sexta-feira, 13 de novembro de 2020

Guiné 61/74 - P21539: Casos: a verdade sobre... (16): Onde foi o "berço da nacionalidade" ? Terá sido em Feto Lugajole, uma colina à cota de 200 mt, frente à atual tabanca de Lugajole ? Fica a 5 km da fronteira, a 40 km de Madina do Boé... E ainda hojé é intransitável de carro, em setembro... (Patrício Ribeiro, Bissau)

 


 Foto nº4 > Guiné-Bissau > Região de Gabu > Sector de Boé >  2005 > Restos do Quartel de Madina > Entrevista a dois antigos militares,   ainda tinham a caderneta militar portuguesa.

 
 Foto nº 3 > Guiné-Bissau > Região de Gabu > Sector de Boé >  2010> Passeio para visitar o local onde o PAIGC diz que proclamou a independência em 24/9/1973.


Foto nº 5  > 
Guiné-Bissau > Região de Gabu > Sector de Boé >  2010>   Monumento à independência.



Foto nº 6 >  Guiné-Bissau > Região de Gabu > Sector de Boé >  Lugajole > Na colina declararam a independência, ao fundo, foto obtida  a partir do Centro de Saúde


Foto nº 1 > 1/7/2018 > Escola de Madina do Boé e cantina escolar



Foto nº 1A > Guiné-Bissau > Região de Gabu > Sector de Boé >  1/7/2018 > Escola Básica (EB) de Madina do Boé > Cantina Escolar > Programa financiado  pelo Departamento Americano de Agricultura (USDA) , sendo o promotor o Porgrama Alimentar Mundial (WFP).


 Foto nº 2 > Guiné-Bissau > Região de Gabu > Sector de Boé >  2005 > Vendu Leidi > Antiga guerrilheira que costumava acompanhar o Amílcar Cabral nas deslocações ao Boé. Esta foto foi tirada, na tabanca Vendu Leidi ( ver mapa militar Vendu Leidi) a sul de Lugajol, junto a fronteira da Guine Conacri, quando a RTP a foi entrevistae para um programa sobre a independência. 


 

Foto nº 7 > Guiné-Bissau > Região de Gabu > Sector de Boé > Uma da diversas escola, 2018,  no caminho entre Beli e Madina


Foto nº 8 > Guiné-Bissau > Região de Gabu > Sector de Boé > 2018 >  Uma das diversas escolas, em tabancas que encontramos no caminho entre Beli e Madina.



Fotos (e legendas): © Patrício Ribeiro(2020). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Mensagem de Patrício Ribeiro 

 [, português, natural de Águeda, criado e casado em Angola,  com família no Huambo, antiga Nova Lisboa, ex-fuzileiro em Angola durante a guerra colonial, a viver na Guiné-Bissau desde meados dos anos 80 do séc. passado, fundador, sócio-gerente e director técnico da firma Impar, Lda.; tem também uma "ponta", junto ao rio Vouga, Agueda, onde se refugiou agora, fugindo da pandemia de Covid-19: é o português que melhor conhece a Guiné e os guineenses, o último dos nossos africanistas: tem uma centena de referências o nosso blogue]


Data - domingo, 8/11, 15:41


 
Boas tardes,

É estranho a RTP nunca ter passado nas televisões a reportagem que fizeram nas colinas do Boé, em 2005.

Será que a reportagem mexeu em Lisboa, em algo que não interessava alterar?  Ou foram os antigos militares Portugueses naturais da Guiné, que a reportagem filmou com as cadernetas militares, dentro do que resta do antigo Quartel de Madina, que não interessava informar?

Não sei quantas operações militares foram feitas durante a ocupação de Beli, para o sul do rio Féfine, para os lados de Vendu Leidi…

Certamente seria zona livre do PAIGC, “naturalmente” pela dificuldade de lá chegar (onde os Angolanos andam a fazer furos de sondagem de Bauxite)

A independência foi declarada em cima de uma colina, à cota 200 mt,  “por cima da Tabanca de Lugajole” (conforme monumento, que lá foi construído).

- 5 Km, da fronteira.

-10 km, a sul de Beli.

-40 km, a leste de Madina do Boé (e onde em setembro é quase impossível lá chegar por estrada, devido à época da chuvas).

Esta zona é muito bonita, nem parece que estamos na Guiné.


Abraço, de domingo de confinado.

Patrício Ribeiro

2. Mensagem enviada em 25 de outubro último pelo Patrício Ribeiro

Luís,

Para nós os confinados, aqui vai.

Sobre a "Montanha Cabral", nunca ouvi falar deste lugar, das diversas vezes que fui a Madina do Boè.

Falei com 2 investigadores Portugueses  que conheces, o Geólogo, Paulo Aves e o Biólogo, Luís Catarino, que também fizeram trabalhos no Boé, mas também não conhecem a "Montanha Cabral".

Madina fica á cota de 90 mt, em uma zona plana (foto 1) mas uma das diversas colinas,  a Dongal Dandu, perto de Dundum,  tem a cota 170 mt (ver carta geológica da Guiné Bissau do Paulo Alves, assim como mapas militares e outros que me ofereceste em CD)

Ver P 18.862, com outras fotos, que enviei daquela zona (*).

Parabéns à Joana Benzinho e sua equipa que, com muito sacrifício, andam a levar a língua Portuguesa a locais de difícil acesso,

Depois da AMI [, AssistênciaMédica Internacional,]  nos anos 80 com a sua equipa médica, chega mais alguém a falar Português ao Boé, esta língua é pouco falada naquela zona.

Envio uma foto de uma antiga guerrilheira do PAIGC ( foto nº 2 tirada em 2005), que costumava acompanhar o Amílcar Cabral, quando ele se deslocava pelas colinas do Boé.

Esta foto foi tirada, na tabanca Vendu LeidI ( ver abaixo mapa militar de Vendu Leidi),  a sul de Lugajol, junto a fronteira da Guine Conacri, quando a RTP a foi entrevistar, para um programa sobre o dia da Independência da Guiné Bissau.

Não sei quantas operações militares, se terão feito para o sul do rio Féfine. Certamente seria zona libertada do PAIGC “naturalmente” pela dificuldade de lá chegar (ver mapa de Capebonde)

“A independência [, em 24 de setembro de 1973] foi declarada a mais de 200 mt altura, numa colina perto da tabanca de Lugajole”:  ver monumento (fotos nº  3, 5 e 6 ), poste P 5050 (**)

Ora em  setembro é quase impossível chegar, mesmo hoje,  por estrada, àquela zona. [Recorde-se que a indepência unilateral da Guiné-Bissau foi feita pelo PAIGC em 24 de setembro de 1973.]

É estranho a RTP nunca passado “esta reportagem”, feita nas colinas do Boé em 2005. Será que a reportagem mexeu em Lisboa, em algo que não interessava alterar ? Ou foram as muitas cadernetas de antigos militares Portugueses,  naturais da Guiné, que a reportagem filmou, dentro do que resta do antigo Quartel, que não interessava informar ? (foto nº 4) (Ver o Poste P5050 de 4.10.2009) (**).

A tabanca de Lugajole ( ver mapa de Beli) está à cota 110 mt, de onde se pode ver perto uma colina com mais de 200 mt de altitude (foto 5), onde alegadamente  foi declarada a Independência, na zona do Felo Lugajole.

Esta tabanca passou a ser importante pós-independência. Tem diversas construções prefabricadas de betão, provavelmente construídas pela fábrica, que os Cubanos tinham em Bissau, na década de 80 ainda funcionava.

