quarta-feira, 12 de outubro de 2022

Guiné 61/74 - P23702: Agenda cultural (820): doclisboa'22- festival internacional de cinema, 6-16/10/2022: Retrospectiva - A questão colonial: 35 filmes - III ( e última) Parte: destaque para a Argélia ("Harkis", 83') e Moçambique ("O Vento Sopra do Norte", 101')


"Em meados da década de 1950, o encontro entre Oumarou Ganda, então um jovem estivador do Porto de Abijão, recém-regressado da guerra da Indochina, e Jean Rouch, o engenheiro-cineasta, marca um ponto de viragem no cinema de Rouch com "I, a Negro". Uma década mais tarde, no Níger, nasce o cinema de Ganda com o autobiográfico "Cabascabo".  [Dois filmes que passaram no doclisboa2022, no passado dia 11]. 

Acima, fotograma de "Cabascabo", de Oumarou Ganda  [1969, Níger, 46’]: "Cabascabo, veterano do exército colonial francês na Indochina, regressa à terra natal no Níger e é aclamado por amigos e familiares. Em analepses fragmentadas, narra a sua aventura e as batalhas naquela terra longínqua. Durante algum tempo, desfruta da glória de veterano, mas, depois de esbanjar tudo o que tem, [...]"


1. Este ano, na sua 20ª edição, o doclisboa tem na secção "Retrospectiva", dedicada à "questão colonial", um total de 35 filmes (de curta, média e longa metragem), que já passaram ou ainda vão passar por estes dias, entre 6 e 16 de outubro, o mês do festival, o mês que "todo o mundo cabe em Lisboa"... Vamos continuar a listar, a título informativo, alguns desses filmes (*).

A Argélia, que conquistou a sua independência em 1962, há 60 anos, após um conflito extemamente sangrento com a potência colonizadora, a França (e as milícias dos "pied-noirs", os colonos franceses), desde 1954, e depois de inúmeros massacres, está talvez sobrerrepresentada no doclisboa2022... Não só devido ao seu peso "geopolítico", mas também por ter uma cinematografia mais ativa do que outros países africanos, a começar pelos PALOP.  Alguns desses filmes já passaram no festival (como "Algiers, Capital of tthe Revolutionaries"), 
outros ainda podem ser vistos até ao fim do festival, como "Harkis".

Moçambique, por seu turno,  também tem uma boa representação no doclisboa deste ano, muito superior à de Angola ou à da Guiné-Bissau. Alguns dos filmes sobre Moçambique, de cineastas moçambicanos  como Ruy Guerra e Licínio de Azevedo. ainda podem ser vistos no doclisboa2022, que termina em 16 do corrente.

O  texto e as imagens, a seguir, são extraídos do programa do doclisboa'22, incluindo as sinopses dos filmes que aqui se reproduzem para mera informação dos nossos leitores, não implicando da nossa parte qualquer juízo de valor, documental, estético, ético, técnico, político ou ideológico.

Algiers, Capital 

of the Revolutionaries

Gordian Troeller, Marie-Claude Deffarge
Aquando da independência, ficou escrito na Constituição da Argélia que todos os movimentos revolucionários e de libertação nacional poderiam reclamar asilo político. Diz assim: “O desenvolvimento do socialismo na Argélia está intimamente ligado à luta de libertação de povos noutras partes do mundo. É imperativo que qualquer movimento revolucionário apoie [...]

[Passou em 9 Out2022, 14:00, no Cinema São Jorge Sala 3]

12 Out — 22:00 / 75’
Cinema Ideal


About the Conquest

Franssou Prenant
Uma sucessão de material de arquivo (relatórios, testemunhos, memórias) é lido num tom de facto, relatando as etapas da colonização da Argélia pela França entre 1830 e 1848 e delineando a paisagem ideológica de um esforço de aniquilação espantoso.



13 Out — 17:30 / 83’
Cinema Ideal

Harkis

Philippe Faucon

Durante a Guerra da Argélia, muitos jovens argelinos pobres alistam-se no exército francês. Paira a hipótese de independência e a perspectiva para eles é sombria. O tenente Pascal insiste para que todos os homens do seu pelotão sejam evacuados para França.

