segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

Guiné 63/74 - P15781: Caderno de Notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (42): A unidade que os cabo-verdianos ajudaram a criar

1. Texto do Antº Rosinho, enviado ontem, domingo, a que se seguiu o comentário de hoje ao poste P15778 (*),  e que diz:

Não é a propósito mas uso este meio
para aconselhar 
que leiam a entrevista de Pedro Pires
no Diário de Notícias de hoje
["Aceitar o uso da violência foi uma decisão difícil",
DN, 22/2/2016; entrevista por Mariana Pereira].
Esta gente continua a não se abrir (meias mentiras), aos 81 anos, 
e,  passados mais de 40 anos,
esta meia dúzia de cabo-verdianos do PAIGC,
continuam a não ser sinceros.
Nem quando ali afirma que foi doloroso pegar em armas.
Na entrevista nem se aborda o assassinato de Amílcar, 
que não deve ter sido tão doloroso para essa gente.
Luís Graça, ainda bem, que te enviei o mail sobre o sonho de Cabral, 
10 horas antes de ler esta entrevista.
Menciona, porque sou eu só contra o cinismo.
Desculpa,  Luís, e o Doutor Gardette, 
um médico colonial com fama em Bissau de um grande humanista, 
de certeza que era contra as armas apontadas 
aos guineenses do lado de lá da fronteira.


[, António Rosinha, foto à esquerda: 
emigrou para Angola nos anos 50, 
 fez o serviço militar obrigatório nessa  sua segunda terra,  
que ele muito amou, 
foi fur mil em 1961/62; 
saiu de Angola com a independência, 
emigrou para o Brasil;
e finalmente foi topógrafo da TECNIL, 
como "cooperante", na Guiné-Bissau, em 1979/93; 
é um "ex-colon e retornado" (sic), 
como ele gosta de dizer 
com a sabedoria, 
a bonomia 
e o sentido de humor de quem viveu  várias vidas 
e, felizmente, está vivo para as contar; 
é membro sénior da Tabanca Grande, 
um dos nossos "mais velhos" ,
a quem a sabedoria africana manda respeitar e saber ouvir]


2. Caderno de Notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (42): A unidade que os cabo-verdianos ajudaram a criar

Ou a UNIDADE onde Amílcar Cabral se inspirou para imaginar a tal Unidade Guiné-Cabo Verde, (im) possível pós-independência.

 Talvez para quem não foi Retornado como eu, com vários anos de Angola, e muitos anos na Guiné pós-independência, não compreenda e até duvide  daquilo que afirmo.

 Existia uma Unidade Guiné-Cabo Verde, uma Unidade Angola-Cabo Verde, uma Unidade São Tomé-Cabo Nerde e com pouca intensidade uma Unidade Moçambique-Cabo Verde.

 As gerações de Amílcar Cabral, Pedro Pires, Mário Wilson, Bana, para falar só de gente que todos conhecem, conheceram bem, muito bem, melhor que eu , que essas Unidades existiam, tanto nos diversos territórios Ultramarinos portugueses como mantinham também essa unidade entre si, aqueles que residiam, estudavam, ou jogavam à bola, aqui na Metrópole.

E foi baseado nessas Unidades que Amílcar chegou a sonhar que era possível a tal almejada  Unidade Guiné-Cabo Verde.

Fur mil Rosinha, Luanda, 1961
 Devo ser eu a primeira pessoa a  escrever isto, mas garanto que não sou o primeiro africanista ou quem viveu por lá a pensar assim.

 Essa Unidade que todos os Cabo-verdianos antigos conheceram, era “caldeada” naquilo que, e aqui muita gente diz que não existiu, ou então deprecia, o chamado LUSOTROPICALISMO.

 E foi nessa Unidade, que surgem irmanados internacionalmente, os embriões dos movimentos  ( hermons)que deram origem aos  actuais Partidos que dominam e governam os vários PALOP: PAIGC, MPLA, MSLPT, e FRELIMO.

 O PAICV aparece posteriormente como sabemos e já alterna no poder em Cabo Verde.

O próprio Amílcar Cabral participa na fundação do MPLA com os angolanos. E até um angolano,  dos irmãos Pinto de Andrade,  chega a pertencer a um governo de Luís Cabral na Guiné.

 E toda a gente em Angola  diz que José Eduardo dos Santos, angolano, é filho de Sãotomenses.

Tantos as Ilhas de Cabo Verde como de São Tomé conheciam e usufruíam bem dessa Unidade.
Eram muitos milhares de cabo-verdianos que viviam nas grandes cidades de Angola, antes e depois de 1961 com a guerra do Ultramar. E também muitos em São Tomé, que ficaram por lá esquecidos numa grande  miséria por Cabo Verde e Portugal, pós-independência  (reportagem na televisão há poucos anos).

 Esse sentido de Unidade que existia  nos anos 50,  era tão natural e tranquila e num ambiente de paz de tantos anos (a pacificação já tinha terminado havia alguns anos) que se uniram para formar aqueles movimentos dentro do mesmo espírito  ideológico e um grande sentido de irmandade.

 Parecia fácil a sonhada independência  “que nós governamos melhor os nossos riquíssimos países do que os portugueses que só nos atrasam", era uma frase feita em Luanda por brancos e mestiços e negros da cidade de Luanda, nados e criados nas Áfricas, com algum apoio de uns tantos politizados metropolitanos,  por simples anti-salazarismo.

 Era esta a ideia geral que imperava nos anos 50 em muitíssima gente em todas as ex-colónias, e assim se uniram esses  hermons numa ideia comum, luta comum pela independência.

 Até que…aparece uma guerra que surpreendeu toda a gente, a UPA com o seu tribalismo, racismo e separatismo,  Congo, Norte de Angola  e o resto.

 Esta surpresa não foi apenas pela chacina dos fazendeiros brancos do Café do Congo, mas também para essa maioria de irmãos unidos, onde muitos entusiastas das independências, e muitos anti-salazaristas fizeram uma giratória de 180 graus, e tanto cabo-verdianos e angolanos ou ficaram “em cima do muro” ou abertamente puseram-se ao lado do exército colonial.

E quando Amílcar Cabral e aquelas elites irmãs, independentistas avançam em  Angola, Guiné e Moçambique, embora bem organizados devido à sua capacidade, já não contavam com quantidades nem multidões, e como todos sabemos, no caso de cabo-verdianos do PAIGC eram mesmo um número reduzidíssimo.

Essas Umidades  coloniais  e anti-coloniais conheci e vivenciei.

 Era uma Unidade bonita, rica, feliz com muita vida, sentia-se no ar, nas cidades, nas fazendas de café, sisal, praias, campos de futebol e outros desportos.

 Mas essa Unidade após 1961, com a Guerra do Ultramar, ficou muito confusa, e aquela minoria dos movimentos, como nunca conseguiram cativar o povo para o seu lado, foi à base de armas na mão que se conseguiram impor… ao próprio povo.

 E como dentro dos próprios partidos houve enormes chacinas não se pode mais falar em qualquer sentido de Unidade.

Essa Unidade que Amílcar conheceu e viveu, não existe mais, e não sei mesmo se na CPLP existe algum sentimento  que se possa chamar Unidade.

Para terminar, digo que me lembrei de escrever isto, porque hoje, 21, Domingo, li num jornal que Portugal ainda deporta gente para Cabo Verde.

Deporta Cabo-verdianos, não li tudo, fiquei sem saber se foram deportados para a ilha do Tarrafal ou para Santiago. 

Cumprimentos para toda a gente,
Antº Rosinha (**)

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(**) 15 de fevereiro de 2016 > Guiné 63/74 - P15748: Caderno de Notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (42): As riquezas das matéria primas africanas e as fantasias criadas

Guiné 63/74 - P15780: Consultório militar do José Martins (18): Forças Militares Portuguesas que passaram por Empada

1. Em mensagem do dia 8 de Fevereiro de 2016, o nosso camarada José Marcelino Martins (ex-Fur Mil Trms da CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70), a propósito da consulta feita ao Blogue pelo nosso leitor Umaru Sambu, que deu origem ao P15720, enviou-nos a relação das Unidade Militares que passaram por Empada.


Dizia-nos Umaru Sambu na sua mensagem de 6 de Fevereiro:

Sou guineense, natural de Empada, maior de 60 anos de idade, vivo em Portugal desde 1986, filho de Bacar Sambu, antigo Soldado Miliciano em Empada, e sobrinho do antigo Comandante Miliciano Bajo Sambu, falecido em combate em 1963.

Este meu tio, Bajo Sambu, passado algum tempo depois da sua morte, como tinha deixado dois filhos menores, entre cinco e seis anos de idade, por qualquer motivo, foi-nos comunicado, na altura, que dentro da companhia de militares portugueses que tinham estado em Empada na altura da morte trágica dele, estavam Bissau, na capital, de partida para a metrópole e que tinham requerido para trazerem um dos filhos deste meu tio, nomeadamente o filho mais velho que tinha na altura 6 anos de idade, cujo nome era Infamara Buli Sambu, que assim foi.

Na altura o pedido foi aceite do imediato, porque como sabe naquela altura era mesmo perigoso viver naquela aldeia de Empada por causa dos ataques dos rebeldes. Não sei como foi feito o processo da vinda dele mas de facto foi trazido por uma companhia que antecedeu a companhia de Cap. Borges, Os Maiorais.
[...]

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Guiné-Bissau > Região de Quinara > Empada > 1969 > Parque da Oficina Auto e no exterior as moranças.
Foto: © Arménio Estorninho


2. Comentário do nosso camarada José Martins:

Parece haver nesta solicitação, alguma confusão de datas.
Trata-se de factos com quase 50 anos e passado com rapazes/crianças muito novas na altura.
Fala-se de ocorrências de 1963 e outras que poderão ter acontecido, pelos factos evidenciados, entre 1966 e 1968.

Segue listagem das unidades e subunidades presentes em Empada, com a origem das mesmas, período em que guarneceram aquele destacamento e os oficiais que exerceram o comando das mesmas.
Exceptuam-se os Pelotões de Morteiro cujo comando só se poderá obter em consulta ao Arquivo Histórico-Militar, caso haja História da Unidade.


Forças Militares Portuguesas que passaram por Empada: 

Companhia de Caçadores n.º 153 (RI 13 – Vila Real), destacou um pelotão que esteve entre Julho de 1961 e Fevereiro de 1963. A companhia foi comandada pelo Capitão de Infantaria José dos Santos Carreiro Curto.