Foi lá construído um bom Centro de Saúde, em blocos de cimento. Onde já dormi, era o melhor hotel da região…

Há poucos anos, tentaram fazer lá mais uma romaria, mas a jangada não deixou.

Foram construídas muitas escolas na região (foto  nº 8) em pequenas tabancas, de muito difícil acesso, onde só é possível as viaturas chegarem no tempo seco. Ao longo do caminho que acompanha o Rio Cobolom, e não em cima nas colinas...

O caminho é entre a tabanca de Cobolom,  é muito bonito, até cruzamento entre Madina e Dandum .

Perto deste cruzamento, morreu o Domingos Ramos, atingido pelos morteiros do quartel de Madina. (ver foto do Memorial, no P 18.863).

A Região do Boé  sofreu grandes alterações nos últimos anos… as casas características dos Fulas, que eram quase todas cobertas a palha e redondas, já quase não existem, agora são retangulares e cobertas a chapa de zinco, como quase por toda a Guiné, perderam a originalidade (foto nº 7).

Os Angolanos, andaram lá a fazer uns furos de sondagem, para a exploração de Bauxite, para os lados de Vendu Leidi.

Já outros procuram, naquela zona, ouro, ainda outros procuram diamantes, etc. Deve haver alguma “coisa” naquelas Colinas e não só as grutas, onde o PAIGC guardava munições.

Já que do outro lado da fronteira, na montanha do Futa Jalom, andam para lá os chineses entretidos, em diversas minas de minerais, junto á estrada de Koundara para Labé. Mas também se dão ao trabalho de abrir a estrada pela montanha acima a ligar as duas cidades.

 Para os Guineenses, o ouro atual é a castanha de cajú… Que dá para construir casas novas e também e trocar a palha da cobertura das casas, por chapas de zinco, e passa a não ser necessário trocar de 4 em 4 anos.

Abraço, que vou fugir para a lareira.(***)



Guiné > Região de Gabu > Setor de Boé > Carta de Vendu Leidi (1959) (Escala 1/50 mil) > Posição relativa da tabanca de Vendu Leidi, junto à fronteira com a Guiné-Conacri. A sudeste fica o Felo Canhage, uma das colinas do Boé que se aproxima da cota dos 300 metros. A tabanca fica a sul de Lugajole.

Infografia: Blogue Luís Graça & Camarads da Guiné (2020)



Guiné > Região de Gabu > Setor de Boé > Carta de Béli (1959) (Escala 1/50 mil) > Posição relativa de Béli, de Lugajole e do rio Fétiné, afluente do rio Corubal, que divide o Boé ao meio, a parte ocidental e a parte oriental. A declaração de independência teria sido feita  num colina, à cota de 200 metros, Feto Lugajole... Mas não havia estradas para este sítio, na altura, não se sabendo como o PAIGC transportou os seus convidados...

Infografia: Blogue Luís Graça & Camarads da Guiné (2020)



Guiné > Região de Gabu > Setor de Boé > Carta de Capebonde (1959) (Escala 1/50 mil) > Não havia tabancas nem estradas, apenas um picada que atravessava a fronteira vinda de Béli...

__________

Notas do editor:


(*) Vd.poste de 21 de julho de  2018 > Guiné 61/74 - P18862: Bom dia, desde Bissau (Patrício Ribeiro) (7): Os meus passeios pelo Boé - Parte I: 30 de junho de 2018: a travessia do Rio Corubal, de jangada, em Ché Ché

(**) Vd. de 4 de outubro de 2009 > Guiné 63/74 - P5050: Efemérides (27): Declaração da Independência em 24 de Setembro decorreu não em Madina do Boé mas Lugajole (Patrício Ribeiro)

(***) Último poste da série > 13 de novembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21538: Casos: a verdade sobre... (15): A retirada de Madina do Boé e o enfraquecimento do flanco sul / sudeste do território (regiões de Gabu e Bafatá) (Valdemar Queiroz / Cherno Baldé / António Rosinha / Fernando Gouveia)

Guiné 61/74 - P21538: Casos: a verdade sobre... (15): A retirada de Madina do Boé e o enfraquecimento do flanco sul / sudeste do território (regiões de Gabu e Bafatá) (Valdemar Queiroz / Cherno Baldé / António Rosinha / Fernando Gouveia)


Foto nº 4

Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Subsector de Galomaro > 21 de junho de 1969 > A antiga tabanca de Padada, a 12 km a sul de Madina Xaquili, na direcção do Rio Corubal.


Foto nº 1 > Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Subsector de Galomaro > 21 de junho de 1969 > Restos, carboizados, da antiga tabanca de Padada, a 12 km a sul de Madina Xaquili, na direcção do Rio Corubal. 


Foto nº 2 > Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Subsector de Galomaro > 21 de junho de 1969 > O grupo de combate do Fernando Gouveia, progredindo nas proximidades da antiga tabanca de Padada,   


Foto nº 3 > Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Subsector de Galomaro > 21 de junho de 1969 > O Fernando Gouveia, nas proximidades da antiga tabanca de Padada,   



Foto nº 5 > Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Subsector de Galomaro > 21 de Junho de 1969 t > Uma pausa para retemperar as forças, a caminho de Madina Xaquili que, tal como Padada antes, viri a ser abandonada em outubro de 1969. 
  

Fotos tiradas pelo nosso camarada Fernando Gouveia (ex-Alf Mil Rec e Inf, Bafatá, 1968/70), no decurso de um patrulhamento ofensivo àquiela tabanca abandonada, com o seu grupo de combate (20 milícias e 10 soldados metropolitanos). Em Padada reencontar-se-ia com forças da CCAÇ 2405 (Galomaro / Dulombi, 1968/70), comandadas pelo Cap Mil Jerónimo. Foram encontrados vestígios recentíssimos da guerrilha do PAIGC.


otos (e legendas): © Fernando Gouveia (2009. Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Comentários de Valdemar Queiroz, Cherno Baldé e António Rosinha ao poste P21531 (*)

(i) Valdemar Queiroz

A questão do abandono de Madina e toda aquela região da zona além Corubal,  é estranha em termos de estratégia da ocupação do terreno, para, inclusivamente, não dar azo a "zona libertada".

Vejamos nos mapas existentes no blogue de toda essa região à data em que foram elaborados. Vejamos, depois, como era a ocupação/fixação da população e presença da NT a partir do início do ano de 1969. 

Verificamos que apenas Canjadude e mais acima Cabuca eram as únicas tabancas existentes a fazer tampão a incursões a Nova Lamego, Dara e Piche, que a partir daquela data começaram a ser atacadas mais frequentemente. 

Em toda aquela área a leste da linha (estrada) Buruntuma - Nova Lamego, só existam Cabuca e Canjadude com pouca população e praticamente só ocupação militar. 

Não sei o que entretanto foi acontecendo (vim para a peluda em dezembro de 1970) com flagelações a estas duas tabancas. O facto de cada vez mais população abandonar essas tabancas da região, concentrando-se nas grandes localidades de Nova Lamego e Bafatá,  fazia com que apenas a NT resistisse nesses locais, não tardando, sabe-se lá, tambéma serem consideradas para retiradas estratégicas formando, assim, mais "zonas libertadas".


(ii) Cherno Baldé: 

Antes do início da guerra, o Sudeste da Guiné, que inclui a parte sul da região de Bafatá (Galomaro Cossé) e da região de Gabu (Boé), não eram zonas desabitadas,  como se pode pensar. 

O seu despovoamento foi gradual e aconteceu nos primeiros anos da Guerra e, em 1968 quando chega o Gen Spinola, a situação ja era irreversível. 

