção a Canquelifá, já que não estava previsto qualquer contacto com o pessoal daquele aquartelamento.
"A partir do início de Fevereiro, esse destacamento passou a estar sujeito a fogo de morteiro de 120 mm, com intensidade variável, mas algumas das vezes até inusitada. Através das comunicações via rádio comunicávamos com aquela força para inferirmos da sua situação. O Furriel, comandante daquele Destacamento, e o próprio responsável pelas transmissões, de início ainda gracejavam, referindo-se aos ataques como se de jogos de futebol se tratassem e dizendo que só levavam golos, sem conseguirem marcar nenhum. Não tinham a possibilidade de levantarem a cabeça, quanto mais ripostarem e, ainda por cima, com o quê? Nós, com os nossos obuses 10,5, de má memória, lá íamos, de vez em quando, tentar a nossa sorte nas 'barbas' daquele aquartelamento, mais próximo do nosso, sabendo, de antemão, que só o barulho dos rebentamentos das granadas é que poderia incomodar o IN.
"O IN, como se verá a seguir, aproveitava-se dessa circunstância e desferia sossegadamente e nas calmas os seus ataques. Nós ouvíamos, por vezes, as suas transmissões onde começou a aparecer, cada vez com maior frequência, um linguarejar em espanhol, sinal de que os internacionalistas cubanos também por ali andavam. Normalmente durante a noite, ouvíamos o roncar de viaturas que deviam proceder ao reabastecimento das diferentes posições no terreno ou, então, à mudança das mesmas com transporte de pessoas, armas e munições.
"Esta situação trazia-me preocupado, pois se viessem ao assalto ao nosso Aquartelamento a nossa posição seria débil, no caso de utilizarem viaturas blindadas, de que se ouvia falar, uma vez que só dispunhamos de umas três ou quatro bazucas, usadas, nos patrulhamentos, e sem nenhum pessoal treinado para a luta anti-carro. Os RPG-2 e RPG-7, usados pelo IN, revelavam-se de manejo mais fácil e eficaz.
"Retomando o assunto: Copà passou a ser 'abonado' quase diariamente, com as flagelações a ocorrerem a horas sempre diversas e com durações igualmente variáveis.
"Lá para a segunda quinzena de Fevereiro [***], depois de uns três dias seguidos de assédio forte a Copà e aí a meio de uma tarde, que nunca esqueceremos, foram aparecendo aos poucos e em pequenos grupos, ou isoladamente, os elementos provindos daquele Destacamento. O pessoal vinha todo sujo, camuflado, se existia, em desalinho, arma às costas ou ao ombro, desorientado e de olhar perdido. Enfim, uma lástima.
"Aqui foi uma das outras vezes em que recordei a tal frase muito usada e divulgada, mesmo em cartazes, nos meios militares, que assentava como uma luva perante o cenário que se me apresentava. A frase, já anteriormente citada, rezava assim: 'O Exército é o Espelho da Nação'.
"Mas prosseguindo. Tinham fugido, praticamente aos pares, do Inferno em que Copà se transformara. Primeiro demos-lhes de beber e de comer e depois procurámos saber o que tinha acontecido, embora, antecipadamente, já soubessemos a resposta. Lá fomos sabendo pormenores à medida que foram acalmando. Como todos sabíamos estavam a ser sujeitos a flagelações cerradas, dia após dia, que lhes foi destruindo o aquartelamento e a moral. Não conseguindo aguentar mais, fugiram naquela tarde, depois de terem passado palavra uns aos outros, dirigindo-se desorientados para o nosso aquartelamento que era o que lhes ficava mais próximo. Ainda hoje estou para perceber como é que não foram interceptados pelo IN. Sem o saberem, deixaram para trás o Furriel, o fulano das transmissões e não sei se mais alguém. Aquilo era deserção. Confrontados com a idéia de regresso, diziam que preferiam ser mortos.
"Entretanto, recebíamos uma mensagem, de que não posso precisar a origem, adiantando-nos que, na manhã do dia seguinte, ir-se-ia proceder à desactivação daquele Destacamento, sendo dali retirada a sua guarnição, sendo que em tal operação estariam envolvidas as unidades de pára-quedistas. Foi um fim de dia agitado. O Capitão Cristo a confirmar essa Operação de resgate e a reunir-se com alguns dos nossos Milícias no sentido de se arranjar uns dois ou três elementos, entre População e Milícias, que conhecessem bem aquela parte da região, para servirem de guias e levarem de volta aqueles elementos transviados que nos tinham ali caído inusitadamente. Paralelamente, os Alferes e Furriéis falavam com os mesmos no sentido de os convencer a regressarem à procedência, em face das novas notícias. Duas tarefas que não se revelaram tão fáceis como poderia parecer. Foi tudo muito estudado e planeado para se ter êxito no que se pretendia: enfiar no Destacamento sem serem interceptados pelo IN e fazer de conta que os mesmos nem dali tinham saído. Houve certa resistência dos mesmos em regressarem, mas ao cabo de umas horas convenceram-se de que aquela, embora arriscada, operação era o melhor para eles, pois não passavam ali de uns 'miseráveis desertores'.
"Um dos factores de maior peso na mudança de atitude daqueles homens foi o caso de terem abandonado o Furriel e mais um ou dois dos seus camaradas. Esse facto que, inicialmente, desconheciam era o que mais os constrangia, sendo por isso aquele que foi mais vezes utilizado, a par do relativo à desactivação do seu aquartelamento, daí a umas quantas horas. Assim, por volta das 03H30, lá seguiu o grupo de militares com os seus guias. O Capitão não dormiu bem nessa noite, tal como eu. Acho que todos suspirámos de alívio quando os guias regressaram a são e salvo com a 'encomenda entregue', o mesmo voltando a acontecer logo que se teve conhecimento de que a Operação de evacuação de Copà se tinha realizado com êxito.
"Sempre me surpreendeu o IN não ter interceptado os fugitivos, bem como não ter ido ao assalto final do Destacamento. Estava a actuar nas calmas, para além de talvez ignorar o que nele se estava a passar. Sabia que a sua queda era inevitável e uma questão de dias, não precisando de expor os seus homens. Se tivessem ido ao assalto após todas as flagelações efectuadas, acho que apanhariam, praticamente à mão, os nossos Militares, totalmente debilitados quer física, quer psicologicamente que dali só tinham uma saída: a morte.
"Para o Furriel e os seus dois ou três acompanhantes, que junto dele sempre se mantiveram, aqui fica exarado um voto de louvor.
"Mais sós ficámos, já que o nosso 'enteado' nos tinha abandonado, deixando mais uma parcela de território para nos 'estendermos', em comunhão com o IN.
"E assim reza a História sobre o final de um Destacamento em terras-do-fim-do-mundo: O Destacamento de Copà. Muito resistiu, embora passivamente, por não ter a mínima chance de ripostar."
_______
Nota de H.S.:
O Capitão Cristo referido no texto acima era o Cap Mil Fernando Peixinho de Cristo, Comandante da Companhia, CCAÇ 3545, colocada em Canquelifá e pertencente ao BCAÇ 3883 e à qual pertenceu o autor do texto inserto no livro também acima identificado, o então Alf Mil Op Esp Fernando de Sousa Henriques.
_________
Notas de L.G.:
(*) Vd. poste de 10 de Novembro de 2008 >Guiné 63/74 - P3430: Bibliografia de uma guerra (36): No ocaso da Guerra do Ultramar, de Fernando Sousa Henriques. (Helder Sousa)
Sobre o autor e o livro, vd. também o artigo, publicado no Diário dos Açores, 9/11/2007 > "No Ocaso da Guerra do Ultramar" relata uma vivência militar na Guiné, por Vera Borges
(...) "Em declarações ao Diário dos Açores, Fernando de Sousa Henriques qualifica o seu trabalho como sendo um livro 'de factos, de vivências, sentimentos e simbolismo, de grande interesse histórico'.
(...) "Repleto de ilustrações, o título do livro No Ocaso da Guerra do Ultramar, remete-nos para um significado: 'os últimos dias da Guerra do Ultramar' (...).
"O livro procura retratar 'como se vivia e se passava na Zona Leste da Guiné, com fronteiras com o Senegal e a Guiné-Conacri, entre 1972-74, num período em que o IN (Inimigo) incrementava aí a sua actividade, procurando levar a cabo a denominada Limpeza do Leste que, a concretizar-se, aumentaria consideravelmente as chamadas Zonas Libertas, permitindo-lhe maior notoriedade e projecção a nível Internacional e um eventual assento na ONU', ressalva o autor.
"Por outro lado, Fernando de Sousa Henriques pretende transmitir ao leitor o período de 'sufoco vivido pelas nossas tropas (NT), perante o cada vez maior poder ofensivo que o IN continuadamente vinha a apresentar, contando mesmo com elementos internacionalistas a integrarem já as suas fileiras'.
(...) "Esta é a segunda obra publicada de Fernando de Sousa Henriques, a primeira tem como título: Um Icebergue Chamado 25 de Abril. 'A Revolução dos Cravos' foi vivida à distância pelo autor, porque nesta altura se encontrava no Ultramar, tendo este acontecimento histórico sido decisivo para o término da guerra colonial.
"Fernando de Sousa Henriques formou-se, no Porto, em Química, e, posteriormente, em Electrotecnia. Em São Miguel seguiu um percurso profissional muito diferenciado, tendo percorrido áreas como as do Ensino Técnico, desenvolvido trabalhos diversos, em especial a nível de Projecto e Fiscalização, no âmbito da sua Formação Profissional, com relevância para a Engenharia Electrotécnica, passando por Empresas como a Mobil Oil Portuguesa e os CTT. Em 1989 assumiu o cargo de Engenheiro-adjunto da Junta Autónoma do Porto de Ponta Delgada".
(**) Vd. postes de:
26 de Janeiro de 2009 >Guiné 63/74 - P3795: Copá, abandonado em 14/2/1974 (José Martins) (1): O princípio do fim, a história do Soldado António Rodrigues
e
26 de Janeiro de 2009 >Guiné 63/74 - P3797: Copá, abandonado em 14/2/1974 (José Martins) (2): Unidades de intervenção no subsector de Bajocunda
(***) Deve ser primeira quinzena de Fevereiro de 1974, já que oficialmente o destacamento terá sido abandonado a 14/2/74.
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
quarta-feira, 28 de janeiro de 2009
terça-feira, 27 de janeiro de 2009
Guiné 63/74 - P3808: Estórias cabralianas (44): O amoroso bando das quatro não deixou só saudades... (Jorge Cabral)
1. Mensagem do Jorge Cabral:
Caros Amigos, hesitei muito em mandar mais uma estória. Ainda por cima sobre esquentamentos... Mas que raio de ex-combatente sou eu, que não falo da guerra? Pergunto-me, às vezes, se lá estive? Parece que sim. Um ano em Fá, outro em Missirá (acreditem, o mesmo do Beja Santos...), doze dias em Bambadinca, e dezoito na Ponte do Rio Undunduma. Conheci muito pouco e sempre de passagem. Enxalé, Xime, Mansambo e Xitole, de partida para operações. De Bafatá, o Teófilo e as Libanesas, mais umas damas simpáticas que trabalhavam na horizontal... à entrada da cidade. Não transitei por Bolama. Nem tive I.A.O. De rendição individual passei em quinze dias dos cafés da Av. de Roma para a Ponte do Rio Undunduma...
Confesso que nunca percebi muito da guerra... Fui apenas um simples Alferes de Mato, que comandou Destacamentos e alinhou em todas as operações para as quais o Pel Caç Nat 63 foi escalado. Mas se não percebi então, hoje ainda percebo menos... Estou porém agora a tentar aprender no Blogue!
Abraço Grande. Jorge Cabral
2. Estórias cabralianas (44) > As Trombas do Lopes
por Jorge Cabral
O Amoroso Bando das Quatro deixou-nos muitas saudades. Mas que noite agradável ... até sonhámos com elas. Só que ainda nem três dias haviam passado, já recebíamos tratamento à fortíssima infecção que nos atingira o dito e adjacências. Graças à Penicilina, o caso seria em breve esquecido, pois afinal tinham sido apenas ossos do ofício, os quais segundo alguns até mereceram a pena... Porém, e estranhamente, os sintomas começaram a surgir nos africanos, soldados e milícias, os quais não tinham usufruído da benesse.
Só então o Alfero ficou preocupado. Ora se nos mandam agora numa operação!
Que vergonha! Avançaremos de pernas abertas como se fossemos da Cavalaria no tempo dos cavalos?
Mas como é que a moléstia teria chegado aos Africanos? Mesmo sem poder contar com o investigador Nanque que continuava preso em Bambadinca, o Alfero acabou por descobrir. Reconstituída a noite do Amor, constatou que as damas se tinham ausentado durante meia hora para comer. Fora, então.
E quem? Óbvio suspeito, Preto Turbado, soldado Bijagó, de quem se dizia, que às vezes aliviava os maridos fulas do débito conjugal. Chamado, confessou. Naquela noite oferecera às visitantes a bianda, e à sobremesa... acontecera. Depois contagiara algumas das mulheres dos militares, as quais por sua vez, contaminaram os fidelíssimos maridos...
O assunto era grave. Que fazer perante aquela verdadeira pandemia? Como tratar as mulheres e ao mesmo tempo dissipar as dúvidas sobre o seu comportamento sexual?
Naquele tempo e para aquele Alfero, tudo era possível. Resolveu reunir todos os africanos, soldados, milícias e respectivas mulheres, proibindo os brancos de assistirem, com uma única excepção – o enfermeiro Alpiarça.
E a todos, pregou o mais absurdo discurso da sua vida. Ainda hoje se lembra dos olhos esbugalhados do Alpiarça... Falou de gonococos trazidos pelo vento, das infecções do útero e das trompas de Falópio... Tratamento imediato, frisou, e nada de mezinhas. Claro que perceberam muito pouco, mas ficou com a certeza que no futuro se protegeriam do vento Blenorrágico...
Na semana seguinte, encontrava-se no bar de oficiais em Bambadinca. Conversava e bebia o seu quarto uísque, quando o foram chamar para ir ao Posto de Socorros. Lá foi. Médico, Furriel e Cabo rodeavam um casal de Missirá, o Milícia Suma Jau e a mulher. Não os percebiam. Eles queixavam-se das... “Trombas do Lopes”.
O Alfero ouviu e muito sério informou:
- É fula, quer dizer, esquentamento.
Parece que o Furriel apontou no seu caderno de sinónimos...
