sábado, 2 de janeiro de 2021

Guiné 61/74 - P21726: Facebook...ando (58): Fotos do meu pai, já falecido, Jorge Nicociano Ferreira, ex-fur mil at cav, CCAV 678 (Bissau, Fá Mandinga, Ponta do Inglês, Bambadinca, Xime, 1964/ 66) (Rui Ferreira)


Foto nº 1 > Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) > CCAV 678 (1964/66) > O fur mil at cav Jorge Nicociano Ferreira, no Saltinho, junto à ponte sobre o Rio Corubal, general Craveiro Lopes. A legenda no verso diz: " 3 outubro de 1964_Ponte do Saltinho. Distam 3 km do fim da ponte à fronteira do Senegal. [.O autor queria dizer: "Guiné-Conacri"].

 
Foto nº 2 > Guiné > Região de Tombali  > Catió > CCAV 678 (1964/66)  > s/d > O fur mil at cav Jorge Nicociano Ferreira,  Lacónica legenda: "Escolta [a]  Catió".


Foto nº 3 > s/l > s/d > Cabo Verde (?) > Graduados (furriéis) da CCAV 678, entre os quais o Jorge Nicociano Ferreira... A foto não tem legenda e é de má qualidade. Sabe.se que a CCAC 678 esteve em comissão, em Cabo Verde, 8 de maio de 1964 e 18 de julho de 1964, e que nesta data embarcou para a Guiné.  A foto pode ter sido tirada em Cabo Verde... Os militares estão junto a um memorial. Não conseguimos identificar a unidade  (CCE 342 ?) nem a divisa. (Parece tratar-se de uma Companhia de Caçadores Especiais, e o número mais provável será o 342.)



Foto nº 4 > Porto > Bonfim > Cemitério do Prado do Repouso > 24 de dezembro de 2020 > Túmulo do capitão Francisco Xavier Pinheiro Torres de Meirelles, a um escasso metro e tal do túmulo onde repousam os restos mortais do ex-fur mil Jorge Nicociano Ferreira.

Fotos (e legendas): © Rui Ferreira (2020). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Bambadinca > CCAV 678 >  1965 > Festa de 1º. aniversário da CCAV 678, em Bambadinca. Na mesa dos oficiais e sargentos, o 1º de frente e da esquerda é o Fur Mil At Manuel Bastos Soares, autor destas fotografias, natural de Vila Nova de Gaia e residente na Maia, 

Foto (e legenda): © Manuel Bastos Soares (2008). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

1. Mensagem de Rui Ferreira, deixada na página do Facebook Tabanca Grande Luís Graça, em 31/12/2020, às 1h39:

Caro Luís Graça, sou filho de um ex-combatente na Guiné e já acompanho o vosso blog há uns anos. O meu pai, Jorge Nicociano Ferreira, foi furriel na CCav 678 e. nomes como Xime, Xitole, Ponta do Inglês, Bambadinca, Bafatá, entre outros, estiveram sempre presentes na minha infância. 

Recentemente encontrei fotos do meu pai e camaradas na Guiné, de uma paisagem na Ponta do Inglês, de uma avioneta que poderia ser a do intrépido Honório... Quase todas têm uma legenda e gostaria de as partilhar convosco. 

Sempre presente está também o capitão Francisco Meirelles, sobre quem o senhor Jorge Araújo escreveu um notável texto, já que está sepultado a pouco mais de um metro do túmulo do meu pai. A vida está recheada de ironias...

2. Resposta do nosso editor LG:

Obrigado, Rui, o prometido é devido, aqui tens o  fazer o poste que tu e o teu pai merecem. Obrigado por nos teres evocado a memória do teu pai e nosso camarada. Vejo que ele conheceu as mesmas estações do calvário que eu. Temos poucas referências no blogue, umas sete ou oito, à CCAV 678.  Mas um dos camaradas do teu pai é membro da nossa Tabanca Grande, o ex.fur mil Manuel Bastos Soares, que mora na Maia.  (*).

Publicamos, acima, uma foto dele, em Bambadinca, no 1º aniversário da companhia. Vê se o teu pai está lá, no grupo de furriéis. Se tiveres mais fotos, manda com melhor resolução, para o meu endereço de email: luis.graca.prof@gmail.com

O teu gesto de amor filial merece ser conhecido e reconhecido (**). Como dizemos, na nossa Tabanca Grande, os filhos dos nossos camaradas, nossos  filhos são. Um ano de esperança para ti e os teus.  LG



3. Ficha de unidade > Companhia de Cavalaria nº 678


Identificação;  CCav 678
Unidade Mob: RC 7 - Lisboa
Crndt: Cap Cav Juvenal Aníbal Semedo de Albuquerque
Cap Cav Inácio José Correia da Silva Tavares
Cap Art José Vítor Manuel da Silva Correia
Divisa: "Com os Nossos Fica a Palma da Victória"
Partida: Embarque em 18Jul64 (em Cabo Verde); desembarque em Bissau, em 18Jul64
Regresso: Embarque em 27Abr66


Síntese da Actividade Operacional

Em 18Ju164, foi transferida de Cabo Verde, onde se encontrava em comissão desde 08Mai64, para a Guiné, por troca com a CCaç 417.

Após um curto período de adaptação operacional realizado na região de Quinhamel com a CCaç 414, de 19 a 26Ju164, ficou colocada em Bissau, na dependência do BCaç 600, com vista à segurança e protecção das instalações e das populações da área.

Em 16Set64, foi substituída em Bissau pela CCaç 594, tendo seguido, em 25Set64, para Fá Mandinga, como subunidade de intervenção e reserva do BCaç 697 e destacando pelotões para Enxalé e Xitole, este de 25Set64 a 11Nov64, em reforço das guarnições locais.

Em 19Jan65, com a realização da operação Farol, ocupou a povoação de Ponta do Inglês, mantendo no entanto, um pelotão destacado em Enxalé.

Em 16Abr65, substituída em Ponta do Inglês por um pelotão da CCaç 508, assumiu a responsabilidade do subsector de Bambadinca, onde rendeu a CCaç 508, mantendo-se na zona de acção do BCaç 697, em acumulação com a função de intervenção e reserva do sector e mantendo ainda o pelotão destacado em Enxalé

Em 2Ago65, deslocou forças para Xime e Ponta do Inglês, a fim de substituir a CCaç 508 e ministrar o treino operacional à CCaç 1439 naquela zona de acção.

Em 10Set65, por troca com a CCaç 1439, assumiu a responsabilidade do subsector de Xime, com pelotões destacados em Ponta do Inglês e Enxalé, este deslocado em 28Jan66 para Quirafo.

Em 14Abr66, por troca com a CCav 1482, voltou a assumir, temporariamente, a função de intervenção e reserva do sector, sendo substituída, em 26Abr66, pela CCaç 1551 e recolhendo a Bissau para o embarque de regresso.

Observações:

Não tem História da Unidade. Tem Resumo de Factos e Feitos (Caixa n." 314 - 2: Div/4." Sec, do AHM).

Fonte: Excertos de: CECA - Comissão para Estudo das Campanhas de África: Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974) : 7.º Volume - Fichas de unidade: Tomo II - Guiné - (1.ª edição, Lisboa, Estado Maior do Exército, 2002), pp. 498/499.


 
Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Sector L1 > Bambadinca > 1970 > O ex-Fur Mil Op Esp Humberto Reis, da CCAÇ 12 (1969/71), junto ao memorial da CCAV 678, identificado por Luís Graça, e aqui confimado pelo Manuel Bastos Soares. (*)

Foto (e legenda): © Humberto Reis (2005). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 14 de novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3453: Brasões, guiões ou crachás (2): CCAV 678, 1964/66 (Manuel Bastos)

(...) Mensagem do nosso camarada Manuel Bastos Soares, ex-Fur Mil At da CCAV 678, Guiné 1964/66, com data de 7 de Novembro de 2008:

Caro Luís:

As minhas cordiais saudações.