O Galomaro, como diz o nome,  era uma zona habitada por ricos ganadeiros fulas e com arrozais nas bolanhas a perder de vista. Foram abandonadas com o recrudescer da guerra. 

Se depois o abandono do terreno se justificava devido à inexistência da população, é caso para dizer que sempre existiu e existe uma grande diferença entre a teoria e prática, entre os sonhos e a realidade, como podemos perecber no excertodo discurso em baixo, é pena que o homem [. o António Oliveira Salazar,]  nunca tenha vindo ao terreno para constatar a realidade "in loco". 

“As terras coloniais, ricas, extensas e de fraquíssima densidade populacional são o natural complemento da agricultura metropolitana, nos géneros pobres sobretudo, e das matérias-primas para a indústria, além de fixadores de uma população em excesso daquilo que a metrópole ainda comporte e o Brasil não deseje receber. (...) 

"Nós cremos que há raças decadentes ou atrasadas, como se queira, em relação as quais perfilhamos o dever de chamá-las à civilização. Que assim o entendemos e praticamos, comprova-se pelo facto de não existir qualquer teia de rancores ou de organizações subversivas que neguem ou que pretendam substituir a soberania portuguesa. (...)"

Fonte:  António Oliveira Salazar. Discursos e Notas politicas, vols. III e V (1943 e 1957). Coimbra, Coimbra editora, sem data. 

(iii) António Rosinha:

Amigo Cherno: "as terras coloniais, ricas, extensas e de fraquíssima densidade" a que o Salazar se referia, foram os tais colonatos que foram construidos em Moçambique e principalmente Angola. 

Na Guiné não havia extensões agrícolas desabitadas, para albergar tantas famílias, como as que foram para Angola e Moçambique, principalmente transmontanos e açoreanos. Os colonatos de Angola conheci-os relativamente bem. 

Cherno, ainda hoje estou convencido que continua a haver maiores extensões desabitadas em Angola do que as que existem na Guiné, mesmo considerando que a região de Madina do Boé continue pouco habitada. Só que as grandes extensões desabitadas em Angola, hoje já está tudo demarcado e aramado pelos "novos senhores" de Angola. 

A Guiné, tirando a região de Madina, sempre deve ter tido uma densidade populacional muito maior que Angola, que conheci bastante bem. Salazar não ia ao terreno, mas estava bem informado. 

PS- Onde parece que está a ficar muito despovoado é o norte de Moçambique, com decapitações e fugas da população e nem a ONU nem Portugal nem a Inglaterra (aquilo já se passou para a Commonuelth) fazem frente à Jihad ou o que aquilo é. A Europa já não pode com uma gata pelo rabo! 

2. O caso do abandono  de Madina Xaquili em outubro de 1969:

Num dos postes da sua série A Guerra Vista de Bafatá, o nosso camarada e amigo Fernando Gouveia (ex-Allf Mil Rec e Inf, Comando de Agrupamento nº 2957,  Bafatá, 1968/70)  explica o porquê da sua ida intempestiva para Madina Xaquili,lá  no "cu de Judas":

"(...) Com a retirada das NT de Madina do Boé a 05/06 de fevereiro de 1969 e na sequência do fracasso da Op Lança Afiada em Março de 69 [,  de 8 a 21],  era de prever (...) que o IN progrediria no terreno, para Norte, ameaçando as zonas povoadas do Cossé, aproximando-se de Bafatá.

"Em princípios de Junho de 1969 chega ao Agrupamento [de Bafatá] uma ordem do Comando Chefe que determinava o envio de oficiais disponíveis, enquadrando grupos de militares, para as tabancas da periferia da zona habitada, no intuito de segurar lá as populações. Sabia-se que a região do Cossé era habitada predominantemente por fulas e que estes, ao mínimo pressentimento de problemas, se deslocavam aproximando-se de Bafatá.

"É neste contexto que o Cor  Hélio Felgas, meu Comandante (, Cmando de Agrupamento nº 2957), determina que eu vá para Madina Xaqili, sendo a Companhia sediada em Galomaro [, a CCAÇ 2405,] que me asseguraria a logística. (....) O Capitão, pessoa afável que gostaria agora de identificar [, cap inf José Miguel Novais Jerónimo,], deu-me todas as indicações sobre o que iria encontrar em Madina Xaquili.

"Sobre os 7 militares metropolitanos que me acompanhariam, escolheu um que sabia cozinhar, um que sabia fazer pão, outro que sabia de enfermagem e um rádio-telegrafista. Quanto ao armamento que me iria fornecer, fiquei alarmado: Além das G3 e de algumas granadas, só tinha o cano (só o cano e um cepo de madeira a servir de prato) de um morteiro 60, e 16 (dezasseis) granadas" (...).

"(...) Chegámos a Madina Xaquili a meio da manhã [ do dia 14 de Junho de 1969]. Era uma tabanca com umas 20 palhotas. Estava em auto-defesa, com cerca de 40 milícias, comandados pelo também africano João Vieira (sem Bernardo). Havia uma razoável cerca de arame farpado e abrigos construídos recentemente. A população civil (2 ou 3 famílias) e as mulheres dos milícias não tinham abrigos" (...). (**)




Guiné > Carta geral da província (1961) (Escala 1/500 mil) >  Posição relativa de Madina Xaquili (rectângulo a verde)  em plena zona leste, tendo a sul o Rio Corubal e a norte a estrada Bafatá-Gabu. Madina Xaquili fazia parte do mapa de Cansissé (1/50 mil). 

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2010)


3. Com a retirada de Béli (em julho de 1968), Madina do Boé e Cheche (em fevereiro de 1969), passou a haver um corredor, com "via verde", por onde o PAIGC se infiltrava mais facilmente na parte sul / sudeste do chão fula, a norte do Rio Corubal. 

Apesar do reforço temporário de tropas paraquedistas do BCP 12, ao sector de Galomaro (a partir de agosto de 1969, COP 7), bem como da CCAÇ 12 (que vai ter a sua estreia e batismo de fogo logo em Julho de 1969, em plena época das chuvas), Madina Xaquili,  guarnecida Pel Mil 147.  tornar-se-ia insustentável, sendo abandonada pela população e depois pelas NT logo em outubro de 1969. Padada, mais a sul, também já tinha sido abandonada (não posso precisar em que altura). O PAIGC apertava o cerco ao chão fula, e nomeadamente o Cossé donde eram originários, juntamente com Badora,  os soldados da CCAÇ 12.

O Pel Mil 147 (Madina Xaquili) fazia parte, em finais de setembro de 1968 (data em que o BCAÇ 2852 passou a tomar conta do Sector L1), da Companhia de Milícias nº 14 que tinhas pelotões e secções espalhados por Quirafo e Cansamange (Pel Mil 144), Dulombi e Cansamange (Pel Mil 145), Madina Bonco e Galomaro (Pel Mil 144). Nesta data já não há referência a Padada, presumindo-se que tenha sido abandonada anteriormente.

Em agosto de 1969, Madina Xaquili e o Pel Mil 147 já constam no dispositivo das unidades combatentes do BCAÇ 2852, em virtude de se passado a constituir um novo Sector, o L5, com sede em Galomaro (onde já estava de resto a CCAÇ 2405, com forças espalhadas por Imilo, Cantacunda, Mondajane, Fá, Dulo Gengele), integrado no CO7 (Bafatá).


(***) Sobre Madina Xaquili ler as venturas e desventuras do Fernando Gouveia em kunho de 1969... Foram 13 dias surreais, de 12 a 24 de Junho de 1969, contados e fotografados como só ele sabe.