Jorge Cabral
__________
Notas de vb:
1. Jorge Cabral foi, como Alferes Mil., comandante do Pel Caç Nat 63 em Fá Mandinga e Missirá, Bambadinca, entre 1969/71. É actualmente especialista em direito criminal.
2. Último artigo da série em
6 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3572: Estórias cabralianas (43): O super-periquito e as vacas sagradas (Jorge Cabral)
Vd. também o poste de 24 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1696: Estórias cabralianas (21): O Amoroso Bando das Quatro em Missirá (Jorge Cabral)
Nos Destacamentos em que vivi, todos eram bem recebidos, à boa maneira da gente da Guiné, cuja cativante hospitalidade foi muitas vezes confundida com subserviência ou portuguesismo. Djilas, batoteiros profissionais, artesãos, doentes, feiticeiros, alcoviteiros, parentes dos soldados, visitavam o aquartelamento e às vezes ali permaneciam, fazendo negócios, combinando casamentos, tratando-se ou tratando, ou simplesmente descansando. Desconfio mesmo que alguns guerrilheiros terão passado férias em Missirá (...)
Caros Amigos, hesitei muito em mandar mais uma estória. Ainda por cima sobre esquentamentos... Mas que raio de ex-combatente sou eu, que não falo da guerra? Pergunto-me, às vezes, se lá estive? Parece que sim. Um ano em Fá, outro em Missirá (acreditem, o mesmo do Beja Santos...), doze dias em Bambadinca, e dezoito na Ponte do Rio Undunduma. Conheci muito pouco e sempre de passagem. Enxalé, Xime, Mansambo e Xitole, de partida para operações. De Bafatá, o Teófilo e as Libanesas, mais umas damas simpáticas que trabalhavam na horizontal... à entrada da cidade. Não transitei por Bolama. Nem tive I.A.O. De rendição individual passei em quinze dias dos cafés da Av. de Roma para a Ponte do Rio Undunduma...
Confesso que nunca percebi muito da guerra... Fui apenas um simples Alferes de Mato, que comandou Destacamentos e alinhou em todas as operações para as quais o Pel Caç Nat 63 foi escalado. Mas se não percebi então, hoje ainda percebo menos... Estou porém agora a tentar aprender no Blogue!
Abraço Grande. Jorge Cabral
2. Estórias cabralianas (44) > As Trombas do Lopes
por Jorge Cabral
O Amoroso Bando das Quatro deixou-nos muitas saudades. Mas que noite agradável ... até sonhámos com elas. Só que ainda nem três dias haviam passado, já recebíamos tratamento à fortíssima infecção que nos atingira o dito e adjacências. Graças à Penicilina, o caso seria em breve esquecido, pois afinal tinham sido apenas ossos do ofício, os quais segundo alguns até mereceram a pena... Porém, e estranhamente, os sintomas começaram a surgir nos africanos, soldados e milícias, os quais não tinham usufruído da benesse.
Só então o Alfero ficou preocupado. Ora se nos mandam agora numa operação!
Que vergonha! Avançaremos de pernas abertas como se fossemos da Cavalaria no tempo dos cavalos?
Mas como é que a moléstia teria chegado aos Africanos? Mesmo sem poder contar com o investigador Nanque que continuava preso em Bambadinca, o Alfero acabou por descobrir. Reconstituída a noite do Amor, constatou que as damas se tinham ausentado durante meia hora para comer. Fora, então.
E quem? Óbvio suspeito, Preto Turbado, soldado Bijagó, de quem se dizia, que às vezes aliviava os maridos fulas do débito conjugal. Chamado, confessou. Naquela noite oferecera às visitantes a bianda, e à sobremesa... acontecera. Depois contagiara algumas das mulheres dos militares, as quais por sua vez, contaminaram os fidelíssimos maridos...
O assunto era grave. Que fazer perante aquela verdadeira pandemia? Como tratar as mulheres e ao mesmo tempo dissipar as dúvidas sobre o seu comportamento sexual?
Naquele tempo e para aquele Alfero, tudo era possível. Resolveu reunir todos os africanos, soldados, milícias e respectivas mulheres, proibindo os brancos de assistirem, com uma única excepção – o enfermeiro Alpiarça.
E a todos, pregou o mais absurdo discurso da sua vida. Ainda hoje se lembra dos olhos esbugalhados do Alpiarça... Falou de gonococos trazidos pelo vento, das infecções do útero e das trompas de Falópio... Tratamento imediato, frisou, e nada de mezinhas. Claro que perceberam muito pouco, mas ficou com a certeza que no futuro se protegeriam do vento Blenorrágico...
Na semana seguinte, encontrava-se no bar de oficiais em Bambadinca. Conversava e bebia o seu quarto uísque, quando o foram chamar para ir ao Posto de Socorros. Lá foi. Médico, Furriel e Cabo rodeavam um casal de Missirá, o Milícia Suma Jau e a mulher. Não os percebiam. Eles queixavam-se das... “Trombas do Lopes”.
O Alfero ouviu e muito sério informou:
- É fula, quer dizer, esquentamento.
Parece que o Furriel apontou no seu caderno de sinónimos...
Jorge Cabral
__________
Notas de vb:
1. Jorge Cabral foi, como Alferes Mil., comandante do Pel Caç Nat 63 em Fá Mandinga e Missirá, Bambadinca, entre 1969/71. É actualmente especialista em direito criminal.
2. Último artigo da série em
6 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3572: Estórias cabralianas (43): O super-periquito e as vacas sagradas (Jorge Cabral)
Vd. também o poste de 24 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1696: Estórias cabralianas (21): O Amoroso Bando das Quatro em Missirá (Jorge Cabral)
Nos Destacamentos em que vivi, todos eram bem recebidos, à boa maneira da gente da Guiné, cuja cativante hospitalidade foi muitas vezes confundida com subserviência ou portuguesismo. Djilas, batoteiros profissionais, artesãos, doentes, feiticeiros, alcoviteiros, parentes dos soldados, visitavam o aquartelamento e às vezes ali permaneciam, fazendo negócios, combinando casamentos, tratando-se ou tratando, ou simplesmente descansando. Desconfio mesmo que alguns guerrilheiros terão passado férias em Missirá (...)
Guiné 63/74 - P3807: Fauna & flora (17): O macaco das Transmissões do Xime (Sousa de Castro)
1. Mensagem do nosso tertuliano n.º 2, Sousa de Castro, ex-1.º Cabo Radiotelegrafista da CART 3494/BART 3873, Xime e Mansambo, 1971/74, com data de 21 de Janeiro de 2009:
Conforme se pode ver nesta foto, também nós CART 3494, Xime, 71/74, tivemos durante algum tempo como mascote um macaco. Como devem calcular, não conheço qual o tipo de raça que ele pertencia.
Era conhecido por macaco das TRMS
Ab
Sousa de Castro
__________
Nota de CV:
Vd. último poste da série de 25 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3793: Fauna & flora (16): Relações amistosas com o Macaco-cão na zona de Cufar (Mário Fitas)
Conforme se pode ver nesta foto, também nós CART 3494, Xime, 71/74, tivemos durante algum tempo como mascote um macaco. Como devem calcular, não conheço qual o tipo de raça que ele pertencia.
Era conhecido por macaco das TRMS
Ab
Sousa de Castro
__________
Nota de CV:
Vd. último poste da série de 25 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3793: Fauna & flora (16): Relações amistosas com o Macaco-cão na zona de Cufar (Mário Fitas)
Guiné 63/74 - P3806: Páginas Negras com Salpicos Cor-de-Rosa (Rui Silva) (2): Golpe-de-mão a Morés (Op Castor)
1. Mensagem de Rui Silva, ex-Fur Mil da CCAÇ 816, Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67, com data de 20 de Janeiro de 2009:
Um abraço para ti Luís, extensivo ao Vinhal e ao Briote com votos de muita saúde e de muito entusiasmo no nosso "Blogue".
Para todos os demais (ex-Combatentes da Guiné),… a mesma coisa.
Rui Silva
Golpe-de-mão a Morés
A 816 faz golpe-de-mão à Base inimiga de MORÉS
20 de Fevereiro de 1966
Operação denominada “CASTOR”
A base inimiga de Morés era considerada a mais forte do Oio, senão a principal do Norte da Guiné.
Sabia-se que para além de uma grande fortificação inclusivé com abrigos em cimento, subterrâneos e à superfície, estes providos de metralhadora pesada, tinha ainda um Hospital que servia toda aquela região, mais ainda uma arrecadação com muito e diverso material, do melhor equipamento e que funcionava como uma central, pois abastecia os refúgios inimigos daquela larga zona, o Oio. Sabia-se também que a base estava situada estrategicamente envolta numa densa e inexpugnável mata, deste modo assim bem dissimulada e de aproximação difícil para as NT, onde não faltavam sentinelas em pontos estratégicos e a vigiarem todos os acessos possíveis.
Enfim missão, quase, impossível.
Das minhas memórias Páginas negras com salpicos cor-de-rosa
…Era já tardinha. Tudo decorria com a serenidade e dentro dos hábitos habituais, uns jogando à bola, outros dormitando ou conversando à porta das messes ou da cantina, a lembrar os Saloons do Oeste americano, outros ainda entretidos com o dominó, ou damas ou cartas.
Abanando a monotonia alguém faz correr que o Capitão queria que toda a Companhia se reunisse dentro de 10 minutos na cantina dos soldados. De que se trata?. Nunca tal aconteceu!, diz este ou aquele. Começamos a interrogarmo-nos. Logo se verá, concluiu-se.
A malta converge então toda para a cantina e logo se formam pequenos grupos nesta, fazendo conjecturas, cochichando sobre que diabo se iria passar. O Capitão entrou e depois de se certificar que não faltava ninguém, e não conseguindo disfarçar um certo nervosismo e apreensão, o que não passou despercebido a ninguém e o que nos fez estranhar logo, e adivinhar que algo de muito especial ia se dar.
Começou a falar e disse mais ou menos o seguinte:
- Meus amigos, vamos fazer uma operação a Morés.
Aqui houve uma leve agitação na malta com alguns murmúrios à mistura. O Capitão fez uma pequena pausa como que para observar o efeito das suas palavras, e prossegue:
- A nossa missão consiste em irmos pelo menos à arrecadação dos tipos que está afastada da casa-de-mato, um pedaço. Aqui viu-se que as últimas palavras vieram por excesso, com o intuito de sossegar um bocado os espíritos.
- Aí temos nós que ir. A ordem é essa e custe o que custar. Como vós sabeis, da última vez que lá fomos retrocedemos sem fazermos o planeado e então as ordens agora são de ir e ir mesmo. A malta vai, a coisa está muito bem estudada, e ninguém abandona ninguém. - Aqui referia-se a feridos ou mortos.
- A Companhia vai toda e vem toda. - Levantou ele a voz.
O Capitão falava assim e como se costuma dizer olhos nos olhos. Não se furtou a dizer de os perigos que a malta iria por certo enfrentar, as potencialidades do inimigo naquela Base, etc., etc.
E assim ficamos todos ao corrente da situação em toda a sua dimensão. Mais adiante, acrescenta:
- Na arrecadação, eles têm grande quantidade de material e se tivermos a sorte de capturarmos esse mesmo material, provocamos-lhes um desfalcamento enorme. Temos a informação que a arrecadação está guardada por cerca de 25 homens cuja arma de maior efeito é a bazooka. Ora, como nós somos uma Companhia completa, enfrentamos bem esses 25 homens. Se a coisa aqui resultar, vamos ainda depois ao hospital dos tipos que fica 500 metros adiante e que também fica afastado da casa-de-mato. Portanto à arrecadação temos nós que ir, pois temos um guia que nos leva lá e que, mais, sabe a posição dos sentinelas, o que nos vai permitir evitá-los. Daí para a frente tudo depende como decorrer os acontecimentos.
De seguida falou do dispositivo a adoptar:
- A nossa Companhia vai à frente seguida da 1418. Esta, a umas centenas de metros do objectivo estaciona e faz a segurança nas nossas costas. Uma outra Companhia, a 1481, que vem de Bissau, vai servir de isco, actuando na zona do lado oposto ao nosso. Assim, enquanto a 1481 procura atrair sobre si a atenção dos tipos, nós pelo lado oposto assaltamos a arrecadação, quando muito com a oposição dos tais 25 homens.
Marcou-se a hora da saída pois o início da operação tinha lugar naquela mesma noite. O Capitão disse mais qualquer coisa de reduzido interesse e a reunião acabou dispersando então o pessoal.
Os dados estavam lançados.
O ir a Morés, o ir à arrecadação custe o que custar e haja o que houver, pois esta era a ordem peremptória do Batalhão, e a maneira nervosa, que a ninguém passou despercebida como o Capitão falou, o que nele não era habitual, tudo isto logo se reflectiu no espírito da malta provocando uma onda de receio como nunca. Cá fora, entre nós Furriéis, ao comentarmos a odisseia e a forma peremptória como foi posta, chegamos à conclusão que isto era nem mais nem menos como uma represália do Batalhão por da última vez que fomos a Morés, como atrás contei (nas “Memórias”), não termos cumprido a missão a contento daquele, cujo seu Estado-Maior se fazia transportar, lá bem no alto, ao abrigo de qualquer surpresa, numa Dornier. Era então o PCA (Posto de Comando Aéreo).
Lembro que este chegou mesmo a dar ordem peremptória de avanço (eu estava junto ao rádio, este nas mãos do Alferes Costa, comandante da operação na altura) a 2 Pelotões da 816 para enfrentarem a base quando esta estava já preparadíssima para nos receber, pois tínhamos sido detectados bem cedo graças aos avanços e recuos do então guia e isto mesmo após a Companhia que nos fazia o apoio ter recusado continuar naquela operação agora suicida.
Após algum diálogo exasperado com o Comandante do efectivo da 816, na circunstância e como disse o Alferes Costa, o PCA fortemente contrariado acabou por mandar-nos recuar.
Custe o que custar, haja feridos haja mortos, temos que lá ir, estas palavras do Capitão enraizaram no espírito da malta.
- Se dá para o torto, ainda lá ficamos todos, disse alguém mais pessimista.
