segunda-feira, 2 de março de 2015

Guiné 63/74 - P14312: Notas de leitura (686): “Nós, Enfermeiras Paraquedistas”, coordenação de Rosa Serra e prefácio do Prof Adriano Moreira, Fronteira do Caos, 2014 (Mário Beja Santos)


Capa do livro "Nós, enfermeiras paraquedistas", org. Rosa Serra, prefácio do Prof. Adriano Moreira, 2ª ed. Porto: Fronteira do Caos, 2014 439 pp.  



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 25 de Fevereiro de 2015:

Queridos amigos,
Está aqui o melhor do que até hoje se publicou sobre as nossas extremosas enfermeiras.
Depõem na primeira pessoa do singular, vão cativar-nos. Obviamente que nem tudo é inesperado, esta bibliografia já não é tão pequena quanto isso, mas o arco histórico aparece totalmente preenchido, a Guiné tem páginas desenvoltas, histórias assombrosas, há episódios em que acompanhamos as lágrimas das narradoras, são coisas muito nossas, estão ali bem impressivos códigos de sofrimento que sabemos entender.
Este livro é de leitura obrigatória e é um documento imorredoiro, obrigatório, do que elas sofreram e viram sofrer.
Honra às enfermeiras paraquedistas portuguesas!

Um abraço do
Mário


Nós, enfermeiras paraquedistas

Beja Santos


“Nós, Enfermeiras Paraquedistas”, coordenação de Rosa Serra, Fronteira do Caos, 2014, é seguramente, entre a bibliografia já publicada sobre as extremosas mulheres que acudiam aos militares em sofrimento na guerra que travámos em África, a obra mais abrangente, mais exaustiva e mais terna. Temos aqui as enfermeiras na primeira pessoa, com os seus registos de compaixão e brandura. Homenageando os socorristas das unidades de combate, logo no pórtico da narrativa, dizendo:  

“Eles acompanhavam os combatentes pelas picadas, apeados ou em viaturas, em colunas de todos os tipos ou em operações penosas ou arriscadas. Na sua quase totalidade tinham escassos conhecimentos de enfermagem e dispunham de meios materiais reduzidíssimos para prestarem os primeiros-socorros aos seus camaradas feridos ou doentes. Atuavam sempre em estado de tensão nervosa. Eram geralmente os primeiros a chegar junto dos seus companheiros feridos, prestando-lhes o primeiro auxílio, tantas vezes debaixo de fogo intenso! Em algumas ocasiões, os socorristas também eram o seu único resguardo, protegendo-os, em prejuízo da sua própria segurança”.

Só gente de qualidade se lembraria desta homenagem, porque a cabeça pensa a partir de onde os pés pisam.

Este livro é um extraordinário compêndio da ética do cuidado, neste caso nos afãs da guerra. Elas contam como foi, as suas origens, o que as levou a decidir uma profissão na saúde, como se processou a preparação militar, como se adaptaram aos serviços de saúde militares e depois como rumaram para África. Decidiram pôr por escrito experiências inolvidáveis, tantas vezes dolorosas, descrevem o trágico e o profundamente íntimo, entre sorrisos e lágrimas: os primeiros dias em África, as primeiras missões de serviço, as primeiras comissões, preponderam as narrativas a partir de Bissau e de Mueda, fala-se do apoio às populações e os episódios ficam mais acalorados com as evacuações, saltar do helicóptero e presenciar a tragédia, confortar um soldado com o pé esfacelado que responde com sentida emoção:  “Senhora enfermeira, com pé ou sem pé, estou vivo. O que me preocupa é a dor da minha mãe”; e há as evacuações de longo curso, conferidos em delírio, outros absortos, em estado de choque, porque perderam as pernas ou as mãos; e há a consciências nos riscos que viveram; aterragens forçadas no meio do inimigo e até a visão da morte de uma outra enfermeira como foi o caso da Celeste, em plena base de Bissalanca, uma enfermeira depõe:  

“A pouco mais de um metro de um DO-27, corpo brutalmente danificado, reconhecemos ser a Celeste, já cadáver. Olhámos para ela, e tinha um corte profundo desde o queixo, passando pelo meio da cabeça, e terminava na parte posterior da omoplata; o braço estava preso por alguns tendões, ou nervos. Olhámos para o lado e vimos a massa encefálica espalhada por ali. A Eugénia e eu sem abrirmos a boca, e mesmo em choque, reagimos de imediato e começamos a apanhar a massa encefálica…”.

Estes depoimentos são um presente valiosíssimo para a história da guerra, um trabalho muito bem sistematizado onde não faltam os aspetos humanos, os episódios mais rocambolescos, a presença do feminino num espaço tipicamente masculino. E há o jeito de contar, envolvente, como se estivéssemos todos à volta de uma lareira e se desfiassem aquelas histórias que já conhecemos por outras bocas mas que aqui riscam como diamante. É o caso da narrativa e que se parte para uma evacuação em Gadamael-Porto, após a aterragem a enfermeira vê aproximar-se um militar, é um alferes que comunica que o capitão morreu, a enfermeira com a ajuda dois ou três militares prepararam o corpo. Quando a maca é levada até ao avião, levanta-se um tumulto, um protesto: “O nosso comandante não sai daqui sem um velório digno, feito por nós!”.

O alferes soluça, debulha-se em lágrimas: “…Desculpe, senhora enfermeira, desculpe…”.
E as lágrimas continuavam correndo livremente pelo seu rosto. E a narradora despe a alma, sente-se tocada pelos militares de Gadamael terem visto que ela também sentira um profundo desgosto pela morte do seu capitão:

“E reparei que houve neles um sentimento de gratidão, não apenas por ter ajudado a compor e a dar dignidade ao cadáver, mas também por me ter disposto a assumir a responsabilidade de fazer aquilo que, e eles sabiam-no, as normas não permitiam. Naqueles momentos em que percorremos a distância entre a improvisada morgue e a pista, todos os militares e eu própria nos sentimos envolvidos pela mesma emoção, como se um invisível abraço de partilha e aconchego nos unisse nesse pesado episódio. Depois descolámos em direção à nossa Base, informando o piloto que o ferido tinha morrido. Tocou-me e comoveu-me muito a admirável atitude da guarnição de Gadamael-Porto. Foi tal o apreço por aquele gesto que ainda hoje, ao descrevê-lo me comovo ao lembrar tão elevados sentimentos que aqueles militares demonstraram em relação ao seu comandante”.

De tudo encontramos nestes relatos: guerrilheiros agradecidos, reconhecimentos de civis, alguém que pede o último cigarro, enfermeiras feitas madrinhas de guerra.

O prefácio do professor Adriano Moreira vem à altura deste monumental trabalho sobre as enfermeiras paraquedistas: 
 
“No caso português, esta iniciativa levou à criação das Enfermeiras Paraquedistas, devida ao general Kaúlza de Arrigada, ainda teve que vencer a resistência cultural que se traduzia em que nem Jefferson, na Declaração de Filadélfia, conseguiu eliminar, que era a condição separada, jurídica e socialmente inferior, das mulheres. A sua persistência conseguiu vencer, e certamente foi uma iluminação coletiva da Nação em armas, verificar a resposta decidida, corajosa, exemplar, das voluntárias que entraram na história por direito, não apenas pelo contingente, mas individualizadas, orientadas pelo saber de que cada ser socorrido, em condições inesperadas de risco e de também escassos recursos, é um fenómeno que não se repete na história da humanidade”.
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Notas o editor

(*) Vd. poste de 23 de Fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14287: Agenda cultural (381): Está de novo à venda o livro "Nós Enfermeiras Paraquedistas", que tem apresentações marcadas em Aveiro, no dia 26 de Março, e no Porto, no dia 9 de Abril

Último poste da série de 27 de Fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14306: Notas de leitura (685): “Crónica do descobrimento e conquista da Guiné”, por Gomes Eanes da Zurara, adaptação de Frederico Alves, edição da Agência Geral das Colónias (2) (Mário Beja Santos)

domingo, 1 de março de 2015

Guiné 63/74 - P14311: Libertando-me (Tony Borié) (6): Quando fomos à Sede das Nações Unidas

Sexto episódio da série "Libertando-me" do nosso camarada Tony Borié, ex-1.º Cabo Operador Cripto do CMD AGR 16, Mansoa, 1964/66.