A jovem nação moçambicana atraiu muitos cineastas, num movimento do qual poucos filmes sobreviveram. Rouch terá realizado Makwayela no âmbito de uma formação para jovens técnicos e cineastas. Já Ruy Guerra, que regressa ao país natal nos primeiros anos da independência, procura em Mueda a memória do início da guerra colonial.

Makwayela

Jacques d’Arthuys, Jean Rouch
O único vestígio que resta da passagem e envolvimento de Jean Rouch numa oficina de formação em Super 8mm em Moçambique é este filme. Em Maputo, um grupo de trabalhadores de uma fábrica de garrafas canta e dança todas as manhãs no pátio. A dança makwayela é uma forma de [...]

[Passou em 10out2022, 15h30, na Cinemateca Portuguesa Sala M. Félix Ribeiro]

Mueda, Memória e Massacre

Ruy Guerra
Ruy Guerra participou activamente na fundação do Instituto Nacional de Cinema de Moçambique e realizou a primeira longa-metragem produzida no país após a independência. O filme cruza a reconstituição teatral do massacre cometido pelas forças coloniais portuguesas em Mueda, a 16 de Junho de 1960, quando soldados portugueses abriram fogo [...]
[Passou em 10out2022, 15h30, na Cinemateca Portuguesa Sala M. Félix Ribeiro ]

Os filmes de Licínio de Azevedo, decano do cinema moçambicano, revisitam e reconstituem a história recente do seu país, num gesto que oscila entre ficção e documentário. A questão da terra e dos seus frutos no coração do conflito colonial e pós-colonial atravessa estes dois filmes, lembrando a dimensão física e económica da exploração.

Nhinguitimo

Licínio Azevedo
Pequena fábula política, Nhinguitimo analisa as relações entre a desapropriação das áreas rurais – e respectivas colheitas – e o sistema colonial. A história da revolta de um trabalhador agrícola contra os colonizadores há seis décadas pode também moldar uma reflexão sobre a exploração continuada do território e suas gentes.  
[Passou em 11out2022, 19h00, Cinemateca Portuguesa Sala M. Félix Ribeiro]
 

A Colheita do Diabo

Brigitte Bagnol, Licínio Azevedo

“A Colheita do Diabo é a minha primeira grande experiência no cinema (…) em que pela primeira vez utilizei, além de actores de teatro, pessoas que não tinham nenhuma experiência [em cinema], sendo as personagens principais antigos combatentes, ex-guerrilheiros da FRELIMO que participaram na guerra pela independência.” Licínio de Azevedo [...]

[Passou em 11out2022, 19h00, Cinemateca Portuguesa Sala M. Félix Ribeiro]

13 Out — 17:30 / 83’
Cinema Ideal

Harkis


Philippe Faucon
Durante a Guerra da Argélia, muitos jovens argelinos pobres alistam-se no exército francês. Paira a hipótese de independência e a perspectiva para eles é sombria. O tenente Pascal insiste para que todos os homens do seu pelotão sejam evacuados para França.


13 Out — 19:00 / 56’
Culturgest Auditório Emílio Rui Vilar

Catembe

Faria de Almeida
Catembe documenta os sete dias da semana no quotidiano de Lourenço Marques. Após uma série de entrevistas em que Manuel Faria de Almeida pergunta a transeuntes na Baixa lisboeta o que sabem sobre Lourenço Marques, o filme integrava sequências de ficção protagonizadas pela rapariga Catembe. O corte, imposto pelo Ministério [...]

14 Out — 19:00 / 101’
Cinemateca Portuguesa Sala M. Félix Ribeiro


O Vento sopra do Norte

José Cardoso
O filme revisita a última fase do colonialismo português. No seu dia-a-dia, dois rapazes e uma rapariga locais lidam como podem com a prepotência dos colonos, até que a violência passa das palavras aos actos. Do Norte, sopra o vento da mudança.


Kuxa Kanema, o projecto de cinema com e para o povo moçambicano, que não pode deixar de lembrar o mítico cine-comboio de Medvedkin, é contado pelos cineastas que o fizeram, entre eles Ruy Guerra. A missão de registar os primeiros passos da independência também passou pelo duro processo dos comprometidos, acusados de compactuar com o colonizador português.