Tínhamos agora um guia da máxima confiança, conhecedor de todo o terreno de Morés e também das instalações inimigas, assim como das exactas posições dos sentinelas. Sabíamos que na 816 tínhamos pessoal de rara coragem e determinação, capaz de enfrentar as maiores vicissitudes desta guerra. O efectivo das nossas tropas também era grande (lembro a 816 completa mais a 1418 no apoio e segurança de cobertura, e do lado oposto a 1481 todas no mesmo objectivo) e assim teríamos boas possibilidades de êxito. Os prós e os contras equilibravam os pratos da balança. Alguém falou que na hipótese de irmos ao hospital, apanhávamos a enfermeira branca que lá trabalhava e então isto servia de incentivo para alguns, nomeadamente para o Zé Baião que, claro, tratando-se do sexo fraco a disposição era logo outra. No entanto esta história da enfermeira branca, ainda que houvesse quem o afiançasse, que sim, que de facto era verdade, nós víamos nisto, antes, um golpe de efeito psicológico.
Embora eu assistisse à dita reunião, como os demais operacionais, e vivesse tudo aquilo, não fui à operação, ao contrário da antecedente e que falo atrás. O Alferes Costa, agora na qualidade de Comandante de Pelotão, entendeu, junto de mim, que eu não fosse, pois estava com o meu joelho direito inchado e mancava em virtude de um acidente no aquartelamento.
Tinha havido o máximo segredo com a operação. Nós, os Furriéis, só soubemos quando também o souberam os soldados, e como já se sabe na dita reunião da Cantina umas horas antes do seu início. Ao que soube, os próprios Comandantes de Pelotão, foi pouco antes daquela, que tomaram também conhecimento, mas, o Capitão, já o sabia há alguns dias e então, por o Braga, que era o seu impedido, soubemos depois que ele há três dias que não comia nada, que só bebia sumos, e que denotava muito nervosismo.
De facto, o Capitão mostrava-se um pouco abatido e pálido. Logo concluímos da dureza da missão que ia ser levada a efeito pela 816 e que a rígida imposição do Batalhão marcaria o Capitão a partir da altura de que dela teve conhecimento.
A Companhia estava, de uma maneira geral, apreensiva. Que diabo, apesar de tudo nunca tínhamos ouvido falar que uma operação se tinha de fazer custasse o que custasse e houvesse as baixas que houvesse. Os menos corajosos lamentavam então a sua desdita. Uns lembravam as suas mulheres e os seus filhos, quem a tinha e os tinha, outros vaticinavam que não se safariam e outros julgavam que esta odisseia ia custar, por certo, caro à Companhia. Confesso que nunca vi a Companhia assim, e, na verdade, embora eu não fosse, comungava dos desabafos e das apreensões da malta então operacional.
À hora combinada, a coluna estava formada como sempre entre as messes dos Oficiais e dos Sargentos e pertinho do cavalo-de-frisa da entrada nascente do aquartelamento - lado Farim - O pessoal começou então a andar e a operação iniciou-se. A fila indiana serpenteou no mato e desapareceu silenciosamente na obscuridade da noite.
Na maioria daqueles rostos, lia-se, de uma forma bem vincada, a preocupação e o receio de tal aventura. Vi-os partir e instintivamente pedi a Deus que estivesse com eles. Os que ficaram, tarde se foram deitar. Embora não alinhássemos, estávamos demasiados excitados para que conseguíssemos dormir. Cedo, logo ao alvorecer, tentamos saber algo pelo rádio.
Entretanto, para reforçar a segurança do quartel, tinha vindo para Olossato um Pelotão de uma outra Companhia.
Foi então junto do Alferes desse Pelotão que tinha na altura um rádio na mão, a tentar escutar algo sobre a operação que se foi sabendo dos acontecimentos em Morés. Fomos sabendo então que a Companhia tinha chegado à arrecadação sem qualquer resistência inimiga e que já estavam em poder dela, tratando da recolha do material. Foram pedidos 6 (!) helicópteros para transportar o material, que era muito, para Olossato. Estávamos profundamente entusiasmados e ainda mais, admirados com tanta facilidade.
- Como é?! Foi chegar lá, pegar no material e andar? E deles, nem sombra? Afinal aonde parariam pelo menos aqueles 25 homens que armados de pistolas-metralhadoras e bazooka defendiam a arrecadação?
Ao que se soube estes homens foram reforçar a casa-de-mato para receberem a 1481 que se dirigia para aquela.
Parecia fácil de mais para ser verdadeiro. Mas… era verdadeiro, fantasticamente verdadeiro!!
Passadas algumas horas, para gáudio dos presentes, o primeiro helicóptero poisa na pista de Olossato e de imediato descarrega material bélico inimigo. Logo partiu para buscar mais e, num vai-e-vem constante, 2 ou 3 helicópteros fizeram a recolha da maior parte do material. Fantástico! Que grande êxito! Mas… a Companhia ainda lá está! Ainda muito pode acontecer. Nós sabíamos bem o que era o regresso depois de um ataque a uma casa-de-mato e logo à de Mores. Está cá o armamento, mas ainda não está cá a malta. Eram estas as palavras ditas ou que estavam no pensamento da reduzida malta que naquela altura estava na pista. O tempo passa-se e receia-se pela integridade da nossa malta. Era impossível não haver recontro…
Mas, ao meio da tarde, eis que começam a chegar os nossos homens, os nossos heróis. Um, a seguir outro, outro mais, vêm espaçados, extenuados, abatidos físicamente, mas com um sorriso de satisfação e sobretudo de orgulho. Alegria a rodos, abraços, lágrimas nos olhos pela felicidade do reencontro de toda a família 816.
Soubemos então, que, quando as duas Companhias, a 816 e a 1418 já estavam de novo juntas no regresso a Olossato, surgira uma enérgica emboscada. Mas aí já eram cerca de 250 homens a responder ao fogo inimigo. A potencialidade das duas Companhias, impregnadas do maior entusiasmo pelo êxito obtido, gerou tal reacção que o inimigo emboscado logo demandou. Houve ali ligeiros feridos, mas os ferimentos não passaram de um ou outro pequeno estilhaço num braço ou numa perna.
A missão tinha sido plenamente cumprida. O objectivo, o objectivo principal, imediato e obrigatório, era o assalto à arrecadação e essa então tinha sido despojada de tudo e posteriormente arrasada.
Então, pelo tardio da hora e por fadiga do pessoal, tanto física como psicológica - lembra-se que o grupo saiu do Olossato para uma missão muito temerosa -, e por então o inimigo que tinha sido apanhado desprevenido - louve-se aqui a táctica da nossa tropa - entretanto se ter reagrupado com grande número de homens, a 816 não passou ao hipotético 2.º objectivo, que seria o ir ao hospital, embora não faltasse quem quisesse lá ir.
Cerca de 3 toneladas de material bélico estava ali espalhado no pequeno campo de futebol contíguo à messe dos Oficiais.
Entre o material destacava-se uma metralhadora anti-aérea que era e pelo que se dizia o ai Jesus do Capitão.
Destacava-se ainda um morteiro de calibre 82, que teria sido o primeiro de tal calibre a ser capturado na guerra na Guiné, até então. Também 2 metralhadoras MG 42, uma metralhadora pesada Breda, pistolas-metralhadoras de vários calibres e tipos, pistolas de sinais, cargas de trotil para armadilhas e outros rebentamentos, dezenas de metros de fita com cartuchos para a metralhadora anti-aérea, uma série de canos de reserva também para esta, minas antipessoal e anticarro, macas para transporte de feridos, centenas de cartuchos de vários calibres e outras coisas mais estavam ali no nosso quartel aprisionadas de fresco ao inimigo e também muitos livros e cadernos de essência didáctico-escolar, estes a provocar alguma emoção contemporizadora.
GRANDE FEITO!! A malta rejubilava. À fisionomia céptica, de expressão fechada e apreensiva da véspera, antes da saída para a operação Morés, sobrepôs-se uma fisionomia de desmedida e incontida alegria. Aquele dia tinha sido e seria o maior dia da 816 e porventura o mais profícuo de todas as forças armadas na Guiné, até então.
A Companhia vinda de Bissau – a 1418 - teve também um papel preponderante, pois ao servir de isco - como se dizia na gíria militar - a muito se arriscou ao fazer incidir sobre si as atenções do inimigo. Como a missão deles era só de se mostrarem, evitaram óbvia e convenientemente as emboscadas em série que para eles estavam reservadas e o que se soube na altura pela aviação que acompanhou a operação. A 1419 também fez jus ao êxito, pois, aquando da emboscada no regresso, teve um comportamento deveras notável. Aquilo parecia inacreditável. Apenas uma emboscada, aí de uns 10 minutos, já bem depois do material em nosso poder, e… nada mais.
Feito memorável que, como atrás se já disse, logo teve lugar em todos os noticiários, quer da Guiné, quer, e sobretudo, na Metrópole. A televisão referiu-se de forma saliente.
A imprensa através de jornais e de revistas também referenciaram o feito de forma bem vincada. Ainda hoje guardo a folha da revista Flama (n.º 941 de 18 de Março de 1966) que se referiu ao acontecimento dispensando-lhe toda uma página.
O êxito da operação deve-se em grande parte à táctica usada. O papel da 1418 ao servir de isco foi preponderante. Mostrou-se, foi detectada pela inimigo e então este convergiu para o trajecto daquela. Soubemos que esta Companhia se continuasse a avançar, o que até não era preciso, tinha já 7 (sete) emboscadas inimigas já montadas.
A 816 fora ali então compensada de tão duro e árduo trabalho que há meses o vinha fazendo sem resultados que se pudessem chamar de francamente positivos.
Ao outro dia, logo pela manhã, esteve no Olossato todo o Estado-Maior do Batalhão. Esteve também, numa presença que muito nos honrou, o Comandante-Chefe das Forças Armadas na Guiné, que compartilhou de toda aquela alegria e satisfação.
As mulheres indígenas engalanaram-se de roupas e pinturas e vieram fazer ronco, que grande ronco (!), dançando pulando e gritando na sua forma típica e étnica entre as messes dos Oficiais e a dos Sargentos. Olossato todo ele vibrou!
O material apreendido ao inimigo foi fotografado, foi filmado, a malta também tirou fotos junto a ele para ficar com uma recordação, recordação essa que por certo se imortalizará por o tempo fora.
Voltaríamos a Morés mais tarde…
__________
Nota de CV:
Vd. último poste da série de 31 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3383: Páginas Negras com Salpicos Cor-de-Rosa (Rui Silva) (1): A terrível estrada do K3: 1 de Agosto de 1965, o Dia Mais Longo
Um abraço para ti Luís, extensivo ao Vinhal e ao Briote com votos de muita saúde e de muito entusiasmo no nosso "Blogue".
Para todos os demais (ex-Combatentes da Guiné),… a mesma coisa.
Rui Silva
Golpe-de-mão a Morés
A 816 faz golpe-de-mão à Base inimiga de MORÉS
20 de Fevereiro de 1966
Operação denominada “CASTOR”
A base inimiga de Morés era considerada a mais forte do Oio, senão a principal do Norte da Guiné.
Sabia-se que para além de uma grande fortificação inclusivé com abrigos em cimento, subterrâneos e à superfície, estes providos de metralhadora pesada, tinha ainda um Hospital que servia toda aquela região, mais ainda uma arrecadação com muito e diverso material, do melhor equipamento e que funcionava como uma central, pois abastecia os refúgios inimigos daquela larga zona, o Oio. Sabia-se também que a base estava situada estrategicamente envolta numa densa e inexpugnável mata, deste modo assim bem dissimulada e de aproximação difícil para as NT, onde não faltavam sentinelas em pontos estratégicos e a vigiarem todos os acessos possíveis.
Enfim missão, quase, impossível.
Das minhas memórias Páginas negras com salpicos cor-de-rosa
…Era já tardinha. Tudo decorria com a serenidade e dentro dos hábitos habituais, uns jogando à bola, outros dormitando ou conversando à porta das messes ou da cantina, a lembrar os Saloons do Oeste americano, outros ainda entretidos com o dominó, ou damas ou cartas.
Abanando a monotonia alguém faz correr que o Capitão queria que toda a Companhia se reunisse dentro de 10 minutos na cantina dos soldados. De que se trata?. Nunca tal aconteceu!, diz este ou aquele. Começamos a interrogarmo-nos. Logo se verá, concluiu-se.
A malta converge então toda para a cantina e logo se formam pequenos grupos nesta, fazendo conjecturas, cochichando sobre que diabo se iria passar. O Capitão entrou e depois de se certificar que não faltava ninguém, e não conseguindo disfarçar um certo nervosismo e apreensão, o que não passou despercebido a ninguém e o que nos fez estranhar logo, e adivinhar que algo de muito especial ia se dar.
Começou a falar e disse mais ou menos o seguinte:
- Meus amigos, vamos fazer uma operação a Morés.
Aqui houve uma leve agitação na malta com alguns murmúrios à mistura. O Capitão fez uma pequena pausa como que para observar o efeito das suas palavras, e prossegue:
- A nossa missão consiste em irmos pelo menos à arrecadação dos tipos que está afastada da casa-de-mato, um pedaço. Aqui viu-se que as últimas palavras vieram por excesso, com o intuito de sossegar um bocado os espíritos.
- Aí temos nós que ir. A ordem é essa e custe o que custar. Como vós sabeis, da última vez que lá fomos retrocedemos sem fazermos o planeado e então as ordens agora são de ir e ir mesmo. A malta vai, a coisa está muito bem estudada, e ninguém abandona ninguém. - Aqui referia-se a feridos ou mortos.
- A Companhia vai toda e vem toda. - Levantou ele a voz.
O Capitão falava assim e como se costuma dizer olhos nos olhos. Não se furtou a dizer de os perigos que a malta iria por certo enfrentar, as potencialidades do inimigo naquela Base, etc., etc.
E assim ficamos todos ao corrente da situação em toda a sua dimensão. Mais adiante, acrescenta:
- Na arrecadação, eles têm grande quantidade de material e se tivermos a sorte de capturarmos esse mesmo material, provocamos-lhes um desfalcamento enorme. Temos a informação que a arrecadação está guardada por cerca de 25 homens cuja arma de maior efeito é a bazooka. Ora, como nós somos uma Companhia completa, enfrentamos bem esses 25 homens. Se a coisa aqui resultar, vamos ainda depois ao hospital dos tipos que fica 500 metros adiante e que também fica afastado da casa-de-mato. Portanto à arrecadação temos nós que ir, pois temos um guia que nos leva lá e que, mais, sabe a posição dos sentinelas, o que nos vai permitir evitá-los. Daí para a frente tudo depende como decorrer os acontecimentos.