Companhia de Caçadores n.º 84 (RI 1 – Amadora), destacou um pelotão que esteve entre Fevereiro de 1962 e Abril de 1963. A companhia foi comandada pelos: Capitão de Infantaria Manuel da Cunha Sardinha e Capitão Miliciano de Infantaria Jorge Saraiva Parracho.

Companhia de Caçadores n.º 417 (RI 15 – Tomar), ocupou o aquartelamento entre Abril de 1963 e Julho de 1964, quando terminou a comissão. Foi comandada pelo Capitão de Infantaria Carlos Figueiredo Delfino.

Companhia de Caçadores n.º 616 (RI 1 – Amadora), ocupou o aquartelamento entre Abril de 1964 e Janeiro de 1966, quando acabou a comissão. Foi comandada pelo Alferes Miliciano de Infantaria Joaquim da Silva Jorge, Capitão Miliciano de Infantaria António Francisco do Vale, Capitão de Infantaria José Pedro Mendes Franco do Carmo, de novo Alferes Miliciano de Infantaria Joaquim da Silva Jorge e Capitão de Cavalaria Germano Miquelina Cardoso Simões. Ostentou como Divisa “Super Omnia”.

Companhia de Milícias n.º 6, (Recrutamento local), ocupou o aquartelamento entre Janeiro de 1965 e Dezembro de 1971, até à extinção da força

Companhia de Caçadores n.º 1423 (RI 15 – Tomar), ocupou o aquartelamento entre Janeiro de 1966 e Dezembro do mesmo amo, seguindo depois para o Cachil. Foi comandada pelo Capitão de Infantaria Artur Pita Alves, Capitão de Infantaria João Augusto dos Santos Dias de Carvalho, Capitão de Cavalaria Eurico António Sacavém da Fonseca, de novo Capitão de Infantaria João Augusto dos Santos Dias de Carvalho, e de novo Capitão de Infantaria Artur Pita Alves. Ostentou como Divisa “Firmes e Constantes”.

Companhia de Caçadores n.º 1587 (RI 2 - Abrantes), ocupou o aquartelamento entre Novembro de 1966 e Janeiro de 1968, seguindo para Bissau. Foi comandada pelo Capitão Miliciano de Infantaria Pedro Eurico Galvão dos Reis Borges.

Companhia de Caçadores n.º 2381 (RI 2 - Abrantes), ocupou o aquartelamento entre Maio de 1969 e Fevereiro de 1970, seguindo para Bissau. Foi comandada pelo Capitão Miliciano Graduado de Infantaria Eduardo Moutinho Ferreira Santos. Ostentou como Divisas “Os Maiorais” e “Pela Lei. Pela Grei”.

Companhia de Artilharia n.º 2673 (GACA 2 – Torres Novas), ocupou o aquartelamento entre Fevereiro de 1970 e Maio de 1971, seguindo para Bissau. Foi comandada pelo Capitão de Artilharia Adolfo Pereira Marques e Capitão Miliciano José Vieira Pedro. Ostentou como Divisa “Leões de Empada”.

Companhia de Caçadores n.º 3373 (RI 1 - Amadora), ocupou o aquartelamento entre Maio de 1971 e Maio de 1972. Foi comandada pelo Capitão Miliciano de Artilharia Adérito Assis Cadório. Ostentou como Divisa “Os Catedráticos” e “Por Uma Guiné Melhor”.

Pelotão de Morteiros n.º 3020 (RI 2 – Abrantes), ocupou o aquartelamento entre Maio de 1971 e Março de 1973.

Companhia de Caçadores n.º 3566 (BC 10 - Chaves), ocupou o aquartelamento entre Maio de 1972 e Abril de 1974, terminando a comissão. Foi comandada pelo Capitão Miliciano de Infantaria João Rocheta Guerreiro Rua, Capitão de Infantaria Herberto Amaro Vieira Nascimento e Capitão Miliciano de Infantaria Pedro Manuel Vilaça Ferreira de Castro.

Pelotão de Morteiros n.º 4277/72 (RI 2 – Abrantes), ocupou o aquartelamento entre Janeiro e Agosto de 1973, seguindo para Aldeia Formosa.

Companhia de Caçadores n.º 4944/73 (BII 19 – Funchal), ocupou o aquartelamento entre Junho de 1974 e Setembro de 1974, aquando da retracção das nossas tropas. Foi comandada pelo Capitão Miliciano de Infantaria Mário José de Oliveira Pinheiro. Ostentou como Divisa “Os Galos do Cantanhez”.
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Nota do editor

Último poste da série de 12 de fevereiro de 2016 Guiné 63/74 - P15739: Consultório militar do José Martins (17): Arquivos, Bibliotecas e Centros de Documentação - Arquivo Histórico Militar

Guiné 63/74 - P15779: Notas de leitura (810): “Amílcar Cabral, Um outro olhar”, por Daniel dos Santos, Chiado Editora, 2014 (2) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 27 de Abril de 2015:

Queridos amigos,
É inegável que Daniel dos Santos se esforçou por nos apresentar uma narrativa biográfica alternativa às dos historiadores guineenses. Sem desmerecer da sua coragem a desmontar os aspetos mitológicos do PAIGC, a sua investigação tem à partida uma declaração de que o cabo-verdiano não é confundível com o guineense. E vezes sem conta irá pôr o acento tónico na unidade Guiné-Cabo Verde que foi a chave para o êxito do PAIGC e do seu descalabro. O autor diz-se guiado pela única preocupação de descrever Cabral como um homem e acabou por atolar o homem na sua obra, com poucos benefícios para ambos. Seja como for, é trabalho de investigação que não se pode descurar.

Um abraço do
Mário


Uma nova investigação sobre Amílcar Cabral (2)

Beja Santos

“Amílcar Cabral, Um outro olhar“, por Daniel dos Santos, Chiado Editora, 2014, é uma obra que tem que ser levada a sério pelo esforço de investigação, pela procura de uma análise original, por ensaiar uma resposta cabo-verdiana às investigações já feitas por historiadores guineenses.

Daniel dos Santos, não terá sido por acaso, inicia o seu trabalho questionando a índole do povoamento, da civilização peculiar que ali se estabeleceu, com a sua cultura euroafricana, uma colonização que depois transferiu as suas gentes em missões civilizadoras e coloniais na Senegâmbia, em Angola e S. Tomé. Retrata a formação de Cabral em Cabo Verde e define-o como um produto do seu tempo, alguém que aspirava vir a ser engenheiro e poeta. Um Cabral que se torna contestatário em Lisboa, aqui chega exatamente no tempo em que o colonialismo é posto em questão, esse Cabral torna-se um profissional de competências reconhecidas, trabalha na Guiné, depois em Lisboa, a seguir em Angola e novamente em Lisboa, e daqui parte, no final da década de 1950, para um exílio feito à opção de combater o colonialismo. O autor dá-nos o ambiente em que Cabral mergulha nesses anos 1950, na Guiné e em Angola, identifica os movimentos, dá como comprovado que a greve e a tragédia do Pidjiquiti nada teve a ver com o PAIGC, só muito remotamente com o Movimento de Libertação da Guiné.

Enquanto o historiador Julião Soares Sousa se preocupou no seu incontornável trabalho “Amílcar Cabral, Vida e morte de um revolucionário” em procurar interpretar os fenómenos federativos africanos, em voga, na segunda metade da década de 1950, e a que Cabral não foi alheio, Daniel dos Santos disserta sobre o movimento anticolonial e como o contexto internacional exigiu que cada um dos países em luta pela sua libertação dispusesse de um partido. O autor dá também como comprovado que até 1959 não há nem PAI nem uma organização definida, nem estratégia para a conquista do poder, a partir de Conacri as mensagens dirigidas ao governo de Salazar falam em negociações, liberdades, constituição de partidos, sindicatos, etc. Goradas as negociações, o aparelho partidário ganha caracterização e a fórmula da unidade Guiné-Cabo Verde surge exclusivamente da cabeça de Cabral, reconhecendo que precisa de quadros qualificados e que não os tem nos grupos guineenses.

No nosso ponto de vista, Daniel dos Santos comete um erro crasso quando procura dissociar Cabral da história do PAIGC, quando comprovadamente o líder revolucionário em nenhuma circunstância pode ser apartado da sua obra. Já está Cabral assassinado, já o autor questionou a quem interessava a morte do fundador do PAIGC, e tendo sido dadas respostas já formuladas por toda a gente (a saber: “Os dados da investigação permitem concluir, à cautela, que a causa próxima da morte de Amílcar Cabral terá sido o ambiente político que o rodeava, em resultado do dissídio entre guineenses e cabo-verdianos, conjugado com certeza com outros fatores, em particular a ação de Sékou Touré, da PIDE e de António Spínola. Cumpre dizer que tanto as autoridades coloniais como Sékou Touré investiram politicamente na divisão entre guineenses e cabo-verdianos. Tanto podia ser mandado eliminar pelo general Spínola como por Sékou Touré, pela PIDE ou pelos seus próprios camaradas de partido”, e mais adiante refere uma profecia de Amílcar Cabral: “Se um dia eu for assassinado, sê-lo-ei, provavelmente, por um homem do meu povo, do partido e, talvez mesmo, da primeira hora”) e Daniel Santos lança-se na história do PAI até ao PAIGC. Escalpeliza todas as contradições sobre a mitologia de um partido nascido em 1956 do qual não há um documento escrito. O PAIGC tinha que procurar uma data remota para a sua existência já que o MLG datava de 1958, o MLGC de 1959, a UPICV de 1954/1955, e a UDC de 1958. Mesmo na reunião de Setembro de 1959, a que Cabral assistiu, em Bissau, há fortes contradições dos participantes. Julião Soares Sousa também hesita perante certas faltas de provas e opiniões hesitantes dos possíveis participantes da reunião. Para o autor o PAIGC evoluiu de um partido tendencialmente democrático para um partido totalitário em que o seu secretário-geral era a cabeça, a coluna vertebral, o sopro anímico, os braços da execução. Cabral é a estratégia do PAIGC, é ele quem lança a guerrilha de modo a surpreender o Estado-Maior português, e conseguiu: “(…) Desencadeámos a luta armada no centro, no sul e no norte (…) Optámos por uma estratégia a que poderíamos chamar centrífuga: a partir do centro para a periferia. E esse facto provocou uma grande surpresa aos portugueses, que tinha concentrado as suas tropas na fronteira da Guiné e do Senegal”.