Antes de tudo, queremos dizer que estamos a falar da nossa “station wagon Malibu Classic”, ou seja da nossa “carrinha”, tinha sido nova em 1976, era robusta, com linhas um pouco a fugir para o modernismo, nunca se lastimava com a neve, frio, calor, chuva ou vento, que constantemente sofria, circulava pelas estradas ou ruas da cidade, carregava com tudo o que dentro dela colocassem, todos a usavam, ensinou os filhos a conduzir, no verão, levava-nos alguns fins de semana à praia, carregava o fogareiro, panelas, tachos e outros utensílios de praia, assim como a família, o cão e, às vezes os filhos do vizinho “Açoriano”, que, tanto ele como a esposa, trabalhavam por turnos e, quando chegavam a casa era para dormir, trazia os géneros alimentícios para casa, tinha muito espaço, era confortável, sendo uma autêntica “street girl”, ou seja “rapariga da rua”, de quem todos gostavam.

Mais tarde, já velha, com alguns acidentes, consumindo muito mal o combustível que necessitava para circular, com algumas amolgadelas aqui e ali, a “cor da pele”, já não era original, ficou quase encostada, mas sempre na família, continuando sempre a ajudar, principalmente nas “emergências”.

Dizia, continuando sempre a ajudar, principalmente nas emergências e, não tendo nada a ver uma coisa com a outra, uma personagem portuguesa, de quem nós por aqui, pelo menos nessa altura, sentíamos muito orgulho, presidiu à 50.ª Sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas e, quando da sua despedida, houve algumas celebrações, onde vieram entidades do Governo de Portugal, onde também participou o Coro dos Antigos Alunos da Universidade de Coimbra.

Nós fomos convidados num dia em que os filhos queriam sair com os companheiros, possivelmente para se  divertirem, tendo portanto levado o carro de serviço e, a “nossa carrinha”, a tal “station wagon Malibu Classic”, já velha, lá estava pronta para as tais “emergências”.


Algum combustível, um pouco de óleo, pois já quase no fim da sua vida, gastava quase tanto combustível como óleo, lá nos levou, entre um trânsito rápido e agressivo, mas nunca desistindo, atravessando as pontes de Nova Jersey, entrando no Holland Tunnel, nunca se lastimando, deixando algum rasto de fumo, chegando com algum atraso ao edifício das Nações Unidas, na cidade de Nova Iorque, onde o funcionário encarregue pelo estacionamento e inspecção dos veículos, antes de entrar no parque do edifício das Nações Unidas, ao lhe entregarmos as chaves da “nossa carrinha”, abanou com a mão aberta na frente da sua cara, sacudindo algum fumo, nos olhou com um sorriso maroto, pensando talvez, “o que andam por aqui a fazer estes Portugueses, lá da antiga Europa”?


Tony Borie, Fevereiro de 2015
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Nota do editor

Último poste da série de 22 de fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14283: Libertando-me (Tony Borié) (5): 50 anos depois

Guiné 63/74 - P14310: (Ex)citações (264): Sondagem: Ao fim destes 40/50 anos, mudei muito, física e psicologicamente - Resposta múltipla (Mário Vitorino Gaspar)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Vitorino Gaspar (ex-Fur Mil At Art e Minas e Armadilhas da CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68), com data de 24 de Fevereiro de 2015:

Caros Camaradas e Amigos
Envio-lhes este texto, escrito à pressão.
Eu, trapezista Mário Vitorino Gaspar, executei este número, e sem rede, saiu um pequeno e escasso rascunho de resumo do tema solicitado.

Cumprimentos à Tabanca Grande, e um grande abraço de amizade
Mário Vitorino Gaspar


Ao fim destes 40/50 anos, mudei muito, física e psicologicamente 
(Resposta múltipla)

Jorge Rosa Pedreiro, Manuel Ferreira Jorge e eu

Passados que foram 47 anos do dia em que terminámos a Comissão, e chegámos ao cais de Alcântara desembarcando no paquete Uíge, a minha Família que era a CART 1659, separou-se. Sendo oriundos de diferentes pontos do país, só por mero acaso existia um encontro.

Recordações não faltavam, tinha memorizado cada um dos camaradas. Diariamente encontrava-me, nos dias de hoje, com eles. Vendo-lhe os rostos, esqueço os nomes. Se lembro os nomes esqueço os rostos de jovens que éramos.

No Livro “O Corredor da Morte", escrevi:
“Os intervenientes, portanto Oficiais, Sargentos e Praças não possuem rosto, nem nome, embora em alguns casos se possam reconhecer”.

Encontro-me com o Jorge em Massamá. Igualzinho ao Amigo Manuel Ferreira Jorge que bebera comigo tanta cerveja. E os belos momentos passados. O Natal festejado a 23 de Dezembro, porque a 25 íamos ser vítimas de um ataque em Gadamael Porto do PAIGC, quando passava das 3 da manhã trajados com as túnicas dos muçulmanos, e ajoelhados junto à cama do Capitão, pedimos:
– Alá, Alá… Vinho para cá!...

Quando ouvia o meu nome da boca de alguém, parecia ter visto um desconhecido.

– Mudei assim tanto? – Perguntava-me o camarada.
Ficava quedo, tristonho e envergonhado.

Quando mirava o homem que pronunciara o meu nome, perguntava:
– Conhecemo-nos?
– Eu sou!…

Abraçava-o, respondendo:
– Passou tanto tempo, mas afinal és…

Teria eu mudado? Não, decerto que não! Fulano reconheceu-me, porque não o reconheci? Eu mudara, estava mais maduro. Casara, era pai.

Psicologicamente? Não era a mesma pessoa. Diferente daquilo que fora. A guerra? Talvez tenha influenciado, sou rígido, frio por vezes… Desconfiado, muito desconfiado. Ai, ai daquele que se aproxima por detrás, pareço ter radares. Os meus olhos observam os passos perdidos na retaguarda. Reajo e parece mais querer esbofetear o agressor. Mas não é decerto um agressor. É um amigo.
– Nunca faças isso… Viste bem o que poderia dar?

Mas, outras vezes, encontros diferentes:
– Conheço-te perfeitamente, és o… Não digas nada...

Após o sinal positivo do velho amigo:
– Sabia que eras tu! Estou mais gordo. Estou muito contente por te ver. Como vai a tua vida, o que fazes?

Ficava imensamente feliz.

Tenho de confessar não ser aquele ser sonhador. Deixei de ler; de ir ao Cinema e Teatro; não escrevo uma linha. Tudo aquilo que adorava fazer, abandonei.