De seguida falou do dispositivo a adoptar:
- A nossa Companhia vai à frente seguida da 1418. Esta, a umas centenas de metros do objectivo estaciona e faz a segurança nas nossas costas. Uma outra Companhia, a 1481, que vem de Bissau, vai servir de isco, actuando na zona do lado oposto ao nosso. Assim, enquanto a 1481 procura atrair sobre si a atenção dos tipos, nós pelo lado oposto assaltamos a arrecadação, quando muito com a oposição dos tais 25 homens.
Marcou-se a hora da saída pois o início da operação tinha lugar naquela mesma noite. O Capitão disse mais qualquer coisa de reduzido interesse e a reunião acabou dispersando então o pessoal.
Os dados estavam lançados.
O ir a Morés, o ir à arrecadação custe o que custar e haja o que houver, pois esta era a ordem peremptória do Batalhão, e a maneira nervosa, que a ninguém passou despercebida como o Capitão falou, o que nele não era habitual, tudo isto logo se reflectiu no espírito da malta provocando uma onda de receio como nunca. Cá fora, entre nós Furriéis, ao comentarmos a odisseia e a forma peremptória como foi posta, chegamos à conclusão que isto era nem mais nem menos como uma represália do Batalhão por da última vez que fomos a Morés, como atrás contei (nas “Memórias”), não termos cumprido a missão a contento daquele, cujo seu Estado-Maior se fazia transportar, lá bem no alto, ao abrigo de qualquer surpresa, numa Dornier. Era então o PCA (Posto de Comando Aéreo).
Lembro que este chegou mesmo a dar ordem peremptória de avanço (eu estava junto ao rádio, este nas mãos do Alferes Costa, comandante da operação na altura) a 2 Pelotões da 816 para enfrentarem a base quando esta estava já preparadíssima para nos receber, pois tínhamos sido detectados bem cedo graças aos avanços e recuos do então guia e isto mesmo após a Companhia que nos fazia o apoio ter recusado continuar naquela operação agora suicida.
Após algum diálogo exasperado com o Comandante do efectivo da 816, na circunstância e como disse o Alferes Costa, o PCA fortemente contrariado acabou por mandar-nos recuar.
Custe o que custar, haja feridos haja mortos, temos que lá ir, estas palavras do Capitão enraizaram no espírito da malta.
- Se dá para o torto, ainda lá ficamos todos, disse alguém mais pessimista.
Tínhamos agora um guia da máxima confiança, conhecedor de todo o terreno de Morés e também das instalações inimigas, assim como das exactas posições dos sentinelas. Sabíamos que na 816 tínhamos pessoal de rara coragem e determinação, capaz de enfrentar as maiores vicissitudes desta guerra. O efectivo das nossas tropas também era grande (lembro a 816 completa mais a 1418 no apoio e segurança de cobertura, e do lado oposto a 1481 todas no mesmo objectivo) e assim teríamos boas possibilidades de êxito. Os prós e os contras equilibravam os pratos da balança. Alguém falou que na hipótese de irmos ao hospital, apanhávamos a enfermeira branca que lá trabalhava e então isto servia de incentivo para alguns, nomeadamente para o Zé Baião que, claro, tratando-se do sexo fraco a disposição era logo outra. No entanto esta história da enfermeira branca, ainda que houvesse quem o afiançasse, que sim, que de facto era verdade, nós víamos nisto, antes, um golpe de efeito psicológico.
Embora eu assistisse à dita reunião, como os demais operacionais, e vivesse tudo aquilo, não fui à operação, ao contrário da antecedente e que falo atrás. O Alferes Costa, agora na qualidade de Comandante de Pelotão, entendeu, junto de mim, que eu não fosse, pois estava com o meu joelho direito inchado e mancava em virtude de um acidente no aquartelamento.
Tinha havido o máximo segredo com a operação. Nós, os Furriéis, só soubemos quando também o souberam os soldados, e como já se sabe na dita reunião da Cantina umas horas antes do seu início. Ao que soube, os próprios Comandantes de Pelotão, foi pouco antes daquela, que tomaram também conhecimento, mas, o Capitão, já o sabia há alguns dias e então, por o Braga, que era o seu impedido, soubemos depois que ele há três dias que não comia nada, que só bebia sumos, e que denotava muito nervosismo.
De facto, o Capitão mostrava-se um pouco abatido e pálido. Logo concluímos da dureza da missão que ia ser levada a efeito pela 816 e que a rígida imposição do Batalhão marcaria o Capitão a partir da altura de que dela teve conhecimento.
A Companhia estava, de uma maneira geral, apreensiva. Que diabo, apesar de tudo nunca tínhamos ouvido falar que uma operação se tinha de fazer custasse o que custasse e houvesse as baixas que houvesse. Os menos corajosos lamentavam então a sua desdita. Uns lembravam as suas mulheres e os seus filhos, quem a tinha e os tinha, outros vaticinavam que não se safariam e outros julgavam que esta odisseia ia custar, por certo, caro à Companhia. Confesso que nunca vi a Companhia assim, e, na verdade, embora eu não fosse, comungava dos desabafos e das apreensões da malta então operacional.
À hora combinada, a coluna estava formada como sempre entre as messes dos Oficiais e dos Sargentos e pertinho do cavalo-de-frisa da entrada nascente do aquartelamento - lado Farim - O pessoal começou então a andar e a operação iniciou-se. A fila indiana serpenteou no mato e desapareceu silenciosamente na obscuridade da noite.
Na maioria daqueles rostos, lia-se, de uma forma bem vincada, a preocupação e o receio de tal aventura. Vi-os partir e instintivamente pedi a Deus que estivesse com eles. Os que ficaram, tarde se foram deitar. Embora não alinhássemos, estávamos demasiados excitados para que conseguíssemos dormir. Cedo, logo ao alvorecer, tentamos saber algo pelo rádio.
Entretanto, para reforçar a segurança do quartel, tinha vindo para Olossato um Pelotão de uma outra Companhia.
Foi então junto do Alferes desse Pelotão que tinha na altura um rádio na mão, a tentar escutar algo sobre a operação que se foi sabendo dos acontecimentos em Morés. Fomos sabendo então que a Companhia tinha chegado à arrecadação sem qualquer resistência inimiga e que já estavam em poder dela, tratando da recolha do material. Foram pedidos 6 (!) helicópteros para transportar o material, que era muito, para Olossato. Estávamos profundamente entusiasmados e ainda mais, admirados com tanta facilidade.
- Como é?! Foi chegar lá, pegar no material e andar? E deles, nem sombra? Afinal aonde parariam pelo menos aqueles 25 homens que armados de pistolas-metralhadoras e bazooka defendiam a arrecadação?
Ao que se soube estes homens foram reforçar a casa-de-mato para receberem a 1481 que se dirigia para aquela.
Parecia fácil de mais para ser verdadeiro. Mas… era verdadeiro, fantasticamente verdadeiro!!
Passadas algumas horas, para gáudio dos presentes, o primeiro helicóptero poisa na pista de Olossato e de imediato descarrega material bélico inimigo. Logo partiu para buscar mais e, num vai-e-vem constante, 2 ou 3 helicópteros fizeram a recolha da maior parte do material. Fantástico! Que grande êxito! Mas… a Companhia ainda lá está! Ainda muito pode acontecer. Nós sabíamos bem o que era o regresso depois de um ataque a uma casa-de-mato e logo à de Mores. Está cá o armamento, mas ainda não está cá a malta. Eram estas as palavras ditas ou que estavam no pensamento da reduzida malta que naquela altura estava na pista. O tempo passa-se e receia-se pela integridade da nossa malta. Era impossível não haver recontro…
Mas, ao meio da tarde, eis que começam a chegar os nossos homens, os nossos heróis. Um, a seguir outro, outro mais, vêm espaçados, extenuados, abatidos físicamente, mas com um sorriso de satisfação e sobretudo de orgulho. Alegria a rodos, abraços, lágrimas nos olhos pela felicidade do reencontro de toda a família 816.
Soubemos então, que, quando as duas Companhias, a 816 e a 1418 já estavam de novo juntas no regresso a Olossato, surgira uma enérgica emboscada. Mas aí já eram cerca de 250 homens a responder ao fogo inimigo. A potencialidade das duas Companhias, impregnadas do maior entusiasmo pelo êxito obtido, gerou tal reacção que o inimigo emboscado logo demandou. Houve ali ligeiros feridos, mas os ferimentos não passaram de um ou outro pequeno estilhaço num braço ou numa perna.
A missão tinha sido plenamente cumprida. O objectivo, o objectivo principal, imediato e obrigatório, era o assalto à arrecadação e essa então tinha sido despojada de tudo e posteriormente arrasada.
Então, pelo tardio da hora e por fadiga do pessoal, tanto física como psicológica - lembra-se que o grupo saiu do Olossato para uma missão muito temerosa -, e por então o inimigo que tinha sido apanhado desprevenido - louve-se aqui a táctica da nossa tropa - entretanto se ter reagrupado com grande número de homens, a 816 não passou ao hipotético 2.º objectivo, que seria o ir ao hospital, embora não faltasse quem quisesse lá ir.
Cerca de 3 toneladas de material bélico estava ali espalhado no pequeno campo de futebol contíguo à messe dos Oficiais.
Entre o material destacava-se uma metralhadora anti-aérea que era e pelo que se dizia o ai Jesus do Capitão.
Destacava-se ainda um morteiro de calibre 82, que teria sido o primeiro de tal calibre a ser capturado na guerra na Guiné, até então. Também 2 metralhadoras MG 42, uma metralhadora pesada Breda, pistolas-metralhadoras de vários calibres e tipos, pistolas de sinais, cargas de trotil para armadilhas e outros rebentamentos, dezenas de metros de fita com cartuchos para a metralhadora anti-aérea, uma série de canos de reserva também para esta, minas antipessoal e anticarro, macas para transporte de feridos, centenas de cartuchos de vários calibres e outras coisas mais estavam ali no nosso quartel aprisionadas de fresco ao inimigo e também muitos livros e cadernos de essência didáctico-escolar, estes a provocar alguma emoção contemporizadora.
GRANDE FEITO!! A malta rejubilava. À fisionomia céptica, de expressão fechada e apreensiva da véspera, antes da saída para a operação Morés, sobrepôs-se uma fisionomia de desmedida e incontida alegria. Aquele dia tinha sido e seria o maior dia da 816 e porventura o mais profícuo de todas as forças armadas na Guiné, até então.
A Companhia vinda de Bissau – a 1418 - teve também um papel preponderante, pois ao servir de isco - como se dizia na gíria militar - a muito se arriscou ao fazer incidir sobre si as atenções do inimigo. Como a missão deles era só de se mostrarem, evitaram óbvia e convenientemente as emboscadas em série que para eles estavam reservadas e o que se soube na altura pela aviação que acompanhou a operação. A 1419 também fez jus ao êxito, pois, aquando da emboscada no regresso, teve um comportamento deveras notável. Aquilo parecia inacreditável. Apenas uma emboscada, aí de uns 10 minutos, já bem depois do material em nosso poder, e… nada mais.
Feito memorável que, como atrás se já disse, logo teve lugar em todos os noticiários, quer da Guiné, quer, e sobretudo, na Metrópole. A televisão referiu-se de forma saliente.
A imprensa através de jornais e de revistas também referenciaram o feito de forma bem vincada. Ainda hoje guardo a folha da revista Flama (n.º 941 de 18 de Março de 1966) que se referiu ao acontecimento dispensando-lhe toda uma página.
O êxito da operação deve-se em grande parte à táctica usada. O papel da 1418 ao servir de isco foi preponderante. Mostrou-se, foi detectada pela inimigo e então este convergiu para o trajecto daquela. Soubemos que esta Companhia se continuasse a avançar, o que até não era preciso, tinha já 7 (sete) emboscadas inimigas já montadas.
A 816 fora ali então compensada de tão duro e árduo trabalho que há meses o vinha fazendo sem resultados que se pudessem chamar de francamente positivos.
Ao outro dia, logo pela manhã, esteve no Olossato todo o Estado-Maior do Batalhão. Esteve também, numa presença que muito nos honrou, o Comandante-Chefe das Forças Armadas na Guiné, que compartilhou de toda aquela alegria e satisfação.
As mulheres indígenas engalanaram-se de roupas e pinturas e vieram fazer ronco, que grande ronco (!), dançando pulando e gritando na sua forma típica e étnica entre as messes dos Oficiais e a dos Sargentos. Olossato todo ele vibrou!
O material apreendido ao inimigo foi fotografado, foi filmado, a malta também tirou fotos junto a ele para ficar com uma recordação, recordação essa que por certo se imortalizará por o tempo fora.
Voltaríamos a Morés mais tarde…
__________
Nota de CV:
Vd. último poste da série de 31 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3383: Páginas Negras com Salpicos Cor-de-Rosa (Rui Silva) (1): A terrível estrada do K3: 1 de Agosto de 1965, o Dia Mais Longo
Guiné 63/74 - P3805: Não venho falar de mim... nem do meu umbigo (Alberto Branquinho) (18): O doutor não tem um remédio para a guerra?
MÉSINHA ? CÁ TEM!
- “É a guerra aquele monstro que se alimenta das vidas e das fazendas… e até Deus… não está seguro”.
Assim dizia solenemente o médico (tenente miliciano médico) que acabava de chegar, aproximando-se do grupo de oficiais que, em pé, se juntavam à volta de uma mesa, apreciando os jogadores de poker.
- Boa noite, meus senhores guerreiros. – cumprimentou.
Não obteve resposta.
Não obteve resposta.
Chegava sempre quase à hora de jantar, nunca muito antes, para evitar permanecer muito tempo naquele espaço, que tinha um pequeno bar e uma cozinha pequena. Era, pomposamente, chamado “messe dos oficiais”.
O médico tinha lugar na mesa do major oficial de operações, com quem discutia tácticas e estratégias. O oficial de operações não o levava a sério, mas alimentava a conversa sem deixar escapar qualquer informação, não confirmando ou negando as que o médico dizia ter.
O médico tinha lugar na mesa do major oficial de operações, com quem discutia tácticas e estratégias. O oficial de operações não o levava a sério, mas alimentava a conversa sem deixar escapar qualquer informação, não confirmando ou negando as que o médico dizia ter.
- O doutor também faz planeamento das suas guerras subterrâneas? – perguntou um capitão que estava na mesma mesa.