Temos depois a caracterização do PAIGC: partido de massas, totalitário, de inspiração animista, guiava-se organicamente pelo centralismo democrático, pela direção coletiva, as suas estruturas repousavam em células, em milícias populares; a filiação ao PAIGC estava estritamente regulamentada: militantes e aderentes. Para Cabral os militantes eram os melhores filhos da nossa terra. E tendo radicalmente separado o homem político da sua construção, Daniel dos Santos diz-nos inesperadamente que Cabral era o corpo e alma do partido, e cita abundantemente Cabral, do género: “Não há nenhum ato, de qualquer dirigente deste Partido, relativo à sua vida, às suas ações, às suas conveniências, que não pode passar pela direção superior do Partido. Só assim é que podemos controlar os camaradas para sabermos o que é que os camaradas estão de facto a fazer”. Do princípio ao fim, Cabral giza uma democracia revolucionária, o partido único onde cabem só os melhores, em que os militantes só se podem casar com autorização do partido. O autor explica o que aconteceu no Congresso de Cassacá, daqui saíram diretivas sobre a orgânica militar e a fiscalização do político sobre o militar. Os quatro anos do governo de Arnaldo Schulz foram marcados exclusivamente pela temática militar, Schulz tinha inicialmente confiado numa vitória, cedo se apercebeu que o inimigo estava moralizado, gradualmente melhor equipado e possuía a iniciativa, a tal ponto que em Março de 1968 o aeroporto de Bissalanca foi atacado. Mas com António de Spínola, Cabral e o PAIGC vão conhecer um embate maior: a guerra psicológica a par de uma mentalidade ofensiva que se julgava perdida por parte dos portugueses.

(Continua)

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Não gosto de vir da Feira da Ladra de mãos vazias. A sorte favorece os audazes que vasculham pacientemente os caixotes de brochuras, panfletos e publicações que parecem condenadas ao esquecimento. Desta feita, na brochura da Unibanco intitulada Roteiro de uma viagem pelo mundo, de 2008, encontrei a propósito dos Bijagós esta portentosa fotografia. Nem era preciso dizer que se tratava de gente dos Bijagós, são bem visíveis dois dançarinos que levam as suas máscaras a imitar cabeças de vaca, o que aqui resplandece é o festival de cor, é um mundo de gente nova, pacífica, e nós imaginamos que eles confiam que têm um mundo melhor à sua espera.
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Nota do editor

Poste anterior de 19 de Fevereiro de 2016 Guiné 63/74 - P15766: Notas de leitura (809): “Amílcar Cabral, Um outro olhar”, por Daniel dos Santos, Chiado Editora, 2014 (1) (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P15778: Historiografia da presença portuguesa em África (69): evocação, na Assembleia Nacional, do 60.º aniversário da eliminação da doença do sono e erradicação das glossinas na ilha do Príncipe; intervenção, antes da ordem do dia, dos deputados Castro Salazar, Cancella de Abreu e Gardette Correia, em 16 de março de 1974



1. Portugal > Estado Novo > Assembleia Nacional > XI Legislatura > Sessão nº 40 > 15 de março de 1974 >

O sr. deputado [por São Tomé e Príncipe, José Maria de] Castro Salazar, médico,  do quadro comum médico do ultramar, com carreira em São Tomé e Príncipe e em Angola, n. 1922, em Guimarães], referiu.-se ao 60.º aniversário da eliminação da doença do sono e erradicação das glossinas na ilha do Príncipe. (*)


851 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 42

O Sr. Castro Salazar:

- Sr. Presidente, Srs Deputados. A doença do sono foi no século passado e no primeiro quartel do actual o flagelo que mais duramente atingiu as populações da África tropical e a responsável pelo despovoamento de extensas regiões e decadência de muitas outras, até então florescentes e prósperas
A tripanossomíase humana, vulgarmente conhecida por doença do sono, fez o seu aparecimento em África nos fins do século XVIII, sendo em 1803 assinalada pela primeira vez por Winterboton entre os escravos oriundos de Benin.  Em 1840 Clarke detectou a existência da doença na Costa do Ouro e na Serra Leoa, e em 1864 Kral e Bellay observaram-na entre os indígenas do Congo.

Supõe-se que só a partir de 1871 a afecção atingiu a província de Angola, tendo-se registado os primeiros casos nas margens do Cuanza, na região de Muxima e Quissama, foco inicial donde irradiou para outras regiões de Angola.

Na ilha do Príncipe a tripanossomíase fez o seu aparecimento em 1895, calculando-se que a mosca tsé-tsé, seu vector biológico, se tivesse introduzido na ilha trinta anos antes, proveniente da costa do Gabão, e por esse motivo é conhecida entre os seus habitantes como «mosca do Gabão». Foi contudo a partir de 1877, a seguir à chegada de serviçais oriundos da região de Cazengo e das margens do Cuanza, que a doença do sono começou a manifestar-se na ilha de forma epidémica, sendo já assustadora em 1885 a mortalidade por ela causada entre os serviçais das propriedades agrícolas, convertendo-se a breve prazo em autêntico flagelo para todos os habitantes da pequena ilha.

A população nativa, que em 1885 era constituída por 3000 pessoas, foi duramente atingida pela doença, ficando reduzida a 800 habitantes em 1900 e não contando em 1907 mais do que 350, pelo que se chegou a admitir a hipótese de um abandono total da ilha.

Entretanto, várias missões médicas se deslocaram ao Príncipe a fim de estudar e combater a doença Saliento a primeira dessas missões, constituída em 1901, na qual participaram, entre outros, dois eminentes médicos, os Drs Aníbal Bettencourt e Ayres Kopke, a qual desenvolveu obra meritória tanto nesta ilha como em Angola, onde se deslocou também. As investigações que os seus cientistas efectuaram no campo da etiopatogenia da doença do sono, muito embora não culminassem com a descoberta do agente infeccioso - este viria a ser descoberto um ano mais tarde por Castellani no sangue e líquido cefalo-raquidiano de indivíduos portadores da moléstia -, revestiram-se contudo de inegável valor científico

O Sr. Cancella de Abreu [, Lopo Cancela de Abreu, 1913-1990, médico, antigo ministro da saúde e assistência, set 1968 / jan 1970, no I Governo de Marcelo Caetano]: 

- Muito bem!

O Orador: 

- Foi, no entanto, para me referir, em breves palavras, à última missão enviada ao Príncipe para combater o terrível flagelo que tantas vítimas causou que eu pedi a palavra. Chefiada pelo Dr. [Bernardo Francisco] Bruto da Costa (**), actuou no Príncipe entre 1911 e 1914 e dela fizeram parte, além deste ilustre médico, os Drs Correia dos Santos, Firmino Santana e Araújo Álvares. 

A missão realizou uma notável, difícil e muitas vezes incompreendida campanha, cujo êxito foi absoluto, não só porque conseguiu debelar uma doença que por pouco não conduziu ao extermínio total da população, como levou à erradicação do insecto vector da doença - a mosca tsé-tsé ou glossina -, eliminando-se o perigo latente de futuras epidemias da terrível afecção Pela primeira vez no Mundo se conseguiu eliminar uma população glossínica no seu próprio habitat, facto verdadeiramente notável que muito prestigiou os nossos serviços médico-sanitários e honrou o País. 

Tal acontecimento teve lugar justamente há sessenta anos, e eu não queria deixar de o lembrar perante VV. Ex.ªs e, ao mesmo tempo, prestar justa homenagem a quem, com invulgar inteligência, saber e determinação, tornou possível o perfeito êxito da campanha - o médico dos serviços de saúde do ultramar Dr Bruto da Costa.

O Sr Gardette Correia [ , Manuel Gardette Correia, natural de Bissorã, deputado pela Guiné, médico]: 

- Muito bem!

O Orador: 

- Há dias, na Academia das Ciências, o Prof [João] Fraga de Azevedo, em oportuna comunicação, louvou a actividade enérgica e modelar do Dr Bruto da Costa e seus colaboradores, que levou com a maior originalidade a uma das mais brilhantes campanhas sanitárias em África, realizada por Portugal no campo da medicina tropical.  Também em livro recentemente publicado, Man Against Tse Tse - Strugle for África  , Cornell University Press; First Edition edition, December 1973], o seu autor, John J McKelvey Jr, presta homenagem ao esforço desenvolvido pelos cientistas portugueses no estudo e combate às tripanossomíases, pondo em realce o trabalho levado a cabo pelo Dr. Bruto da Costa na eliminação da doença do sono e erradicação das glossinas na ilha do Príncipe.

O Sr Cancella de Abreu: 

- V Ex.ª dá-me licença?

O Orador: 

- Com muito gosto.

O Sr Cancella de Abreu: 

- Associo-me plenamente à homenagem que V. Ex.ª está prestando aos cientistas nacionais que deram um contributo tão válido para o combate à doença do sono. Essa homenagem é não só devida por nós, nacionais, mas teve também uma repercussão internacional, que não é demasiado aqui referir neste momento

O interruptor não reviu

Vozes: 

- Muito bem!

O Orador: 

- Muito obrigado, Sr. Deputado Cancella de Abreu, pela sua achega, que veio, de certa maneira, valorizar esta minha comunicação.

A propósito, seja-me permitido dizer que o autor se refere larga e elogiosamente à segunda campanha de erradicação da mosca do sono na mesma ilha - reintroduzida muito provavelmente a partir da Guiné Equatorial, quarenta anos após ter sido capturada a última glossina no Príncipe, em 1914 -, realizada pela Missão de Combate às Glossinas da Ilha do Príncipe no curto espaço de dois anos (1956-1958) e utilizando métodos que não coincidiram com os da campanha anterior.


852 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 42

O Sr. Gardette Correia: 

- V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: 

- Com certeza.

O Sr. Gardette Correia: 

- Eu, como guineense e chefe da Missão de Combate às Tripanossomíases da Guiné, não poderia de forma alguma ficar insensível ao seu discurso e sobretudo às grandes referências que vem fazendo acerca da erradicação da doença do sono na ilha do Príncipe.

No que diz respeito a esta afecção, gostaria de esclarecer a Câmara de que não conheço em toda a África uma campanha semelhante à que Portugal vem fazendo em todo o território ultramarino.

Vozes: 

- Muito bem!

O Sr Gardette Correia: 

- Na realidade, e eu posso dar números, na Guiné, em 1945 foram apanhados dois mil quinhentos e tal doentes e em 1973 apenas encontrámos quinze doentes, dos quais cinco da República da Guiné, do Senegal e da Zâmbia.