Durante o dia de hoje, estive a visionar o teu blogue, e verifiquei que, no álbum das minhas fotos, inseriste uma outra, do e com o Humberto Reis, onde se vê os brasões de algumas das unidades que passaram por Bambadinca, e de entre eles, lá está o da minha CCAV 678, já com as cores comidas pelo tempo e pelo rigor do clima da Guiné.

Fiquei deveras sensibilizado, pelo que quero expressar-te o meu agradecimento. Não há dúvida nenhuma de aquele brasão é de facto o da CCAV 678, e a prova segue em anexo, de um slide que digitalizei do dito brasão.(...)

Vd. também poste de 7 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3418: Álbum fotográfico de Manuel Bastos Soares  (1): Bambadinca, a festa da comunhão solene, Dona Violete e a malta da CCAV 678 (1965/66)

(**) Último poste da série > 7 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21618: Facebook...ando (57): Confúcio e o confucionismo, ontem e hoje: visita ao templo de Pingyao, 2011 (António Graça de Abreu, ex-alf mil, CAOP1, Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar, 1972/74)

Guiné 61/74 - P21725: Os nossos seres, saberes e lazeres (431): De Trancoso para Santa Maria de Salzedas (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 7 de Setembro de 2020:

Queridos amigos,
É sacramental, chegado o mês de agosto, subir à Beira Alta, de Trancoso se pode cirandar entre primórdios da nacionalidade, sobretudo sentir a dimensão das atalaias para resistir ao hostil castelhano, intruso século fora. Um amigo dileto põe e dispõe quanto ao que se faz o dia inteiro, é sempre aprazível o orgulho com que mostra o que o seu terrunho e circunvizinhança oferece de esplendoroso.
Chega-se a Rio de Mel, e é aí que se dita a sentença das excursões do dia. Desta feita, S. João de Tarouca e Santa Maria de Salzedas, compraz ver com olhos de ver que obras não faltam e que os monumentos nacionais, outrora postergados ou praticamente desconhecidos, aparecem altaneiros e verdadeiros expoentes do turismo cultural.

Um abraço do
Mário


De Trancoso para Santa Maria de Salzedas

Mário Beja Santos

Todos os anos, chegada a época estival, com filha e neta em Pedrógão Pequeno, telefono ao meu dileto amigo Luís Rodrigues, cuja terra-berço é Rio de Mel, concelho de Trancoso, para marcar visita, ladeia-se a Serra da Estrela, passam-se dois túneis, anda-se à margem da Guarda, conferem-se as muralhas de Trancoso e segue-se por uma estrada de pedregulhos, que trazem à reminiscência a cultura megalítica, e entra-se na quinta, pela calada já está organizado um programa bem surpreendente, pode ser Numão, Sernancelhe, Almeida, descer ao Douro, milhentas são as hipóteses. Aqui chegados, no agosto pandémico de 2020, vem a notícia, desta feita o passeio será a S. João de Tarouca e a Santa Maria de Salzedas, já lá tivemos há um bom par de anos, tem havido e continuam as obras de restauro, há que comparar entre o pretérito e o presente. Tinha saudades deste reencontro, é uma amizade encetada em 1977, este engenheiro químico enveredou pela política dos consumidores e marcou presença, foi uma referência durante décadas na área da segurança dos consumidores, mexia-se à vontade entre os cosméticos e os produtos de limpeza, a normalização dos bens de consumo, saiu-lhe das mãos legislação de realce, ainda hoje vigente. Uma carreira de funcionário público exemplar, foi galardoado com uma condecoração da Ordem de Mérito. Saúdo-o aqui, ele não sabe que o apanhei à porta do mosteiro, agradeço-lhe o seu acolhimento modelar e a plena surpresa destas digressões culturais.


As obras deste mosteiro cisterciense arrancaram em 1168, a patrona foi a segunda esposa de Egas Moniz, neste território que era designado de Salzeda, estamos no concelho de Tarouca. A escolha do território obedecia à lógica da regra de Cister, incrustado num vale, com acesso direto a um curso de água, a ribeira de Salzedas, afluente do rio Varosa. Enquanto igreja medieval de planta em cruz latina, com três naves e transepto saliente, foi sagrada em 1225. A atenção do visitante é de andar à cata dos sinais desse tempo, alguma coisa se encontrou, e dentro da intervenção a que o mosteiro está a ser sujeito mostram-se colunas do passado, como se pode ver.

Interior da Igreja de Santa Maria de Salzedas

Como foi uso na vida destes templos religiosos, as alterações acabaram por tudo transformar, e Salzedas conheceu obras de vulto entre os séculos XVI e XVIII. Como se viu na primeira imagem, a atual fachada data dos finais do século XVIII, tem duas torres laterais adiantadas. Monumento nacional desde 1997, Salzedas tem conhecido benéficas intervenções, todas elas justificadas, guarda obras notáveis de Grão Vasco e porventura da sua oficina, possui retábulos excecionais deste grande artista, produzidos entre 1511 e 1515. A sacristia é um espanto, resta dizer que este conjunto monástico abarca a igreja e adjacências como o Claustro do Capítulo, a Sala do Capítulo, a botica, a cozinha e o refeitório, espraia-se por dois andares, há muito para ver e assim perceber a riqueza dos artistas que aqui intervieram, sobretudo Vasco Fernandes e Bento Coelho da Silveira.

Magnificência, riqueza e grande aparato na Sacristia de Santa Maria de Salzedas

Esplendor barroco não falta, mas quem aqui acaba de chegar elogia para si mesmo estas intervenções de conservação e salvaguarda, fizeram bem em integrar Salzedas na rede de monumentos do projeto turístico-cultural Vale do Varosa. E se valeu a pena comparar o que se viu anos atrás e o estado de conservação a que se chegou, mesmo sabendo que foi bem pesada para os monumentos nacionais a forma como se distinguiam as ordens monásticas em 1834, e daí, em jeito de despedida, olhar-se ao fundo para as instalações monásticas arruinadas, num profundo contraste com a recuperação a que se assiste na igreja e nos claustros. Vamos ver o que o futuro nos reserva. E bem hajas, meu querido amigo Luís Rodrigues, pela magnífica digressão a Salzedas.

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Nota do editor

Último poste da série de 26 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21693: Os nossos seres, saberes e lazeres (430): Os primeiros Cistercienses de Vale Varosa: S. João de Tarouca (Mário Beja Santos)

sexta-feira, 1 de janeiro de 2021

Guiné 61/74 - 21724: Op Mabecos Bravios: a participação da CCAÇ 2403, na retirada de Madina do Boé, em 6 de fevereiro de 1969 (Hilário Peixeiro, cor inf ref)


Foto nº 1 > Guiné > Região de Gabu > Canjadude > Op Mabecos Bravios > 2  fevereiro de 1969 >  Canjadude foi o local onde as NT se reuniram para o início, propriamente dito, da Operação. À esquerda os pilotos da FAP Cap Pilav José Nico (filmando) [, hoje ten gen pilav ref] [1] e o Sarg mil  Honório [2] e o Cmdt da Operação,  Cor Inf Hélio Felgas [, Cmd Agrup 2957, Bafatá, 1968/70][3].



Foto nº 2 Guiné > Região de Gabu > Canjadude > Op Mabecos Bravios > 2 de fevereiro de 1969 >  Concentração das NT em Canjadude, quartel guarnecido pela CCAÇ 5.



Fotos (e legendas): © Hilário Peixeiro (2011). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Há dias falou-se aqui do cor inf ref Hilário Peixeiro, que foi capitão no CTIG, cmdt da CCAÇ 2403 / BCAÇ 2851, Nova Lamego, Piche, Fá MandingaOlossato e Mansabá, 1968/70, mas de quem não temos notícias há já uns anos largos (*). 

Num poste já antigo, de 16/5/2011, há documentação interessante (texto e fotos) sobre a participação da CCAÇ 2403 / BCAÇ 2851 na operação de retirada de Madina do Boé (Op Mabecos Bravios) (**). Reeditamos agora esse materal, valorizando em especial a documentação fotográfica. (***) 

Recorde-se que o desastre do Cheche, em 6 de fevereiro de 1969, fez 47 vítimas mortais. Foi há 52 anos. É uma efeméride difícil de esquecer por todos nós.