Kuxa Kanema – O Nascimento do Cinema


Margarida Cardoso
A primeira ação cultural do governo Moçambicano após a independência, em 1975, foi a criação do Instituto Nacional de Cinema (INC). As suas unidades de cinema móvel vão mostrar por todo o país o jornal cinematográfico Kuxa Kanema. Kuxa Kanema quer dizer o nascimento do cinema e o seu objectivo [...]

Os Comprometidos — Actas 

de um Processo de Descolonização

[Acta 5]


Ruy Guerra

O duro julgamento de presumidos colaboradores do regime colonial por um tribunal popular foi liderado pelo presidente Samora Machel em 1982. Ruy Guerra acompanhou o processo ao longo de seis dias de filmagem quase ininterrupta. O material resultou numa série de quarenta horas para a Televisão Experimental de Moçambique, sendo [...]
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Último poste da série >10 de outubro de 2022 > Guiné 61/74 - P23691: Agenda cultural (819): Conferência sobre Bases Aéreas de Portugal - BA 11 - Beja e BA 12 - Bissalanca, Guiné, no dia 20 de Outubro de 2022, às 18h00, Palácio da Independência, Largo de São Domingos (ao Rossio)

Guiné 61/74 - P23701: Lembrete (42): Amanhã, dia 13 de Outubro, pelas 17h00, apresentação do livro "Rua do Eclipse", de Mário Beja Santos, a levar a efeito no Salão Nobre do Palácio da Independência, Largo de São Luís, em Lisboa




A todos aqueles que puderem dar-me companhia nesse dia e àquela hora:

Estava previsto este lançamento para 15 de setembro, por razões muito ponderosas a que não me devo furtar, houve que alterar a data, tive a compreensão da Comissão Portuguesa de História Militar, a data foi alterada para 13 de outubro, pelas 17 horas. Terei uma satisfação enorme em falar-vos desta paixão luso-belga onde se irá imiscuir, por indiscutíveis razões do coração e dos rotores da memória, acontecimentos de uma guerra que ocorreu nalguns lugarejos da então província da Guiné, e só uma imaginação descabelada é que pode encontrar pilares de consistência entre uma guerrilha e contra-guerrilha que as novas gerações praticamente ignoram e o encontro de dois cinquentões que se entregam à mais arrebatada epistolografia. Se esta temática de algum modo vos acicata a curiosidade e a minha companhia não seja de desmerecer, prometo não defraudar-vos sobre esta história que começou num breve encontro, corria o ano 1999.

Com a muita cordialidade,
Mário para muitos (ou Mário Beja Santos para todos)

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Em Bruxelas, um breve encontro entre cinquentões, temos paixão e guerra na Guiné

Apresentamo-nos, há aperto de mão, ela chama-se, percebi bem, Annette Cantinaux. E desabridamente pergunto-lhe se podemos almoçar juntos, ocorreu-me, imagine-se, a ideia de um romance, trata-se e alguém que combateu na guerra da Guiné, que ama uma belga, os dois não podem por enquanto, por razões profissionais, viver juntos, telefonam e escrevem muito, ele procura todas as oportunidades para regressar a Bruxelas, para estar junto da mulher amada, ela é intérprete profissional, vive em Bruxelas, na Rua do Eclipse.
Annette Cantinaux, vejo-lhe bem na face, está arrelampada com o pedido que lhe faço, mas acede, iremos almoçar juntos e falar-lhe-ei do que me está a passar pela cabeça, este estranhíssimo rompante de alguém que tem tanto que fazer e que recua 30 anos, até ao tropel de uma guerra. Pasmo-me com a resposta dela: “Parece que me reservou um papel que me assenta bem, na vida real, sou uma mulher divorciada, com filhos a singrar na vida, até me posso de dar ao luxo de me embeiçar por um português, vamos vivendo juntos à experiência e no entretanto damos um ao outro elementos para o seu romance”.
Assim começa uma espiral de palavras cruzadas, de encontros em Bruxelas e em Lisboa, ela às vezes sente-se uma anti-Penélope, vai coligindo e montando uma trama à volta de uma estranhíssima história que tem a ver com uma guerra de guerrilhas que ela totalmente desconhecia, junta as peças, telefonam-se, ele envia-lhe montanhas de correio, até o correio eletrónico é fervente, e ela dirá, sempre radiante que aquele título de romance, Rua do Eclipse, que começou num inesperado encontro, é o galvanizador das suas vidas, como aconteceu.