Isto quer dizer que apenas temos dez doentes, os quais não foram tratados ou não se submeteram ao tratamento que nós temos vindo a fazer. Essa é a grande vitória de Portugal no ultramar, precisamente no campo da doença do sono, que conseguiu dominar na ilha do Príncipe e em S. Tomé. Contudo, na Guiné é impossível falarmos na erradicação, temos de falar antes num controle, e podemos dizer que a doença hoje está absolutamente controlada, absolutamente dominada.

Quanto aos cientistas que realmente contribuíram para a erradicação desta doença, V. Ex.ª falou no nome de Fraga de Azevedo, mas não nos podemos esquecer dos nomes do Sr. Prof. Cruz Ferreira, do Sr. Prof. Salazar Leite, Profs. [Janz ] [e não Ians, Guilherme Jorge Janz] e [Francisco] Cambournac, que realmente muita contribuição deram para a erradicação e controle desta doença em África.

O interruptor não reviu.

Vozes: 

- Muito bem!

O Orador:

 - Muito obrigado, Sr Deputado. Eu associo-me à homenagem que está a prestar aos cientistas que enumerou. Eles estavam realmente no meu pensamento, mas a índole do trabalho não permitia que a eles me referisse.



A mosca Glossina palpalis (conhecida como "mosca tsé-tsé"), vector da doença-do-sono. Por Mr. Tam Nguyen - American Museum of Natural History, in New York City, USA., CC BY-SA 3.0, https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=215445 [in Wikipédia > Doença do sono]


A Missão limitou os seus trabalhos ao estudo da biologia das glossinas e sua erradicação do território,
já que o exame clínico e laboratorial de toda a população levara à conclusão da não existência de tripanossomíase humana. No entanto, a permanência na ilha do vector biológico da doença do sono constituía indubitavelmente uma séria ameaça que tinha de ser eliminada. Não cabe aqui descrever os trabalhos que conduziram pela segunda vez à erradicação das glossinas no território, mas sim lembrar que o êxito da missão se ficou devendo ao eminente professor do Instituto de Medicina Tropical Fraga de Azevedo (***), que chefiou, e ao Dr. Manuel da Costa Mourão, seu mais directo colaborador, nomes que, com o do Dr. Bruto da Costa, são credores da gratidão do povo, que nesta Câmara represento, e da admiração de todos nós.

Vozes: 

- Muito bem!

Fonte: Excerto, com a devida vénia > República Portuguesa > Secretaria-Geral da Assembleia Nacional e da Câmara Corporativa > Diário das Sessões > Nº 42 > 16 de março de 1974, pp. 851-852

[ Seleção / revisão / fixação de texto / notas: LG]
_______________

Notas do editor:

(*) Último poste da série > 3 de janeiro de 2016 > Guiné 63/74 - P15569: Historiografia da presença portuguesa em África (68): As colónias portuguesas: a província da Guiné, vista em 1884, em livro da biblioteca do povo e das escolas (Lisboa, David Corazzi, Lisboa, 2ª ed.) - II (e última) parte (António J. Pereira da Costa, cor art ref)

(**)  Vd. COSTA, Bernardo Francisco Bruto daVinte e três anos ao serviço do país no combate às doenças em África / Bernardo Francisco Bruto da Costa. - Lisboa, 1939. - XIV, 208 p.

(***) Vd.  AZEVEDO, João Fraga deA erradicação da Glossina palpalis palpalis da Ilha do Príncipe (1956-1958) / J. Fraga de Azevedo, M. da Costa Mourão, J. M. de Castro Salazar. - Lisboa : Junta de Investigações do Ultramar, 1962. - 181 p. : il. ; 23 cm. - Estudos ensaios e documentos. 91)

domingo, 21 de fevereiro de 2016

Guiné 63/74 - P15777: (In)citações (86): Opinião sobre os Governadores e Comandantes-Chefes das Forças Armadas da Guiné - 3 (Coutinho e Lima, Cor Art Ref)

1. Em mensagem do dia 5 de Fevereiro de 2016, o nosso camarada Alexandre Coutinho e Lima, Coronel de Art.ª Reformado (ex-Cap Art.ª, CMDT da CART 494, Gadamael, 1963/65; Adjunto da Repartição de Operações do COM-CHEFE das FA da Guiné entre 1968 e 1970 e ex-Major Art.ª, CMDT do COP 5, Guileje, 1972/73), enviou-nos um trabalho com a sua opinião sobre os Governadores e Comandantes-Chefes da Guiné, durante a sua permanência naquela Província: Arnaldo Schulz, António de Spínola e Bettencourt Rodrigues. 
Terceira e última parte.

Aceitando o repto do Tabanqueiro-mor Luís Graça, entendi apresentar algumas considerações sobre o tema.
Por ter cumprido 3 Comissões, por imposição, na Guiné (tenho a convicção que não haverá muitos militares nestas condições), eis a minha opinião resultante, fundamentalmente, das funções que desempenhei em cada um dessas comissões.

************

Opinião sobre os Governadores e Comandantes-Chefes das Forças Armadas da Guiné - 3


4.5 – REUNIÃO DE COMANDOS EM 15MAI73 

Em 15MAI73, realizou-se, no Quartel-General do Comando Chefe em Bissau, uma reunião de Comandos, presidida pelo Sr. General Spínola, estando presentes o Sr. Comandante Adjunto Operacional, os Senhores Comandantes dos 3 Ramos das Forças Armadas (Exército, Marinha e Força Aérea), o Sr. Chefe do Estado-Maior do Comando Chefe e os Senhores Chefes das Repartições de Operações e Informações do Comando Chefe. Dessa importante reunião foi feita a respectiva ACTA, com 62 páginas. Tendo obtido uma fotocópia desta, no Arquivo Histórico Militar do Exército, vou fazer algumas transcrições da mesma. Este documento deveria ser objecto de uma análise e comentário mais alargados, que não cabem no âmbito deste texto. Oportunamente voltarei a este assunto.


4.5.1 – Intervenção inicial do Sr. Comandante-Chefe, Sr. General Spínola

O Sr. Comandante-Chefe, a iniciar os trabalhos, afirmou:

“...Encontramo-nos, indiscutivelmente, na entrada de um novo patamar de guerra, o que necessariamente impõe o reequacionamento do trinómio missão-inimigo-meios. Começaremos esta reunião pela consideração da análise da situação no T.O. face ao inimigo actual e à sua evolução futura, análise a apresentar pelo Chefe da Repartição de Informações a que se seguirá a apresentação do estudo das incidências da evolução do In na situação das NT, no seu potencial, capacidade de manobra, liberdade de acção e suficiência para o cumprimento da missão em termos de prosseguimento da manobra de contra-subversão. Apresentará esse estudo o Chefe da Repartição de Operações em cujo âmbito se projectam em pleno os condicionalismos actuais. Solicitarei, em seguida, aos Senhores Comandantes-Adjuntos a sua impressão sobre o In e a situação das Nossas Forças, bem como sobre o reflexo da situação actual e futura na sua esfera de responsabilidade; e ainda a definição das necessidades cuja carência se reflicta no cumprimento das respectivas missões.”… 


4.5.2 – Intervenção do Sr. Comandante Adjunto Operacional, Sr. Brigadeiro Leitão Marques

Entre outras considerações, o Sr. Brigadeiro disse:

“...No mínimo, e disso não restam quaisquer dúvidas, o In está a preparar as necessárias condições para conquista e destruição de guarnições menos apoiadas por dificuldades de acesso (GUIDAGE, BURUNTUMA, GUILEJE, GADAMAEL, etc), a fim de obter os êxitos indispensáveis à sua propaganda internacional e manobra psicológica – isto está já ao alcance das suas possibilidades militares. 

Quanto às vantagens para manobra psicológica In, não podemos esquecer que qualquer êxito pode conduzir à captura de prisioneiros em número tal que possa constituir um elemento de pressão psicológica sobre a Nação Portuguesa. A dar-se este facto e aceitando que a orientação comunista prevalecerá, tal elemento será aproveitado ao máximo para desmobilizar a retaguarda e manter-se-á até serem atingidos os objectivos finais em todas as PU. Assisti ao pressionamento psicológico do povo americano por causa dos seus prisioneiros no Vietnam do Norte durante quatro anos; e senti em toda a sua profundidade o efeito desmoralizador desse pressionamento, o qual, em larga medida, juntamente com o elemento económico, levou à agitação interna das massas e à capitulação, apesar de todo o poderio militar americano. 

O que acontecerá se tivermos de enfrentar situação semelhante? O In não perderá a oportunidade e tem experiência técnica para a aproveitar ao máximo. É aqui na Guiné onde o problema é mais agudo e o In sabe isso; o seu esforço será aqui realizado.”...


4.5.3 – Intervenção do Sr. Chefe da Repartição de Informações, Sr. Ten. Cor. de Inf.ª Baptista Beirão Da intervenção do Sr. Chefe da REP/INFO, transcreve-se: 

“Esta actividade incidirá, mais provavelmente, nas guarnições de fronteira, em especial nas mais vulneráveis às acções com carros de combate, pelo que se consideram áreas de preocupação: 

- o eixo NOVA LAMEGO-BURUNTUMA e em especial a guarnição de BURUNTUMA, particularmente ameaçada;

- a região de ALDEIA FORMOSA e, em especial, as guarnições de GADAMAEL e GUILEJE, expostas a uma acção de carros de combate irradiando da REP GUINÉ; 

- a fronteira Norte da ZONA LESTE, com particular incidência para a faixa tradicional de infiltração (GUIDAGE/BIGENE/FARIM/CUNTIMA). 

No imediato, julga-se que o IN: 

- mantenha a actividade generalizada e dispersa de fixação e desgaste às NF em todo o T.O.; 

- intensifique o seu esforço de implantação de um forte dispositivo militar no BOÉ, em ordem a materializar a sua ocupação, aliás já iniciada conforme se refere no decurso desta análise; 

- mantenha a sua pressão sobre GUIDAGE/BIGENE/BINTA, continuando a concentrar sobre GUIDAGE violento potencial que imediatamente desviará para qualquer outro ponto menos protegido pelo nosso eventual reforço de GUIDAGE; 

- passe à ofensiva no “Chão MANJACO” visando recuperar a área subtraída à subversão, através de acções violentas e sistemáticas contra as populações e NF em especial a Sul dos rios COSTA e BABOQUE; 

- intensifique a sua actividade de resistência à reocupação do Sul pretendendo impedir o desenvolvimento da nossa manobra no CANTANHEZ e TOMBALI;

- intente uma acção tipo convencional com carros de combate contra GADAMAEL, GUILEJE e/ou BURUNTUMA, tirando partido da vulnerabilidade destes pontos a esse tipo de acções e visando o aniquilamento ou captura das guarnições; 

- incremente a sua actividade contra meios navais, em especial a partir do momento em que disponha dos especialistas em preparação. 