O médico não respondeu, mas ficou incomodado. Era uma referência às instalações que ocupava: um abrigo com dois metros e meio abaixo do chão, com tecto e paredes de ferro e cimento. Para conseguir essas instalações argumentara que a enfermaria deveria ser instalada em abrigo seguro. Então tomou como suas parte das instalações, que passaram a ser o seu quarto e local de trabalho.
Durante o dia circulava pelo quartel, mas, logo que anoitecia, prevendo o risco de ataque com armas pesadas, recolhia às suas instalações, onde lia e ouvia música debitada por um gravador gigante, que desdobrava rolos de fita magnética. Saía só para o jantar, a coberto das paredes das traseiras da messe, entrando pela porta da cozinha. Terminado o jantar, regressava às suas instalações pelo mesmo caminho.
Um dos alferes milicianos lançou-lhe outra farpa:
-A guerra subterrânea do doutor acabou quando foi mobilizado para a Guiné.
Também não respondeu. Era outra referência aos rumores sobre a sua militância política nos tempos de estudante.
Também não respondeu. Era outra referência aos rumores sobre a sua militância política nos tempos de estudante.
O oficial de operações mudou de assunto:
- Então doutor, quantos homens tem internados com paludismo?
- Três. Um vai ter alta amanhã. Acho que o pessoal não toma o quinino.
- Eu também não o tomo há mais de três meses - disse um alferes – quando os mosquitos me picam, começam a voar aos ziguezagues e caem bêbados no chão.
- Então doutor, quantos homens tem internados com paludismo?
- Três. Um vai ter alta amanhã. Acho que o pessoal não toma o quinino.
- Eu também não o tomo há mais de três meses - disse um alferes – quando os mosquitos me picam, começam a voar aos ziguezagues e caem bêbados no chão.
O médico voltou-se para a mesa ao seu lado esquerdo:
- Então, meu Comandante, notícias de Lisboa?
- Ó doutor, você é que está sempre informado.
- Mas o senhor recebe notícias diárias de Bissau…
- De Bissau só dizem o que querem.
- Oi! Cuidado, meu Comandante! Ainda tem alguma visita inesperada!
- Só se for por sua causa, doutor.
O médico fingiu ter ficado agastado.
- Não se chateie, homem. Olhe, dizem que a PIDE vai acabar.
- Não acredito.
- Ó doutor, você quer que eu ensine o padre-nosso ao vigário?
- Verdade… Não sei nada.
- Não se chateie, homem. Olhe, dizem que a PIDE vai acabar.
- Não acredito.
- Ó doutor, você quer que eu ensine o padre-nosso ao vigário?
- Verdade… Não sei nada.
- Sr. Capitão – chamou o médico para uma outra mesa – aquele rapaz do pelotão do alferes Silva, que teve ontem um ataque de abelhas, não estava nada bem. Fez uma reacção anafiláctica. O rapaz quase não respirava.
- Ora! Quase todo o pessoal chegou aqui com a cara inchada. Nem conseguiam ver.
- Pois. Cara, pescoço e braços inchados, mas não foi a mesma coisa. O rapaz contou-me que foi durante uma emboscada.
- Eu sei.
Cortou o comandante:
- Da população, o que é que lhe aparece mais?
- Coisas que o furriel enfermeiro e os cabos tratam: suturas, pensos, feridas infectadas… Apareceram dois casos de infecção depois do fanado.
- Rapazes?
- Sim, rapazes. Recentemente houve dois partos. E agora está a aparecer muita garotada com infecções causadas pela matacanha. Mais que no ano passado.
- Bonita conversa para o jantar – disse um alferes.
- Da população, o que é que lhe aparece mais?
- Coisas que o furriel enfermeiro e os cabos tratam: suturas, pensos, feridas infectadas… Apareceram dois casos de infecção depois do fanado.
- Rapazes?
- Sim, rapazes. Recentemente houve dois partos. E agora está a aparecer muita garotada com infecções causadas pela matacanha. Mais que no ano passado.
- Bonita conversa para o jantar – disse um alferes.
- O que é preciso é conseguir um remédio para a guerra. O doutor não tem um remédio para isto?
O médico bebeu o último gole de café. Começou a levantar-se.
- Dão-me licença?
Fez com a mão um sinal de despedida e continuou:
- Remédio? Mésinha? Mésinha cá tem!
Ia sair pela cozinha, como sempre, mas voltou atrás. Irónico, falou para toda a sala:
- Tenham cuidado com as cadeiras. Podem cair quando menos esperam.
E recolheu aos aposentos subterrâneos.
Alberto Branquinho
ex-alf mil da CArt 1689, 1967/69.
__________
Notas de vb:
Últimos artigos da série em
Guiné 63/74 - P3804: Historiografia da presença portuguesa em África (16): A Exposição Histórica da Ocupação: A Guiné (Beja Santos)
1. Mensagem de Mário Beja Santos, com data de 23 de Janeiro de 2009.
Luís,
Conforme a mensagem que te deixei no gravador, mergulho na escuridão nos próximos 3/4 meses, chegou o momento de agarrar nos meus cadernos de apontamentos e começar a escrever, dia após dia, o meu próximo livro. Além disso, ando embrulhado com um novo projecto que tem a ver com a educação do consumidor, não paro de ler nem de escrever. Nada obsta, no entanto, que eu possa corresponder a uma solicitação tua, em caso de necessidade. Deixo-te bastante material, garanto-te que aí por Abril retomo as minhas voluntárias obrigações no blogue. O material que agora te envio nasceu num catálogo que comprei na Feira da Ladra, foi uma verdadeira surpresa, li de um só fôlego, complementei com outras leituras na biblioteca da Sociedade de Geografia de Lisboa. A ideologia do colonialismo que ainda respirámos na nossa passagem pela Guiné repassa as leituras que fiz, vale a pena meditar o que representou o Acto Colonial e a sua vanglória.
Sempre ao vosso dispor,
Mário
2. A Exposição Histórica da Ocupação: A Guiné
Beja Santos
No mesmo ano em que a Exposição Internacional de Paris põe em confronto as ideologias nazi e soviética na arte, em que Raoul Dufy pinta a Fada Electricidade e Le Corbusier assombra os visitantes com o pavilhão dos Tempos Novos, inaugura-se no Parque Eduardo VII uma exposição dedicada ao esforço português na ocupação dos domínios ultramarinos, uma verdadeira exaltação da epopeia dos Descobrimentos e da presença dos portugueses em todos os continentes.
Não era só o Acto Colonial que dava o mote ao grande evento propagandístico. O regime tinha que acautelar o seu património face aos novos ventos coloniais: no norte de África, há disputas dos franceses e espanhóis, o Duce lança-se na aventura em plena Etiópia, nos bastidores os diplomatas de Hitler reclamam os seus antigos talhões em África. Pelo Decreto-Lei nº 27.269, de 24 de Novembro de 1936, o Governo determina a realização da Exposição Histórica da Ocupação e refere concretamente que para ela convergirá uma eloquente demonstração de carácter iconográfico, militar e bibliográfico, havendo que mostrar os trabalhos e a acção dos portugueses tanto pela assimilação dos indígenas como para defesa do ultramar português. E marcou-se logo a data para a Primavera de 1937.
A Exposição acabou por abrir em 19 de Junho de 1937, foi indiscutivelmente uma grande demonstração do nacionalismo. Salazar não regateou meios e António Ferro entregou a encenação a alguns dos nomes mais brilhantes das artes plásticas do tempo: Francisco Franco, Barata Feyo, Mário Eloy, Sara Afonso, Hein Semke, Almada Negreiros, Emérico Nunes, Domingos Rebelo, Tomaz de Melo (Tom), entre outros.
Tudo obedece a critérios de grandiosidade, pompa, épica, fausto militar, um Portugal sempre vencedor: a magnificência estende-se pelas Salas dos Brasões, de Marrocos, dos Movimentos Literários, do Brasil, do Oriente, da Fé e da Marinharia. Há um parque de material de guerra, sucedem-se as salas militares e há mesmo uma Sala do Drama da Ocupação.
Os intelectuais são convocados para escreverem monografias sobre a Ocupação. Ao tenente-coronel João José de Melo Miguéis cabe a monografia da Guiné, e ele baliza o seu trabalho entre 1834 a 1915, ou seja à última "pacificação" de Teixeira Pinto. Sabendo-se hoje, e constando aliás do monumento que se construiu em pleno centro de Bissau e que lá está bem legendado, que a pacificação só se deu por concluída em 1936, com a rendição do régulo de Canhanbaque, é bem sugestivo que o regime não estivesse interessado em falar de uma pacificação de fresca data...
A Agência Geral das Colónias produziu 2 soberbos catálogos e foi dedicado o número de Dezembro de 1937 do seu boletim inteiramente aos conteúdos desta exposição.
As atenções focaram-se no período henriquino e nas colonizações de Angola e Moçambique. Mas há referências à Guiné portuguesa. Da Biblioteca Municipal do Porto vieram o Tratado breve dos rios da Guiné do Cabo Verde, de André Álvares de Almada, 1594, a planta da Praça de Bissau de 1796, estiveram expostas as espadas de Oliveira Muzanty e Teixeira Pinto, os dois nomes mais importantes na ocupação do século XX, havia mesmo diapositivos sobre uma rua antiga de Bolama e a Bissau antiga. A Guiné não aparece no mapa da expansão da língua, fala-se do crioulo. Há referências à Guiné na política sanitária, concretamente a doença do sono, a lepra e a tuberculose e aparecia um diapositivo sobre o Hospital de Bolama. E para mostrar que a ocupação também se fazia em nome da fé exibia-se um Alcorão apreendido na região do Oio, na campanha de 1902.
A exposição terminava na Sala Acto Colonial, publicada em 1930 e retocado em 1937 e que abriu caminho à Carta Orgânica do Império. Escrevia-se numa das portas da exposição: solidariedade, unidade, nacionalismo, eis a trindade de princípios em que assenta a ideia imperial.
O segundo volume deste catálogo vai ser oferecido ao blogue para ser leiloado e para que o seu produto seja canalizado para as despesas do seu funcionamento.
__________
Nota de CV:
Vd. último episódio da série de 14 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3740: Historiografia da presença portuguesa (16): Filatelia, da medicina tropical à Missão do Sono (Beja Santos / Luís Graça)
Luís,
Conforme a mensagem que te deixei no gravador, mergulho na escuridão nos próximos 3/4 meses, chegou o momento de agarrar nos meus cadernos de apontamentos e começar a escrever, dia após dia, o meu próximo livro. Além disso, ando embrulhado com um novo projecto que tem a ver com a educação do consumidor, não paro de ler nem de escrever. Nada obsta, no entanto, que eu possa corresponder a uma solicitação tua, em caso de necessidade. Deixo-te bastante material, garanto-te que aí por Abril retomo as minhas voluntárias obrigações no blogue. O material que agora te envio nasceu num catálogo que comprei na Feira da Ladra, foi uma verdadeira surpresa, li de um só fôlego, complementei com outras leituras na biblioteca da Sociedade de Geografia de Lisboa. A ideologia do colonialismo que ainda respirámos na nossa passagem pela Guiné repassa as leituras que fiz, vale a pena meditar o que representou o Acto Colonial e a sua vanglória.
Sempre ao vosso dispor,
Mário
2. A Exposição Histórica da Ocupação: A Guiné
Beja Santos
No mesmo ano em que a Exposição Internacional de Paris põe em confronto as ideologias nazi e soviética na arte, em que Raoul Dufy pinta a Fada Electricidade e Le Corbusier assombra os visitantes com o pavilhão dos Tempos Novos, inaugura-se no Parque Eduardo VII uma exposição dedicada ao esforço português na ocupação dos domínios ultramarinos, uma verdadeira exaltação da epopeia dos Descobrimentos e da presença dos portugueses em todos os continentes.
Não era só o Acto Colonial que dava o mote ao grande evento propagandístico. O regime tinha que acautelar o seu património face aos novos ventos coloniais: no norte de África, há disputas dos franceses e espanhóis, o Duce lança-se na aventura em plena Etiópia, nos bastidores os diplomatas de Hitler reclamam os seus antigos talhões em África. Pelo Decreto-Lei nº 27.269, de 24 de Novembro de 1936, o Governo determina a realização da Exposição Histórica da Ocupação e refere concretamente que para ela convergirá uma eloquente demonstração de carácter iconográfico, militar e bibliográfico, havendo que mostrar os trabalhos e a acção dos portugueses tanto pela assimilação dos indígenas como para defesa do ultramar português. E marcou-se logo a data para a Primavera de 1937.
A Exposição acabou por abrir em 19 de Junho de 1937, foi indiscutivelmente uma grande demonstração do nacionalismo. Salazar não regateou meios e António Ferro entregou a encenação a alguns dos nomes mais brilhantes das artes plásticas do tempo: Francisco Franco, Barata Feyo, Mário Eloy, Sara Afonso, Hein Semke, Almada Negreiros, Emérico Nunes, Domingos Rebelo, Tomaz de Melo (Tom), entre outros.
Tudo obedece a critérios de grandiosidade, pompa, épica, fausto militar, um Portugal sempre vencedor: a magnificência estende-se pelas Salas dos Brasões, de Marrocos, dos Movimentos Literários, do Brasil, do Oriente, da Fé e da Marinharia. Há um parque de material de guerra, sucedem-se as salas militares e há mesmo uma Sala do Drama da Ocupação.
Os intelectuais são convocados para escreverem monografias sobre a Ocupação. Ao tenente-coronel João José de Melo Miguéis cabe a monografia da Guiné, e ele baliza o seu trabalho entre 1834 a 1915, ou seja à última "pacificação" de Teixeira Pinto. Sabendo-se hoje, e constando aliás do monumento que se construiu em pleno centro de Bissau e que lá está bem legendado, que a pacificação só se deu por concluída em 1936, com a rendição do régulo de Canhanbaque, é bem sugestivo que o regime não estivesse interessado em falar de uma pacificação de fresca data...
A Agência Geral das Colónias produziu 2 soberbos catálogos e foi dedicado o número de Dezembro de 1937 do seu boletim inteiramente aos conteúdos desta exposição.
As atenções focaram-se no período henriquino e nas colonizações de Angola e Moçambique. Mas há referências à Guiné portuguesa. Da Biblioteca Municipal do Porto vieram o Tratado breve dos rios da Guiné do Cabo Verde, de André Álvares de Almada, 1594, a planta da Praça de Bissau de 1796, estiveram expostas as espadas de Oliveira Muzanty e Teixeira Pinto, os dois nomes mais importantes na ocupação do século XX, havia mesmo diapositivos sobre uma rua antiga de Bolama e a Bissau antiga. A Guiné não aparece no mapa da expansão da língua, fala-se do crioulo. Há referências à Guiné na política sanitária, concretamente a doença do sono, a lepra e a tuberculose e aparecia um diapositivo sobre o Hospital de Bolama. E para mostrar que a ocupação também se fazia em nome da fé exibia-se um Alcorão apreendido na região do Oio, na campanha de 1902.