26 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4585: A Guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia) (7): Um alferes desterrado em Madina Xaquili, com um cano de morteiro (VI Parte)

6 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4470: A Guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia) (6): Um alferes desterrado em Madina Xaquili, com um cano de morteiro 60 (V Parte)

28 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4429: A Guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia) (5): Um alferes desterrado em Madina Xaquili, com um cano de morteiro 60 (IV Parte)

21 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4395: A Guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia) (4): Um alferes desterrado em Madina Xaquili, com um cano de morteiro 60 (III Parte)

8 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4305: A Guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia) (3): Um alferes desterrado em Madina Xaquili, com um cano de morteiro 60 (II Parte)

27 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4254: A Guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia) (1): Três oficiais: um General, um Coronel, um Alferes - suas personalidades

Guiné 61/74 - P21537: Esboços para um romance - II (Mário Beja Santos): Rua do Eclipse (27): A funda que arremessa para o fundo da memória

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 12 de Novembro de 2020:

Queridos amigos,
Annette Cantinaux está eufórica nas suas férias do Natal português, o seu apaixonado põe-a a viajar em vários transportes, não falta o elétrico 28, desta feita começaram na Basílica da Estrela, já viram a árvore de Natal do Terreiro do Paço, banquetearam-se com o bife da Portugália, ela não esconde o seu assombro por aquela casa forrada de estantes e quadros de toda a espécie, onde até se corre alguns riscos de tropeçar em pilhas de livros. Tem tido enormes surpresas, muitos daqueles trastes vieram da Feira da Ladra de Bruxelas, ela está neste momento a folhear um álbum que diz por fora Vilar Formoso, Lisboa, Fátima, Coimbra, boas fotografias, quase sempre mostrando um jovem com ar decidido, ela até ficou muito impressionada com a fotografia do Rossio naquele ano de 1951, parece o mesmo que eu já vi, disse para si. Annette não resistiu a perguntar porque é que tu juntas isto a estas coisas, um tanto seraficamente ele respondeu-lhe que quer estar rodeado de boas memórias na velhice. Estamos a 24, nessa noite virão os filhos de Paulo e respetivos cônjuges, um amigo que é pintor surrealista, um guineense e um vizinho nonagenário que não tem família, como comunicarão logo se vê, o mais fácil será o guineense Abudu Soncó pôr à prova o seu francês, a felicidade do encontro virá por acaso e para glória do nascimento do Deus Menino.

Um abraço do
Mário


Esboços para um romance – II (Mário Beja Santos):
Rua do Eclipse (27): A funda que arremessa para o fundo da memória


Mário Beja Santos

Très chère Josephine, não pude infelizmente despedir-me de ti antes de partir para Lisboa, sei que estás em Mariemont a passar as férias de Natal com os teus pais, cheguei a Lisboa um pouco antes das festas, o Paulo tem-me proporcionado passeios encantadores pela cidade, por razões profissionais já aqui tinha vindo três vezes, mas sempre de raspão, tu sabes o que é a vida de intérprete, desembarcamos com um dossiê debaixo do braço e uma mala de viagem com rodas, toma-se um táxi para o hotel, horas depois estamos atrás de uma cabine de interpretação, por vezes há a deferência em convidar-nos para jantar, o dia seguinte poderá ser a mesma coisa, excecionalmente podemos ter um dia por nossa conta, às vezes consigo programar ficar mais um dia para bisbilhotar o local, com Lisboa não tem sido o caso e daí o fascínio de calcorrear uma cidade com o meu amoroso a dar-me a mão.
O Paulo queria que eu visse a animação natalícia no centro da cidade, mas antes levou-me a uma basílica gigantesca, chamada Estrela, confesso-te que não me impressionou muito aquela arquitetura sobredimensionada, mas íamos ali por outro motivo, o Paulo queria-me mostrar um presépio que saíra das mãos de um barrista de génio, retive o nome Machado de Castro. O postal que tenho para te mandar é eloquente na humanização das figuras, no equilíbrio das formas e na transparência da espiritualidade. De há muito afastada da prática religiosa, ali fiquei especada e, para minha surpresa, desfiei orações que aprendera em casa dos meus pais adotivos. E seguimos para a Baixa, num elétrico que desceu e subiu por ruas apertadas, muito comércio, quase à moda antiga, e assim chegámos a uma praça dedicada ao poeta nacional, Camões. Descemos uma rua cheia de bulício, em dado momento Paulo segurou-me o braço e entrámos numa ourivesaria, com interior requintado, julguei que estava na Praça Vandôme, qualquer coisa semelhante à loja Cartier, o Paulo pediu para vir anéis de senhora, nada de brilhantes, pérolas ou diamantes, perguntou por engastes de safiras ou esmeraldas. Obsequiosa, a funcionária foi tirando peças de umas vitrinas e expô-las num pano de veludo na minha frente. “Annette, escolhe o que te der mais prazer, a partir de agora és a minha noiva comprometida”. Apanhada de chofre, não pude reter a emoção, há muito tempo que não andava tanto a pé, trouxera uns ícones gregos para presentear o Paulo, coisas simples, mas um dia ele quis entrar numa loja do Grand Sablon dedicada à Arte Sacra e vi como os seus olhos brilhavam de contemplar a iconografia oriental. Escolhi uma peça, ajeitava-se perfeitamente ao meu dedo anelar esquerdo, só tremia a pensar no preço, ele falava em escudos, passou um cheque, nem me atrevi a perguntar o montante da joia. A funcionária entregou-me uma caixa, olhei-o com ternura e ele não fez mais nada, beijou-me ali mesmo, passou-me as mãos pelo cabelo, beijou-me delicadamente a mão, os funcionários da ourivesaria mantinham-se impávidos, estas cenas apaixonadas devem fazer parte da profissão.
Presépio de Machado de Castro, Basílica da Estrela
Ícone grego, século XVIII
Ourivesaria Aliança, Rua Garrett, Lisboa

À saída da ourivesaria, apanhámos um táxi, percebi que o Paulo deu como destino a Feira da Ladra, fiquei a saber que ela funciona às terças-feiras e aos sábados, ao contrário da Place du Jeu de Balle que é diária, se bem que seja mais pujante aos sábados e domingos. Apeados, o Paulo quis-me mostrar em primeiro lugar o exterior e o vestíbulo do Panteão Nacional, um monumento barroco que creio que a cúpula só foi concluída há umas décadas atrás, as dimensões são impressionantes e fiquei assombrada com a beleza dos mármores, predominam os róseos bem inseridos na pedra branca. E entrámos na feira, verifiquei que o Paulo conhece alguns dos vendedores, fomos para uma enorme bancada de livros e quinquilharia, imagina tu que até encontrei um volume com o teatro completo de Albert Camus, edição da Gallimard, em muito bom estado, paguei uma quantia irrisória, o Paulo fez as suas compras, livros e peças de porcelana. Aproximava-se a hora do almoço e ele disse-me que íamos almoçar o bife da Portugália, lá fomos para uma cervejaria enorme e deliciei-me com uma peça macia de carne, um molho muito gostoso, embebi aos bocadinhos um pão inteiro, com batatas fritas também saborosas, seguiu-se um pudim flan e um café à moda portuguesa.
Um aspeto parcial do Panteão Nacional
A Feira da Ladra com vista para o Panteão Nacional e o rio Tejo ao fundo