Num futuro próximo, prevê-se que o In, partindo do clima de denso agravamento que a sua actividade imediata proporcionará:

- tente a eliminação sistemática das guarnições mais expostas sobre a fronteira, em acções de tipo convencional;

- amplie progressivamente esta manobra da periferia para o interior; 

- estabeleça no BOÉ a fisionomia de novo estado a proclamar conforme sua intenção declarada;

- consolide as bases de uma ulterior evolução do conflito para a fase convencional com directo empenhamento externo. 

Resta referir, a finalizar, que o quadro dispersivo do largo potencial referenciado e a elevada capacidade de manobra do In não permitem, como se desejaria, uma melhor objectivação das zonas preferenciais de esforço do In atenta a fluidez com que se revelam e o quadro geral que se desenha; e apenas pode concluir-se por uma situação na qual todo o T.O., sem qualquer exclusão, acaba por constituir um vasta área de preocupação, na qual dificilmente se podem, no momento, visualizar priorizações. 

Este quadro agravar-se á extraordinariamente caso venha a verificar-se a intervenção da OUA no conflito por iniciativa de SEKOU TOURÉ, que não se terá ainda materializada atenta a posição de não-alinhamento do SENEGAL, a todo o momento susceptível d ser alterada, como atrás se referiu.” 


4.5.4 – Intervenção do Sr. Chefe da Repartição de Operações, Sr. Ten. Cor. do CEM Pinto de Almeida 

O Sr. Chefe da REP/OPER disse, entre outras considerações:

“3. Se não forem concedidos os reforços solicitados e as armas que permitam às NF enfrentar o In actual, para lhe evitar, a breve prazo, a obtenção de êxitos de fácil exploração psicológica e graves efeitos tácticos da maior influência no moral das NT, julga-se que será necessário remodelar o dispositivo, reforçando guarnições que sob o ponto de vista militar se considere essenciais e que permitam, à luz de outras concepções da manobra, desencadear mais tarde acções ofensivas com forças de grande envergadura para recuperação das posições enfraquecidas, ou estruturar uma manobra de feição caracterizadamente defensiva baseada na implantação de um certo número de pontos de apoio a sustentar a todo o custo. Mas neste caso, as missões actualmente dadas às NF, em termos de protecção das populações e apoio ao esforço principal da manobra de contra-subversão centrado na manobra sócio-económica, teriam de ser revistas. E além disso, ficariam também altamente prejudicadas as missões de contra-penetração e de detenção do alastramento da subversão, comprometendo-se dessa maneira, a missão das Forças Armadas no TO.

4. A intenção do In de instalar-se fortemente no BOÉ, já em via de concretização, e de que resultam efeitos psicológicos desastrosos, impõe-nos a ocupação daquela região com Forças Terrestres caso o controlo não possa ser efectuado pela FA. Neste caso haveria que abrir estradas que permitissem a instalação e o reabastecimento das FT a implantar e a sua movimentação. No mínimo seriam necessários 2 Batalhões que, não podendo ser retirados do actual dispositivo do TO, pelas razões já arás indicadas, teriam que ser fornecidos pela Metrópole. 

O esforço de Engenharia a desenvolver exigiria o reforço de, pelo menos, 1 Companhia de Engenharia equipada com material adequado. 

Como apoio de fogos, tornar-se-ia necessário ainda o reforço com 1 Comando de Bataria de Artilharia e 3 Pelotões de Artilharia (14 cm). Para permitir a segurança das colunas de reabastecimento para e no BOÉ seria ainda conveniente o reforço de, pelo menos, 1 Esquadrão de Reconhecimento.

5. A ameaça de utilização, pelo In, de carros de combate, mesmo em acções de reduzida amplitude, em golpes-de-mão sobre as guarnições mais isoladas da fronteira, aconselha a, desde já, dotar, pelo menos as guarnições indicadas pela Repartição de Informações como mais susceptíveis de ataques deste tipo, de meios que permitam a sua defesa anti-carro. Com o armamento que possuem e com o pessoal treinado para o tipo de guerra que temos enfrentado até ao presente, as guarnições apresentam-se impotentes e inaptas para fazer face à nova ameaça. As necessidades em subunidades adaptadas à luta anti-carro são, como é óbvio, dependentes do tipo e eficiência do material com que forem equipadas.”… 


4.5.5 – Intervenção do Sr. Comandante do CTIG, Sr. Brigadeiro Silva Banazol 

Da intervenção do Sr. Comandante do CTIG (Comando Territorial Independente da Guiné), transcreve-se:

“Se do que acabo de expor a V. Ex.ª me é permitida uma conclusão que tudo resuma, eu direi, como se faz nos estudos de situação: 

- O CTIG está em condições, desde que reforçado, de apoiar logisticamente a manobra do Comandante-Chefe nas ZONAS LESTE e OESTE, com algumas limitações a N do RIO CACHEU e desde que assegurada a ligação, por meios navais, BISSAU-XIME, condição essencial que impõe sublinhar; 

- O CTIG não está em condições de apoiar logisticamente a ZONA DO BOÉ; 

- O CTIG depende totalmente dos meios navais para o apoio da ZONA SUL e não o poderá manter se aqueles meios se revelarem insuficientes ou não puderem operar.”


4.5.6 – Intervenção final do Sr. General Comandante-Chefe 

Para terminar a reunião, o Sr. General Spínola afirmou:

“De tudo quanto aqui foi dito conclui-se, com clara evidência, que nos encontramos em nova fase de evolução da guerra, à qual temos que fazer face com um mínimo de afectação do curso normal da manobra de contra-subversão traçada... 

Chega-se assim à conclusão da impossibilidade de economizar meios com recurso à manobra. E se na concepção inicial da nossa manobra foi possível desguarnecer áreas desabitadas cuja ocupação se não justificava, em ordem a recuperar meios em proveito do esforço que se impunha realizar nas zonas Oeste e Leste para deter o alastramento da guerrilha a áreas densamente povoadas, de forma alguma a situação actual admite semelhante balanceamento de meios, dado o facto de o Inimigo, invertendo a sua concepção face ao desequilíbrio das populações a nosso favor, visar agora a ocupação de uma área territorial com fins exclusivamente políticos. 

O crescente potencial do In conjugado com as nossas limitações; as restrições no apoio de fogo da Força Aérea resultante do aparecimento dos mísseis terra-ar; a necessidade de empenhamento de mais meios e mais forças na protecção dos fluxos de reabastecimento, que aqui foi bem claramente acentuado; e o imperativo de defesa e enquadramento das populações que se desequilibrarão em favor do In perante a constatação de qualquer abrandamento na protecção que lhes é dada ou na política de protecção em curso – todos estes factores obrigam, taxativamente, não só à manutenção do actual dispositivo em superfície como até ao seu reforço. Além disso, as intenções do In em relação a áreas pretensamente libertadas obriga ainda ao substancial reforço dos meios de intervenção do Comando-Chefe, ampliado pelas limitações impostas à liberdade de acção aérea. Deste modo afiguram-se-nos manifestamente insuficientes os meios actuais face à evolução verificada, pois considero demonstrada à evidência a impossibilidade de alterar a manobra para economizar meios, sem grave compromisso da missão. Salienta-se que a ocupação do Sul só foi possível à custa do enfraquecimento do dispositivo das Nossas Tropas no Oeste e no Leste, com todos os graves riscos inerentes. 

[...]

Neste quadro geral impõe-se tomar medidas em dois planos distintos: o interno, com reflexo imediato nas adaptações aos novos condicionalismos determinados pela nossa quebra no potencial relativo de combate, e o externo, que se traduz no reforço de meios, equipamento e armamento a obter para o prosseguimento da missão. 

Quanto ao primeiro plano, já foram tomadas medidas parcelares que vão ser reunidas numa directiva operacional a difundir imediatamente. 

Quanto ao segundo, devem os Senhores Comandantes-Adjuntos estudar e apresentar-me, dentro de 48 horas, uma estimativa dos meios necessários ao cumprimento das respectivas missões para serem enviadas ao Escalão Superior, juntamente com a Acta desta reunião. 

As implicações resultantes da carência de meios para enfrentar a presente ofensiva do In e o previsível agravamento da situação, conduzem a opções que ultrapassam a minha esfera de responsabilidade, pelo que serão expostas superiormente em ordem a uma tomada de posição de que oportunamente os Senhores Comandantes-Adjuntos tomarão conhecimento.”


Comentário 

Esta Reunião de Comandos foi realizada no dia 15MAI73, como consequência do aparecimento e utilização, por parte do IN, de uma nova arma – os mísseis terra-ar STRELA, de fabrico soviético.

O Sr. General Comandante-Chefe concluiu que:

”… nos encontramos em nova fase de evolução da guerra, à qual temos que fazer face com um mínimo de afectação do curso normal da manobra de contra-subversão traçada.”

Outra das suas conclusões foi:

“ Deste modo afigura-se-nos manifestamente insuficientes os meios actuais face à evolução verificada, pois considero demonstrada à evidência a impossibilidade de alterar a manobra para economizar meios, sem grave comprometimento da missão.”

A Acta desta Reunião de Comandos, acompanhada das estimativas, apresentadas pelos Senhores Comandantes Adjuntos, dos meios necessários ao cumprimento das respectivas missões, foi enviada ao Escalão Superior (leia-se Governo de Lisboa).

A propósito dos reforços necessários, refiro como exemplo (Anexo D à acta da reunião) o que o Sr. Comandante da Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné apresentou como meios aéreos e de defesa aérea necessários:

- 8 aviões SKYVAN, para substituir os DO-27 (transporte ligeiro);
- 5 helicópteros equipados com armamento axial, para substituir os AL-III armados;
- 12 aviões MIRAGE, ou de tipo semelhante, para substituir os T-6 e FIAT G-91;
- Radar de detenção, planimétrico e altimétrico, de longo alcance (não existente);
- Mísseis terra-ar do tipo REDEYE (não existentes).