 Op Mabecos Bravios: a participação da CCAÇ 2403

por Hilário Peixeiro (**)


Durante o mês de Janeiro [de 1969] tiveram lugar os preparativos e reconhecimentos na zona do Boé, com vista à Operação de evacuação de Madina do Boé, denominada “Mabecos Bravios”.

Para além da CCaç 1790, local, comandada pelo Cap inf Aparício,  participaram na operação outras 6 Companhias [, incluindo da CCaç 2405, Destacamento F].

A 2 de Fevereiro [de 1969] a CCaç 2403, com 3 G Comb  (...)  [Destacamento ], deslocou-se para Canjadude e depois para o Cheche onde chegou já no final do dia, transportada nas viaturas destinadas ao transporte, no regresso, dos materiais da CCaç 1790 e da população de Madina. Desta vez todos os Gr Comb eram comandados pelos respectivos Alferes.

Juntamente com a CCaç 2405, do Cap Jerónimo [Destacamento F], atravessou o Corubal numa das jangadas, recém-construídas para o efeito, indo cada uma ocupar as colinas que flanqueavam a estrada para Madina, á esquerda e á direita. 

Quando as Companhias se separaram, já noite fechada, o IN lançou 2 granadas de morteiro sobre a estrada, sem consequências o que, 15/20 minutos antes, poderia ter tido resultados bem diferentes. 

Na manhã seguinte [, 3 de fevereiro], as Companhias seguiram, apeadas, rumo a Madina, sempre sobrevoadas por 1 T6 ou 1 DO até ao final do dia.

 
Foto nº 3 > Guiné > Região de Gabu > Cheche > Op Mabecos Bravios > 3 de fevereiro de 1969 > Progressão da coluna em direção a Madina do Boé, sob a proteção da DO 27 do srgt pil Honório



Foto nº 4 > Guiné > Região de Gabu > Cheche > Op Mabecos Bravios > 3 de fevereiro de 1969 > Progressão da coluna em direção a Madina do Boé, sob a proteção da DO 27 do srgt pil Honório


A meio da manhã [do dia 3 de fevereiro] houve um reabastecimento de água, planeado e, mais à frente, não planeado, um fortíssimo ataque de abelhas à CCaç 2405  {Destacamento F] que deu origem à evacuação de alguns homens no heli do Comandante da Operação, Cor Felgas, que aterrara entretanto.

Este contratempo provocou grande atraso na coluna e a certa altura o efeito do calor e das abelhas fez-se sentir mais acentuadamente sobre a CCaç 2405, tendo a CCaç 2403 [, Destacamento D] que ia na retaguarda, passado para a frente com o intuito de pedir a Madina reabastecimento de água para o pessoal mais atrasado que estivesse em dificuldades. 

Quando, cerca de 10 minutos depois, um Gr Comb se preparava para sair do quartel, chegou a outra Companhia [, CCAÇ 2405].

Enquanto o pessoal foi instalado,  os Capitães receberam do Comandante a missão para o dia seguinte  [4 de fevereiro] que consistia na ocupação dos morros que se estendiam a sul de Madina entre esta e a República da Guiné.



Foto nº 5 > Guiné > Região de Gabu > Cheche > Op Mabecos Bravios > 3 de fevereiro de 1969  > Evacuação de vítimas de ataques de abelhas e insolação,  com o helicanhão a sobrevoar a zona.

 

Foto nº 6 > Guiné > Região de Gabu > Cheche > Op Mabecos Bravios > A caminho de Madina do Boé > 3 de fevereiro de 1969 > Viaturas das NT abandonadas (Mercedes)



Foto nº 7  > Guiné > Região de Gabu > Cheche > Op Mabecos Bravios > A caminho de Madina do Boé  > 3 de fevereiro de 1969 > Viatura das NT abandonada (Berliet)



Foto nº 8  > Guiné > Região de Gabu > Cheche > Op Mabecos Bravios > A caminho de Madina do Boé > 4/5 de fevereiro de 1969 > Viatura das NT abandonada (Berliet)



Foto nº 9 > Guiné > Região de Gabu > Cheche > Op Mabecos Bravios >  Madina do Boé > 5 de fevereiro de 1969 > Reparação
 de GMC (rebocada) e sem paragem da coluna, de regresso a Cheche,


Quando se fez dia  [em 5 de fevereiro de 1969] o pessoal ficou surpreendido com o cabeço a que Madina estava encostada e os que a rodeavam. Eram autênticas “montanhas” na Guiné, onde tudo era plano. 

As Companhias ocuparam as elevações que lhes foram indicadas e aí permaneceram nesse dia enquanto as viaturas chegaram e no dia seguinte enquanto se procedeu ao seu carregamento com os materiais da guarnição e da população civil que ia ser deslocada para Nova Lamego. 

No dia 6 [de fevereiro], logo que se fez dia, deslocaram-se para a coluna que já se encontrava em movimento a caminho do Cheche, assumindo a segurança dos flancos e retaguarda. 

Antes de atingir o rio Corubal,  a coluna ainda foi alvo de mais um feroz ataque de abelhas que só provocou, como vítimas, a morte de dois cães da população.



Foto nº 10 > Guiné > Região de Gabu > Cheche > Op Mabecos Bravios > Cheche > 6 de fevereiro de 1969 >  I
magem das jangadas com a CCaç 2403 a embarcar para a última travessia antes da tragédia



Foto nº 11 > Guiné > Região de Gabu > Cheche > Op Mabecos Bravios > Cheche > 6 de fevereiro de 1969 >  I
magem das jangadas com a CCaç 2403 a embarcar para a última travessia antes da tragédia



Foto nº 12 > Guiné > Região de Gabu > Cheche > Op Mabecos Bravios > Cheche > 6 de fevereiro de 1969 >  I
magem das jangadas com a CCaç 2403 a embarcar para a última travessia antes da tragédia



As viaturas e pessoal foram atravessando o rio até só restarem as 2 Companhias e parte da CCaç 1790 de Madina. Comandava a Operação de carregamento da jangada o Cap Aparício [, da CCAÇ 1790]. 

Na penúltima travessia foram transportadas a CCaç 2403 e parte da CCaç 2405, tendo a primeira recebido imediatamente ordem do Cor Felgas para montar a segurança do flanco esquerdo da coluna que partiria, logo que pronta, rumo a Canjadude.

Para a última travessia, seria embarcado o pessoal que restava das CCaç 2405 e CCaç 1790, muito menos de 100 homens. 

Enquanto se aguardava a chegada do pessoal que faltava para a coluna se pôr em marcha foram disparadas 1 ou 2 granadas das armas pesadas do Destacamento do Cheche. 

Pouco depois surgiu um soldado a correr em direcção ao rio, a chorar, dizendo que a jangada se havia virado e que muita gente tinha caído à água no meio do rio. 

Através do rádio do Capitão,  foi ouvido o Cor Felgas em comunicação com o General Spínola, que não esteve no local, dizendo que havia muitos homens desaparecidos no rio. 

Com grande atraso em relação à hora prevista, a coluna iniciou o deslocamento para Canjadude onde pernoitou.

No dia seguinte [, 7 de fevereiro] chegou a Nova Lamego, onde o Comandante-Chefe falou às tropas participantes na Operação.

Com a chegada da CCaç 1790 a Nova Lamego,  a CCaç 2403 recebeu ordem de marcha para o Olossato com passagem por Fá Mandinga (...) e aí ficou mais de 1 mês, em missão de intervenção do Comando de Agrupamento de Bafatá. (...)

[Revisão / fixação de texto: LG]

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Notas do edidtor:


(*) Vd. poste de 31 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21715: Em busca de... (310): Hilário Peixeiro, capitão que conheci no Forte da Graça, em Elvas, em 1973/75 (João Rico, ex-fur enfermeiro)

Vd. poste de 13 de julho de 2013 > Guiné 63/74 - P11837: Op Mabecos Bravios (1-8 de fevereiro de 1969): a retirada de Madina do Boé, com o trágico desastre no Cheche, na travessia do Rio Corubal, foi há 44 anos (1): Relato do cmdt da CCAÇ 2405 / BCAÇ 2852 (Galomaro e Dulombi, 1968/70)


(...) 2. Extractos de: Guiné 68-70. Bambadinca: Batalhão de Caçadores nº 2852. Documento policopiado. 30 de Abril de 1970. c. 200 pp. Classificação: Reservado. Cap. II. 36-38..