Mário Beja Santos
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Nota do editor

Vd. poste da série de 4 de Outubro de 2022 > Guiné 61/74 - P23668: Agenda Cultural (813): Convite para a apresentação do livro "Rua do Eclipse", de Mário Beja Santos, a levar a efeito no próximo dia 4 de Outubro de 2022, pelas 17h00, no Salão Nobre do Palácio da Independência, Largo São Luís, 11, em Lisboa


Último poste da série de 20 DE JUNHO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23372: Lembrete (41): 37º Encontro Nacional do Pessoal do BENG 447, Brá, Bissau, sábado, 25 de junho, Restaurante O Paraíso do Coto, Caldas da Rainha: há autocarros a partir do Porto e de Lisboa

Guiné 61/74 - P23700: Historiografia da presença portuguesa em África (338): Viagens por alguns títulos do Boletim Geral das Colónias (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 14 de Janeiro de 2022:

Queridos amigos,
Se dúvidas subsistissem de que há um manancial informativo nas publicações coloniais, sobretudo nas primeiras décadas do Estado Novo, aqui se comprova como se faziam relatos de missões científicas ou brochuras divulgativas sobre figuras dadas como notáveis na ocupação colonial. Recordo que o texto do antigo governador Leite de Magalhães retoma aquele acervo de relatórios que os administradores de circunscrição enviavam aos governadores, exaltando as potencialidades económicas, apelando à existência de melhores infraestruturas e sobretudo tecendo considerações sobre aquela agricultura que vivia da subsistência ou a grande avidez exportadora da CUF, reclamando não só a diversidade como a urgência da industrialização e a extrema prudência na política madeireira, já naquele tempo sujeita a depredações escandalosas.

Um abraço do
Mário



Viagens para alguns títulos do Boletim Geral das Colónias

Mário Beja Santos

Depois de uma brevíssima digressão pela Coleção Pelo Império, da Agência Geral das Colónias, chegou a vez de folhear artigos referentes à Guiné publicados no Boletim Geral das Colónias, logo o nº 85, de julho de 1932, é seu autor o antigo Governador António Leite de Magalhães e o título é A Guiné e os preceitos da associação científica. Após fazer referências de caráter geral à história e a geografia da colónia, Leite de Magalhães questiona as riquezas e cita-as: amendoim, amêndoa e óleo de palma, cera, borracha e couros, sobretudo. Estima que a terra é mal trabalhada e mal aproveitada, a industrialização ainda não lá chegou, como produtos cultivados só aparece o amendoim e sentencia: “As estatísticas enganam-se sobre a diversidade e valor das produções que a Guiné é suscetível de exportar em grande quantidade”. E novamente faz o elenco dos produtos exportáveis: arroz, mandioca, algodão, sumaúma, fibras de piteira, gergelim, rício e madeiras, não deixando de aludir que o café irá pesar no futuro na balança da colónia. E observa que mais importante de tudo seria extrair da palmeira todo o óleo que ela nos pode dar, que, há razão de 9 quilos por cada 5 quilos de coconote subiria a cerca de 5 mil toneladas anuais. Então, o que falta para gerar essa abundância? Apenas organização e tenacidade. Há que criar fábricas onde o arroz e o café se descasquem, se prepare a mandioca e se descaroce a sumaúma, os óleos se espremam e as madeiras se talhem.