Preocupado com o bem-estar da Família, o trabalho é uma outra Família, mas nada que se compare à Família da Guiné: aos camaradas da Companhia e todos os amigos dos aquartelamentos que percorria operacionalmente: Guileje; Mejo; Sangonhá; Cacoca; Cameconde; Cacine e, mais tarde Gandembel.

Encontros houve, reconheci o camarada de imediato. Era uma festa, voltavam as cervejas fresquinhas, sempre fresquinhas. Depois o adeus e…

Um dia não reconheci o meu grande amigo Jorge Pedreiro, um técnico da Indústria Vidreira da Marinha Grande, no único almoço de confraternização organizado pela CART 1659, os sempre ZORBAS. “Os homens não morrem” era o lema.
Olhava para ele, que diariamente confraternizava comigo na fome, na sede, na solidão. Olhei-o. Mas quem é? Ele também não me dirigiu a palavra, possivelmente julgara que estava zangado. Zangado com o mundo sim, com ele nunca. Quando o reconheci juntei a alegria com a tristeza. Muito contente de o ver. Estava diferente, muito diferente, mas arreliado por não o reconhecer. Como podia esquecer o Pedreiro? Verdade seja dita, no dia do Lançamento do meu Livro “O Corredor da Morte”, não reconheci alguns camaradas. Custa-me ter voltado a não reconhecer Jorge Rosa Pedreiro. Pedi-lhe desculpa, não mereço perdão!
Perdoou-me, há pouco tempo falámos…
Acho que mudei. Não tenho o direito de esquecer os meus amigos.

Na minha vida, em primeiro lugar a Família, e em segundo os Amigos.

Mário Vitorino Gaspar
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Nota do editor

Último poste da série de 27 de fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14307: (Ex)citações (263): Eu respondi à sondagem "4. Não, não mudei muito"... Mas acho que mudei, não sei se para melhor, se para pior (Hélder Sousa, ex-fur mil, trms TSF, Piche e Bissau, 1970/72)

sábado, 28 de fevereiro de 2015

Guiné 63/74 - P14309: Pensamento do dia (21): Por que é que este blogue é tão importante para os ex-combatentes (Torcato Mendonça)... E por que é que eu me sinto tão bem ao pé deles... (Jorge Rosales)






Guiné > Zona leste > Setor L1 (Bambadinca) > CART 2339 (Fá Mandinga e Mansambo, 1968/69) > O alf mil art Torcato Mendonça > Fotos Falantes II, sem legenda...

Fotos: © Torcato Mendonça (2007). Todos os direitos reservados.[Edição: LG]

1. Comentário de Torcato Mendonca ao poste P14307 (*)


Olá,  Hélder,

Ainda pensei, depois de votar, em escrever algo. Quase uma justificação do voto feito. Deixei passar o tempo para ver os resultados. 

Votei “1 – Sim, mudei muito"! 

Digo-te porquê. Antes de ser militar,  fui estudante e nalguns intervalos fiz “diversos”. Caçado, sem esperar, pela tropa,  aí talvez na especialidade comecei a sofrer uma metamorfose. Aos poucos,  e já mais na Guiné, o rapaz alegre e “bon vivant” foi-se ou, porque não, apagou-se mesmo. 

Quando vim,  nada ou muito pouco restava do outro. Deram-me várias opções de escolha de vida. Faria amanhã [100 anos], 28 de Fevereiro, esse meu melhor Amigo, esse Homem que me deu o ser e muito saber. 

Optei, já o tinha feito em parte, e deixei a adaptação correr. O meu mentor, o meu companheiro- amigo um dia morreu-me. Chorei nesse dia e compreendi que ainda sabia chorar. Mas tinha mudado muito. 

Fui sentindo os anos passarem por mim, os meus filhos crescendo. A guerra estava guardada e, de quando em vez, saltitava para o presente e depois de amansada ia-se. Tratava-a com cuidado e sentia que nunca mais voltara de todo, em grande parte talvez. Nem isso. Fisicamente fui envelhecendo, como é natural. Apressado por “aquilo” e pelas cicatrizes físicas. 

Mais forte, a parte psicológica foi de certeza a de estabilização mais difícil. Nunca estabilizará. Por isso hoje, velho aos 70 anos, com a saúde (ou falta dela) a mostrar os rombos na carcaça nada tem a ver com a hipotética entrar normal na velhice. 

Seria assim? Talvez. Se fosse seria melhor ou pior?
Em nota de rodapé: 

(i) O meu Velho serviu, como eu, no RAL 3 (ele, RAL 1) em Évora, tenho aí fotos dele que já apareceram no Blog. 

(ii) Um ponto importante,  a minha entrada no Blog, o reviver, o desabafar, analisar, criar amigos etc. Este Blog é demasiado importante para os ex-combatentes. Longa conversa…para um dia… (**)

Abraço, T

2. Comentário do Jorge Rosales (*) [, membro da nossa Tabanca Grande, desde junho de 2009, foi alf mil da 1ª CCaç Indígena, Porto Gole, 1964/66]

Caro Hélder

Vieste mexer na minha memória, os sentimentos que vivi após o regresso. Frases como: "este vem apanhado e nós agora é que o temos de aturar"...

Não matam mas moem. O apoio só senti o da familia. É por isso que me sinto tão bem, perto do pessoal da Guiné.

Um forte abraço,amigo, Helder.
Jorge Rosales

[, Foto à esquerda, 2011, Tabanca da Linha. Foto de Manuel Resende]
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 27 de fevereiro de  2015 > Guiné 63/74 - P14307: (Ex)citações (263): Eu respondi à sondagem "4. Não, não mudei muito"... Mas acho que mudei, não sei se para melhor, se para pior (Hélder Sousa, ex-fur mil, trms TSF, Piche e Bissau, 1970/72)

Guiné 63/74 - P14308: Manuscrito(s) (Luís Graça) (47): Quem em caça, política, guerra e amores se meter, não sairá quando quiser...


Quem em caça, política, guerra e amores se meter, não sairá quando quiser

por Luís Graça (*)




Quem terá sido o 'grafiteiro'
que escreveu:
"Em Mueda, os cordeiros que chegam,
são lobos que saem" ? (**)

É um pensamento que é válido
para todas as situações de guerra.
E em todas guerras houve ‘grafiteiros’.
Os jovens, quase imberbes,
os meninos de sua mãe
(como escreveu o nosso Fernando Pessoa),
que chegam à frente de batalha,
ainda são cordeiros,
inocentes,
virgens,
imaculados...
O horror e a violência da guerra
irão transformá-los em lobos,
puros e duros,
violentos,
conspurcados...
Não necessariamente predadores,
assassinos,
criminosos...
(que é o estereótipo
que o ser humano ainda guarda
do ‘lobo mau’)...


Foto de Tino Neves (2007)
Mas há, seguramente, uma perda de inocência:
não foste foi para a guerra
e vieste de lá impunemente,
igual...
Os teus amigos e familiares deram conta disso:
já não eras o mesmo,
nunca mais foste o mesmo...

É isto
que o inspirado (ou provocador) autor do mural de Mueda  (*)
te quis dizer.
É claro que há também aqui
a dose habitual de bravata e de fanfarronice:
a frase feita para intimidar
os 'checas', os 'piras', os 'maçaricos', os novatos...

Também os militares, profissão de risco,
têm a sua ideologia defensiva,
as suas crenças,
os seus talismãs,
os seus mesinhos
(usavam-nos, de resto,  os guerrilheiros
na Guiné,
em Angola,
em Moçambique,
não obstante a  'formação' racionalista, 
dos seus comandantes,
que estudaram na cartilha marxista-leninista,
dita revolucionária)...