(...) Iniciada a Op Mabecos Bravios, em 1 [de Fevereiro de 1969], com a duração de 8 dias, para retirar as nossas tropas de Madina do Boé. 

Entre vários destacamentos, tomou parte no Destacamento F a CCAÇ 2405 [ .Comandante: Cap. Mil. José Miguel Novais Jerónimo; 1º Gr Comb – Alf Mil Jorge Lopes Maia Rijo; 3º Gr Comb  – Alf Mil Rui Manuel da Silva Felício; 4º Gr Comb  – Alf Mil Paulo Enes Lage Raposo]. (...)

1 de fevereiro de 1969

(...) O Dest F com o efectivo de 112 homens (4 oficiais, 10 sargentos e 98 praças - estão incluídos 1 secção de sapadores e 8 condutores auto), saiu de Galomaro em 1 de Fevereiro de 1969, pelas 9.30h, e chegou a Nova Lamego por volta das 13.00h do mesmo dia, sem qualquer novidade.

Aqui fizeram-se os preparativos finais da organização da coluna que partiu às 5.30h do dia 2 [D]. (...)

2 de fevereiro de 1969

(...) A coluna saiu de Nova Lamego para Canjadude com o pessoal totalmente embarcado e atingiu-se esta povoação por volta das 9.00h sem qualquer problema. A partir de Canjadude a coluna progrediu com guardas de flancos,  tendo o Dest F colaborado na guarda da rectaguarda da coluna fazendo uma progressão apeada que não estava prevista.

Atingiu-se o Cheche [entre Canjadude e Madina do Boé] por volta das 17.00h (sempre com uma cobertura aérea excelente).

3 de fevereiro de 1969

(...) O IN não voltou a manifestar-se mas obrigou-nos a uma vigilância nocturna permanente e a uma mudança de posição por volta das 23.00h.  (...)

Pelas 5.30h [do dia 3, D + 1] mandou-se um Pelotão a Cheche buscar um Pelotão do Dest E que fazia guarda imediata às viaturas e que eu [, cmdt da CCAÇ 2405,] devia levar até Madina.

Cerca [ das 10.00h ] o Dest F sofreu um violento ataque de abelhas e teve que recuar cerca de um quilómetro para se reorganizar de novo. Um soldado, em consequência, ficou imediatamente fora de acção. Foi pedida a respectiva evacuação bem como a de outro soldado que apresentava sintomas de insolação.

As evacuações fizeram-se para Nova Lamego  (...)

O héli desceu mais tarde para reabastecer o pessoal de água.

O Dest D [CCaç 2403[ passou para a frente e reinicou-se a marcha, sempre fora da estrada até à recta que leva a Madina. Nada mais se passou além do sofrimento intenso das tropas por via do calor. O Det D foi reabastecido de água. 

Atingimos Madina [do Boé] por volta das 19.00h [do dia 3 de fevereiro ] desligados do Dest D que prosseguiu a sua marcha quando F teve que parar para reajustar o dispositivo e tratar os mais debilitados (4 praças e 1 furriel).

Houve descanso em Madina e tomou-se uma refeição quente (...)

4 de fevereiro de 1969

(...) No dia 4 (D + 2)  o Dest F dirigiu-se para [ Felo Quemberá, ilegível] ocupando a posição 3 que se atingiu sem dificuldade por volta das 11.00h. Alternadamente ocupou-se as posições 3 e 4 de acordo com o plano.(...)

5 de fevereiro de 1969

(...) Em D + 3 [5 de Fevereiro de 1969] por volta das 7.30h,  recebemos ordens do PCV [Posto de Comando Volante] para a abandonar a nossa posição e seguir ao encontro da coluna. 

Uma hora depois atingimos o campo de aviação de Madina onde fomos reabastecidos de água e r/c [rações de combate]. 

Pelas 9.00h a coluna pôs-se em movimento e meia hora depois 4 carros da rectaguarda tiveram um acidente. Não obstante, a coluna prosseguiu e o pessoal do Dest F mais os mecânicos resolveram a dificuldade.

6 de fevereiro de 1969

(...) Próximo de Cheche recebi ordens para ocupar a posição que ocupara que tivera em D / D+1 porque o Exmo. Comandante da Operação [, cor inf Hélio Felgas,] entendeu dever poupar alguns quilómetros ao Dest F e D, bastante atingidos pela dureza dos respectivos percursos. Essa foi a razão porque não transpus o [Rio] Corubal em D + 3 [ 5 de Fevereiro] só o vindo a fazer em D + 4 [6 de Fevereiro] por volta das 9.00h.(...)

(...) Durante a transposição do Corubal a jangada em que seguiam 4 Gr Comb [da CCAÇ 2405 e da CCAÇ 1790], respectivos comandos e tripulação afundou-se espectacularmente acerca de um terço da largura do rio, provocando o desaparecimento de 17 militares do Dest F e grandes quantidades de material perdido. (...)

(...) Por voltas das 10.00h de D+ 4 [6 de Fevereiro] saímos de Cheche para Canjadude que atingimos por volta das 16.30h com o pessoal deste Dest embarcado. (...)

7 de fevereiro de 1969

(...) Descansou-se e em D + 5 [7 de Fevereiro] às primeiras horas a coluna pôs-se em movimento para Nova Lamego que foi atingida por volta das 11.00h. 

Às 12.00h as tropas ouviram uma mensagem do Exmo. Comandante-Chefe [, brig António Spínola,] que se deslocou propositadamente para a fazer.

Guiné 61/74 - P21723: In Memoriam (379): as minhas manas freiras, franciscanas hospitaleiras, Maria Augusta Crisóstomo e Emília de Jesus Bárbara Crisóstomo, que acabam de morrer em Portugal, vítimas de Covid-19, e cujas vidas foram uma grande história de amor a Deus, aos pais e ao próximo (João Crisóstomo, Nova Iorque)



Torres Vedras > A-dos-Cunhados > Paradas > Lar de Paradas > s/d > O João Crisóstomo, na  "última foto com as duas  minhas manas": no Lar das Paradas,  fomos visitar minha irmã mais velha, Maria Rosa (na cadeira de rodas) e apresentar-lhe o seu último bisneto." As manas freiras do João, as irmãs Franciscanas Hospitaleira Maria Augusta Crisóstomo e Emília de Jesus Bárbara Crisóstomo, aparecem em segundo plano.
 
Foto (e legenda): © João Crisóstomo (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1. Através do nosso comum amigo, Rui Chamusco, tivemos conhecimento do infortúnio que atingiu o João Crisóstomo que, no fim do ano,  perdeu duas das suas irmãs, vítimas de Covid-19, "as duas minhas manas freiras, Maria Augusta  Crisóstomo e Emília de Jesus Bárbara Crisóstomo".

John Crisostomo / João Crisóstomo [ luso-americano, natural de Torres Vedras, conhecido ativista de causas que muito dizem aos portugueses: Foz Côa, Timor Leste, Aristides Sousa Mendes; Régulo da Tabanca da Diáspora Lusófona; ex-alf mil, CCAÇ 1439 (Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67): vive desde 1975 em Nova Iorque; é casado com a eslovena Vilma desde 2013; tem mais de 125 referências no nosso blogue; acabei de falar com ele, já agendou para o mês de outubro de 2021 a festa da família Crisóstomo & Crispim, já reservada, desde o ano passado, para o convento do Varatojo.


É uma  família  notável, a dos Crisóstomos & Crispins, "especialmente pela sua vertente religiosa", como o João nos explica: "um frade/ irmão franciscano que era meu tio; 6 padres e oito freiras, das quais três eram minhas irmãs  e os outros/as eram todos primos direitos"...