A exposição terminava na Sala Acto Colonial, publicada em 1930 e retocado em 1937 e que abriu caminho à Carta Orgânica do Império. Escrevia-se numa das portas da exposição: solidariedade, unidade, nacionalismo, eis a trindade de princípios em que assenta a ideia imperial.
O segundo volume deste catálogo vai ser oferecido ao blogue para ser leiloado e para que o seu produto seja canalizado para as despesas do seu funcionamento.
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Nota de CV:
Vd. último episódio da série de 14 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3740: Historiografia da presença portuguesa (16): Filatelia, da medicina tropical à Missão do Sono (Beja Santos / Luís Graça)
Guiné 63/74 - P3803: As nossas mulheres (7): As minhas correspondentes e a minha mulher (José Colaço)
1. Mensagem de José Colaço, ex-Sold de Trms da CCAÇ 557, Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65, com data de 22 de Janeiro de 2009:
Se te parecer que a mensagem possa servir de incentivo aos nossos camaradas para dar um pouco de vida à rubrica lançada pelo V. Briote, publica.
Assim se desanuvia um pouco a importante controvérsia da Retirada de Guileje.
Tentando dar voz ao desafio que o V. Briote lançou
As nossas mulheres, namoradas, madrinhas, correspondentes
Enfim, aquelas que estão sempre prontas para nos acompanhar nos bons e maus momentos.
Sei por conhecimento próprio que eu não sou a pessoa indicada para promover tal rubrica, devido ao modo como me portei, que vou tentar resumir.
Um dos meus passatempos era a correspondência. Chegar o dia do correio e eu receber tanto ou mais correspondência que os meus camaradas era uma pequena vitória, devia ser um meio de promoção pessoal, não ser um Zé ninguém que estava esquecido naquelas longínquas terras da Guiné.
Recebia as cartas da namorada, das duas madrinhas de guerra, duma correspondente espanhola e mais o correio da família que por motivo de vida e saúde estava um pouco dispersa, pois no Hospital do Rego hoje Curry Cabral tinha deixado o meu irmão agarrado aos ferros de uma cama, devido a acidente de moto do qual ficou paraplégico.
Por que não sou a pessoa para promover a mensagem!
Primeiro, a da madrinha de guerra residente em Lisboa que nunca cheguei a conhecer por culpa minha, pois quando faltavam duas semanas para o meu regresso, deixei de lhe dar resposta. Razão nenhuma. Só o que ainda existe aqui em casa, que pode confirmar o que digo, esta foto que tem a dedicatória ao afilhado da madrinha amiga Helena, que envio para embelezar a mensagem.
A então, jovem Helena, madrinha de guerra do José Colaço
Da namorada e a outra madrinha que sabiam da existência uma da outra, com as visitas a ambas tudo se desmoronou.
Com a correspondente, também houve um interregno entre 1966 e 1969, mas como 1969estive na Alemanha e sabendo que ela lá se encontrava, resolvi recomeçar a troca de correspondência no que fui bem recebido. Encontrei-me com a Paquita algumas vezes na cidade de Mainz, onde a visitava aos fins de semana, já que eu estava em Dusseldorf. Se já éramos amigos, mais amigos ficámos.
Após o meu regresso a Portugal, ainda esteve combinado um encontro, que devido a um acidente quando a Paquita se dirigia ao nosso País. Desfez o coche e assim se desfez o encontro, possivelmente também por culpa minha por se aproximar a data do meu casamento, os contactos tiveram fim.
Eis as estórias das minhas namorada, madrinhas, correspondente, Mulheres.
A minha estada na Guiné sempre ficou ligada à minha futura vida, pois aquela que em 5/08/73 casou comigo e ainda hoje por vezes me acorda do sonho que se transforma no chamado pesadelo, deve-se em grande parte à minha estada na Guiné.
Em Bafatá, do batalhão 757, fazia parte o 1.º cabo José Alexandre Peres, um conterrâneo meu que recebia correspondência de uma prima à qual fazia grandes elogios. Tive ocasião de lhe dizer: - Porque não lhe falas em namoro - nesse tempo ainda era normal esse termo, mas para ele seria bom demais e nem pensar em tal proposta.
O meu conterrâneo regressou a Portugal cerca de ano e meio após o meu regresso.
Como residíamos os dois na zona de Lisboa, o meu conterrâneo em Santa Iria de Azóia e eu em Moscavide, os nossos contactos e passeios eram constantes. Num desses passeios, numa ida à nossa conhecida praia de Carcavelos, conheci a prima. Falámos pouco devido eu namoriscar com uma rapariga que fazia parte do grupo. Como houve mais encontros, tornamo-nos amigos, namorados, marido e mulher, felizmente, há 35 anos. Desta união há um fruto, uma filha licenciada em Informática.
Um alfa bravo
Colaço
__________
Vd. último poste da série de 23 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3779: As nossas mulheres (5): Ni, uma combatente em Mansoa (1973/74)
Se te parecer que a mensagem possa servir de incentivo aos nossos camaradas para dar um pouco de vida à rubrica lançada pelo V. Briote, publica.
Assim se desanuvia um pouco a importante controvérsia da Retirada de Guileje.
Tentando dar voz ao desafio que o V. Briote lançou
As nossas mulheres, namoradas, madrinhas, correspondentes
Enfim, aquelas que estão sempre prontas para nos acompanhar nos bons e maus momentos.
Sei por conhecimento próprio que eu não sou a pessoa indicada para promover tal rubrica, devido ao modo como me portei, que vou tentar resumir.
Um dos meus passatempos era a correspondência. Chegar o dia do correio e eu receber tanto ou mais correspondência que os meus camaradas era uma pequena vitória, devia ser um meio de promoção pessoal, não ser um Zé ninguém que estava esquecido naquelas longínquas terras da Guiné.
Recebia as cartas da namorada, das duas madrinhas de guerra, duma correspondente espanhola e mais o correio da família que por motivo de vida e saúde estava um pouco dispersa, pois no Hospital do Rego hoje Curry Cabral tinha deixado o meu irmão agarrado aos ferros de uma cama, devido a acidente de moto do qual ficou paraplégico.
Por que não sou a pessoa para promover a mensagem!
Primeiro, a da madrinha de guerra residente em Lisboa que nunca cheguei a conhecer por culpa minha, pois quando faltavam duas semanas para o meu regresso, deixei de lhe dar resposta. Razão nenhuma. Só o que ainda existe aqui em casa, que pode confirmar o que digo, esta foto que tem a dedicatória ao afilhado da madrinha amiga Helena, que envio para embelezar a mensagem.
A então, jovem Helena, madrinha de guerra do José Colaço
Da namorada e a outra madrinha que sabiam da existência uma da outra, com as visitas a ambas tudo se desmoronou.
Com a correspondente, também houve um interregno entre 1966 e 1969, mas como 1969estive na Alemanha e sabendo que ela lá se encontrava, resolvi recomeçar a troca de correspondência no que fui bem recebido. Encontrei-me com a Paquita algumas vezes na cidade de Mainz, onde a visitava aos fins de semana, já que eu estava em Dusseldorf. Se já éramos amigos, mais amigos ficámos.
Após o meu regresso a Portugal, ainda esteve combinado um encontro, que devido a um acidente quando a Paquita se dirigia ao nosso País. Desfez o coche e assim se desfez o encontro, possivelmente também por culpa minha por se aproximar a data do meu casamento, os contactos tiveram fim.
Eis as estórias das minhas namorada, madrinhas, correspondente, Mulheres.
A minha estada na Guiné sempre ficou ligada à minha futura vida, pois aquela que em 5/08/73 casou comigo e ainda hoje por vezes me acorda do sonho que se transforma no chamado pesadelo, deve-se em grande parte à minha estada na Guiné.
Em Bafatá, do batalhão 757, fazia parte o 1.º cabo José Alexandre Peres, um conterrâneo meu que recebia correspondência de uma prima à qual fazia grandes elogios. Tive ocasião de lhe dizer: - Porque não lhe falas em namoro - nesse tempo ainda era normal esse termo, mas para ele seria bom demais e nem pensar em tal proposta.
O meu conterrâneo regressou a Portugal cerca de ano e meio após o meu regresso.
Como residíamos os dois na zona de Lisboa, o meu conterrâneo em Santa Iria de Azóia e eu em Moscavide, os nossos contactos e passeios eram constantes. Num desses passeios, numa ida à nossa conhecida praia de Carcavelos, conheci a prima. Falámos pouco devido eu namoriscar com uma rapariga que fazia parte do grupo. Como houve mais encontros, tornamo-nos amigos, namorados, marido e mulher, felizmente, há 35 anos. Desta união há um fruto, uma filha licenciada em Informática.
Um alfa bravo
Colaço
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Vd. último poste da série de 23 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3779: As nossas mulheres (5): Ni, uma combatente em Mansoa (1973/74)
Guiné 63/74 - P3802: Convívios (93): I Encontro de militares da CART 2732, no Continente. 18 de Janeiro de 2009, Arruda dos Vinhos (Carlos Vinhal)
CART 2732 - Mansabá, 1970/72 - Divisa - Nam Acham Quem Por Armas Lhe Resista
1. No passado dia 18 de Janeiro, em Arruda dos Vinhos, Restaurante Valverde, aconteceu o I Encontro dos ex-combatentes da CART 2732 (*), do Continente. Sublinha-se que este foi o I Encontro no Continente, já que na Madeira há Encontros regulares do pessoal natural daquela Pérola do Atlântico.
Este Encontro aconteceu graças à iniciativa dos nossos camaradas Reis Pedro, Malhão Gonçalves e Pinheiro Miranda.
Na hora da concentração, o Reis Pedro franqueou-nos as portas de sua casa, literalmente, onde nos serviu uns miminhos e onde pudemos estabelecer os primeiros contactos. À sua esposa Helena, o nosso muito obrigado pela amabilidade e paciência que teve em nos aturar.
Estiveram presentes 21 ex-militares da CART, entre os quais o ex-Cap Mil Jorge Picado que foi um dos seus Comandantes.
Agradável surpresa foi termos entre nós o senhor Coronel Carlos Marques Abreu, um dos Comandantes do COP 6, onde a CART esteve integrada. Compareceu também o ex-Alf Mil Brito Ribeiro que chefiou as Transmissões em Mansabá.
Da Madeira vieram expressamente para o evento os camaradas Alfredo Gouveia e Olim Meneses, que anteciparam viagem de negócios a Lisboa para poderem estar presentes. Ainda naturais da Madeira, mas radicados no Continente, participaram no Encontro, o Inácio Silva (nosso tertuliano) e o Manuel Jesus Ferreira, meu camarada no 3.º Pelotão.
Um primeiro encontro ao fim de quase 37 anos é invulgar, e causa alguns embaraços e surpresas. Por um lado, os anos e os quilos causam algumas alterações, por outro, há camaradas que se mantêm praticamente com o aspecto que tinham na juventude. A uns branqueou ou levou o cabelo, noutros apareceu a barriga e há os felizardos para quem os anos nem passararam. Houve quem levasse os netos. Como? Se ainda ontem éramos uns jovens com 24/25 anos, vindos das matas da Guiné?
2. Ficam algumas fotos do acontecimento.
O ex-Fur Mil Gardete Correia, meu camarada do 3.º Pelotão, hoje advogado
O ex-Fur Mil Mec Auto Rodas Dias, o ex-Fur Mil TRMS Lourenço e o ex-1.º Cabo Op Cripto Mário Romana Soares trocam impressões
Ex-Cap Mil Jorge Picado em conversa com um dos seus ex-furriéis
Inácio Silva (nosso tertuliano) ladeado pela sua simpática companheira Amélia
Ex-Alf Mil Manuel Casal que muitas vezes assumiu o Comando da CART 2732
O nosso camarada Pinheiro Miranda um dos impulsionadores do I Encontro da CART 2732
Os nossos anfitriões, Reis Pedro e esposa Helena
Da esq. para a dta. - Cor Carlos Marques Abreu, ex-Alf Mil Trms Brito Ribeiro, ex-Alf Mil Nunes Bento, hoje Ten Cor Ref, ex-Fur Mil Vinhal e ex-Sold Trms Malhão, um dos organizadores do Encontro, no uso da palavra
Ex-Fur Mil Op Esp Luís Pires e sua esposa Jacinta que se deslocaram de Macedo de Cavaleiros para o efeito
Ex-Furs Mils Francisco Fonseca e Ismael Santos, acompanhados das respectivas esposas
Bolo comemorativo do Encontro, oferta do Ten Cor Ref Nunes Bento
Foto de família com os participantes no I Encontro da CART 2732, no Continente
Fotos e legendas: © Rita Casal, Inácio Silva e Carlos Vinhal (2009). Direitos reservados.
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Notas de CV:
(*) Vd. poste de 18 Abril 2006 > Guiné 63/74 - DCCXI: Breve historial da CART 2732 (Mansabá, 1970/72) (Carlos Vinhal)
Vd. último poste da série de 30 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3684: Convívios (91): Encontro de ex-combatentes da Madeirense CART 2732, dia 18 de Janeiro de 2009, Arruda dos Vinhos (Carlos Vinhal)
1. No passado dia 18 de Janeiro, em Arruda dos Vinhos, Restaurante Valverde, aconteceu o I Encontro dos ex-combatentes da CART 2732 (*), do Continente. Sublinha-se que este foi o I Encontro no Continente, já que na Madeira há Encontros regulares do pessoal natural daquela Pérola do Atlântico.
Este Encontro aconteceu graças à iniciativa dos nossos camaradas Reis Pedro, Malhão Gonçalves e Pinheiro Miranda.
Na hora da concentração, o Reis Pedro franqueou-nos as portas de sua casa, literalmente, onde nos serviu uns miminhos e onde pudemos estabelecer os primeiros contactos. À sua esposa Helena, o nosso muito obrigado pela amabilidade e paciência que teve em nos aturar.
Estiveram presentes 21 ex-militares da CART, entre os quais o ex-Cap Mil Jorge Picado que foi um dos seus Comandantes.