A bravata e a fanfarronice,
além das praxes e do álcool,
ajudaram-te
a lidar com o medo,
as situações-limite,
a morte,
o sofrimento, físico e moral,
a impotência,
o desespero…
Mas também ajudaram a criar
laços de abnegação, coragem e camaradagem...

Não há, nunca houve,
super-homens,
super-heróis:
há apenas deuses,
que inventaste, à tua imagem e semelhança,
e para quem transferiste 
qualidades e defeitos humanos...
Aliás, deuses que inventamos todos os dias…
Precisamos, de resto, dos mitos,
das lendas,
da efabulação,
do pensamento mágico,
mesmo sob a roupagem (enganadora) da ciência e da tecnologia.

Há quem diga
que há três espécies de homens:
os vivos, os mortos e os homens que andam no mar...
Devias acrescentar uma quarta categoria;
o soldado para quem a guerra nunca acaba...
Patriota, revolucionário ou mercenário,
não importa.

Há homens que são incapazes de deixar de combater...
(Como há homens que são incapazes de viver fora do mar)...
Mesmo, no limiar da decadência física,
a adrenalina da guerra será mais forte que a razão...
É um pulsão muito forte.
o que os leva a matar e a morrer
por pátrias, causas, bandeiras ou ideologias
que muitas vezes não são verdadeiramente as suas...

O ser humano é motivacionalmente muito complexo
e manipulável
e moldável
ou formatável…
A guerra também pode ser viciante,
havendo homens que nela entram
e dela nunca mais saem...
A guerra pode inclusive  
ser uma forma (heróica ?) de suicídio.
Como, de resto, diz o provérbio popular,
"Quem em caça, política, guerra e amores se meter, 
não sairá quando quiser"...

Lourinhã, 28/2/2015
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Notas do editor:

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

Guiné 63/74 - P14307: (Ex)citações (263): Eu respondi à sondagem "4. Não, não mudei muito"... Mas acho que mudei, não sei se para melhor, se para pior (Hélder Sousa, ex-fur mil, trms TSF, Piche e Bissau, 1970/72)

1. Comentário do nosso colaborador permanente Hélder Sousa, ao poste P14296 (*): 

 Caro Luís Graça e restantes camaradas

É claro que a passagem do tempo deixa as suas marcas. Todos nós mudámos fisionomicamente. Uns de forma mais acentuada, outros menos.

Para além dessa coisa irrefutável, acresce ainda que, de nós para os outros (e vice versa), se não houver contacto de proximidade que permita acompanhar a evolução haverá sempre mais dificuldade em reconhecimentos mútuos.

Isto, pelos aspectos físicos. Há também os aspectos psicológicos. Quanto a isso será mais prudente ser os outros a julgar. Costuma-se dizer que ninguém é bom juiz em causa própria. No entanto, também se disse e por aqui também dissemos, e eu concordo, que mudámos muito.

Chegava-se a África como meninos, mais ou menos crescidos, e rapidamente se transformavam em homens. Ora essa alegadas transformações, assim reconhecidas na generalidade, traduziram-se por reconhecidas mudanças 'de estado'. Psicológico? "De alma"? Comportamental?

Já não falo dos que foram directamente afectados pelos acontecimentos vividos, seja por ferimentos no corpo, seja pelo que se passou "ao lado", e temos muitos casos desses, alguns deles até já referidos aqui no blogue, que esses encontram-se muito mais enquadrados na tipificação dos casos enquadráveis no "stress pós-traumático", mesmo que não 'sejam praticantes'... Refiro-me à generalidade dos 'outros'.

Portanto, este aspecto, o da mudança psicológica, é de mais difícil resposta.


Guiné > Bissau > c. 1970/72 > O Hélder de Sousa, na avenida marginal,  junto ao cais. Foto do álbum de Hélder de Sousa, ex-fur mil de trms  TSF (Piche e Bissau, 1970/72), ribatejano, engenheiro técnico, residente em Setúbal, membro da Tabanca Grande desde abril de 2007 e nosso colaborador permanente.

Foto: © Hélder de Sousa (2007). Todos os direitos reservados

Cartaz do filme O Caçador (1978), do realizador
norte-americano Micael Cimino, com Robert
de Niro no principal papel.  Fonte: Wikipédia
 (com a devida vénia...) (***)
Eu acho que mudei. Mudei sim. Não sei se para melhor, se para pior. 

Quando regressei vinha ainda mais determinado a contribuir para a mudança da situação do poder vigente à data. Mas também havia uma grande contradição entre o que sentia e o ambiente geral, à grande bebedeira colectiva que me parecia haver.

Uma das formas mais notórias foi o silêncio quase total sobre o que se vivia, em meu entendimento, no pedaço de terra em guerra donde tinha vindo.

Alguns, mais empenhados, ainda procuravam saber para supostamente avaliar e 'teorizar' mas muitos
ficavam-se pela superficialidade, de meter nojo, de saber se 'tinha matado muitos pretos', 'se tinha feito muitos filhos'. Na realidade não queriam saber nada: tinham os seus preconceitos, metidos na cabeça pela propaganda governamental, um pouco à semelhança do que se passa agora com 'inevitabilidades', com aquela de 'os gregos (que gregos?) opuseram-se antes e agora também é bem feito que 'a gente' (cá está a colagem) lhes faça o mesmo', e no fundo só buscavam 'confirmações' para que a sua arquitectura mental não sofresse abalos...

Quantas e quantas vezes lhes respondi como o 'marine' do filme "O Caçador" na cena do bar na festa de despedida dos que iam para o Vietname....

Portanto, respondendo ao inquérito (já o fiz nos quadradinhos) (**),  acho que a resposta correcta e óbvia é, porque global,  "4.Não, não mudei muito", embora isso seja tudo relativo. (****)

Hélder Sousa
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Notas do editor:



(***) Um dos filmes de culto da guerra do Vietname. O filme ganhou 5 óscares em 1978: (i) Melhor Filme, (ii) Melhor Realizador, (iii) Melhor Actor Secundário (Christopher Walken), (iv) Melhor Montagem e (v) Melhor Som. Foi estreado em Potugal em outubro de 1979.

(...) "The Deer Hunter é um filme que nos fala de valores em desuso - a coragem, o companheirismo, o esforço, a amizade, a abnegação, a integridade - em tom de envolvente cumplicidade, sem sequer um fio de retórica, enquanto nos apresenta uma comunidade operária de origem eslava na vila de Clairton, Pensilvânia. É uma viagem à América profunda - à que produz riqueza e se integra num vasto esforço colectivo a partir de uma pequena comunidade. Não a América protestante de raiz anglo-saxónica, mas os verdadeiros Estados Unidos da América, nação enriquecida pela presença de imigrantes com o seu mosaico de crenças e culturas.

Poucos filmes como este, brindado com o rótulo de "reaccionário", nos mostraram de forma tão impressiva e convincente o quotidiano da classe trabalhadora. O Caçadorfoi também o filme que melhor soube mostrar - apenas três anos após a partida dos marines da Indochina - o absurdo da guerra do Vietname, bem ilustrado na metáfora da roleta russa, como corpo estranho e adverso ao incomparável sonho americano. Mike, Nick e Steven, os três amigos de infância que para lá partiram aureolados de heróis, regressam de modo muito diferente: a guerra marcou cada um deles de forma irremediável." (...)


Excerto reproduzido, com a devida vénia, do blogue Delito de Opinião >  Os filmes da minha vida (16)
por Pedro Correia, em 22.09.10.