Socorrendo-nos da mensagem que ele entretanto nos mandou, no final do ano:

"As minhas irmãs eram  membros da Ordem das irmãs franciscanas hospitaleiras portuguesas, dedicando as suas vidas a fazer bem a outros, sem nunca esquecerem os seus deveres de filhos e família e de que a caridade começa em casa e de que as obrigações e responsabilidades para com o nosso semelhante começam por aqueles que nos são mais queridos. 

"Lembro que, quando meus pais já velhinhos precisavam de ajuda e os outros filhos, incluindo eu, estávamos longe e sem condições de os poder ajudar pessoalmente, elas foram ter com a Madre Superiora: que queriam dar assistência aos meus pais na nossa casa, onde tinham nascido, propondo-se revezarem-se  uma cada ano. 

"Eu lembro-me bem dos tempos em que   a minha casa  não tinha água, que era preciso ir buscar  ao poço  com uma bilha,  e o poço ficava a  uma certa distância no meio da vinha... dos tempos quando  não havia electricidade… e  as amenidades eram poucas e as dificuldades e privações eram muitas. E elas sabiam bem disso. Mas a minha mãe,   com Alzheimer e meu pai muito velhinhom  precisavam de ajuda.    

"Como resposta foi-lhes dito [, às manas freiras,]  que uma vez que agora  eram membros da ordem não lhes era possível irem tratar dos nossos pais na nossa casa. E elas então com uma coragem que fizeram de minhas manas as minhas heroínas também, responderam que então tinham muita pena mas que iam deixar a ordem para poderem tratar dos meus pais. 

"Perante este amor  para com meus pais e esta inesperada coragem de  consciência,   tudo se resolveu e   foi-lhes concedido o que pretendiam :   a partir daí alternavam-se,    indo  então cada uma delas passar um ano em minha casa, sujeitas às adversidades e privações que há muito não experimentavam nas suas  vidas de convento.  

"Sem deixarem de dedicar as suas vidas aos seus semelhantes,  elas souberam pôr tudo no devido contexto, de que a caridade começa em nossa casa: não podemos  honrar e amar a Deus esquecendo o nosso semelhante; mas não podemos amar o nosso semelhante longínquo, sem amar primeiro aqueles mais próximos de nós, começando pelos nossos pais e irmãos.

"A minha irmã Maria das Dores faleceu já há muitos anos, após uma   longa convalescença que nunca chegou a ser completa,  depois de ter  sido esfaqueada por um lunático, que, recém saído da prisão , assim consta,  havia jurado matar a primeira pessoa que encontrasse ao sair da prisão. O acaso quis que fosse uma freira .. e era a minha irmã. 

"As outras duas, por motivos de idade e de saúde estavam já as duas num convento/lar em Leiria. Na semana passada,  a Covid-19 atacou esse lar e quando telefonei apenas três pessoas não  estavam  contaminadas.  Uma das primeiras vítimas  foi a minha irmã Emília que foi levada para o Hospital de Leiria. A Maria Augusta adoeceu logo depois, mas  ficou no lar. 

"Ontem,  dia 30 de Dezembro, telefonaram-me a dizer que a  minha mana Maria Augusta  tinha falecido de manhã.  E.  ao fim do dia,  recebi outro telefonema  de que a outra minha mana  Emília que estava no hospital tinha acabado de falecer também. As duas no mesmo dia!

"Como último destino aqui nesta terra  vão ser sepultadas no mesmo jazigo de meus pais, em Póvoa de Penafirme, Torres Vedras.   É justo e próprio que o amor que para eles tiveram  continue bem lembrado  aqui, ficando juntos depois da morte; e  com eles  lá e cá restem agora juntos também. 

"No dia primeiro de Janeiro as suas almas serão lembradas ao Senhor numa missa às 10.30 na  Igreja de St. Cyril, uma Igreja eslovena em  Nova Iorque, no número  62 da  St. Marks Place. Pelas conhecidas razões esta missa  não terá assistência,  e será levada a efeito via Zoom.
  
"E no dia 10 de Janeiro as minhas manas serão lembradas numa missa às 12.00 na Igreja franciscana de Varatojo, Torres Vedras.

"Convido todos os que queiram associarem-se em espírito a estes acontecimentos. Para mim, além do pedido de generosa misericórdia ao Senhor, esta é também uma missa de Accão de Graças ao Senhor pelas manas que me Ele deu.

"João Crisóstomo, Nova Iorque"
 _________

Nota do editor:

Guiné 61/74 - P21722: Esboços para um romance - II (Mário Beja Santos): Rua do Eclipse (33): A funda que arremessa para o fundo da memória

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 23 de Dezembro de 2020:

Queridos amigos,
Era necessário criar a circunstância de Paulo Guilherme nos dar minimamente a saber em que trabalha nessa viragem de século, como reflete sobre os desafios prementes que se põem às causas em que está envolvido. Fez amizade com este Gilles Jacquemin , este, esporadicamente, pergunta que livro é que ele está a escrever com Annette, e pede alguns detalhes sobre essa bizarra guerra de guerrilhas de que nunca ouviu falar, pois para um belga a África é o Congo. E Paulo, sem grandes minudências, conta-lhe a história de uma grande flagelação, estavam todos convencidos em Missirá, com o potencial fogo que tinham visto e ouvido, Finete ficara reduzida a escombros, pois não era verdade, era o primeiro ataque a Bambadinca, provocou pânico, mas foi conduzido desastradamente pela guerrilha, teve consequências, aquele local que parecia tão sossegado passou a viver em permanente estado de alerta. E Paulo disse a Gilles que os meses que se seguiram foram duríssimos, um imprevisto castigo depois de pôr de pé Missirá. Talvez seja uma outra história que Paulo contará a Gilles, se ele mostrar interesse, claro está.

Um abraço do
Mário


Esboços para um romance – II (Mário Beja Santos):
Rua do Eclipse (33): A funda que arremessa para o fundo da memória


Mário Beja Santos

Cher Gilles Jacquemain, Estou a escrever-te à pressa, parto amanhã cedo para Bruxelas, a Annette vai-me buscar a Zaventem, partimos logo para Lier, vamos fazer a campina até Antuérpia, passaremos mesmo um dia em Eindhoven e Groningen, voltamos a Bruxelas e preciso de conversar contigo a sério, a política dos consumidores está em risco de anquilosar, preparei um documento para distribuir pelos outros diretores da minha associação, noto uma incompreensível relutância na parceria proposta pelo comissário com as medidas de política de Saúde, acho que é um grande desafio a que nos devemos afoitar, não há perigo nenhum na perda de identidade, as questões da sustentabilidade crescem de importância, devemos saber corresponder aos desafios da mudança de milénio. Não se pode ficar insensível às tendências do consumo no final do século, a esta sociedade móvel centrada na rede das redes, falava-se nos jovens mileuristas, tudo indicia que os jovens vão viver com muito menos dinheiro neste capitalismo de mão-de-obra barata, onde há tanto entusiasmo pelo low-cost, vivemos agora com os jargões do empreendedorismo, inovação e criatividade, com os benefícios da microeletrónica, energias renováveis e mercado global do comércio eletrónico. O que está a dar é a flexibilidade do trabalho, o que chamam a reengenharia para fazer mais com menos. E entrámos na tirania do instante, na cultura da urgência. Na esfera relacional, estou totalmente de acordo com Zygmunt Bauman, é o tempo da modernidade líquida, das relações de fachada, dos sorrisos que não chegam ao coração, que se limitam às relações públicas. E a política dos consumidores entrosa perfeitamente com as questões de saúde e ambiente, este novo século está confrontado com o envelhecimento. Parece que a política dos consumidores se esqueceu que em 1999 o Conselho Económico e Social das Nações Unidas reconheceu o consumo sustentável como parte dos direitos dos consumidores. Somos úteis para os ambientalistas e temos um histórico ao serviço das políticas de saúde, foram os consumidores europeus que denunciaram o que se estava a passar com a talidomida e conseguiram fazer aprovar o código do medicamento. Temos colegas com uma visão paroquial, temem perder apoios financeiros se acaso se estabelecer uma ligação programática com a saúde. Esta conceção da defesa do consumidor técnica poderá levar-nos ao apagamento, não me custa nada vaticinar que passaremos a ser uma política subsidiária no futuro, só representada pelas instituições estatais e por associações transformadas em empresas, a vender serviços. Não contem comigo. Por isso, meu estimado Gilles, preciso de me encontrar contigo antes de regressar a Lisboa, coordeno amanhã com a Annette a nossa viagem e espero de ti alguma disponibilidade para, por exemplo, nos encontrarmos durante uma refeição.