Mesmo que houvesse meios financeiros suficientes (e muito provavelmente não havia), para adquirir estes meios aéreos, bem como o armamento e equipamento apresentados pelos Senhores Comandantes Adjuntos, o Governo Português, teria grande dificuldade em encontrar quem os fornecesse. Estou convicto que, quer o Sr. General Spínola, quer os participantes nesta Reunião, estavam cientes da dificuldade ou mesmo impossibilidade da obtenção, em tempo oportuno, dos reforços solicitados.

As transcrições do Sr. Comandante Adjunto Operacional, Senhores Chefes das Repartições de Informações e Operações e do Sr. Comandante do CTIG, levam-me às seguintes conclusões:

- Ocupação do BOÉ

Para esta ocupação, de acordo com a intervenção do Sr. Chefe da REP/OER, eram necessários os seguintes meios de reforço, vindos da Metrópole:

- 2 Batalhões
- 1 Companhia de Engenharia
- 1 Comando de Bataria de Artilharia
- 3 Pelotões de Artilharia (14 cm)
- 1 Esquadrão de Reconhecimento

O Sr. Brigadeiro Silva Banazol, na sua intervenção, declarou:

“ O CTIG não está em condições de apoiar logisticamente a ZONA do BOÉ.”

A ocupação do BOÉ, não se realizou.

Recordo que o Sr. General Spínola, no início do seu mandato, mandou retirar as NT da região do BOÉ: 1 Companhia em Madina do Boé e 1 destacamento em Beli. Faça-se a comparação entre estes efectivos e os necessários para a ocupação, apresentados em 15 MAI 73.


- Guileje

Refiro que a acção em força do IN sobre Guidage teve início em 8 MAI e o ataque a Guileje começou em 18 MAI; isto significa que a Reunião de Comandos (15 MAI), teve lugar entre aquelas duas acções inimigas.

Na sua intervenção, o Sr. Comandante Adjunto Operacional (Sr. Brigadeiro Leitão Marques), declarou:

“…No mínimo, e disso não restam quaisquer dúvidas, o In está a preparar as necessárias condições para conquista e destruições de guarnições... GUILEJE... isto está já ao alcance das suas possibilidades militares.”

O Sr. Chefe da REP/INFO referiu:

“...Esta actividade incidirá, mais provavelmente, nas guarnições de fronteira, em especial as mais vulneráveis às acções com carros de combate, pelo que se consideram áreas de preocupação: 
- ...

-...e, em especial, as guarnições de... GUILEJE... 

No imediato, julga-se que o In: 
- ...

- intente uma acção tipo convencional com carros de combate contra...GUILEJE...e visando o aniquilamento ou captura das Guarnições... 

Num futuro próximo, prevê-se que o In... 

- tente a eliminação sistemática das guarnições mais expostas sobre a fronteira, em acções isoladas de tipo convencional”… 

O Sr. Chefe da REP/OPER, na sua intervenção, declarou:

“ 3. Se não forem concedidos os reforços solicitados e as armas... julga-se que será necessário remodelar o dispositivo, reforçando guarnições que sob o ponto de vista se considerem essenciais” ...

Atendendo às transcrições anteriores:

- O Sr. Comandante Adjunto Operacional considerou que já estava das possibilidades militares do IN, a conquista e destruição da guarnição de Guileje.

- O Sr. Chefe da REP/INFO afirmou julgar que, no imediato, o In levaria a efeito uma acção com carros de combate contra Guileje e num futuro próximo, tentaria a eliminação sistemática das guarnições mais expostas sobre a fronteira.

- O Sr. Chefe da REP/OPER, considerou que seria necessário remodelar o dispositivo, reforçando guarnições essenciais. É de supor que Guileje seria uma delas.

Conjugando as 3 considerações supra, penso que é lícito poder concluir que, em coerência, o Sr. Chefe da Repartição de Operações, deveria, no final da Reunião, propor o REFORÇO IMEDIATO da guarnição de Guileje, impedindo a sua conquista e destruição pelo IN, como declarou o Sr. Comandante Adjunto Operacional.

Continua por desvendar o MISTÉRIO que foi a não atribuição de qualquer reforço a Guileje, muitíssimo mais difícil de explicar, face ao que foi referido na Reunião de Comandos de 15MAI73. Quando tomei a decisão de efectuar a retirada - 22MAI, mal sabia eu que, 7 dias antes – 15MAI, ao mais alto nível, em Bissau, tinha sido debatido o assunto, exaustivamente, e as conclusões acabaram por ser, por mais inverosímil que pareça, o sancionamento à minha decisão.

O Sr. Brigadeiro Leitão Marques, na sua intervenção (reunião de 15 MAI), afirmou:

“Quanto às vantagens para manobra psicológica In, não podemos esquecer que qualquer êxito pode conduzir à captura de prisioneiros tal que possa constituir um elemento de pressão sobre a Nação Portuguesa. A dar-se este facto... tal elemento será aproveitado ao máximo para desmoralizar a retaguarda...” 

O mesmo Sr. Brigadeiro, quando me interrogou, em 31 MAI (isto é, 16 dias mais tarde), no âmbito do processo que me foi instaurado, fez-me a seguinte:

“25ª. Pergunta: Quando decidiu retirar tinha ponderado os altos prejuízos para a Nação resultantes desse procedimento?”

Confrontando aquela afirmação e esta interrogação: estamos perante um bom exemplo de HIPOCRISIA.


4.6 – Fim de mandato do Sr. General Spínola 

Em 72, o Sr. General Spínola participou em algumas reuniões na Rep. do Senegal, a última das quais teve lugar em 18MAI72, em Cap Skiring, na qual esteve presente o Sr. Presidente Senghor. Estas reuniões tinham a finalidade de tentar uma outra saída para a guerra, baseada no diálogo. Tais encontros foram interrompidos por ordem do Sr. Primeiro-Ministro de Portugal, Sr. Prof. Marcelo Caetano, que terá dito que era preferível um desaire militar na Guiné do que estabelecer conversações com o inimigo.

Entretanto, em 25MAR73, foi abatido, na região de Guileje, por um míssil terra-ar STRELA, o primeiro Avião FIAF G-91 da nossa Força Aérea, tendo o respectivo Piloto conseguido ejectar-se e recolhido pelas NT. O aparecimento destes mísseis provocou grandes condicionamentos à actuação da nossa Força Aérea, com prejuízo flagrante ao apoio às Forças Terrestres e Marítimas.

Em MAI73 o PAIGC, modificando radicalmente a sua maneira de actuar, levou a efeito operações de grande envergadura, empenhando grandes efectivos, apoiados por poderosas bases de fogos. Fez ataques em força, sucessivamente contra Guidage (fronteira Norte), Guileje e Gadamael, com início em 08MAI, 18MAI e 31MAI, respectivamente.

Para descrever a última parte do mandato do Sr. General Spínola, como Comandante-Chefe das Foças Armadas da Guiné, socorro-me do livro “MARECHAL COSTA GOMES – No centro das tempestades” (A Esfera dos Livros – 1ª. Edição: Março de2008), da autoria de Luís Nuno Rodrigues. Nas páginas 101 a 103, pode ler-se:

“...Foi neste contexto que, em Junho de 1973, o CEMGFA Francisco da Costa Gomes se deslocou à Guiné. Ao chegar ao território, presidiu, de imediato, a uma reunião com os principais comandos militares com o objectivo de proceder a uma “profunda análise da situação”. A posição de Costa Gomes relativamente à situação no teatro de operações da Guiné era bastante clara. Na sua opinião, “o desenvolvimento da manobra em curso” e a “manutenção do actual dispositivo” só seria possível mediante a “disponibilidade de volumosos meios adicionais que permitissem o reforço adequado das guarnições de fronteira”. Nisso concordava com Spínola. No entanto, nas condições existentes em Portugal, tanto humanas como materiais, a Guiné não poderia contar com o “reforço adequado de meios por absoluta impossibilidade de os fornecer actualmente”. A solução, sob o ponto de vista militar, passaria pela “ adopção de uma manobra visando o encurtamento de área efectivamente ocupada, evitando-se desse modo a contingência de aniquilamento das guarnições de fronteira que se impõe a todo o transe evitar, atentas as repercussões militares e políticas externas e internas”

[...]

Apesar da oposição de Spínola, Costa Gomes transmitiu a sua ideia a Marcelo Caetano uma vez regressado a Lisboa. Na opinião, a Guiné era “defensável” caso o “dispositivo” fosse modificado, retirando para o interior as guarnições militares que estavam a defender as povoações localizadas junto à fronteira. 

Conhecida a posição de Costa Gomes, Spínola escreveu ainda uma carta ao ministro do Ultramar, Silva Cunha, manifestando-se crítico em relação às propostas avançadas pelo CEMGFA. Na sua opinião, “a redução do espaço efectivamente ocupado com vista à concentração de meios que permita aumentar a capacidade de resistência das nossas forças, evitando paralelamente a contingência do total aniquilamento das guarnições de fronteira” era uma manobra que obrigava a abandonar áreas geográficas e, o que é bem pior, a entregar à sua sorte populações a que não podemos fornecer meios adequados de defesa. Ou seja, um conjunto de medidas que “frontalmente se opõem à linha política a que me vinculei, criando-se assim uma situação incompatível com os compromissos que claramente assumi perante as populações”. Ora Spínola não estava disposto a “abandonar áreas e as correspondentes populações em cuja protecção, justa administração e desenvolvimento socioeconómico” se tinha empenhado “pessoalmente”. Apesar de, enquanto comandante-chefe, considerar “absolutamente necessária” a referida manobra, não se mostrava disposto a efectuá-la, uma vez que tal lançaria o “rótulo amargo de demagogia” sobre a sua acção na Guiné até ao momento. Por isso solicitava a sua substituição “ a tempo de possibilitar a alteração do dispositivo militar que é mister fazer”. Spínola regressa a Lisboa no início de Agosto, inicialmente em licença de férias, mas já não voltaria ao território onde granjeara fama.” 

O Sr. General Spínola regressou a Lisboa em 6 de Agosto de 1973, terminando assim o seu mandato.


Sr. General Bettencourt Rodrigues (1973/74) 

O Sr General Bettencourt Rodrigues iniciou as funções de Governador e Comandante-Chefe das Forças Armadas da Guiné, em 21 SET 73. Regressou a Lisboa pouco depois de 25 de Abril de 1974.