Precisava de descansar, voltamos para casa. Ainda não te dei pormenores da decoração, as paredes estão forradas de alto a baixo com uma variedade de obras de que eu não consigo ainda ter o elemento de ligação, são quadros a óleo, gravuras e serigrafias, sanguíneas e carvões, aguarelas, desenhos de toda a espécie, fotografias, tapeçaria, pelos cantos as esculturas em madeira ou mesas a abarrotar de livros, livros em cima dos sofás e das cadeiras, também predomina o tema religioso, perguntei o que é que estava a ver e ele falou-me em registos, um deles impressionou-me muito, tinha uma imagem do que me parecia um santo, o Paulo explicou-me que era o Senhor Santo Cristo dos Milagres, uma imagem reduzida a um tronco, a decoração era impressionante, metia escamas de peixe, recortes de papel colorido, pérolas, tecidos acetinados. O Paulo sossegava-me, está descansada, quando vieres viver para cá grande parte destas coisas vai para casa dos meus filhos, pretendo que tu organizes um espaço que dê alegria de viver, onde sintas intimidade e não dependente da organização que fui dando ao meu ambiente.
A casa tem uma bela varanda, um balcão cheio de vasos e um armário onde ele guarda coisas, abriu esse armário e mostrou-me uma quantidade enorme de copos dizendo que os ia oferecer a uma organização que angaria fundos para ações de filantropia. Aí descansámos e o Paulo deu-me conta de como pretende organizar a Consoada. E explicou-me que a Consoada é para ele o momento dominante do Natal, é a festa do júbilo pela vinda do Menino, os entes-queridos devem estar juntos e saborear os alimentos da festa. Foi buscar um livro e mostrou-me o prato de bacalhau destinado à noite de 24. “Chama-se Bacalhau à Baltar, depois de uma primeira demolha meto-o em leite, no dia seguinte aqueço azeite com alhos e meto o bacalhau guarnecido com pão ralado, vai ao forno até tostar, é acompanhado por legumes salteados. E falou-me que já encomendara um conjunto de doces tradicionais, o bolo rei, as broas (tinha saudades das broas de milho, eram frequentes quando Portugal era um país muito pobre, praticamente desapareceram), compra também iguarias de que os filhos gostam, caso do bolo de amêndoa com gila e a siricaia.
Fizemos uma refeição ligeira, o Paulo tinha feito uma sopa de curgete com batata e muitos coentros, eu tinha trazido queijos, acabámos a beber uma taça de chocolate e o Paulo propôs uma saída, ir ver o Terreiro do Paço à noite. Confesso que teria preferido ficar em casa, mas ele fez-me o convite com uma expressão tão feliz, percebi perfeitamente que eu estava intimamente associada àquele passeio que disse logo que sim. E fiquei felicíssima, naquela noite escura, naquela ampla praça reconstruída como sala de entrada de Lisboa depois do Terramoto de 1755, uma praça cheia de harmonia, tens o Tejo a marulhar ali bem perto, aqui funcionavam ainda alguns departamentos do Estado, mas a razão de ser da visita era uma esplendorosa e policromática árvore de Natal, eu sentia-me tão feliz, tão agradecida às pancadas do destino, àquele momento em que um senhor desconhecido me pedira para almoçar comigo na hora do almoço para me pedir apoio para um romance em que a guerra da Guiné seria o eixo central, acedi e decisão mais feliz não podia ter tomado, já passo dos 50 anos e pareço uma garota apaixonada pronta a ressurgir e a acreditar que a felicidade nos dá sempre uma nova oportunidade quando estamos disponíveis.
A árvore de Natal no Terreiro do Paço

Caminhamos para o Natal, assentou-se que vai haver uma manhã de passeio cultural, a tarde é para preparar a Consoada. Outra grande surpresa. Ali para os lados do Castelo de S. Jorge está uma igreja um tanto escurecida na fachada, mas ele tinha organizado uma visita, imagina tu o nome da Igreja, do Menino de Deus, que ternura, está praticamente adossada às muralhas do castelo, é opulenta no seu barroquismo em que a pedra fria contrasta com os elementos pictóricos e a decoração das capelas, o teto é magnífico e o altar de uma enorme riqueza. Foi um bom princípio de manhã de um turismo inesperado, hoje não se trabalha em Portugal, até ao dia 26 ou 27 a vida será a meio gás, mas foi-nos proporcionado este passeio, sinto-me muito agradecida. No regresso a casa, o Paulo já me comunicou que vai fazer uma açorda de gambas, novamente muitos coentros, e uma salada de frutas, impõe-se a sobriedade, as pratalhadas do Natal vão aparecer durante a tarde. Falei-lhe na Baixela Germain, tinha ouvido dizer que a existente no património português era de uma enorme riqueza. Está na minha agenda, Annette, não regressarás a Bruxelas sem ver os Painéis de São Vicente, a Custódia de Belém, a Arte Nanban e a Baixela Germain, para além do nosso Bosch, que não tem rival.
Voilá, Josephine, o inacreditável aconteceu, a minha vida tem um novo sal, este homem não esconde um profundo afeto e sei que digo uma banalidade, amigas íntimas como somos espero que saibas que estou preparada para viver um grande amor, desta vez agarro as golas do destino com as duas mãos. Beijo-te com a maior amizade do mundo, conto ver-te em meados de janeiro, tens que saber ao pormenor o que foram estas férias de Natal e como a minha vida é um sonho.
Igreja do Menino de Deus
Baixela Germain, Museu Nacional de Arte Antiga

(continua
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Nota do editor

Último poste da série de 6 de novembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21521: Esboços para um romance - II (Mário Beja Santos): Rua do Eclipse (26): A funda que arremessa para o fundo da memória

Guiné 61/74 - P21536: Parabéns a você (1891): José Manuel Lopes, ex-Fur Mil Art da CART 6250 (Guiné, 1972/74)

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Nota do editor

Último poste da série de 10 de novembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21530: Parabéns a você (1890): António Garcia de Matos, ex-Alf Mil Inf MA da CCAÇ 2790 (Guiné, 1970/72) e Jorge Araújo, ex-Alf Mil Op Esp da CART 3494 (Guiné, 1971/74)

quinta-feira, 12 de novembro de 2020

Guiné 61/74 - P21535: (Ex)citações (378): Talvez por causa de Madina do Boé... (Juvenal Amado, ex-1.º Cabo CAR, CCS / BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74)


1. Mensagem do nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas da  autor do livro "A Tropa Vai Fazer de ti um Homem", com data de 9 de Novembro de 2020:


TALVEZ POR CAUSA DE MADINA DO BOÉ

Talvez como consequência do abandono de Madina do Boé e o grande espaço de progressão que ficou livre até à zona de Galomaro, resultou em 5 mortos no local e mais 3 em consequência dos ferimentos, em emboscada feita à CCS/BCAÇ 2912 nas Duas Fontes em Outubro de 1971.

A CCAÇ 3491 - Dulombi - Fevereiro de 1972

Logo no período de transição teve um encontro de frente durante uma patrulha com IN, do qual só por milagre não resultaram baixas, mas cantis e casacos furados por balas, foram vários tal a violência de parte a parte.

CCAÇ 3489 - Cancolim - 1972/73

Depois seguiu-se Cancolim. Já depois de duas flagelações, a 2 de Março de 1972, Cancolim foi fortemente atacada com morteiros 82 mm tendo daí resultado a morte dos seguinte camaradas:

José António Paulo - 1.º Cabo Atirador - natural de Mirandela.
João Amado - Soldado Aux. Cozinheiro - natural de Carvide - Leiria.
Domingos do Espírito Santo Moreno - Soldado Atirador - natural de Macedo de Cavaleiros.

No final de 1972 a CCAÇ 3489 tinha 60 operacionais.