Perguntas-me pela Annette, sinto-a feliz, viaja que se farta, mas anda sempre com os meus papéis da guerra da Guiné, é uma pasta que a acompanha com tudo que eu lhe envio, há dias atrás contou-me que nas noites de Liège estava exatamente a falar de um episódio inesquecível, vou dar-te um lamiré, creio que a guerra em que participei num ponto minúsculo de África Ocidental não é assunto que te acalore, mas como tu és um amigo do coração apanha com os dados explicativos, os tais que entusiasmam Annette.

Estamos no final de maio de 1969, houve sucesso numa emboscada noturna, não era atividade muito comum, havia mesmo quem a desaconselhasse, tem muitos riscos, felizmente que eu dispunha de gente que conhecia as matas, eram soldados experientes. No dia seguinte a este episódio, imagina tu, ao anoitecer ouvimos troar os canhões e o disparo constante das metralhadoras e os estrondos dos morteiros, julgávamos que a guerrilha estava a retaliar sobre outro dos nossos quartéis, qualquer coisa como a 14 quilómetros dali. Estávamos especados na parada a ouvir aquele fogo ensurdecedor, a ver o céu riscado pelas balas, bem cedo começou a chegar o odor de toda aquela pólvora, o vento soprava de feição para o nosso lado. Não resisti, pedi voluntários, e da forma mais imprudente do mundo fomos numa corrida disparada até perto do nosso outro quartel. E começou o insólito, eramos aguardados com entusiasmo e abraços, com voz embargada perguntei a alguém que eu tratava por irmão se havia mortos e feridos, a que ele me respondeu que todo aquele fogo fora disparado sobre Bambadinca, a poucos quilómetros dali. Lá fomos, atravessámos um rio e fomos levados para Bambadinca, que estava num perfeito pandemónio, fora uma surpresa total, os guerrilheiros tinham-se aproximado do campo de futebol, por milagre não houvera acidentes graves, mal eu suspeitava que era o princípio da queda dos oficiais de comando em Bambadinca, em breve serão punidos e afastados, o sistema defensivo irá ser alterado e eu próprio sofrerei as consequências dessa mudança quando for viver para Bambadinca, em novembro desse ano. E regressámos ao amanhecer. São esses os papéis agora que eu estou a juntar para a Annette, o meu quartel está-se a recompor, o trabalho não para, chegamos a ir montar vigilância à navegação duas vezes por dia, são uns duros 25 quilómetros ou com calor sufocante ou chuva diluviana, a qualquer hora do dia, andamos à mercê da tabela das marés.

Para findar esta curta narrativa à volta dos papéis que Annette está a organizar, e como não espero tão cedo voltar-te a falar da Guiné, tu ficas a saber que se muita canseira já tivemos, os meses que se seguem, entre junho e novembro vão significar para este teu amigo uma sucessão de flagelações em Missirá, onde habitualmente vivo (a primeira, logo em junho, será um amargo de boca para os guerrilheiros, deixarão baixas confirmadas), mas também em Finete; haverá episódios burlescos, caso de uma noite em que Missirá, por vários desencontros, ficou defendida por escassos doze homens, eu estava lá, à cautela mandei toda a população para os abrigos e os homens puseram-se em posição defensiva com as suas espingardas, felizmente não houve flagelações e tudo está bem quando acaba bem nestas vigílias inquietantes. Estou agora a juntar papéis porque tenho que ir a Bissau como testemunha de defesa de um militar que deixou fugir um prisioneiro durante uma operação. E aproveitando a tal vigilância aos barcos que vão ou partem de Bambadinca, haverá nova emboscada, que nos foi favorável. Paro por aqui, tu tens mais que fazer, não te irei contar que em agosto, numa emboscada noturna em Finete, inopinadamente me surge um vulto esbranquiçado à frente, disparei sobre uma pobre mulher que vinha numa coluna de reabastecimento dos rebeldes, um dos meus colaboradores perdeu a cabeça, tive que pôr a disciplina militar a funcionar; um sargento, em completo estado de exaustão, ameaçou matar meio mundo, teve que ser evacuado, passou dois anos na psiquiatria; e em outubro, foi a vez da guerrilha nos atingir a fundo com uma mina anticarro. Nada mais te digo, se me quiseres fazer perguntas, esta guerra da Guiné não era uma mera reminiscência, faz parte da minha transformação em homem, procurei ao longo destas décadas recuperar as solidariedades e as amizades que me animaram e de algum modo fizeram de mim esta pessoa de quem tu dizes que és profundo amigo. Por aqui fico, já preparei a bagagem, mas tenho que dormir umas horas para fazer uma viagem que me vai pôr nos braços da minha amada. Bien à toi, Paulo.

(continua)

Vista aérea de Bambadinca, fico com a sensação que podia entrar e percorrer todo este território que me foi familiar, desde o campo de futebol onde me comportei como um frangueiro, a residência naquele grande U, com tantas recordações, o edifício do comando, a secretaria e as transmissões, a capela, a manutenção militar, a delegação do batalhão de engenharia, e posso mesmo imaginar que me dirijo à rampa para cambar o Geba, estou a correr contra o tempo, são três e meia da tarde, preciso de chegar a Missirá ainda com luz, partirei pelas três da manhã para Mato de Cão. Uma imagem que reterei até ao último dos meus dias.
Fernando Calado, alferes das transmissões do BCAÇ 2852, de braço ao peito, mostra-nos as marcas da flagelação da noite de 28 de maio de 1969
Pensão Central, da Dona Berta que me autorizava a tratá-la por avó, Bissau, paredes meias com a catedral

Imagem de Bolama
Imagem do porto de Bambadinca, do álbum de Luís Mourato Oliveira, com a devida vénia
No rio Corubal, onde nem tudo é tarrafo
O esplendor do tarrafo num pequeno rio da região do Boé
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Nota do editor

Último poste da série de 25 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21690: Esboços para um romance - II (Mário Beja Santos): Rua do Eclipse (32): A funda que arremessa para o fundo da memória

Guiné 61/74 - P21721: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (122): Notícias do blogue no ano de 2050, por Jorge Cabral


Capa do livro de Jorge Cabral, "Estórias Cabralianas", vol I. 
Lisboa: Ed José Almendra, 2020, 144 pp. (Preço de capa: 10 €).

1. Amigos e camaradas, nada como começar o ano de 2021, dando um salto para 2050, antecipando as notícias. Nessa altura, já poderemos fazer viagens tanto ao passado como ao futuro.  

Felizmente,  alguns de nós ainda não morreram de Alhzeimer em 2050. E mesmo os que entretanto foram morrendo (, desta e doutras doenças crónicas degenerativas),  vivem agora num condomínio de luxo lá no Olimpo  dos combatentes, e podem manter uma janela aberta sobre a terra... Sempre distraem a vista...

Dos que ainda andam, cá em baixo, no planeta azul, em 2050, conservando o seu saudável sentido de humor  (, que é o que lhe resta, depois de lhe terem tirado tudo),  é o nosso  "alfero Cabral". Lembram-se dele em 1969/71, o régulo de Fá Mandinga e de Missirá, na antiga Guiné, que fez parte do glorioso império colonial português  ?!...  

Pois, fomos apanhá-lo, 80 anos depois, sempre igual a ele próprio,  ou pelo menos uma cópia perfeita, se não mesmo até melhor do que o original. Vale a pena escutá-lo. 

Para quem, em 2021, continua a caminhar na perigosa picada da vida, cheias de minas e armadilhas, que são os km 70 em diante, é um motivo de alento encontrar um ex-camarada de armas em 2050, sociologicamente classificado como UPV (com prazo de validade completamente ultrapassado), mas espantosamente  lúcido e translúcido. 