Guiné 63/74 - P14306: Notas de leitura (685): “Crónica do descobrimento e conquista da Guiné”, por Gomes Eanes da Zurara, adaptação de Frederico Alves, edição da Agência Geral das Colónias (2) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 20 de Maio de 2014:

Queridos amigos,
Esta adaptação da “Crónica do descobrimento e conquista da Guiné”, publicada em 1944, oferece ao leitor uma visão acalorada de um poderoso panegírico onde se exalta o projeto henriquino, etapa por etapa.
Descobriu-se posteriormente que a cronologia das expedições não foi o ponto forte de Zurara, de tal sorte que ainda hoje não é precisa a data da chegada à Guiné como a conhecemos.
Seja como for é um documento vivacíssimo, exaltado, cedendo a fábulas como a chegada dos navegadores ao rio Nilo, cantada com a maior das exaltações. Zurara escreveu um dos bilhetes de identidade da Guiné, a sua crónica é um desses documentos imorredoiros para a história de Portugal e da Guiné-Bissau, vale a pena, ao menos, conhecer-lhes alguns aspetos capitais.

Um abraço do
Mário


O romance da conquista da Guiné contado a rapazes (2)

Beja Santos

Aqui se continua e finda a recensão quanto ao “Romance da Conquista da Guiné”, uma adaptação da “Crónica do descobrimento e conquista da Guiné”, por Gomes Eanes de Azurara, feira por Frederico Alves, publicação da Agência Geral das Colónias em 1944.

Os descobrimentos henriquinos tomam um rumo imparável, toda a costa está mapeada até ao Cabo Branco, é preciso ir mais longe, o Infante confia a Gonçalo de Sintra uma caravela, diz-lhe para ir direito à Guiné, a bordo vem um gentio que a seu tempo se escapulirá. A caravela vai até à ilha de Naar, mal fundeados, mandou o capitão arrear o batel, rumou-se para a praia, esperou-se pelos mouros. Vieram como inimigos, lutou-se rijamente. Nesse dia, ali ficou morto Gonçalo de Sintra e mais sete. E regressou-se a Portugal. O Infante não desiste, nomeia Nuno Tristão que vai até às ilhas por onde Lançarote, almoxarife de Lagos, andara. Segue-se Dinis Dias em demanda da terra dos negros conhecidos por guinéus, e Zurara escreve:  
“E falando em guinéus, convém não perder de memória que se chamou Guiné a todas as terras primeiramente descobertas na linha da costa Ocidental de África. Não porque todas sejam, na verdade, uma só terra; pelo contrário, fazem diferenças umas das outras”.

Dinis Dias velejou até à vista de um grande cabo a que puseram o nome de Cabo Verde (não confundir com o nome do arquipélago só muito mais tarde deixado).

Talvez em 1445, aparelharam-se duas caravelas por mandado de D. Afonso, Regente do Reino, confiadas a Antão Gonçalves e Diogo Afonso, e largaram para o Rio do Ouro, à busca de indígenas que pudessem converter ou mercadejar, a expedição não teve sucesso, João Fernandes ficara no Rio do Ouro, foi viajar com os nómadas, procurava novidades de alguns reinos de África.

Antão Gonçalves pediu ao Infante para ir até ao Rio do Ouro buscar João Fernandes, prometendo trazer carregamento que pagasse todo o gasto da viagem, e assim foi, Antão Gonçalves, Garcia Homem e Diogo Afonso partiram para a Madeira, o mau tempo separou as caravelas, só se juntaram no Cabo Branco e depois reencontraram João Fernandes, regressaram carregados de homens e desembarcaram os cativos em Lisboa.

O relato de Zurara possui enorme vivacidade, colorido e até moralístico, como se pode ver na expressão “a vida humana é como uma roda que ora gira na direção da fortuna ora na desgraça”. Encerra o essencial de todo o projeto henriquino, quando necessário mostra o heroísmo dos homens da casa do Infante, com uma descrição de Gil Eanes, Cavaleiro de Lagos, a lançar-se contra os mouros, quando se lançaram na terra de Zaara.

É por demais sabido que estes descobridores viajavam verdadeiramente em terra incógnita. E tal como no passado recente Dinis Dias assinalara que ali começava a terra dos negros, esta expedição que passou a terra de Zaara julgou ter chegado a um braço do Nilo. Tinham descoberto água doce e alguém observou que estariam perto do Nilo e dá-se uma cena de combate entre um guinéu e um português, episódio rocambolesco, assim contado:  
“À vista do guinéu, troncudo, membrudo, de estatura grada, o português, miúdo e delgado, foi para ele, de um salto, e pendurou-se-lhe nos cabelos. O negro era teimoso e valente, e, embora, achasse, espantado, que escarneciam da sua corpulência, por mais voltas que desse não conseguiu libertar-se, que o marinheiro parecia um galgo dependurado na orelha de um touro possante”.

E no meio da fantasia de que se tinha chegado ao Nilo, Zurara é luxuriante na descrição, que ultrapassa todos os níveis da fantasia:  
“O Nilo é o rio das maravilhas, o rio mais nobre do mundo, e a sua grandeza foi cantada pelos sábios da Antiguidade.
Dizem alguns que ele nasce ao pé do Mar Vermelho e dali corre, para o Ocidente, através de muitas terras, e formando, no meio, a Ilha de Meroe. Nesta ilha, do senhorio da Etiópia, há uma cidade outrora chamada Sabá, ao tempo em que o faraó do Egipto lá enviou Moisés. Foi Cambises, rei da Pérsia, quem lhe pôs este nome.
Chegando o Nilo a Meroe, dali se encaminha para o Norte e, do setentrião, volta ao meio-dia; e em certas estações do ano transborda do leito e inunda os campos do Egipto”.

Prosseguem as refregas, reencontram-se as caravelas, regressam os navios a Lagos, mas a impaciência para regressar à costa da Guiné é enorme. E Zurara descreve a valentia de Nuno Tristão que partiu para a terra dos negros e que sessenta léguas além do Cabo Verde ordenou que se entrasse num rio, saíram em batéis e enfrentaram doze embarcações com oitenta guinéus, armados de frechas. E Zurara escreve lamentoso:  
“No fim de contas – Deus louvado – dos vinte e dois homens dos batéis, apenas dois ficaram sãos. E dos sete da caravela que primeiro escaparam, dois caíram trespassados ao levantar dos ferros e jazeram vinte dias às portas da eternidade (…) Assim acabou, o nobre, valente cavaleiro Nuno Tristão, que muito amava a vida; e também João Correia, Duarte de Holanda, Estevão de Almeida e Diogo Machado, fidalgos que o Infante criara na sua Câmara; e outros escudeiros e peões e mareantes e demais gente da companha.
Então, os corpos foram atirados ao fundo dos mares, sepultas suas carnes já frias nos ventres dos peixes vorazes! Mas que importa o túmulo? É igual que sejamos lançados à terra, como às águas, que nos devorem os peixes ou as aves! Felizes dos que morrem com Deus! E se os leitores desta história orarem por Nuno Tristão e pelos outros portugueses, tais mortes tornaram bem-aventuradas!”.

E diz Zurara que o Infante chorou tamanha perda, pois a quase todos criara, em sua casa, desde meninos.