Não ficou por aí e, assim, morreram ainda em combate, alguns já em 1973:

António Martinho Vaz - Soldado Atirador - natural de Grijó da Parada - Bragança
Álvaro Geraldes Delgado Ferrão - Soldado Ap Morteiro -natural de Silvares - Fundão
Domingos Moreira da Rocha Peixoto - Soldado Atirador - natural de Alto da Vila - Duas Igrejas - Paredes
Califo Baldé - Soldado Milícia - natural de Anambé - Cabomba - Bafatá
Samba Seide - Soldado Milícia - natural de Anambé - Cabomba - Bafatá

Juntamos a este numero duas deserções (um capitão e um alferes) e a captura do Soldado António Manuel Rodrigues, que veio a fugir do cativeiro para o Saltinho já nós estávamos para embarcar para a Metrópole.

CCAÇ 3490 - Saltinho - 1972

Armandino da Silva Ribeiro - Alf Mil Inf - natural de Magueija - Lamego
Francisco de Oliveira dos Santos - Fur Mil Inf - natural de Ovar
Sérgio da Costa Pinto Rebelo - 1.º Cabo Ap Metralhadora - Vila Chã de São Roque - Oliveira de Azeméis
António Ferreira [da Cunha] - 1.º Cabo Radiotelegrafista - Cedofeita - Porto
Bernardino Ramos de Oliveira - Soldado Atirador - Pedroso - V. N. de Gaia
António Marques Pereira - Soldado Atirador - Fátima - V. N. de Ourém
António de Moura Moreira - Soldado Atirador - S. Cosme - Gondomar
Zózimo de Azevedo - Soldado Atirador - Alpendurada - Marco de Canaveses
António Oliveira Azevedo - Soldado - Moreira - Maia (**)
Demba Jau - Soldado Milícia - Cossé - Bafatá
Adulai Bari - Soldado Milícia - Pate Gibel - Galomaro - Bafatá
Serifo Baldé - Assalariado - Saltinho - Bafatá

Juntar o soldado António Baptista feito prisioneiro, bem como os diversos feridos com mais ou menor gravidade.

CCS/BCAÇ 3872 - 1972/73

Manuel Ribeiro Teixeira - 1.º Cabo Rec e Inf - natural Cimo da Vila - Varziela - Felgueiras - Vítima de mina antipessoal na estrada do Saltinho.
Mamassaliu Baldé - Soldado Milícia - natural de Cossé - Bafatá
Mama Samba Embaló - natural de Cossé
Ila Bari - Soldado Milícia - natural de Campata - Nossa Senhora da Graça - Bafatá
Alberto Araújo da Mota - Alf Mil TRMS - natural de Curral - Pico de Regalados - Vila Verde - Evacuado com hepatite, morre 2 dias depois em Bissau. 

Antes tinha sido evacuado o Soldado Radiomontador Carlos Filipe e aos 20 meses de comissão é igualmente evacuado com a mesma maleita o Alferes da ferrugem Amadeu.

Para fechar o ano de 1972 foi a CCS/BCAÇ 3872 violentamente atacada ao arame no dia 1 de Dezembro.

Em 1973 uma mina na estrada do Dulombi destrói Unimog e fere gravemente o meu camarada Falé que é evacuado e já não volta.

De referir o aparecimento de minas na estrada do Dulombi e ataques em Bangacia, Campata e Cansamba, tudo na região das Duas Fontes (entre 6 e 9 km de Galomaro).

Posteriormente a CCS bem como Cancolim foram reforçados com pelotões de Dulombi em retracção, que também reforçam operacionalmente Nova Lamego. Fomos também ajudados com grupos de intervenção independentes bem como com Paraquedistas.

Tendo o meu batalhão chegado à Guiné na véspera de Natal de 1971, a sua partida só se viria a efectivar em 28 de Março de 1974. Escrevo isto para situar o período das minhas narrativas e assim dar a perspectiva da alteração e da intensidade da guerra a que estivemos sujeitos. A violência, bem como o equipamento utilizado contra nós, foram assim sendo alterados de região para região.

Enquanto o alcance da nossa artilharia era ultrapassada largamente pelo o alcance da artilharia do PAIGC, também nos vimos privados da normal utilização de meios aéreos, pese a grande coragem com que os pilotos se forçaram a voar após serem confrontados com uma arma da qual ignoravam tudo, ou quase tudo.

E passo citar o TenGeneral António Martins de Matos no seu livro Voando Sobre Um Ninho De “Strelas”:

A guerra estava a entrar numa nova fase, nada de emboscadas e confrontos directos mas sim, de duelos de artilharia e seria de esperar o aparecimento de uma aviação rebelde/mercenária.

Duelos de artilharia? Interroga-se o autor. A grande maioria desses obuses  estavam no Sul, autênticos monos da II Guerra com alcance não superior a 14.000 metros. Na maioria dos quartéis da Guiné só tinham direito a morteiros 81 mm (4000 metros) e ainda 11 morteiros 105 mm espalhados por diversos sítios de alcance igual.

O PAIGC usava o 120 (5700 metros) depois haviam os foguetes 122 mm (20.000 metros) e a breve trecho emprestados por Sekou Touré, peças de 130 mm (27.000 metros) e enquanto a artilhara utilizada pela guerrilha só podia ser posta em causa pelo aparecimento da nossa força aérea. Estas últimas peças fariam fogo directamente do Senegal e da Guiné Conácri e sete dos nossos aquartelamentos ficariam assim debaixo de fogo.

Tudo isto para relembrar que aquela guerra era intensificada consoante interesse do PAIGC, uma fez que lhe chegavam abastecimentos cada vez de maior qualidade e quantidade, enquanto a nós há muito enfermávamos de uma penúria franciscana.

PS: Publico os nomes dos nossos mortos porque lembrá-los é honrá-los e é uma obrigação registar os nomes de quem na flor da idade nos deixou.

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O António Tavares que pertenceu à CCS do BCAÇ 2912, que nós fomos render, sobre a emboscada das Duas Fontes fez-me chegar a correcção sobre o numero de mortos e assim: 

Na emboscada morreram 5 militares e posteriormente três dos feridos que foram evacuados vieram a falecer em resultado dos ferimentos.

Os mortos foram oito e não seis como eu tinha inicialmente escrito.

Da parte do ex-Alf Mil Luís Dias, que chegou a comandar a companhia do Dulombi, chegaram-me estas informações mais precisas sobre a actividade operacional do Batalhão 3872.

CURIOSIDADES OU NOTAS SOBRE A NOSSA ZONA

Podemos verificar que os 4 quartéis do Batalhão sofreram 22 ataques/flagelações (CCS-1; CCAÇ 3489 - 12; CCAÇ 3490 - 0 e CCAÇ3491 - 9) e que as Tabancas das nossas populações em redor dos nossos aquartelamentos sofreram 23 ataques/flagelações, sendo que 9 deles foram contra populações indefesas e num acto de salteadores de estrada, o IN roubou dinheiro e bens a 16 elementos da população que transitavam na picada Saltinho-Galomaro.

