António Martins de Matos, ex-ten pilav, Bissalanca. BA 12, 1972/74; ten gen ref, autor de"Voando sobre um Ninho de Strelas (Lisboa: BooksFactory, 2018, 375.pp.) |
1. Para abrir o apetite para a sessão de lançamento do livro "Voando sobre um Ninho de Strelas", na próxima 3ª feira, às 18h00 (*), e a título de primeiras notas de leitura, aqui ficam algumas frases e pequenos excertos, selecionados pelo nosso editor.(**)
O autor dá-nos a honra se sentar à sombra do poilão da Tabanca Grande, como camarada da Guiné que foi (e é). Desde que o conheço, há coisa de 10 anos, sempre apreciei a sua camaradagem, lealdade, frontalidade e sentido de humor (, às vezes sarcástico). Tem uma qualidade que eu aprecio: não faz fretes a ninguém, é contra o "politicamente correto", diz o que pensa, é intelectualmente honesto, mas também sabe respeitar as opiniões dos outros.
Capa do livro |
Não lhe vou chamar "glorioso maluco das máquinas voadoras", porque ele ficaria logo furioso comigo... Mas acho que estarei a ser justo se disser que ele, o Miguel Pessoa e outros pilotos da FAP que estiveram connosco na guerra do ultramar / guerra colonial, e que voaram o Fiat G-91, enfrentando no TO da Guiné, a nova ameaça que representava o míssil terra-ar Strela (, são poucos esses pilotos, da Esquadra 121, contam-se pelos dedos das duas mãos...) , são credores da nossa admiração e do nosso orgulho. (Naturalmente, a nossa homenagem é extensível a todos os demais camarads da FAP.)
Para mais, o António Martins de Matos, sempre se deu bem com a malta de terra, mar e ar... E ainda hoje alinha nos convívios das nossas tabancas, a começar pelo encontro nacional, anual, da Tabanca Grande. E, não é de mais lembrar, foi aqui, nas páginas do nosso blogue, que ele descobriu a urgência, a paixão e o desafio da escrita. Ficámos todos a ganhar. (LG)
_______________
Nestes últimos anos tenho encontrado muitos amigos do Exército que estiveram comigo na Guiné, nos inúmeros aquartelamentos por lá espalhados e que, bem ou mal, algumas vezes tentei apoiar. Com eles acabei por cohecer uma outra visão da guerra, bem mais difícil que a minha(p. 12.
Não sei se é da velhice, se é do Alzheimer, mas tenho saudades dos bons tempos passados na Guiné (p. 13).
(…) Lista nominal dos 304 militares mortos em combate, apenas e só durante os 21 meses da minha passagem por terras da Guiné (…). Bem os gostaria de os ter podido ajudar melhor. É à memória destes 304 jovens que dedico o meu livro (p. 16).
Era o primeiro a escolher e podia ter optado por Luanda mas, por ter a noção que a guerra iria durar uns largos anos… preferi Bissau. Começava pelo pior, depois era só a melhorar. Eu sei, era jovem, não pensava (p. 35).
Na Academia Militar estudava-se o Clausewitz, como sendo a Bíblia das Guerras, mas faltavam os ensinamentos dos outros, dos que sabiam os conceitos de guerrilha, Che Guevara, Mao Tse Tung… (pp. 38/39).
À chegada a Nova Lamego abriram as portas da cauda do avião e logo se formou uma “feira de gente”, era “dia de São Avião” (p. 49).
(…) Encontrei uma cidade [, Bissau,] demasiadamente feia e suja (p. 53).
Com base nas primeiras impressões tornava-se desde logo evidente que aquela terra não nos pertencia (p. 55).
‘Ganda maçarico, isto aqui [, percurso Bissalanca-Bissau-Bissalanca,] é uma zona segura onde nada acontece’… (p. 56).
‘Ganda maçarico, isto aqui [, percurso Bissalanca-Bissau-Bissalanca,] é uma zona segura onde nada acontece’… (p. 56).
(…) Em resumo, lá tivemos que nos aguentar com o GINA [Fiat G.91]R-4 [, armado com 4 metralhadoras 12.7](…), tinha.nos dado mais jeito o R-3 dos canhões [, de 30 mm,] para, no Ultramar, não termos de andar a brincar às guerras (p. 62).