Gostei de o ouvir, em 2050, a dar-nos notícias do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné e dos Encontros Nacionais da Tabanca Grande, agora virtuais.  

Sinceramente, foi a melhor notícia que até agora recebi nas primeiras horas do Novo Ano de 2021, depois, claro, de saber que a minha neta Clarinha, com um ano e um mês e vinte dias de vida, se havia estreado no Funchal a ver,  com um ângulo de 360º,  o melhor fogo de artifício do mundo na passagem de ano.


 Notícias do ano 2050

por Jorge Cabral

Tenho, como sabem, uma máquina do tempo, na qual viajo ao passado. Porém hoje a máquina avariou e, em vez de recuar os quarenta anos programados, avançou e eis-me aqui no ano de 2050.

Estou vivo e ainda trabalho pois agora já ninguém tem direito à reforma. Exerço as minhas funções no Instituto da Promoção da Pobreza. Preparo um estudo sobre o Empobrecimento Lícito e o certo é que já sei as conclusões - empobrecer é legítimo, justo, lícito e patriótico.

Precisam-se mais pobres para manter os serviços sociais. O crime tem diminuído assustadoramente. Os polícias passam os dias a jogar às cartas, a contar anedotas ou a ver televisão. Felizmente vai ser inaugurada, em breve, uma Escola de Delinquência, na qual sepodem licenciar ladrões e vigaristas, estando até previsto um Doutoramento em Tráfico de Influências.

O meu quotidiano é simples. Apanho de manhã o transporte e, se o perco, tenho logo apoio psicológico, pois há em cada paragem um Psicólogo. Aliás, existem por todo lado.

Ainda na semana passada, quando no Restaurante entornei a sopa, tive logo o respectivo apoio da Psicóloga do Estabelecimento.

 Também há Advogados nos restaurantes, nos cafés e até nas casas de alterne, sempre disponíveis, pois são quatro por cada cidadão.

Moro num Velhil, destinado aos que U.P.V. (Ultrapassaram Prazo de Validade). Embora fosse um antigo canil, a casa é agradável. Recebemos muitas visitas de estudantes e uns gostam muito, outros preferem o Jardim Zoológico.

No meu quarto afixei fotografias da Guiné e no outro dia uma professora perguntou-me se eu é que era o Soldado Desconhecido. Respondi-lhe afirmativamente. Quanto à guerra,  já ouvira falar… Foi depois de Aljubarrota, não foi?

O Blogue sobrevive. O Maestro Luís comanda-o com o olhar, pois já não se usam teclas.

Qualquer dia, teremos mais um encontro da Tabanca Grande. Virtual, claro… mas, com chá e biscoitos!


[Com a devida vénia: Excerto de: Jorge Cabral, "Estórias Cabralianas", vol I. 
Lisboa: Ed José Almendra, 2020]
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quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

Guiné 61/74 - P21720: Boas Festas 2020/21: Em rede, ligados e solidários, uns com os outros, lutando contra a pandemia de Covid-19 (39): E já aí bem a bacina, / Diz a gente aqui do Norte, / Não é santa a medicina, / Mas quem a tem, está com sorte! (Os editores do blogue)



Lisboa > Praça do Comércio > Dezembro de 2020 > As... luzes ao fundo do túnel...

Foto:   Mário Beja Santos (2020), editada com a devida vénia... (*)


Quem canta as nossas janeiras,
seu mal espanta!

Para a minha querida cunhada e 'mana' Nitas,
com votos de muita saúde e longa vida
porque ela... merece tudo!
Pode ter perdido uma batalha no "annus horribilis" de 2020, 
mas vai a ganhar a guerra no Novo Ano de 2021! (LG)


Desinspirado, confesso
Que ando,  desde o Natal,
Mas a todos eu vos peço
Que não me levem a mal.

“Annus horribilis”, este
Ano que agora acaba,
Mas não acaba a Peste,
Nem com um... abracadraba!

Com muita fé e esperança,
O Novo vamos saudar,
Qu’ o Velho fique de lembrança,
Não o podemos olvidar!

Foge, foge, c’um caraças!,
Qu’ o Covid, e outras maleitas,
Semeado tem desgraças,
Com ou sem as malas feitas.

Em sendo a doença mortal,
Não te vale nenhum doutor,
Mas mal por mal hospital,
Lá tens um ventilador.

Entre mortos e feridos,
Haveremos de escapar,
Uns mais que outros, sofridos,
Inda é tempo d'aguentar.

Estar aqui é um bom presságio,
Na praia não morreremos,
Tendo escapado ao naufrágio,
Muito ainda contaremos.

É meio caminho andado,
Não esquecer a nossa história,
Não há futuro projetado,
P’ra quem perder a memória.

Doze passas são desejos,
P’rós meses que hão de vir,
Não havendo mais festejos,
... Toca a comer,beber, rir!

E já aí bem a bacina,
Diz a gente aqui do Norte,
Não é santa a medicina,
Mas quem a tem, está com sorte!

E quem as janeiras canta,
Dizendo a sua asneira,
Também o seu mal espanta,
A fingir que' é brincadeira.

Diz o povo, que é otimista,
“A cada dia Deus m’lhora”,
Eu, que sou racionalista,
Não me fui ainda embora.

Pandemias, pandemónios
Vão e vêm com o inverno,
Entre anjos e demónios,
Escaparemos ao inferno.

... Pois, as janeiras, senhores,
Cantadas sob o poilão,
São de nós todos, editores,
Que p'ró ano aqui estarão.

Luís Graça... e demais editores do blogue, 
Carlos Vinhal, Eduardo Magalhães Ribeiro,  Jorge Araújo, ativos, 
e Virgínio Briote, jubilado. 

Que os bons irãs do nosso poilão, nos protejam a todos/as, camaradas e amigos/as! (**)
__________


Guiné 61/74 - P21719: (Ex)citações (382): Tavira, CISMI, por quem nenhum de nós morreu de amores... (João Candeias da Silva / Carlos Silva / Luís Graça)


Facebook > Grupo dos Antigos Militares do CIQ-CISMI, Tavira e QG Évora > Carlos Cordeiro > 17 de janeiro de 2017

(...) Há 49 anos dava entrada no CISMI - 4.ª companhia. Deixo de lado as coisas menos boas para olhar com ternura o tempo de juventude. Foto: regresso da Semana de Campo. À excepção do cabo miliciano (...) todos os recrutas são naturais de S. Miguel - Açores. Da esquerda para a direita: Carlos Alberto Pereira Rangel; José Luís Vasconcelos Botelho; cabo miliciano; Domingues e eu,  Carlos Cordeiro  [, saudoso membro da nossa Tabanca Grande, 1946-2018]  (...)




Grupo dos Antigos Militares do CIQ-CISMI, Tavira e QG Évora  > Carlos Cordeiro > 9 de março de 2015 

 
(...) CISMI. 1.º turno de 1968 (recruta). Um dos pelotões da 4.ª Companhia (não me lembro o n.º), "foto de família". Regressámos da "visita" às salinas já tarde e não havia muito tempo para vestir a farda n.º 2, tirar a foto e a seguir formar para o almoço. O aspirante (que talvez tivesse feito com que chegássemos tarde de propósito) disse então para vestirmos a parte de cima da farda n.º 2 e ficarmos com as botas e calças como se pode ver pela foto. 

Sou o terceiro a contar da direita na fila do meio [, assinalado com cercadura a amarelo[. Ao meu lado direito está um amigo aqui de S. Miguel,  Açores. De resto, infelizmente, não me lembro do nome de mais ninguém, ainda que todos tenham assinado a foto. O aspirante era bastante reguila, o que era temperado pelo cabo miliciano, excelente pessoa. Oxalá algum camarada se reveja na foto. (...) 
 

1. Comentários do João Candeias e do Carlos Silva ao poste P217092 (*):

(i) João Candeias da Silva [ex-fur mil at inf, de rendição individual, CCAV 3404 (Cabuca, 1972), CCAÇ 12 (Bambadinca, 1973) e CIM Bolama (1973/74)]

CISMI, Tavira. Terceiro turno de 1971.