As suas considerações histórico-políticas são dignas de atenção. Logo dizendo que a Carta de Alforria da Guiné é o Decreto de 18 de março de 1879 que desafetou a colónia de Cabo Verde, só a partir desta data é que começou a ser cuidada a sua prosperidade. Deplora o que aconteceu no passado em que o indígena era o senhor absoluto do mato, a ocupação limitava-se a ilha de Bolama e à fortaleza de Bissau, às Praças e Presídios de Cacheu, Farim, Geba e Buba; a ocupação missionária, que chegara a estender-se por cinco freguesias estava reduzida a um padre. Em Portugal, nem sequer fazia ideia do valor que o território representava. “E por duas vezes se pensou em dá-lo quase inteiro, como quem quer alivar-se de um fardo, a entidades que se despusessem a recebê-los: foram seus primeiros concessionários os irmãos Condes de Buttler, franceses de origem, em 1891; e, depois, os senhores Mateus Sampaio e o Conde Vale Flor, em 1894”. Recorda que a ocupação continental da colónia só terminou na terceira campanha de Teixeira Pinto. E aludindo à vida recente, não deixando bem claro o que era obra dos seus antecessores ou sua menciona o desenvolvimento de estradas, rede telegráfica e telefónica, estações radiotelegráficas, edificações do Estado, faróis e farolins, parcos, portos marítimos e fluviais. Deixa recados para o futuro: para um melhor aproveitamento do sol impõe-se que o Estado fizesse o estudo das culturas adaptáveis e lembra obra feita: criou-se o Jardim da Aclimação e o Campo Experimental de Culturas, com os seus viveiros de café, cacau, coqueiros, sisal e coleiras. Diz com orgulho que os guineenses passaram a dispor de hortaliças, granjas com os seus viveiros de plantas e pomares de frutas; criaram-se e instalaram-se os serviços meteorológicos; e serviços veterinários foram dotados de uma estação zootécnica. Deixara a colónia com sete padres, mas tinha consciência de que havia muitíssimo para fazer em obra de civilização.

Mexericando em toda esta papelada, vejo uma referência a uma exposição da colónia da Guiné no Museu da Sociedade de Geografia de Lisboa, produziu-se um catálogo muito sóbrio com breves notícias sobre a situação geográfica, superfície, hidrografia e geologia, vias de circulação (veja-se: uma rede de estradas com 2800 quilómetros e uma circulação de 225 automóveis que cortavam o território em todos os sentidos, ligando os centros agrícolas e comerciais, uma rede de 685 quilómetros de linhas telegráficas e telefónicas) e após se fazer referência aos recursos económicos publicava-se o que fora amostra dos produtos: arroz, ervilha do Congo (é o nosso feijão verde), malagueta, café, cola, amendoim, caju, coco, coconote, óleo de palma, farinha de mandioca, algodão, sumaúma, borracha, bissilão (mogno da Guiné), pau de conta, pau ferro, pau rosa, e até panaria, artigos em couro e manipansos (termo depreciativo utilizado para falar da arte escultórica Bijagó e Nalu). Via eu estas diferentes referências a produtos exportáveis quando surgiu a palavra compó, curioso era a explicação dada no catálogo:
“O compó é um individuo que só aparece mascarado, tem também o nome de diabo do mato e vive sempre em palhotas escondidas nos matagais é simultaneamente padre, feiticeiro e bailarino e nenhuma festa pode ter lugar sem a sua comparência. Usa na cabeça, tapando-lhe o rosto, um capacete e máscara feitos de despojos de todos os animais conhecidos, cinto de palha desfiada e enfeites da mesma palha nos punhos e tornozelos. Desempenha sempre um papel preponderante durante a época do fanado. Como os antigos bobos tem o direito de dizer tudo o que entender. É expressamente proibido procurar ver-lhe a cara. Na época do fanado, quando sai da sua palhota ou da sua mata, é acompanhado por todos os rapazes que serão circuncisados. Nesta época anda sempre em altas andas e munido de um chavelho de carneiro metido num grande pau. É ele que no meio de cerimónias diversas e danças procede à circuncisão. É uma entidade que atinge a máxima consideração na região Nalu, mas que se encontra também entre os Mandigas e entre os Grumetes”.

Folhei no Boletim Geral das Colónias, número de agosto/setembro de 1946, o artigo do Professor Major Dinas Lopes de Aguiar intitulado Guiné Portuguesa – Terra de lenda, de martírio, de estranhas gentes, de bravos feitos, de futuro, tratava-se de uma conferência que ele proferia em ambiente escolar-militar, não trazia nada mais do que aquilo que já sabemos. E por fim uma referência a outro Boletim Geral das Colónias, número de outubro de 1946, tem a ver com a missão de uma equipa de Medicina Tropical que foi estudar a doença do sono na Guiné Portuguesa, constituída por Fraga de Azevedo, F. Cambournac e Manuel Pinto. O objetivo era averiguar o estado atual da doença do sono e avaliar o grau de endemicidade da febre amarela. Percorreram mais de 3000 quilómetros e colheram elementos em 43 localidades. É referido que em 1932 a Escola de Medicina Tropical de Lisboa fez realizar uma missão em que participou o Dr. Fontoura de Sequeira, este concluiu que “a hipnose graça na colónia sob a forma de endemia ligeira, ao que parece sem tendência a agravar-se”. Estes especialistas de Medicina Tropical fazem menção aos trabalhos desenvolvidos, dissecaram animais domésticos e selvagens suspeitos de desempenharem o papel de reservatório do agente da doença, como também os insetos transmissores, as glossinas ou moscas tsé-tsé. Dão abundantes explicações sobre as manifestações da doença do sono, caso da hipertrofia ganglionar. Um aspeto curioso do artigo é o seu aspeto didático, por exemplo explicam ao leitor que as moscas tsé-tsé apenas se encontram nas zonas de densa vegetação, não desarborizada, pois carecem de sombra e certo grau de humidade para sobreviverem.