Algumas vezes foram utilizadas duas napalms de 300 litros e duas de 80 litros. Nunca soube o peso exato desta configuração, acho que já estaria fora do permitido, coitado do “Gina”, … arrastava-se pela pista (p.66).
O avião era abastecido com 3600 libras (1800 litros). (…) Numa missão normal para a zona Sul ou Norte, normalmente conseguíamos estar até cerca de uns quinze minutos na área. No ponto mais afastado da Base (, região de Buruntuma,) e sem depósitos exteriores, o tempo que se podia estar sobre o objetivo era… zero (p. 67).
(...) Por que raio de razão os aviões [, DO-27,] estavam pintados de vermelho ? (p. 71).
Que diabo andariam aqueles cérebros em Lisboa a pensar ? Estariam a dormir ? Teriam lido o tal papel sobre a evolução das guerrilhas ? Se não leram, eram incompetentes! Se leram, eram… desleixados! (p. 84).
A Guerra do Ultramar arrastou-se por 13 longos anos. Durante todo esse tempo nunca em Lisboa se produziu uma Doutrina de Emprego dos Meios Aéreos que pudesse ser usada nas três Frentes, Guiné, Angola e Moçambique (p. 87).
Normalmente ao fim de 6 minutos após soar o alarme, a parelha [de Fiat G-91] estava no ar (p. 87).
Bastava o ruído da aeronave em aproximação para se obter um efeito dissuasor no PAIGC e moralizador nas nossas tropas (...), a melhor arma que o Fiat G-91 dispunha era o seu… ruído (…), o avião Fiat G-91 não era capaz de resolver a guerra na Guiné e muito menos a de Moçambique (p. 88).
(…) Os médicos nunca iam ao mato (material precioso ?), a missão era apoiada por uma enfermeira paraquedista (p. 90).
A população da Guiné tinha mais apoio [, em termos de evacuações por via aérea] do que (hoje) os habitantes das nossas aldeias de Trás os Montes (p. 90).
(…) Fico de cabelos em pé quando oiço alguém contar histórias do A e do B que voavam de porta aberta ou aos loopings ou com uns uísques no bucho… (p. 104).
‘Senhor major, aqui ninguém vai consigo, o senhor é que vai comigo’ (p. 106).
Com a manhã a chegar, logo o mistério que os “velhos” [do destacamento da FAP em Nova Lamego] me tinha feito recear, acabava por ser desvendado, alguém me acordava movimentando-me o sexo acima e abaixo, em ritmo bem compassado. Subitamente acordado, logo reparei na intrusa, vinda não sei de onde, negra e jovem, eventualmente demasiado jovem, seios erectos e o sorriso matreiro. Acordar destes só em África, de imediato um movimento envolvente no sentido de a tentar agarrar, logo ela rindo e recuando, dizendo com ar malicioso: ‘Ná ná, nem qui foras Tinente!’… (pp. 107/108).
Ao sexto mês de Comissão a neura já começava a produzir os seus efeitos (p. 125).
No final de janeiro de 73 soubemos do assassinato de Amílcar Cabral, algo que nos trouxe alguns pensamentos estranhos, tristes e confusos (p. 130).
Em termos de hierarquia militar havia enfermeiras com vários postos, de tenente a furriel. Nunca se sabia quem era quem, já que o seu fardamento habitual era com as botas da tropa, calças de camuflado e t-shirt branca, a melhor maneira de as tratar seria por “senhora enfermeira”. Logo se voltavam para nós, sorriso inquiridor, “Diga lá, senhor piloto”; não sei bem porquê, mas o coração acelerava-nos um pouco (p. 140).
Amo a minha Força Aérea (p. 299).
Notas do editor:
(*) Vd. poste de 4 de dezembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19257: Agenda cultural (661): "Voando sobre um ninho de Strelas", livro de memórias de António Martins de Matos, ten gen pilav ref. Sessão de apresentação: 11 de dezembro, 3ª feira, 18 horas, no Hotel Travel Park, na Av. Almirante Reis 64, Lisboa (metro Anjos). Estamos todos convidados.
(**) Último poste da série > 16 de outubro de 2018 > Guiné 61/74 - P19106: (Ex)citações (345): a Pátria, a classe social, a cunha, o mérito, os "infantes"... e que Santa Bárbara nos proteja!... (C. Martins / Luís Graça)