Aqui e acolá, Zurara deriva para outros episódios, como é o caso das Ilhas Canárias, fala da Madeira e do Porto Santo e de novo regressamos à terra dos negros, como Gil Eanes como capitão. No Cabo do Resgate tomaram 46 mouros e houve escaramuças. Para trás ficara o episódio de na região da Guiné, num imenso paul, Diogo Afonso e mais quinze, passaram à frente dos outros e penetraram num arvoredo muito denso e foram surpreendidos, de través, por uns guinéus armados de azagaias, e Zurara escreve:
“Então, correu sangue da nossa gente das terras de África, pois quis a má fortuna que, de sete feridos, morressem logo cinco – dois portugueses e três estrangeiros, dos que acorriam de longe, tentados pela fama de aventuras, e pela largueza de alma do senhor Infante”.

O relato encaminha-se para o seu termo, sempre ziguezagueando na cronologia. Em 1447, o Infante envia caravelas a um lugar chamado Meça, lá voltaram João Fernandes, que vivera sete meses entre os naturais da terra de Zaara, e Diogo Gil, e Rodrigueanes, entre outros, houve tempestade e tiveram que regressar ao reino. E assim escreve Zurara:
“Foram correndo os anos; e, à medida que passavam, tanto se acostumaram os moradores de Lagos, por aquelas terras de mouros, e tamanha confiança ganharam, por sobre as ondas do oceano, que já os homens não se contentavam em viajar até África para guerrear os infiéis e dilatar a lei de cristo. Mas até houve alguns pescadores que abandonaram os lugares conhecidos de seus pais e avós e foram deitar as redes no mar africano. Muitos dos que na conquista de Guiné se esforçaram, puderam ver, por lá, as águas coalhadas de peixe; e, ao tornarem, rogaram a D. Henrique permissão de longínqua pescaria”.

Zurara findou a sua crónica em 18 de fevereiro de 1453. O documento que escreveu é peça fundamental para a história dos descobrimentos henriquinos. Continua a ser polémico, nesta extensa e nebulosa costa da Guiné, saber quem chegou e quando à terra dos negros, os historiadores debatem e não se entendem quanto à data rigorosa da chegada ao que foi a Guiné onde tivemos praças e presídios até que no século XIX se deu a ocupação e nasceu aquela Guiné que é hoje a Guiné-Bissau.
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Nota do editor

Último poste da série de 23 de fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14286: Notas de leitura (684): “Crónica do descobrimento e conquista da Guiné”, por Gomes Eanes da Zurara, adaptação de Frederico Alves, edição da Agência Geral das Colónias (1) (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P14305: Inquérito online: só um em cada quatro de nós admite que não mudou muito, física e/ou psicologicamente. Resultados preliminares: 65 respostas


Guiné > Região de Tombali > Nhala (a nordeste de Buba) > 1974 > Agosto de 1974 > Os "Unidos de Mampatá", em final de comissão, foram despedir-se dos "periquitos" de Nhala (2ª CCAÇ/BCAÇ 4513)... À esquerda, assinalado por um quadrado amarelo, o nosso António Carvallho, o Toni, mais conhecido por Carvalho de Mampatá. Esta foto foi o pretexto para a nossa sondagem desta semana.

Foto: © António Murta (2015). Todos os direitos reservados [Edição: LG]


A. Resultados preliminares da nossa sondagem (n=65)

"AO FIM DESTES 40/50 ANOS, MUDEI MUITO, FÍSICA E PSICOLOGICAMENTE" (RESPOSTA MÚLTIPLA)





1. Sim, mudei muito  > 17 (26%)

2. Mudei muito fisicamemnte  > 29 (44%)

3. Mudei muito psicologicamente  > 24 (36%)

4. Não, não mudei muito  > 18 (27%)

5. Não mudei muito fisicamente  > 13 (20%)

6. Não mudei muito psicologicamente  > 15 (23%)

7. Não sei > 2 (3%)


Votos apurados: 65

Dias que restam para votar: 4 (até ao dia 3 de março)

B. Comentário do Carvalho de Mampatá (*)


Caro Luís: Eu e o meu irmão (posso falar por ele) não nos zangamos por coisa pouca ou por nenhuma coisa. Sobre nós podes publicar tudo porque sabemos que és um rapaz muito ajuizado e jamais publicarias o impublicável. Devo acrescentar que ambos ficámos muito contentes, para não dizer envaidecidos, por sermos alvo da tua atenção, mesmo sabendo que isso se deve à circunstância pouco comum de ambos termos estado no mesmo conflito.

Já agora quero-te informar que o meu irmão é que me deu conta deste post, em comunicação por telemóvel. Na verdade ele dedica-se mais ao computador do que eu e, por isso, costuma alertar-me sempre que aparece algo de novo por estas bandas. Eu, normalmente, só pela calada da noite é que abro esta caixa. 

Sobre o inquérito, já respondi dizendo que estou diferente, física e psicologicamente, porque as marcas da idade e dos escolhos da vida são inelutáveis.

Aproveito para, reiteradamente, manifestar-te a minha gratidão por tudo o que tens feito em prol da manutenção deste nosso blog, intervindo algumas vezes com sabedoria e paciência para curar uma ou outra ferida que, às vezes, emerge.

Um abração
Carvalho de Mampatá.

C. Comentário do Vasco Pires (Brasil) (*):




(i) (...) Boa pergunta, diria eu, andei até a pensar em fazer um "post "
intitulado "Retrato de um jovem soldado, (re)visto por um sexagenário ".

Me pergunto se aquilo que escrevemos são memórias ou construções mentais.  Memória voluntária?  Memória involuntária?  Escrevo sobre mim, ou o "Alfero di canhão" é um outro?

Forte abraço.
VP

(ii) ... Ao que o nosso editor respondeu nestes termos: "Vasco, fico a aguardar o teu poste... Se a nossa pergunta é boa, a tua questão ainda é melhor: (...) "Me pergunto se aquilo que escrevemos são memórias ou construções mentais. Memória voluntária? Memória involuntária? Escrevo sobre mim, ou o 'Alfero di canhão' é um outro?" (...)

(iii) Resposta imediata do Vasco Pires, o brasileiro mais "bairradino" do Brasil:

(...) "Luis, a tua pergunta, me fez lembrar adaptação de uma frase de um notável escritor,afixada numa República de Coimbra que no original diz: 'eu não sou eu nem sou o outro, sou qualquer coisa de intermédio: pilar da ponte de tédio, que vai de mim para o outro' - Mário de Sá-Carneiro" (...).
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Nota do editor:

Guiné 63/74 - P14304: Agenda cultural (380): V. N. Famalicão, Museu Bernardino Machado: ciclo de conferências 2015: Portugal na 1ª Guerra Mundial, pelo Cor Aniceto Afonso, hoje, às 21h30




1. Mensagem encaminhada

De: Museu Bernardino Machado

Data: 25 de fevereiro de 2015 às 16:44

Assunto: Convite - Ciclo de Conferências 2015 - Coronel Aniceto Afonso - 27/02

Sinta-se convidado!

O Ciclo de Conferências 2015 é acreditado pelo CFAE de V. N. de Famalicão para os professores dos grupos 200, 300, 400, 410, 420 e 430. 