Agradável surpresa foi termos entre nós o senhor Coronel Carlos Marques Abreu, um dos Comandantes do COP 6, onde a CART esteve integrada. Compareceu também o ex-Alf Mil Brito Ribeiro que chefiou as Transmissões em Mansabá.
Da Madeira vieram expressamente para o evento os camaradas Alfredo Gouveia e Olim Meneses, que anteciparam viagem de negócios a Lisboa para poderem estar presentes. Ainda naturais da Madeira, mas radicados no Continente, participaram no Encontro, o Inácio Silva (nosso tertuliano) e o Manuel Jesus Ferreira, meu camarada no 3.º Pelotão.
Um primeiro encontro ao fim de quase 37 anos é invulgar, e causa alguns embaraços e surpresas. Por um lado, os anos e os quilos causam algumas alterações, por outro, há camaradas que se mantêm praticamente com o aspecto que tinham na juventude. A uns branqueou ou levou o cabelo, noutros apareceu a barriga e há os felizardos para quem os anos nem passararam. Houve quem levasse os netos. Como? Se ainda ontem éramos uns jovens com 24/25 anos, vindos das matas da Guiné?
2. Ficam algumas fotos do acontecimento.
O ex-Fur Mil Gardete Correia, meu camarada do 3.º Pelotão, hoje advogado
O ex-Fur Mil Mec Auto Rodas Dias, o ex-Fur Mil TRMS Lourenço e o ex-1.º Cabo Op Cripto Mário Romana Soares trocam impressões
Ex-Cap Mil Jorge Picado em conversa com um dos seus ex-furriéis
Inácio Silva (nosso tertuliano) ladeado pela sua simpática companheira Amélia
Ex-Alf Mil Manuel Casal que muitas vezes assumiu o Comando da CART 2732
O nosso camarada Pinheiro Miranda um dos impulsionadores do I Encontro da CART 2732
Os nossos anfitriões, Reis Pedro e esposa Helena
Da esq. para a dta. - Cor Carlos Marques Abreu, ex-Alf Mil Trms Brito Ribeiro, ex-Alf Mil Nunes Bento, hoje Ten Cor Ref, ex-Fur Mil Vinhal e ex-Sold Trms Malhão, um dos organizadores do Encontro, no uso da palavra
Ex-Fur Mil Op Esp Luís Pires e sua esposa Jacinta que se deslocaram de Macedo de Cavaleiros para o efeito
Ex-Furs Mils Francisco Fonseca e Ismael Santos, acompanhados das respectivas esposas
Bolo comemorativo do Encontro, oferta do Ten Cor Ref Nunes Bento
Foto de família com os participantes no I Encontro da CART 2732, no Continente
Fotos e legendas: © Rita Casal, Inácio Silva e Carlos Vinhal (2009). Direitos reservados.
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Notas de CV:
(*) Vd. poste de 18 Abril 2006 > Guiné 63/74 - DCCXI: Breve historial da CART 2732 (Mansabá, 1970/72) (Carlos Vinhal)
Vd. último poste da série de 30 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3684: Convívios (91): Encontro de ex-combatentes da Madeirense CART 2732, dia 18 de Janeiro de 2009, Arruda dos Vinhos (Carlos Vinhal)
Guiné 63/74 - P3801: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (4): Cobarde num dia, herói no outro (João Seabra, ex-Alf Mil, CCav 8350)
1. Carta ao Director do Público, enviada pelo João Seabra, advogado com escritório em Lisboa, ex-Alf Mil da CCAV 8350 (Guileje, 1972/73) (*);
Senhor Director,
Tendo lido as peças de Eduardo Dâmaso “A nave dos feridos, mortos, desaparecidos e enlouquecidos” e “Ninguém entregou a condecoração ao coronel”, publicadas no “Público de 26/6/2005”, achei conveniente pôr à sua disposição as tardias considerações que se seguem, às quais dará o destino que bem entender.
Fui alferes miliciano na Ccav 8350, retirada de Guileje, em 22/5/73, por sensata decisão do comandante do então COP5, sr. major (coronel) Coutinho e Lima.
Nunca estive a bordo da “fragata Orion” (não seria uma LFG – lancha de fiscalização grande?), pela simples razão de que nunca me ausentei de Gadamael na sequência dos ataques dos dias 1/6/73 (uma quinta-feira) e seguintes.
Escreve-se numa das peças em causa: “os três ou quatro soldados que sobraram da tropa comandada pelo recém-chegado capitão Ferreira da Silva, ficaram sem artilharia, sem apoio aéreo, sem oficiais, sem posto de rádio ...”.
Não foi assim.
Para além de mim próprio, permaneceram no interior do destacamento, o alferes Luís Pinto dos Santos, comandante do pelotão de artilharia do Guileje e o alferes Rocha, comandante de um pelotão de canhões sem recuo 57 mm (e já vão três oficiais), e ainda, pelo menos, um furriel, e algumas (poucas) praças desta mesma unidade e da CCaç 4743 (a companhia originariamente de guarnição a Gadamael).
Além disso, encontravam-se em patrulha próxima do aquartedamento um pelotão da CCaç 4743 (com o seu alferes) e outro da CCav 8350 (alferes Reis).
Sou portanto uma das raras pessoas, que reúne em si a dupla qualidade de “cobarde” que, sob as ordens do major (coronel) Coutinho e Lima, retirou do Guileje e de pretenso “herói” de Gadamael. Nesta última condição fui louvado por despacho do General Comandante-Chefe de 28/8/73.
E não saímos de Gadamael por razões de decência básica (havia mortos e feridos que não podiam ser abandonados) e de elementar sensatez (uma retirada, devidamente comandada, é uma manobra militar, mas não consigo imaginar nada de tão perigoso como uma debandada).
Acontece que, na situação que se gerou em 1/6/73, só por comodidade de expressão se poderá falar em “tropa comandada pelo recém-chegado capitão Ferreira da Silva”.
Para o perceber, há que retroceder às peripécias que determinaram a retirada de Guileje, e às que se lhe seguiram.
Ao contrário de Guileje, Gadamael era uma posição sustentável, com poços de água potável muito próximos do perímetro exterior do aquartelamento, dotada de um cais acostável, acessível por via fluvial através de LDM, que na praia-mar navegavam sem dificuldades no braço do rio Cacine em cuja margem se situava.
Já Guileje era um destacamento absurdo, necessitando de organização de colunas escoltadas para reabastecimento de água a 3,4 Km, dependente, para o seu aprovisionamento, de complicadas colunas rodoviárias múltiplas, de e para Gadamael, com uma pontualidade que poderia servir de exemplo à CP, e que ficava completamente isolado na época das chuvas.
O inimigo (termo convencional pelo qual designarei a entidade que nos pretendia matar, estropiar ou capturar, e a quem, se tivéssemos oportunidade, faríamos outro tanto) conseguiu conjugar duas vastas operações, práticamente simultâneas, ao norte sobre Guidage e ao sul sobre Guileje.
A primeira dessas operações, quase esgotou a chamada reserva do comando chefe, em tropas especiais.
Os meios utilizados pelo inimigo, tanto em artilharia como em infantaria, eram quantitativa e qualitativamente muito superiores aos das nossas guarnições de quadrícula.
A este propósito, tem interesse a leitura do artigo, publicado no Público, de 26/7/2004, pelo comandante Osvaldo Lopes da Silva do PAIGC, se bem que a desenvoltura com que este oficial transita da astronomia para a geografia e da geografia para a topografia, me sugira não ter sido ele o autor do plano de fogos na operação sobre Guileje.
Seja como for, dada a prioridade à defesa de Guidaje, Guileje foi isolado mediante a interdição dos seus acessos rodoviários a Gadamael e à água potável, através de emboscadas permanentes, por unidades de infantaria do inimigo, numerosas e dotadas de superior poder de fogo, minagem em profundidade dos itinerários, e sujeito a contínuo bombardeamento por todas as armas pesadas de que o inimigo dispunha.
Retirada a guarnição, e população, de Guileje, através de um itinerário ainda não reconhecido pelo inimigo, foi recebida em Gadamael, pelo então coronel (agora brigadeiro na reserva) Rafael Durão (Comandante do CAOP3, com sede em Cufar) esclarecido oficial, cuja primeira medida consistiu em promover uma formatura da CCav 8350, para ademoestar os respectivos oficiais, sargentos e praças, em bom vernáculo militar. O major Coutinho e Lima foi enviado para Bissau, onde permaneceu detido, pelo menos até ao 25/4/74.
Ainda hoje estou para perceber por que razão, confirmada a sua evacuação, o aquartelamento de Guileje não foi imediata e intensivamente bombardeado pela Força Aérea. Provavelmente havia quem acalentasse a fantasia de uma reocupação imediata. Certo é que o inimigo continuou a flagelar a posição após a nossa retirada, e só nela entrou dois a três dias depois (como diria Alves a C.ª: “ que coisa prudente é a prudência!”).
Dir-se-ia que, naquela conjuntura, se afigurava, pelo menos, bastante provável que o inimigo procurasse balancear, sobre Gadamael, os abundantes e sofisticados meios que tinha reunido para a operação de Guileje.
Nessa eventualidade – e sem prejuízo do indispensável patrulhamento em profundidade – eram necessárias providências urgentes.
Antes de mais – porque em Gadamael não havia obras ou abrigos adequados a uma guarnição entretanto duplicada – impunha-se a necessária actividade de organização do terreno, fortificando o destacamento, reforçando os espaldões de armas pesadas, abrindo trincheiras eficientes, enquadrando as subunidades, dotando-as de postos de combate defensivos bem determinados e interligados entre si e com o comando.
Em vez disso, o pessoal da CCav 8350 foi caóticamente disperso, em alojamentos de ocasião, pelos cerca de 40 000 m2 do aquartelamento, sem contacto com os seus oficiais e com o comando. Não se iniciaram quaisquer obras defensivas.
Por iniciativa de alguém que não consigo identificar, nas semanas anteriores operou-se uma radical alteração do material à disposição dos pelotões de artilharia de Guileje e Gadamael: as peças 114 mm (Guileje) e 105 mm (Gadamael), foram substituídas por obuses de 140 mm.
Ora, tanto as peças de artilharia de campanha como as próprias armas pesadas de infantaria, quando instaladas numa dada posição, necessitam de regulação do tiro, mediante a observação dos respectivos pontos de impacto, geralmente através de observação aérea, que já se sabia ser impraticável a partir do momento em que o inimigo passou a dispor de misseis solo-ar Strella-SA7.
As causas da desregulação são variadas, tendo a ver, designadamente, com choques sofridos pelas armas durante o serviço, com as condições meteorológicas, com insuficiências de cartografia, etc..
Os nossos obuses 140 mm (modelo 1943), tinham portanto a interessante função de fazer barulho e, nos casos em que abriam fogo de noite, de fornecer indicações de ajustamento do tiro do inimigo.
Nesta prometedora situação, o coronel Durão – certamente a benefício do brio e da disciplina – pôs de parte qualquer trabalho de organização defensiva, determinando um patrulhamento que se pretendia agressivo e que envolvia, em permanência, dois a quatro pelotões de entre as duas companhias.
De tal actividade resultaram dois contactos com pequenos grupos de reconhecimento do inimigo (os quais, por definição, evitam empenhar-se em combate), a quem foram capturadas três espingardas automáticas Kalashnikov.
No dia 31 de Maio de 1973 (uma quarta-feira), de manhã, o coronel Rafael Durão, retirou-se para Cufar, tendo chegado à lúcida conclusão que o inimigo, em consequência dos nossos “sucessos”, tinha retraído o seu dispositivo, sendo improvável um esforço sério da sua parte sobre Gadamael. Tratou-se evidentemente de uma bazófia só comparável com a sua idílica ignorância das intenções e do sistema de forças do inimigo.
Em sua substituição deixou o capitão (coronel/dr.) Ferreira da Silva. Nesse mesmo dia, à tarde, iniciou o inimigo uma forte flagelação sobre Gadamael, utilizando, sobretudo, morteiros 120 mm, mas também foguetões Katyusha de 122 mm e peças de 130 mm, com uma qualidade de tiro surpreendente.
No dia 1 de Junho, o fogo da artilharia do inimigo intensificou-se qualitativa e quantitativamente e, entre as 10 e as 13 horas, uma área de 20 000 a 30 000 m2 do destacamento de Gadamael encaixou, seguramente, entre 350 e 400 impactos de morteiro 120 mm, provocando consideráveis baixas na guarnição.
Os dois capitães (comandantes, respectivamente, da Ccaç 4743 e da Ccav 8350), foram evacuados entre as 10,30 e as 11,00 horas, e não “ao princípio da tarde”.
Apercebendo-me de que se estava a gerar uma debandada, tentei impedi-la, pelas razões acima expostas, com resultados muito limitados.
O pessoal estava completamente entregue a si próprio e a falta de condições de comando era total: só conseguíamos transmitir ordens a quem nos passasse ao alcance da voz.
Dois dos três espaldões das peças de artilharia receberam granadas de morteiro 120 mm, que feriram, mataram ou dispersaram a totalidade das respectivas guarnições.
O pessoal que ia debandando dizia-me que o capitão (coronel/dr.) Ferreira da Silva tinha dado ordens para se “sair do quartel”.
Dirigindo-me a uma das posições da artilharia, encontrei o alferes Luís Pinto dos Santos, que sobreviveu, com ferimentos ligeiros, e resolvemos ambos procurar o capitão (coronel/dr.) Ferreira da Silva, para lhe perguntar se tinha ordenado a evacuação do aquartelamento. Respondeu-nos que tal não era a sua intenção, tendo apenas recomendado ao pessoal que se deslocasse temporariamente “para fora do arame”, isto é, para o exterior do perímetro do destacamento, uma vez que o seu interior estava a ser intensamente batido pela artilharia inimiga.
Fizemos-lhe saber que tal “deslocação temporária” tinha degenerado em debanda incontrolável.
O alferes Pinto dos Santos, com a minha ajuda, conseguiu improvisar um mínimo de serventes (entre os quais o furriel de transmissões da CCav 8350) para activar um dos três obuses 140 mm, à cadência de um tiro de quarto de hora em quarto de hora.
Tudo visto, recolheram-se os mortos, evacuaram-se os feridos por via fluvial, e garantiu-se, com fogo esporádico de obus 140 mm, de morteiro de 81 mm e de canhão sem recuo de 57 mm, uma aparência de capacidade de reacção que dissuadisse um eventual reconhecimento em força por parte do inimigo (que aliás não se mostrou muito afoito).