BCAÇ 3872

FLAGELAÇÕES E ATAQUES AOS NOSSOS QUARTÉIS

CCAÇ 3489 - CANCOLIM

8 Flagelações em 1972 (1 delas c/ 3 mortos, 5 feridos graves e 5 feridos ligeiros)
2 Flagelações em 1973
2 Flagelações em 1974

CCAÇ 3490 – SALTINHO

Não sofreram quaisquer ataques ou flagelações durante a comissão

CACAÇ 3491 – DULOMBI

3 Flagelações em 1972
4 Flagelações em 1973
2 Flagelações em 1974

CCS - GALOMARO

1 Ataque/flagelação em 1972 c/1 IN morto confirmado e prováveis feridos IN

MINAS ACTIVADAS E DETECTADAS

Cancolim: Mina A/P reforçada accionada c/1 morto e 1 ferido+mina A/C accionada c/12 feridos graves, 1 ferido ligeiro e 2 feridos pop.+2 minas A/P levantadas
Saltinho: 3 minas A/C levantadas e 1 A/P levantada
Dulombi: 2 minas A/C levantadas e 2 minas A/P levantadas
Galomaro: 1 mina A/P reforçada accionada c/1 morto+1 mina A/C reforçada accionada c/1 ferido grave

EMBOSCADAS/CONTACTOS/FLAGELAÇÕES AUTO

CCAÇ 3489 - 1 contacto com o IN, após flagelação ao quartel, em 1972+1 emboscada aos milícias em Anambé, em 1973 c/2 mortos e 1 ferido
CCAÇ 3490 - 1 emboscada no Quirafo c/ 9 mortos+1 milícia e 2 civis+1 militar capturado. 1 emboscada c/feridos e mortos do IN+1 contacto do IN c/milícias de Cansamange
CCAÇ 3491 - Flagelação numa operação no Fiofioli+1 emboscada/contacto com 4 feridos ligeiros nossos e mortos do IN (s/confirmação de quantos, mas a rádio do PAIGC referiu que tínhamos tido 8 mortos e eles também tinha tido mortos+1 emboscada/flagelação junto à recolha de águas no Dulombi+2 flagelações a coluna de escolta e protecção na estrada Piche-Buruntuma.
CCS - Contacto entre forças milícias e o IN, após ataque a Campata c/elemento IN capturado.

ATAQUES A TABANCAS EM AUTO-DEFESA E TABANCAS INDEFESAS

- Tabanca indefesa de Bambadinca/Cancolim, em 25/1/72;
- Tabanca indefesa de Mali Bula/Galomaro, em 1/2/72;
- Tabanca de Umaro Cossé/Galomaro, c/2 feridos civis, em 7/12/72;
- Tabanca de Campata/Galomaro, em 20/6/72;
- Tabanca indefesa de Sinchã Mamadu/Saltinho, na mesma data de 20/6/72;
- Tabancas indefesas de Sana Jau e Bonere/Saltinho, em 30/6/72;
- Tabanca de Cassamange/Saltinho, em 15/7/72;
- Tabanca indefesa de Guerleer/Galomaro, c/ morte de 3 prisioneiros civis e 1 ferido grave, em 27/7/72;
- Tabanca de Patê Gibele/Galomaro c/ 1 sarg. milícia morto+1 ferido grave e 2 feridos ligeiros da pop., em 11/8/72;
- Tabanca de Anambé/Cancolim c/1 morto (CCAÇ 3489)+3 feridos também da mesma CCAÇ, que ali estava de reforço, em 5/9/72;
- Tabanca de Sinchã Maunde Bucô/Saltinho, c/3 feridos IN confirmados, em 20/9/72;
- Tabanca de indefesa de Bujo Fulpe/Galomaro, em 26/9/72;
- Tabanca ainda indefesa de Bangacia/Galomaro, com 1 milícia e 2 civis mortos, no mesmo dia (26/9/72);
- Tabanca de Dulô Gengele/Galomaro, com 3 mortos IN confirmados e 3 mortos civis (que tinham sido feitos prisioneiros antes do ataque e que foram abatidos+1 ferido grave e 1 ferido ligeiro dos milícias e 4 feridos graves da pop e 5 feridos ligeiros da pop., em 17/10/72;
- Tabanca indefesa de Sarancho/Galomaro, com 2 mortos civis e 2 feridos civis;
- Tabanca indefesa de Samba Cumbera/Galomaro, c/1 ferido grave da pop., em 13/11/72;
- Tabanca de Cansamange/Saltinho, 17/12/72;
- Picada Saltinho-Galomaro c/16 elementos da pop. capturados e roubados dos seus haveres (dinheiro), em 18/1/73;
- Tabanca de Bangacia/Galomaro, c/2 mortos civis+2 feridos civis+2 feridos milícias, em 1/2/73;
- Tabanca de Campata/Galomaro, c/5 mortos do IN e 1 capturado+3 mortos milícias e 3 mortos civis, em 16/3/73;
- Tabanca de Sinchã Maunde Bucô/Saltinho, em 14/5/73;
- Tabanca de Bangacia/Galomaro, em 18/9/73;
- Tabanca de Madina Bucô, em 20/1/74.

09 de Novembro de 2020 às 21:26
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Nota do editor

Último poste da série de17 de outubro de 2020 > Guiné 61/74 - P21457: (Ex)citações (377): As visitas da D. Cecília Supico Pinto ao leste da Guiné (Abel Santos, ex-Soldado At Art da CART 1742)

Guiné 61/74 - P21534: Armamento (11): Material apreendido ao PAIGC em 1972 e 1973, em Galomaro e Dulombi (Luís Dias, ex-alf mil, CCAÇ 3491, Dulombi e Galomaro, 1971/74)


Foto nº 1 > Mina A/C


Foto nº 2 > Tambor e fita de metralhadora ligeira Dectyarev RPD


Foto nº 3 >  Granadas de RPG 2 e RPg 7 e outro material


Foto nº 4 > Baionetas de Kalashnikov AK-47 e AK-47/51


Foto nº 5 >  Estilhaços de RPG 2 e de RPG 7

Fotos (e legendas): © Luís Dias (2020). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Luís Dias

1. Mensagem do Luís Dias[, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 3491/BCAÇ 3872 (Dulombi e Galomaro, 1971/74), o nosso especialista em armamento; tem mais de 8 dezenas de referências no nosso blogue]:

Date: sexta, 6/11/2020 à(s) 11:56
Subject: Material que pode ter interesse de museu

Caro Luís Graça

Atendendo ao teu pedido,  seleccionei um grupo de fotos que talvez aches interessantes, relativos às nossas actividades na Guiné.

Assim segue um grupo de "roncos" ou prendas"... do PAIGC.

Foto nº 1 > Mina A/C levantada na picada Dulombi-Galomaro, em Outubro de 1972; 

Foto nº 2 > Fita e tambor de metralhadora ligeira Dectyarev RPD, no calibre 7,62 x 45mm, apreendida num ataque a uma das tabancas da área de Galomaro, em 1973;

Foto nº 3 >  Material apreendido num contacto com o IN em Março de 1972, em Paiai Lemenei-Dulombi. 

Foto nº 4 > Baionetas de Kalashnikov AK-47 e AK-47/51, a primeira apreendida num ataque à tabanca de Campata- Galomaro e a outra, após contacto com o IN, na estrada Piche-Buruntuma, em 1973. 

Foto nº 5 >  Estilhaços de RPG 2 e de RPG 7, após flagelação ao aquartelamento do Dulombi, em 1972.

A seguir envio e-mail, com objectos da arte fula.

Abraço.
Luís Dias
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Nota do editor:

Último poste da séreie > 25 de junho de 2020 > Guiné 61/74 - P21110: Armamento (10): As novas Armas Ligeiras para o Exército (Conclusão) (Luís Dias, ex-Alf Mil Inf)

quarta-feira, 11 de novembro de 2020

Guiné 61/74 - P21533: Pequenas histórias dos Mais de Nova Sintra (Carlos Barros, ex-fur mil at art, 2ª C/BART 6520/72, 1972/74) (11): O morcego e a cria, ou um "desastre.. da caça"


Capa do livro de: Ana Rainho e Cláudia Franco - Morcegos da Guiné-Bissau: um contributo para o seu conhecimento. Lisboa: Instituto de Conservação da Natureza, 2001, 86 pp., il. (Coleção Técnica) [Disponível aqui em formato pdf] (*) (Reproduzido com a devida vénia...)