Depois da recruta no Hotel das Caldas, rumámos a sul até Tavira para fazermos a especialidade de atirador de infantaria.

A viagem longa e demorada foi feita sem paragens em vilas onde pudessemos dar ao dente, a excepção era para fazer xixi no meio do mato.

Em Tavira, no CISMI, destaco 3 personagens:

(a)-Tenente Moleiro, que no primeiro dia aparaceu no campo da feira, conhecido por Atalaia. O pelotão formou e depois do blá, blá da retórica, tirou o quico e disse: "é este o corte de cabelo da companhia;

(b) Caifás, o barbeiro onde nos iríamos apresentar e dizer #corte à tenente Moleiro":

(c) O capitão capelão que dava palestras aos sábado ao fim da manhã no refeitório.

O pessoal estava exausto, sentado e com o queixo apoiado ao cano da G3, não tardava em adormecer. A palestra que alertava para o "respeito" pelas meninas e ameaçava que quando tal não acontecia termimava em casamento na parada. E dava como exemplo o que, na recruta / especialidade, anterior, tinha acontecido.

Depois era ouvi-lo: "tu aí ao fundo levanta-te e castiga-te a ti próprio".... "Sim tu que estavas a dormir"...

A malta como não sabia a quem ele se dirigia, levantavam-se dois ou três. Então dizia: "não és tu, ele sabe quem é". À segunda ou terceira acertava.

A malta que sabia tocar e cantar e fosse "actuar" na missa de domingo tinha tratamento VIP. Também havia outros VIP por serem futebolistas, destaco o Vaqueiro, um dos chamados bebés do Varzim. Havia mais.

A salina era onde os mais tesos eram humilhados por resistirem onde não havia hipótese de vencer. Terminava quando todos estavamos encharcados de água podre e mal cheirosa. O cheiro ficava presente por dias.

Na Guiné, onde fui dos primeiros a chegar por ir em rendição individual, encontrei vários camaradas. Destaco o Penedos, que tocava trompete e em Tavira já tinha um Renault.

João Silva, terceiro turno de 1971, com passagem por Beja, Depósito de Adidos e Guiné.

(ii) Carlos Silva  (ex-Fur Mil Inf,  CCAÇ 2548/BCAÇ 2879, Jumbembem, 1969/71), Régulo da Tabanca dos Melros]

Meus Amigos & Camaradas:

Entrei no dia 8/1/1969 no RI 5 nas Caldas da Rainha e fiquei integrado na 2ª Companhia comandada pelo Ten Bicho Beatriz, Capitão de Abril, infelizmente já falecido, homem de bom trato.

Integrei o 2º Pelotão, comandado pelo Ten Carneiro, também um militar respeitador. Os Cabos Milicianos, um deles era o Moreira que encontrei na Guiné e posteriormente muitas vezes em Lisboa, um tipo porreiro. O outro, cara de mauzão, mas bom rapaz e quem era ele ? Quem era ele ? Todos o conhecem aqui no Blogue, nem mais nem menos, o nosso amigo & camarada o Humberto Reis.

Das Caldas, para além de vários episódios, lembro-me do mais importante, que foi o sismo de 28 ou 29 de Fevereiro de 1969 e da audição em parada das Ordens de Serviço com o final de " O Comandante ... Giacomino Mendes Ferrari "...

Daqui deram-me a guia de marcha para apanhar o comboio e parar em Tavira onde nos esperavam os autocarros de turismo do Exército para nos transportar até ao designado quartel da Atalaia - CISMI onde dei entrada no dia 9/4-/969, 2º Turno, para aí tirar a especialidade de Armas Pesadas, ficando integrado na 2ª Companhia, comandada pelo Cap Viegas, bom homem, que nunca mais ouvi falar dele. talvez o Carlos Alberto Nascimento, se lembre dele.

O pelotão era comandado por um Aspirante Miliciano do qual não me lembro o nome, coadjuvado por dois Cabos Milicianos, sendo um de nome Soromenho, cara de mauzão, o outro não me recordo o nome.

A instrução e aplicação militar, claro, era exercida no campo da Atalaia e para os lados da Conceição de Tavira ou nas encostas do rio Gilão, para os lados da ponte nova EN.

Falam muito do Ten Madeira, do "Trotil", etc., etc, não me lembro deles, pois a nossa convivência era restrita. Lembro-me de um Tenente, do qual não me recordo o nome, um tipo magro e alto, que nos dava as aulas teóricas, nada acessível, militarista, que andava sempre com um pingalim e um outro Ten Coelho Lima, do Norte, indivíduo de bom trato.

Episódios não são muitos, mas recordo-me de uma cena de uma barata que vinha no prato de arroz de um dos camaradas, que percorreu os pratos todos, pois foi passando de prato em prato, porque nenhum de nós era chinês.

Lembro-me também de quando íamos fazer marchas, sempre que íamos para o lado de lá do rio, ao passar junto às esplanadas, ouvíamos a ordem de comando: "Pelotão... olhar... direita" !!! "... para saudar o 2º Comandante, Maj Teixeira que por ali estava sentado acompanhado ...

Nunca mais ouvi falar deste senhor, nem do Comandante do CISMI que não sei quem era. A rapaziada aqui nunca se referiu aos altos Comandos.

Um outro episódio que me recordo, foi termos um castigo colectivo, privação de fim de semana, dado pelo Maj Teixeira, porque lhe foram fazer queixinhas que os instruendos tinham participado numa operação de assalto a um laranjal ... Pudera!, as laranjas do Algarve tinham fama...

Quanto às meninas e aos casamentos, também eram falados, mas não sei se alguém do meu Turno ficou por lá perdido. Creio que apenas houve por lá um episódio relativo à "espanholita" (?)...

A semana de tiro foi normal, fomos com os canhões e morteiros 81 para Cacela fazer fogo para a Ilha de Tavira. Do CISMI fui parar ao RI 10 Aveiro, mas nem aqueci o lugar, fui logo mobilizado para a Guiné, o que não esperava, pois tinha sido bem classificado.

Foi o meu azar, os camaradas maus classificados foram mais tarde mobilizados, mas foram integrados em pelotões de canhões ou de morteiros e não alinhavam para o mato. Encontrei-me com alguns na Guiné, já eu andava por lá há 6 ou 8 meses. Talvez fosse essa a minha vantagem. Bem, Tavira já vai longe.

Abraço para todos com votos de um Bom Ano 2021 com saúde.

(iii) Luís Graça, editor:

Lembram -se do Carlos Alberto Dores Nascimento, 1º cabo miliciano, e monitor do CSM, entre 1967 e 1969 ? Há uns anos, em 9 de setembro de 2010, escreveu-me o seguinte email:

"Alô, Luis. Sou o Carlos Alberto Dores Nascimento, estive em Tavira de Janeiro de 67 a Dezembro de 69. Especialidade de atirador... e por lá fiquei até ao fim como monitor. Conheci o Robles e o Trotil. O Trotil era Óscar. Conheci-os de alferes a capitães.

"Também gostava de encontrar alguns companheiros daquele tempo (,agora somos avós, ) mesmo que tivessem sido 'meus' intruendos. Sei que todos os anos em Outubro fazem lá no quartel um convívio com todos os que passaram por lá. Eu este ano quero ir pois nunca fui. Estou inscrito no Facebook, tenho lá algumas fotos do nosso tempo para ver se há alguém que se identifica.

"Bom, um grande abraço."


De facto, o Nascimento, algarvio, que é natural de Alagoa, e vive em Portimão, é (ou era, em 2014) um dos elementos mais ativos do Grupo (aberto) do Facebook, Grupo dos Antigos Militares do CIQ-CISMI, Tavira e QG Évora.

Segundo o Carlos Nascimento, a 2.ª companhia era "a companhia das várias especialidades",  incluindo a de armas pesadas de infantaria. Ou seja, o ten Esteves Pinto  foi meu comandante de companhia, no CISMI, no último trimestre de 1968.