Quando o Sr. General Bettencourt Rodrigues chegou a Bissau, estava eu preso preventivamente; regressei a Lisboa em 12MAI74. Sem acesso a qualquer informação, naquela situação, não me sinto confortável para fazer qualquer consideração sobre a actuação deste Sr. Comandante-Chefe. O Sr. General Bettencourt Rodrigues não teve nenhuma intervenção no auto de corpo de delito que me foi instaurado, como consequência da minha decisão de retirar de Guileje, que já estava em fase adiantada quando o Sr General chegou à Guiné.

Nota – Os elementos sobre Gandembel, foram recolhidos do livro “ A CCAÇ 2317, NA GUERRA DA GUINÉ - GANDEMBEL/PONTE BALANA” da autoria de Idálio Reis (Edição do Autor), que foi Alferes Miliciano da CCAÇ 2317, a única Companhia que ocupou as guarnições de Gandembel/Ponte Balana.

Lisboa, 5 de Fevereiro de 2016

Alexandre da Costa Coutinho e Lima
(Cor. de Art.ª, Reformado)
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Nota do editor

Postes anteriores de:

17 de fevereiro de 2016 Guiné 63/74 - P15759: (In)citações (84): Opinião sobre os Governadores e Comandantes-Chefes das Forças Armadas da Guiné - 1 (Coutinho e Lima, Cor Art Ref)
e
19 de fevereiro de 2016 Guiné 63/74 - P15768: (In)citações (85): Opinião sobre os Governadores e Comandantes-Chefes das Forças Armadas da Guiné - 2 (Coutinho e Lima, Cor Art Ref)

Guiné 63/74 - P15776: Blogpoesia (438): "Banho de Chuveiro" e "O Terror das Artrites" (Joaquim Luís Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728)

1. Em mensagens de 14 e 18 de Fevereiro de 2016, o nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66), enviou-nos estes dois poemas da sua autoria:


Banho de chuveiro

Como a chuva escorre e lava
A mole dura dum penedo,
A catarata em fúria escorre
No ventre à mostra da escarpa.
O ribeiro astuto sulca o campo verde
Dum fio de água.

E a onda branca
Se espraia em espuma sobre a areia,
Assim, não tendo mar,
De corpo e alma
Me purifico,
Nos breves minutos dum chuveiro.

Berlim, 18 de Fevereiro de 2016
8h16m

Jlmg
Joaquim Luís Mendes Gomes

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O terror das artrites

Passou a vida em lufa-lufa.
Primeiro, a correr a pé.
Depois bicicleta, a pedalar.
Só descansava nas descidas.

Depois, ao volante,
Desfazendo curvas
Desde o chão até às nuvens.

No comboio longo,
Furando túneis
E inundando campos
Com a verdura incandescente.

Atravessou o mar
Como um peixe leve
À tona d’água.

Experimentou alturas
Onde, sereno, reina o sol
Para lá das nuvens.

Por uns dias só,
Sentiu o cheiro acre
Da cama e fardas brancas
Dum hospital.
E viu a morte.
Foi em Coimbra.
Mas teve sorte.

Depois da alta.
Eis que a anca,
Sem saber a tinha,
Se queixou aflita.

Pela calada,
Fora atacada
Impiedosamente,
Artrite aguda.
Se recusa andar.

Só outra nova!...

Berlim, 14 de Fevereiro de 2016
8h2m

Jlmg
Joaquim Luís Mendes Gomes
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Nota do editor

Último poste da série de 17 de fevereiro de 2016 Guiné 63/74 - P15762: Blogpoesia (437): "Quem Sou Eu?" (José Teixeira, ex-1.º Cabo Aux Enf da CCAÇ 2381)

Guiné 63/74 - P15775: Atlanticando-me (Tony Borié) (7): Talvez lá, como cá

Sétimo episódio da nova série "Atlanticando-me" do nosso camarada Tony Borié (ex-1.º Cabo Operador Cripto do CMD AGR 16, Mansoa, 1964/66).




Talvez lá, como cá!

Quando, numa manhã fria de Janeiro do ano de 1965, foram dadas ordens a um Esquadrão de Caças F-105 da Base Americana de Okinawa, no Japão, para que se transferisse para a Base Aérea de Da Nang, no Vietname do Sul, para dar cobertura ao Corpo de Marines, que tinham por missão cruzar o Paralelo 17, que era uma linha de demarcação militar provisória e desmilitarizada entre o Vietname do Norte e o Vietname do Sul, estabelecida na Conferência de Genebra de 1954, que pôs fim à Guerra da Indochina, embora não coincidindo com o verdadeiro paralelo, pois no terreno era uma região um pouco a sul ao longo do rio Ben Hai, na província de Quang Tri, até à vila de Bo Ho Su e dali para oeste até à fronteira entre o Vietname e o Laos, foi quase o mesmo quando anos antes o responsável pelo então governo de Portugal disse em frente às câmaras de televisão, referindo-se ao então ultramar que, “vamos para a guerra e em força”.

Quando no dia seguinte, 49 destes caças levantaram voo da base de Da Nang, para atacar alvos do Vietname do Norte, fazendo com que a partir desse dia a guerra não ficasse mais restrita ao território do Vietname do Sul e, o primeiro desembarque de 3500 soldados americanos em Março, naquele território, já se havia transformado em 200 mil, em Dezembro do mesmo ano e, quando em 1973, as tropas americanas se retiraram do conflito, havia cerca de 58 mil soldados americanos mortos, contudo o conflito prosseguiu com a luta armada entre o Norte e Sul do Vietname, que ficou dividido, terminando em absoluto em 1975, com a invasão e ocupação de Saigon, então a capital do Vietname do Sul e a rendição total do exército sul-vietnamita, foi quase o mesmo quando os militares de Portugal, um ano antes, se revoltaram e destituíram o então governo de Portugal, ficando para trás um número de mortos, nas então províncias ultramarinas, que nós pelo menos não sabemos exactamente, mas devia andar pelas dezenas de milhar, talvez milhões, nas populações que foram ou viriam a ser afectadas pelo conflito, que infelizmente foi armado.

Quando terminou o conflito, no caso do Vietname, os números não eram precisos, mas oscilam entre milhão e meio a dois milhões de vietnamitas mortos, entre civis e militares, onde parte considerável desta população era economicamente activa, que morreu durante o conflito e, como se compreende, este facto provocou uma grave crise económica nos anos seguintes ao seu final, além dos talvez milhões de pessoas, oriundas do Camboja e do Laos, que foram arrastados para a guerra com a propagação deste mesmo conflito.


Comparações com a guerra que vivemos em África? Os números são gigantes, nós chamávamos aos guerrilheiros “Turras”, os americanos chamavam "Vietcongs". Este termo, abreviado para "VC", deu origem ao termo utilizando a fonética militar de "Victor-Charlie" de onde surgiu o nome "Charlie", também como apelido aos guerrilheiros, tirando isto talvez houvesse mais coincidências: na data, no combate e contacto com o inimigo nas selvas húmidas e pântanos da Guiné, mas em cenário de guerra não há lá muita comparação, nós lutávamos com um infinito de dificuldades, tanto em material logístico, como em alimentação, alojamento, assistência médica, evacuação de feridos e mortos em combate, tal como outros motivos de sobrevivência. Valia-nos, entre outras coisas, um pouco de audácia, coragem e improviso, em que éramos e continuamos a ser, pelo menos os que nasceram nos anos quarenta ou cinquenta do século passado, alguns com a instrução escolar mínima, um pouco melhor que a média, talvez por sermos descendentes de diversos povos que em tempos habitaram a Península Ibérica, que eram sobretudo guerreiros por natureza.

Nós aprendemos depressa que aquela era uma guerra que só poderia ter um fim político e não de luta armada, onde uma faca, por vezes era a melhor arma de combate e, a pior, no nosso modesto entender, era um avião. Enquanto os soldados americanos se armaram de grande poder de fogo, em artilharia e aviação de combate para destruir as bases inimigas e impedir as suas ofensivas, pois no terreno praticavam acções defensivas, deixavam a acção ofensiva para os F-105 e helicópteros armados, embora eles fossem treinados e instruídos para guerras ofensivas, os seus comandantes eram psicológica e institucionalmente pouco qualificados para essas acções defensivas, no entanto nós éramos treinados para lutar e ir ao encontro do inimigo, fazer aquelas incursões no terreno, diárias, ir ao encontro, não importava se a zona era perigosa e base de inimigos, nós tínhamos que caminhar por lá, calcar minas e fornilhos mortais, onde o inimigo usava os segredos daquela selva e daqueles pântanos em seu favor, onde havia a necessidade de beber a para nós, “célebre água da bolanha”, motivo por que hoje começam a aparecer sinais de doença, como por exemplo, entre outras, o cancro, de que não se sabe a origem.

Quando o Jack, que nasceu no estado do Wyoming, depois de fazer dois “tours” de seis meses cada à guerra do Vietname, regressou ao continente americano, continuou no Corpo de Marines, seguindo a carreira militar, pois as suas possibilidades de sobrevivência nas planícies do Wyoming eram montar um cavalo durante todo o dia, guardando manadas de vacas ou cavalos, comendo carne de algum animal que tivesse que ser abatido, carne essa que podia ser consumida assada ou seca e curada, para ser comida crua durante sete dias por semana, tal como o nosso sargento da messe, lá no aquartelamento de Mansoa, que era oriundo das planícies do Alentejo.

Quando o Smith, soldado do Alabama, que foi ferido em combate e transferido para o hospital militar de Saigon, hoje se faz transportar numa cadeira de rodas, se orgulha de ser combatente dizendo alto e bom som que não se queixa do destino, pois criou a sua família e sempre foi ajudado pelo governo, que lhe proporcionou algum conforto no meio da sua vida de pessoa com alguma desvantagem. Ou mesmo o John, soldado ferido em combate, a quem posteriormente foi amputado um membro superior, não quer qualquer ajuda, mudando ele mesmo a roda do seu carro, tal como qualquer João, José ou Manuel, companheiros feridos nas savanas da Guiné.