Carlos Barros, Esposende


1. Mais uma pequena história do Carlos Barros [, um de "Os Mais de Nova Sintra", 2ª C/BART 6520/72 (Bolama, Bissau, Tite, Nova Sintra, Gampará, 1972/74), os últimos a ocupar o aquartelamento de Nova Sintra antes da sua transferência para o PAIGC em 17/7/1974; membro da Tabanca Grande nº 815, tem 14 referências no nosso blogue; vive em Esposende, é professor reformado]


O morcego e a cria…

por Carlos Barros (**)


O Comando da 2ª Cart de Nova Sintra, escalou, mais uma vez, o 3º grupo de combate para garantir a segurança da estrada Tite-Enxudé, uma via de extrema importância  uma vez que garantia o acesso, por via marítima e fluvial, à cidade de Bissau, através da utilização de pequenas embarcações.

Numa 4ª feira, o furriel Barros estava descansado, devidamente armado, no seu posto de vigilância nesse percurso e, por sinal, entretinha-se a caçar alguns pássaros com a sua arma de pressão, no meio dos cajueiros.

Num cajueiro, amarrado a um ramo, encontrava-se um morcego e o Barros, decidiu dar-lhe um tiro já que nunca tinha visto ao perto um morcego.

Um tiro certeiro e passados segundos, esse animal cai no chão poeirento do posto de vigilância e, algo de imprevisível tinha acontecido: o morcego caiu morto e tinha uma cria junto de si e o destino da cria estava traçado…

O Barros estava amarelo e tremendamente arrependido por ter morto o morcego já que nunca suspeitou que existia uma cria em amamentação pois, se soubesse, jamais atiraria ao infeliz animal.

Um dia estragado, mais um “desastre” na caçada do Barros,  e este militar, como muitos outros, andava um “pouco apanhado” da guerra que transformava os homens em autênticos “animais irracionais”…

Se houvesse, na altura uma Associação Protectora dos Animais, o Barros assumiria a culpa e suportaria as consequência e digo isto, porque o furriel, em parte, recuperou das mazelas psíquicas que a atroz guerra provocou.

A partir desse momento, a arma de pressão entrou de féria durante muito tempo…

Nova Sintra, 1972

Barros

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Notas do editor:

(*) Excertos: Considerações Finais (pp. 77/78)

(...) Uma das principais ameaças que recai sobre os morcegos do Oeste africano é a falta de estudos dirigidos à conservação. Nas últimas décadas, poucos trabalhos têm sido realizados nesta região, sendo assim difícil avaliar, não só a situação das populações de morcegos, mas também os verdadeiros factores de ameaça que recaem sobre estas espécies.

Não constituindo uma excepção, os trabalhos realizados até à data, na Guiné-Bissau, não permitem obviamente, avaliar o estado das populações de quirópteros aí presentes, de modo a determinar o seu estatuto de ameaça ou a sua tendência populacional. No entanto, da análise que nos é permitida fazer aos dados de que dispomos, evidenciam-se alguns pontos que merecem ser aqui ser referidos:

(i) Constata-se que a maioria dos quirópteros encontrados na Guiné-Bissau, são espécies florestais, que utilizam estas áreas para abrigo e alimentação. É também bastante evidente que este é o habitat mais (sobre) explorado no território. Num país onde a energia eléctrica se reduz à área da capital, e mesmo aí sofre frequentes interrupções, é fácil compreender o valor do carvão como fonte de energia. 

Agravando ainda mais esta situação, existe uma política de incentivo à exploração de madeira e procede-se à eliminação da floresta para dar lugar a campos agrícolas. Assim, este habitat, onde ocorre a maioria do quirópteros conhecidos para a Guiné-Bissau, sofre uma redução considerável e continuada que é bastante preocupante. Esta situação revela a necessidade urgente da tomada de medidas prementes para o controlo da destruição desregrada da floresta. 

A estratégia de controlo da desflorestação parece quase inevitavelmente passar pela recurso a energias alternativas, nomeadamente à energia solar. Um exemplo excepcional que vai de encontro a esta estratégia é o plano da IUCN (em implantação em 1998), de divulgação de fornos solares de alto rendimento, a qual deveria ser feita, não apenas em áreas protegidas, mas também a nível nacional.

(ii) A reconversão da floresta em arrozal já desde há muito se provou ineficaz, já que os anos de produtividade são muito reduzidos, sendo estes campos geralmente abandonados após um curto espaço de tempo. O acelerar da recuperação de muitos terrenos de cultura, com plantação de espécies pioneiras, seria outra estratégia a tomar, juntamente com prévia análise e controlo das áreas a desflorestar para a agricultura. 

Também se verifica a reconversão da floresta para plantações frutícolas, sobretudo de cajueiros, resultante de uma política de incentivo à produção, tendo em vista a exportação de frutos. Neste caso, dever-se-ia tentar utilizar os terrenos já previamente desflorestados, para esta actividade.

(iii) De salientar também que, para além das áreas florestais, as savanas do tipo Guineano, do Oeste Africano, são consideradas como centros de riqueza específica (...)  ao nível africano, o que confere uma responsabilidade acrescida na preservação deste habitat no território.

(iv) Ao nível de populações de morcegos, o reduzido número de capturas e a reduzida riqueza específica revelados nas ilhas de Bubaque e Orango, justificam o estudo da capacidade de migração de algumas das espécies aí presentes e assim averiguar a viabilidade das populações de morcegos insulares.

(v) Também as grutas do Boé, cuja importância a nível nacional é inegável, deveriam ser regularmente monitorizadas, para acompanhamento das colónias que as ocupam e controle atempado de potenciais ameaças. 

(vi) Da listagem de espécies obtida para a Guiné-Bissau, 8 espécies podem ser preliminarmente consideradas como prioritárias nos estudos a desenvolver, pelo estatuto que lhe é atribuído pela UICN a nível mundial, pela falta de confirmação da sua presença ou por se encontrarem no limiar da sua área de distribuição. 

Estas são: H. monstrosos, E. buetticoferi, C. afra, H. cyclops, H. abae, R. alcyone, R. denti, H. fuliginosus, E. guineensis, C. poensis e C. beatrix.  Os estudos a desenvolver deveriam ter como fim o desenvolvimento de planos de acção para estas espécies. 

Obviamente que todos estes pontos têm subjacente o reconhecimento político e popular da necessidade de conservação dos quirópteros. Os morcegos são raramente incluídos em políticas ambientais ou projectos educacionais, sendo por isso importante garantir que os políticos e decisores sejam totalmente esclarecidos sobre a importância dos morcegos e do seu papel nos ecossistemas africanos (...).

 Este deverá certamente ser o primeiro passo a dar na conservação dos morcegos na Guiné-Bissau. Refira-se por exemplo, a propósito de projectos educacionais, que, apesar de actualmente a situação não parecer particularmente gravosa, se deveriam também realizar algumas campanhas informais de esclarecimento dos proprietários das fruticulturas sobre a importância dos morcegos frugívoros, e do real impacto que estes têm sobre esta actividade, geralmente sobrestimada. (...)

[Revisão e fixação de texto para efeitos de edição neste blogue: LG]

(**) Último poste da série > 5  de novembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21517: Pequenas histórias dos Mais de Nova Sintra (Carlos Barros, ex-fur mil at art, 2ª C/BART 6520/72, 1972/74) (10): Relembrando a morte, por acidente com um dilagrama, no CIM de Bolama, em 10/7/1972, do alf mil Carlos Figueiredo