Inscreva-se já, em http://www.bernardinomachado.org/





Museu Bernardino Machado

Rua Adriano Pinto Basto, n.º 79

4760-114 Vila Nova de Famalicão

Telef. 252 377 733

Site: www.bernardinomachado.org

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Nota do editor:

Último poste da série > 24 de fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14293: Agenda cultural (383): Lançamento do livro "Dez Décadas de Força Aérea", dia 4 de Março de 2015, às 17h30, no Auditório do Estado Maior da Força Aérea, Av. Leite de Vasconcelos, 4 - Lisboa

Guiné 63/74 - P14303: Parabéns a você (869): Luís Moreira, ex-Alf Mil Sapador do BART 2917 e BENG 447 (Guiné, 1970/71)

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Nota do editor

Último poste da série de 26 de Fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14299: Parabéns a você (868): João Carlos Silva, Amigo Grã-Tabanqueiro, ex-1.º Cabo Esp MMA (Força Aérea Portuguesa, 1979/82)

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

Guiné 63/74 - P14302: Recordando a Operação Revistar (Mário Vitorino Gaspar, ex-Fur Mil Art MA da CART 1659)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Vitorino Gaspar (ex-Fur Mil At Art e Minas e Armadilhas da CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68), com data de 11 de Fevereiro de 2015:

Caros Camaradas:

Envio-lhes a “Operação Revistar”, quando da sua preparação, mereceu decerto a atenção devida, até pela ambição do projecto. Destruição de acampamentos; capturar o chefe Nino Vieira e apanhar armamento e documentação do PAIGC. Era obra…

Enquanto a NT, principalmente os nossos Comandantes Militares, planeavam a Acção mortífera, o “nosso deles” Serviço de Informação, funcionou ao contrário. O informador “jogava com um pau de dois bicos”, toda a Guiné sabia, e mais que eu… talvez até o nome da Operação.

Grande fracasso! E como existe medo de se contar a verdade, surge a mentira. Vivi tudo isto.
Estive dias beliscando papéis no Arquivo Histórico-Militar. Encontrava um, faltava-me outro, mas reuni estes elementos. Tenho fotocópias de tudo, poderia ter escrito mais. Gostava de saber por que razão camaradas da CCAÇ 1620 não respondem aos meus mails, e um até foi mal educado, porque nem sequer lhe tinha dito quem era já me tinha respondido que “não queria comprar nada”.

Por que razão na História da Unidade da CCAÇ 1620 não falam desta Operação?

Um abraço
Mário Vitorino Gaspar




OPERAÇÃO REVISTAR

Acabado de gozar Licença na Metrópole, em Bissau só se falava de uma Operação a efectuar no Sector 2, onde a CART 1659 estava agregado em termos operacionais por ser no caso uma Companhia Independente.

Escrevi uma carta à minha mulher que “estava já farto de Bissau, porque aqui só se fala em guerra”. Sou chamado ao Quartel-General, encontrava-me hospedado no Hotel Portugal, e lá me foi dito que tinha de partir com urgência para Gadamael. Respondi que não tinha transporte nos barcos tão depressa, e disseram para ir ao aeroporto que partiria de avioneta para Gadamael Porto. 

Pouco descansei, seguimos com um Grupo para Mejo a 30 de Novembro. A CCAÇ 1591 partiu para a Operação. O ambiente, passado pouco tempo era escaldante, tínhamos conhecimento do que se ia passando. Surgiam muitos evacuados por insolações. Analisei militarmente a situação e concluí que iríamos todos os que fazíamos a segurança a Mejo, chamados a intervir na Operação. 

Comecei por escrever cartas de despedida para os familiares, namoradas e amigos. Entreguei-as em mão a um camarada Furriel Miliciano de Mejo, pedindo-lhe que as guardasse, e no caso de não regressar que as colocasse no Correio. Conhecia bem Mejo, Quartel onde estava destacada a CCAÇ 1591, comandada pelo Capitão de Infantaria Luís Carlos Loureiro Cadete. O então Capitão Cadete já era meu conhecido do CISMI, em Tavira. Tinha sido o meu Comandante do Pelotão da Especialidade de Armas Pesadas, Especialidade que iniciara a Agosto de 1965. Ele na altura era Alferes, a famosíssimo Alferes Cadete, tão conhecido por todos os Sargentos Milicianos.

Mas a “Operação Revistar”, e segundo o que se pode ler na História da Unidade da CART 1613, destacada em Guileje, não se desenrolou de 1 a 3 e de 6 a 7 de Dezembro de 1967, já teriam sido efectuadas outras Operações Secundárias da “Operação “Revistar”, por parte da CART 1612, com Montagem de uma base de fogos em Nhacobá (com Pelotão de Morteiros 1086, Pelotão de Milícias 137 e CCAÇ Nativos). Causaram ao IN 5 feridos confirmados. As NT sofreram 1 morto, 3 feridos graves e 6 ligeiros. 

Também existem sinais da intervenção da CCAÇ 1622, Patrulhamento e Emboscada no “Corredor de Guileje” onde as NT foram flageladas à distância. Isto no dia 27 de Novembro de 1967.

A CCAÇ 1622 viria a ser a maior vítima da “Operação Revistar”, que tinha por objectivo a Acção ofensiva em diversos acampamentos do PAIGC e o aprisionamento do chefe Nino Vieira. Participaram na “Operação Revistar”, a CCAÇ 1622; CCAÇ 1591; CCAÇ 1624 e CART 1613.

No dia 3 (de dezembro de 1967), teve a Companhia, 3 feridos (um Oficial, um Sargento e um Soldado; 18 evacuados por esgotamento físico e dois por doença).

No dia 6, repete-se a Operação, e para além das Companhias que tinham estado na 1.ª Acção no terreno, foram reforçados com a minha CART 1659 e CCAÇ 1620.

Na História da Unidade da CCAÇ 1620, nem uma linha sobre a “Operação Revistar”, entretanto esteve lá.

Na História da Unidade da CART 1659 consta:

“De 1 a 3 e de 6 e 7 de Dezembro de 1967, feita a Operação Revistar, uma Acção ofensiva na Península de Salancaur, tendo as forças da CART 1659 colaborado numa primeira fase, montando segurança ao aquartelamento de Mejo. Numa segunda fase, participaram da operação juntamente com as forças da CART 1613 e CCAÇ 1591, 1622 e 1624. Os objectivos previstos não foram atingidos devido ao esgotamento físico das nossas tropas”.

Na História da Unidade da CCAÇ 1591, repetem-se as dificuldades que a NT teve ao percorrer matas fechadas, calor intenso o que provocou o agravamento do estado físico das NT. Termina dizendo que a Companhia acusou, notoriamente, as 5 noites ao relento, dormindo no chão e a falta de alimentação capaz, antes de iniciar a Operação.

Na História da Unidade da CCAÇ 1624, repete-se o mesmo, só com mais 15 evacuações (1 Oficial e 1 Sargento), não existindo condições para se concluir a Operação.

No dia 7 de Dezembro encontrei-me com o Comandante da “Operação Revistar”, o Capitão Luís Carlos Loureiro Cadete. Estranho,  por nunca nos termos encontrado, quando ia tantas vezes a Mejo e a sua CCAÇ 1591 as visitas que fazia a Gadamael Porto. Olhou-me, e reconheceu-me. Mesmo junto da bolanha, com a zona a atingir escondida, faziam-se evacuações. O helicóptero ali perto, e foi ele que iniciou a conversa. Perguntou-me o que pensava da Operação.

- Quem está a sobrevoar sobre nós a todo o momento, e que ao mesmo tempo nos localiza? -  perguntei eu.

Respondeu que era o Comandante da Operação. Falei-lhe que toda a Guiné, de certeza sabia daquela Operação, e qual a razão do Comandante da Operação não pisar terra e ver o estado de espírito das NT.. Com certeza que o PAIGC se juntara todo na Península de Salancaur. Respondeu-me que, segundo informações recolhidas,  o PAIGC tinha 20 Canhões S/R, apontados para a bolanha, bolanha essa por onde entraríamos.