Tudo isto companheiros, vem a propósito de que os soldados americanos regressados dessa guerra, e nós somos testemunhas privilegiadas devido à nossa posição, quando em actividade de oficial da United Steelworkers, que é hoje o maior sindicato de trabalhadores de metalúrgica nos Estados Unidos, porque convivemos durante anos com alguns destes militares, por vezes mediando conflitos, que embora tivessem pouca instrução escolar e estivessem um pouco traumatizados, foram sempre encorajados na procura de trabalho, na compra de casa e outros bens. Existe mesmo um Banco dos Veteranos que lhes facilita empréstimos para compra de habitação ou qualquer outro investimento. Foram sempre preferidos e respeitados, por vezes bastava-lhes dizer que eram veteranos, que quase todas as portas se abriam, claro, havia excepções como em tudo na vida, mas os ainda sobreviventes da guerra do Vietname têm assistência. Existem os Hospitais dos Veteranos, localizados nas principais cidades de quase todos os estados, têm ajudas relativas em algum caso de necessidade extrema e, acima de tudo, orgulham-se do seu passado de combatentes. Quando começamos qualquer conversa, as primeiras palavras deles são para dizer que não querem nem ouvir a palavra, “Vietnam Syndrome”, levantam a cabeça e dizem bem alto que são veteranos de guerra. 

Tony Borie, Fevereiro de 2016.
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Notas do editor

1 - Realce do último parágrafo do texto da responsabilidade do editor

Último poste da série de 14 de fevereiro de 2016 Guiné 63/74 - P15745: Atlanticando-me (Tony Borié) (6): Às armas, às armas, contra os canhões, lutar... lutar!

Guiné 63/74 - P15774: Parabéns a você (1036): Veríssimo Ferreira, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 1422 (Guiné, 1965/67)

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Nota do editor

Último poste da série de 17 de fevereiro de 2016 Guiné 63/74 - P15757: Parabéns a você (1034): António Carvalho, ex-Fur Mil Enf.º da CART 6250 (Guiné, 1972/74) e Fernando Chapouto, ex-Fur Mil Op Esp da CCAÇ 1426 (Guiné, 1965/67)

Guiné 63/74 - P15773: Inquérito 'on line' (34): Sim, "também já passei por uma ou mais situações de doença grave", dizem 48% dos 50 respondentes, até à data. Prazo de resposta: 4ª feira,dia 24, 9h00

A. Inquérito de opinião, a responder até 4ª feira, dia 24, 9h00...

[Imagem à esquerda, o nº europeu da emergência (incluindo a emergência médica pré-hospitalar]




"TAMBÉM JÁ PASSEI POR UMA OU MAIS SITUAÇÕES DE DOENÇA GRAVE"...

Temos até agora 39 respostas, assim distribuidas:

1. Sim, já passei por uma > 14 
(28,0%)
2. Sim, já passei por duas > 8 
(16,0%)
3. Sim, já passei por três ou mais > 2 
(4.0%)
4. Não, felizmente ainda não passei por nenhuma > 26 
(52.0%)
5. Não sei / não me lembro >  0 
(0,0%)
Votos apurados: 50
(100,0)  

Prazo para votar: até 4ª feira, dia 24,  9h00.

 A resposta, como habitualmente, é "on line", no canto superior esquerdo do blogue.

Um abraço e bom fim de semana.

Os editores

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Nota do editor:

Último poste da série > 24 de janeiro de 2016 > Guiné 63/74 - P15660: Inquérito 'on line' (33): Só pouco mais de um terço (35,7%) de um total de 123 respondentes, é que diz que "sim, a tropa fez de mim um homem"...

Guiné 63/74 - P15772: Ser solidário (194): Obrigado, Portugal, da Guiné, Cumura (João Martel e Ana Maria Gala)



Foto nº 1 > O contentor em Bissau, na sede da Fundação João XXIII



Foto nº 2 > Largar amarras para Cumura, bem amarrados


Foto nº 3 > O Tarzan a encantar gerações, pela primeira vez projectado na escola


Foto nº 4 > O que, incrivelmente, coube nas malas de avião, uma parcela do crowdfunding.


Foto nº 5 > Experiência das cores feito pelo 2º Ciclo com as tintas oferecidas.


Fotos (e legendas): Um pé na Guiné (com a devida vénia)


1. Mensagem dos nossos amigos João Martel e Ana Maria Gala:


Data: 12 de fevereiro de 2016 às 19:40

Assunto: Obrigado, da Guiné!



Algo que não podemos deixar de partilhar!... No nosso sítio Um pé na Guiné

 Com um grande abraço a todos, aí na Tabanca Grande!


Ana Maria Gala e João Martel




2. Obrigado, Amigos! Chegou Tudo Inteiro!

por Ana Maria Gala e João Martel


Chegou o dia! Há já muito que de Portugal nos perguntavam: “então o contentor, já chegou?”, “perdeu-se no mar, o que se passa?” “já conseguiram tirá-lo do porto?”… 

Ao ritmo das burocracias e contratempos guineenses, com Natal e Ano Novo pelo meio, um dia toca o telefone – é o nosso amigo Raúl, mestre “diplomata das alfândegas” e director da Cooperativa Escolar S. José, em Bôr, a avisar-nos que o despacho portuário está já no último ministério, na última secretária, com o último carimbo!… Alegria!

No dia 18 de Janeiro, navegando a heróica carrinha velha dos frades, fomos até Bissau, à casinha-sede da Fundação João XXIII, a associação portuguesa, com sede em Ribamar, Lourinhã, que gentilmente nos ofereceu o transporte marítimo dos materiais reunidos para Cumura.

Lá estavam eles, um grupo animado e de piada pronta, à boa maneira lusa (que bom é ouvir e expandir-se na nossa língua), que se lançou, de mangas arregaçadas, aos caixotes que os muitos amigos de Portugal juntaram para nos enviar.

Tudo bem empilhado e amarrado, com solidez à prova das crateras na estrada que teríamos de enfrentar, muitos abraços e cumprimentos e o convite para nos juntarmos ao grupo daí a dois dias, em Ondame, nas profundezas da região do Biombo, onde a Fundação tem feito renascer o velho e vital projecto da Clínica “Bom Samaritano”, um projecto tão antigo como a missão de Cumura, começado por duas missionárias evangélicas nos idos anos 50.

Mas afinal, o que veio de Portugal? (*)

Principalmente, material para a escola e para o hospital. Para este tinham-se comprado 500 unidades de 100 mL de soro fisiológico a preço reduzido, na farmácia do Hospital Garcia de Orta, em Almada, que são muito necessárias para a Pediatria e que normalmente não fazem parte da “lista de compras” da Missão.

Para a escola – a maioria – chegou bastante material escolar, algum material de escritório e o mais necessário – os Livros. Como tínhamos já combinado de antemão com o director da escola, o Frei Carlos, era nossa intenção ajudar a criar a biblioteca para o 1º e 2º ciclos, assim como ampliar a colecção da biblioteca do Liceu. Durante estas próximas semanas, vamos trabalhar na catalogação e criação do espaço e daremos a conhecer as várias obras que chegaram, à medida que estiverem em utilização.

Queremos aproveitar este momento da chegada do contentor, estando agora a bater a metade do tempo da Missão “Um pé na Guiné”, para agradecer a todos os que generosamente quiseram contribuir para nos ajudar neste projecto missionário e ajudar o povo da Guiné-Bissau!

Além do que descrevemos acima, os fundos que recolhemos nas iniciativas do “Crowdfunding” e de outras fontes serviu para comprar vários materiais importantes que vieram connosco de avião, como:

– Um projector vídeo para uso na escola (o cinema tem sido um sucesso!)
– Livros para mediação de leitura
– Material de escrita e artes plásticas
– Livros técnicos de apoio ao professor.
– Cd’s de canções e lenga-lengas em português.

Foram muitos os que contribuíram. Sendo impossível invocar o nome de todos, gostaríamos de lembrar aqui:

– Os que apoiaram a iniciativa do “Crowdfunding”, dando-nos alguns dos fundos iniciais para arrancar com este projecto. Aqui estão eles: Paulo Martel, Mafalda Lima,  João Gala,  Maria Machado, Leonor Matos, Luís Carvalhais,  Ana Gabriela Silva,  Esther de Lemos,  Cecília Albuquerque, DICP,  Hélder Sousa, Maria do Rosário Costa,  Joana Casal Ribeiro, Carlos Farinha Manuel Joaquim, António Sucena Rodrigues,  Alberto Grácio,  Zepinela,  José Viegas,  Acílio Gala, Tiago Tomaz , Tomás Albuquerque,  Maria Henriques.  Catarina Vieira,  Celestino Manso,
Aurora Tomaz, Diogo Martel, Inês Martel, Lourenço Leite,  Inês Santos, Carlos Júlio,  Miguel Borges, Ana Isabel Carvalho,  Mariana Matos,  Nuno Vasconcelos,  José Luís Gala,  Ana Isabel Gala, Alexandra Coelho,  Carolina Pinheiro,  Liliana Lopes,  Rui Marmota,  João Filipe Almeida,  Joana Ressurreição,  Maria, Isabel, Francisco e Filipa Gala,  Rita Coelho Nadjos,  João Silva,  Maria Martel Creche “O Piu-piu”, Pedro Gala,  António Boavida,  Maria do Céu Gomes,  Tomás Mendes.

– As comunidades das paróquias de Porto Salvo (Oeiras), Igrejas do Carmo, dos Carmelitas e de Nª Srª dos Anjos (Porto) e os colaboradores da Fundação Calouste Gulbenkian, que mostraram verdadeiro sentido de solidariedade e família, criando uma grande rede de ajuda e apoiando a nossa partida.

– As nossas famílias, por estarem sempre connosco e por se envolverem na recolha, preparação e envio de todos os materiais reunidos, mesmo após a nossa ausência.

– A Fundação João XXIII, que nos ofereceu o transporte deste contentor e de um segundo, que está prestes a chegar a Bissau e o Raúl, que permitiu que os caixotes vissem a luz do dia na Guiné.

Em nome da comunidade de Cumura e de todos os que irão beneficiar das vossas ofertas e amizade, enviamos um muito obrigado! (**)

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 23 de dezembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15532: Ser solidário (189): Notícias de Cumura: estamos muito gratos a todos os que têm apoiado este projecto, sabendo que não há verdadeiramente um projecto 'de alguém', somos todos a remar na mesma canoa da amizade entre os povos (João Martel e Ana Maria Gala)

(**) Último poste da série > 13 de janeiro de 2016 > Guiné 63/74 - P15616: Ser solidário (193): A Associação dos Deficientes das Forças Armadas (ADFA), distinguida com o Prémio Direitos Humanos 2015, "pelo seu papel notável de 41 anos de apoio aos ex-combatentes vítimas da guerra colonial"