Enfim: o trivial.
As munições para as armas pesadas eram transportadas do paiol em uma viatura Berliet temerariamente conduzida por um cabo escriturário (Raposo) da CCaç 4743, o qual, na volta, também transportava feridos para locais de embarque.
Nesse mesmo dia 1 de Junho à tarde:
Reentraram no quartel os dois pelotões que estavam em patrulha exterior; desembarcaram, de helicóptero, dois oficiais de confiança do Comando Chefe (capitães Caetano e Manuel Soares Monge) e o coronel Rafael Durão (pessoa dotada de coragem física em proporção inversa à do respectivo discernimento).
No dia 3 de Junho (Sábado), desembarcou a companhia 122 de paraquedistas (capitão Terras Marques), e no dia seguinte a 123 (capitão Cordeiro).
Uns dias mais tarde chegou a companhia de paraquedistas nº 121 (comandatada pelo então tenente, e hoje tenente-general, Hugo Borges), o que significa que foi deslocado para Gadamael um batalhão completo de paraquedistas (BCP 12).
Entre sexta-feira, dia 2/6/73 e o domingo seguinte, a presença do major Pessoa, do BCP 12, pôs termo ao efémero comando do capitão (coronel /dr.) Ferreira da Silva) no, assim chamado, COP5.
Um verdadeiro e próprio comando das forças de Gadamael foi estabelecido no domingo (4/6/73) na pessoa do tenente-coronel Araújo e Sá (comandante do BCP 12).
Nesse mesmo dia – por razões que, para mim, permanecem obscuras – o major Pessoa (era o 2º comandante do BCP12) retirou-se de Gadamael.
Apesar de não figurarem habitualmente como “heróis de batalha de Gadamael”, as operações das diversas companhias paraquedistas, em cerca de duas semanas, desarticularam o dispositivo inimigo, sofrendo baixas moderadas (uns 25 a 40 feridos, na maior parte ligeiros, com estilhaços de RPG 7).
Nunca será demais sublinhar a qualidade destas tropas de elite. Recordando os contactos que mantive com os seus oficiais (designadamente os capitães Terras Marques e Cordeiro), anoto, como curiosidade, que se mostravam extremamente críticos (no limiar do humor negro) em relação aos fundamentos e à condução da guerra, sendo a sua considerável eficiência, fruto exclusivo de um extraordinário brio profissional.
O corpo de tropas pára- quedistas – das melhores que se poderiam encontrar, inclusivé a nível da NATO – foi destroçado, como unidade combatente, em 1975. Ao que me consta o brigadeiro Rafael Durão e o major Pessoa tiveram, nessa meritória obra, a sua função, cada um do seu lado, respectivamente, no “11 de Março” e no “25 de Novembro”.
Não sei se o tenente coronel Fabião tinha condecorações para atribuir. Recordo que o alferes Pinto dos Santos e eu próprio fomos ouvidos como testemunhas num processo de averiguações para atribuição de condecoração militar ao capitão (coronel/dr.) Ferreira da Silva, pelo major (brigadeiro) Manuel Soares Monge, no quartel general do Comando Chefe, em Bissau.
A nenhum de nós dois pareceu que fosse caso de condecorações a propósito do que se passou em Gadamael no dia 1 de Junho de 1973 (excepção feita ao cabo Raposo, atentos o seu posto e especialidade).
Recordo-me que, na altura, o então capitão Caetano me disse que tinha chegado a “fase dos baldes de plástico” (brinde comercial muito apreciado à época). Temíamos o aproveitamento de tal “fase” para transformar o capitão Ferreira da Silva numa espécie de contra-exemplo, em relação ao major Coutinho e Lima.
A serem atribuídas condecorações, deveriam elas ser, obviamente, atribuídas a oficiais, sargentos ou praças das tropas paraquedistas.
A partir da chegada do BCP 12, a CCav 8350 e a CCaç 4743 não tiveram qualquer actividade operacional de relevo.
Aliás nem poderiam ter, uma vez que não tinham treino, nem armamento, para se defrontar com a infantaria inimiga em reconhecimento avançado, do que foi feita a (desnecessária) demonstração no dia 4 de Junho, quando um pelotão da CCav 8350, reduzida a uma dúzia de elementos, caiu numa emboscada a menos de 1 km do aquartelamento, sofrendo quatro mortos (entre eles o respectivo alferes) e cinco feridos graves.
Será a este episódio que o dr. Ferreira da Silva, por equívoco, se quererá referir quando alude a “seis paraquedistas mortos no mesmo dia” (os cadáveres foram efectivamente recuperados por um pelotão de paraquedistas).
O objectivo desta pretensa patrulha era o de “descongestionar” o aquartelamento da sua, por assim dizer, densidade humana, face à eficiência do tiro da artilharia inimiga. Em suma: a CCav 8350 e a CCaç 4743 tinham passado a desempenhar a proverbial função de carne para canhão.
Note-se que a nossa tropa de quadrícula (companhias tipo caçadores), nem sequer estava dotada de uma metralhadora ligeira decente (a nossa inacreditável HK-21 encravava ao fim de cinco ou seis tiros).
As tropas especiais usavam as metralhadoras ligeiras MG 42 e, em considerável quantidade, equipamento capturado ao inimigo: metralhadoras ligeiras Degtyarev, lança granadas RPG 2 e RPG 7, espingardas automáticas Kalashnikov. Excelente material que, ainda hoje, está ao serviço, do Iraque ao Afeganistão, do Sudão à Libéria.
Tive a inspiração de selecionar, de entre os meus pertences, que carreguei de Guileje, um grande livro: Bouvard et Pécuchet, de Gustave Flaubert.
Quando saí de Gadamael, faz agora trinta e dois anos, tinha chegado a uma passagem célebre: “alors une faculté gênante se développa dans leur esprit, celle de percevoir la bêtise e de ne plus pouvoir la tolérer.” [ “então uma faculdade embaraçosa se desenvolveu em suas mentes, a de perceber a estupidez e não mais ser capaz de tolerá-la.” [tr. do editor LG ]
Dê a este enfadonho relato, Sr. Director, o destino que bem entender.
João Seabra
Antigo Alferes Miliciano da CCaV 8350 (1972/74)
P.S. - Porque, em certos aspectos factuais, confirma algo do acima relatado, junto segue extracto da minha folha de matrícula.
____________
Nota de L.G.:
(*) Vd. último poste desta série > 25 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3790: Dossiê Guileje / Gadamael (3): "Um precedente grave" (Diário, Mansoa, 28 de Maio de 1973) ... (António Graça de Abreu)
segunda-feira, 26 de janeiro de 2009
Guiné 63/74 - P3800: Recado para o senhor José (José Manuel Dinis)
1. Mensagem de José Manuel M. Dinis, ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71, com data de 24 de Janeiro de 2009:
Caro José
Permita-me que o trate assim, pois apesar de muito recentemente ter aparecido um comentário subscrito por José Oliveira e Rocha, Bart 2857, Piche, não posso deduzir tratar-se da mesma pessoa. Também vou tratá-lo por senhor, na medida em que ainda não fez a apresentação à Tabanca.
Como já deve ter reparado, a Tabanca Grande é um espaço de tertulia, onde os intervenientes se apresentam, partilham e discutem ideias, conhecimentos, opiniões, na maior liberdadade, e com o devido respeito pelas divergências de cada um. Como já li do Luís Graça, a Tabanca não tem portas nem janelas. Cada um pode entrar, identificando-se, e participando, descomplexadamente, do elo que a todos nos une, a passagem na condição militar pelo território da Guiné.
Mas, ainda assim, foram estabelecidas regras aos tertulianos, constantes, depois da fiche técnica, do lado esquerdo do ecran. Nada do outro mundo, coisas de bom senso, regras de sã convivência, de que destaco, a obediência à verdade e o respeito recíproco.
O senhor, espero, vai compreender-me: dei-me conta de um comentário a um texto meu sobre a criação e emissão de um posto de rádio em Piche, onde duvidava do conteúdo. Nada que me melindrasse, e respondi sinteticamente. Depois, dei conta de novos comentários, de tom jocoso, em relação a textos subscritos por outros tertulianos. Não relevei por aí. Mas surgiu um comentário ao Nuno Robim, desprimorando-o insidiosamente, referindo que ele conheceria a Guiné da secretaria, como fundamento para um atestado. Leia se faz favor a biografia do visado, que comandou uma Companhia em Guilege e foi comando noutra ocasião, para além de oficial de artilharia. Não conheço o Nuno Robim, mas não gostei da desfaçatez. Por último, com o estilo acutilante, a identificação mais completa, o mesmo Bart, coincidências para a mesma pessoa, em apoio a uma tese de um tertuliano, enaltece-o por, com o texto, arrasar com os Fala Barato. Engana-se, se foi o autor, porque no blogue, ninguém arrasa ninguém, nem se manifesta tal intenção, apesar de poder acontecer alguma teimosia na defesa dos pontos de vista. Isto é natural, e, delicadamente, cultiva o respeito e a amizade. Que vai continuar a ter expressão nos encontros do pessoal de que Matosinhos é farol.
Meu caro, não encare esta mensagem como reprimenda. Se chegou aqui, é porque tem elos fortes com o pessoal e interessa-se pelas matérias tratadas. Não se acanhe, apresente-se e participe. Os editores, seguramente, prontificam-se a ajudar, desde a revisão de textos e tratamento de fotografias, à procura de camaradas. A Tabanca, também é um lugar de solidariedade.
Com os melhores cumprimentos
José Dinis
2. Aos que se nos dirigem a coberto do anonimato ou de nomes mais ou menos fictícios.
É apanágio dos editores, sempre que publicam algum trabalho enviado pelos tertulianos, fazê-lo, afixando a fotografia do autor e/ou no mínimo identificando-o com o nome, antigo posto militar, local e anos de cumprimento de comissão. Isto porquê? Porque quem envia os seus trabalhos para publicação no Blogue responsabiliza-se pelo que escreve. Em bom português, dá a cara. Os editores como não têm dúvidas disso, publicam sem reservas.
Quem emite comentários sem identificação, fazendo-o premeditadamente, mais não é que alguém que tem medo que as suas afirmações não sejam levadas a sério. Mas, mesmo os momentos de boa disposição no nosso Blogue são autenticados com o nome dos autores e não acreditamos que haja por aí algum anónimo com a categoria de, por exemplo, Jorge Cabral, mestre do no sense.
Com os comentários ofensivos o melhor é nem perder tempo e retirá-los imediatamente para não poluirem. Não é qualquer Zé ou Tone que ofende quem se expõe com a sua cara e o seu nome completo.
Carlos Vinhal
Caro José
Permita-me que o trate assim, pois apesar de muito recentemente ter aparecido um comentário subscrito por José Oliveira e Rocha, Bart 2857, Piche, não posso deduzir tratar-se da mesma pessoa. Também vou tratá-lo por senhor, na medida em que ainda não fez a apresentação à Tabanca.
Como já deve ter reparado, a Tabanca Grande é um espaço de tertulia, onde os intervenientes se apresentam, partilham e discutem ideias, conhecimentos, opiniões, na maior liberdadade, e com o devido respeito pelas divergências de cada um. Como já li do Luís Graça, a Tabanca não tem portas nem janelas. Cada um pode entrar, identificando-se, e participando, descomplexadamente, do elo que a todos nos une, a passagem na condição militar pelo território da Guiné.
Mas, ainda assim, foram estabelecidas regras aos tertulianos, constantes, depois da fiche técnica, do lado esquerdo do ecran. Nada do outro mundo, coisas de bom senso, regras de sã convivência, de que destaco, a obediência à verdade e o respeito recíproco.
O senhor, espero, vai compreender-me: dei-me conta de um comentário a um texto meu sobre a criação e emissão de um posto de rádio em Piche, onde duvidava do conteúdo. Nada que me melindrasse, e respondi sinteticamente. Depois, dei conta de novos comentários, de tom jocoso, em relação a textos subscritos por outros tertulianos. Não relevei por aí. Mas surgiu um comentário ao Nuno Robim, desprimorando-o insidiosamente, referindo que ele conheceria a Guiné da secretaria, como fundamento para um atestado. Leia se faz favor a biografia do visado, que comandou uma Companhia em Guilege e foi comando noutra ocasião, para além de oficial de artilharia. Não conheço o Nuno Robim, mas não gostei da desfaçatez. Por último, com o estilo acutilante, a identificação mais completa, o mesmo Bart, coincidências para a mesma pessoa, em apoio a uma tese de um tertuliano, enaltece-o por, com o texto, arrasar com os Fala Barato. Engana-se, se foi o autor, porque no blogue, ninguém arrasa ninguém, nem se manifesta tal intenção, apesar de poder acontecer alguma teimosia na defesa dos pontos de vista. Isto é natural, e, delicadamente, cultiva o respeito e a amizade. Que vai continuar a ter expressão nos encontros do pessoal de que Matosinhos é farol.
Meu caro, não encare esta mensagem como reprimenda. Se chegou aqui, é porque tem elos fortes com o pessoal e interessa-se pelas matérias tratadas. Não se acanhe, apresente-se e participe. Os editores, seguramente, prontificam-se a ajudar, desde a revisão de textos e tratamento de fotografias, à procura de camaradas. A Tabanca, também é um lugar de solidariedade.
Com os melhores cumprimentos
José Dinis
2. Aos que se nos dirigem a coberto do anonimato ou de nomes mais ou menos fictícios.
É apanágio dos editores, sempre que publicam algum trabalho enviado pelos tertulianos, fazê-lo, afixando a fotografia do autor e/ou no mínimo identificando-o com o nome, antigo posto militar, local e anos de cumprimento de comissão. Isto porquê? Porque quem envia os seus trabalhos para publicação no Blogue responsabiliza-se pelo que escreve. Em bom português, dá a cara. Os editores como não têm dúvidas disso, publicam sem reservas.
Quem emite comentários sem identificação, fazendo-o premeditadamente, mais não é que alguém que tem medo que as suas afirmações não sejam levadas a sério. Mas, mesmo os momentos de boa disposição no nosso Blogue são autenticados com o nome dos autores e não acreditamos que haja por aí algum anónimo com a categoria de, por exemplo, Jorge Cabral, mestre do no sense.
Com os comentários ofensivos o melhor é nem perder tempo e retirá-los imediatamente para não poluirem. Não é qualquer Zé ou Tone que ofende quem se expõe com a sua cara e o seu nome completo.
Carlos Vinhal
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