Segundo o que se dizia, Paraquedistas, Fuzileiros e Comandos actuariam do lado oposto da bolanha, depois de nós iniciarmos o avanço. Logo após os primeiros passos cairiam sobre nós e poucas possibilidades de sobreviver. O Capitão chamou o Comandante a terra, saiu de um helicóptero com um camuflado acabado de sair do Casão, muito gordo.

Passado pouco tempo dão-nos ordens para irmos para Mejo. Caminhada rápida. Lembro-me que nem um gole de água bebera do cantil. Perguntei a todos se tinham sede. Ninguém quis. A dentadinha na palha verde do capim era eficaz, molhava os lábios. Rindo, depois de ouvir de todos que não queriam água, despejei o cantil sobre a cabeça. Chegado a Mejo, pedi as cartas ao Furriel Miliciano, meu camarada e rasguei- as. Bebi a minha dose de cerveja. Seguimos de imediato para Gadamael.

Não se entende a razão de logo no dia seguinte o Capitão de Infantaria Luís Carlos Loureiro Cadete foi em coluna auto para Cacine, e no dia 10 embarcou com destino a Buba, via Bolama. Buba (curiosamente era a Sede do Sector 2 em termos operacionais). Foi afastado devido ao fracasso da Operação Revistar? Não sou capaz de encontrar uma outra resposta. Não conheço nenhuma rendição nestes termos.

Sobre a actividade da Força Aérea nada é focado, mas que a aviação esteve lá não me podem negar. Dias antes já actuava, e em força, bombardeando constantemente a Península de Salancaur.

Em relação aos motivos que levaram que a Operação não fosse concluída, todos falam em desgastes nas NT.

Estavam Paraquedistas, Fuzileiros e Comandos do lado contrário da Bolanha? E a aviação?

Uma Grande Operação falhada. Quem foram os culpados?

Estes também foram para mim dias horríveis, 7 dias consecutivos que não esqueço.

Nota: - Pena que o Blogue não tenha camaradas destas Companhias. Ou tem? Colaborem para tentarmos encontrar uma resposta. Assim se pode colocar a verdade na história da Guerra Colonial.

Mário Vitorino Gaspar

Guiné 63/74 - P14301: Pensamento do dia (20): "Em Mueda, os cordeiros que entram, são lobos que saem. Adeus, checas". (Grafito, c. 1968/70)


Moçambique > Mueda > CART 2369 (1968/70) > O 2º sargento miliciano Sérgio Neves (que também passou pela Guiné), irmão do nosso camarada Tino Neves, junto a um mural onde se lê: "Em Mueda, os cordeiros que entram, são lobos que saem. Adeus,  checas". Recorde-se que o checa, em Moçambique, era o nosso pira ou periquito, na Guiné (ou maçarico, em Angola). (**)

Foto: © Tino Neves (2007). Todos os direitos reservados.[Editada por L.G.]


1. Comentário do editor:

Pode ser uma boa frase ou um pretexto para uma reflexão à volta do tema da sondagem desta semana (*). Em que   medida a guerra muda os combatentes, física e psicologicamente ? E como é que os antigos combatentes, nomeadamente os que passaram pelo TO da Guiné,  se veem hoje, 40 ou 50 anos depois ?... Obviamente, o grafito (a frase inscrita na parede, algures num quartel em Mueda, no norte de Moçambique,. por volta de 1968/70) não tem que ser tomado à letra... Tem um sentido figurado. (**)

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(**) Último poste da série > 25 de fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14297: Pensamento do dia (19): A sociedade de Brunhoso (Francisco Baptista)

Guiné 63/74 - P14300: História do BART 3873 (Bambadinca, 1972/74) (António Duarte): Parte XXII: novembro de 1973: crescente africanização da guerra de contraguerrilha no setor L1: são a CCAÇ 12 e a CCAÇ 21, constituídas por militares do recrutamento local, quem se arrisca a ir à sempre temida região do Poindom / Ponta do Inglês


Guiné > Zona leste > Setor L1 (Bambadinca) > c. 1970/72 > Paisagem típica da bacia hidrográfica do rios Geba e Corubal.

Foto: © Benjamim Durães (2010). Todos os direitos reservados.


1. Continuação da publicação da História do BART 3873 (que esteve colocado na zona leste, no Setor L1, Bambadinca, 1972/74), a partir de cópia digitalizada da História da Unidade, em formato pdf, gentilmente disponibilizada pelo António Duarte (*)

[António Duarte, ex-fur mil da CART 3493, a Companhia do BART 3873, que esteve em Mansambo, Fá Mandinga, Cobumba e Bissau, 1972-1974; foi transferido para a CCAC 12 (em novembro de 1972, e não como voluntário, como por lapso incialmente indicamos); economista, bancário reformado, formador, com larga experiência em Angola; foto atual à esquerda].

O destaque do mês de novembro de 1973 (pp. 74/77) vai para:

(i) fraca atividade do IN no setor L1 (Bambadinca), com flagelações ao Enxalé e ao Xime; intensificação da atividade no sul da província, no subsetor de Cobumba (onde o BART 3873 tinha uma companhia destacada, a CART 3493, que antes guarnecia  Mansambo);

(ii) crescente pressão do PAIGC sobre as populações sob o seu controlo na zona de Madina/Enxalé;

(iii) crescente "africanização da guerra de contraguerrilha" no setor L1: são a CCAÇ 12 (agora unidade de quadrícula do Xime) e a CCAÇ 21 (unidade de intervenção ao serviço do comando do BART 3893), ambaS "constituídas por militares do recrutamento provincial", quem se arrisca a ir à sempre temida região do Poindom / Ponta do Inglês; percebe-se: os "tugas" do BART 3893 estão em fim de comissão;

 (iv) a CCAÇ 21, comandada pelo ten comando graduado Jamanca,  tinha regressado ao setor L1 (Bambadinca), vinda do setor L6 (Pirada); a ela pertencia o nosso saudoso Amadu Bailo Jaló (1940-2015), com o posto de alferes comando graduado;

(v) visita,  a Bambadinca, de jornalistas brasileiros e dinamarqueses.

(vi) reafirmação do "perfeito entendimento" entre civis e militares e entre militares europeus e guineenses;

(vii) atribuição do "13º mês", beneficiando os militares do recrutamento provincial;

(viii) Sexa Governador e Com-chefe, gen Bettencourt Rodrigues visita, pela 1ª vez, Bambadinca, no exercício das suas funções; guarda de honra constituída por uma companhia a três pelotões; 

(ix) preocupações, do comando do BART 3873,  com o crescente entendimento do Senegal com o PAIGC.










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Nota do editor:

Último poste da série > 26 de janeiro de  2015 > Guiné 63/74 - P14189: História do BART 3873 (Bambadinca, 1972/74) (António Duarte): Parte XXI: outubro de 1973: Flagelação, pela primeira vez, do reordenamento de Nhabijões, de maioria balanta, com parentes no mato...

Guiné 63/74 - P14299: Parabéns a você (868): João Carlos Silva, Amigo Grã-Tabanqueiro, ex-1.º Cabo Esp MMA (Força Aérea Portuguesa, 1979/82)

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Nota do editor

Último poste da série de 25 de Fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14295: Parabéns a você (867): Gumerzindo da Silva, ex-Soldado Condutor Auto da CART 3331 (Guiné, 1970/72)