Suspendo aqui a leitura destas publicações, mas reconheço, que com todas as limitações houve um enorme esforço destes serviços coloniais para divulgar as atividades no nosso Império Africano.

Governador António Leite de Magalhães na Inauguração do Monumento a Teixeira Pinto, Bissau, 1930
Carta da Comissão Francesa da delimitação das fronteiras entre a Guiné portuguesa e as possessões francesas, gravura de J. Geisendörfer, sem data, é pena não se poder ver o traçado das fronteiras, a superfície atribuída à Guiné portuguesa veio a ser amputada
Carta da Guiné Portuguesa, Lisboa, 1843, é possível verificar como a presença portuguesa estava circunscrita à orla marítima e a algumas ilhas dos Bijagós
Mapa feito em 1606 por Hondius, é visível no canto superior esquerdo o território de que é hoje a Guiné-Bissau, há meramente referência aos reinos, nem a palavra Senegâmbia é mencionada.
Dança de Compó
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Nota do editor

Último poste da série de 5 DE OUTUBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23674: Historiografia da presença portuguesa em África (337): Viagem por alguns títulos da Coleção Pelo Império, da Agência Geral das Colónias (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P23699: As subunidades do Exército que estiveram no Cacheu no meu tempo (José Macedo, ex-2º ten RN, DFE 21, Cacheu e Bolama, 1973/74; natural de Cabo Verde, vive hoje nos EUA)

1. Mensagem de José Macedo (ex-2º tenente fuzileiro especial, RN, DFE 21, Cacheu e Bolama, 1973/74; nasceu na Praia, Santiago, Cabo Verde, em 1951; vive nos Estados Unidos, onde é advogado; é membro da nossa Tabanca Grande desde 13/2/2008; aqui, em 2017, em Monte Real, no XII Encontro Nacional. da Tabanca Grande)

Data - domingo, 2/10/2022, 22:08
Assunto - Companhia que substituiu a 3460 em Vila Cacheu

Saudações, camarada Luís. Corpo? Há muito que não falava 
contigo.

Não tenho estado de visita ao Blogue,  mas soube da morte do teu  cunhado. Os meus pêsames.

Li que a Companhia 3460 (do Capitão Morgado) saiu do Cacheu em 1973. Nós saímos de Cacheu em 74 para ir para Bolama, contudo, não me lembro de nenhuma outra companhia em Cacheu. Serás capaz de me dar uma achega e qual era o nome da companhia lá?

Um abraço amigo.
Zeca


Guiné > Região de Cacheu > Cacheu > CCAÇ 3460 (Cacheu, 1071/73) e DFE 21 (Cacheu e Bolama, 1973/74) > Da esquerda para a direita:
  • alferes mil Silva (CCAÇ 3460) [1];
  • 2º Tenente, oficial imediato, Castro Centeno (DFE 21) [2];
  • furriel mil Lopes (CCAÇ 3460) [3];
  • 2º tenente  RN Macedo (DFE21)[4];
  •  e, em primeiro plano, alferes Médico Moura (CCAÇ 3460 / BCAÇ 3863) [5]-

Guiné > Região de Cacheu > Cacheu > Destacamento de Fuzileiros Especiais, DFE 21 (Cacheu e Bolama, 1973/74) > O ten fuzileiro especial, Zeca Macedo, no cais da vila de Cacheu. com a sua bela motorizada, de 125 cm3 (ou 200?) , matrícula G8831 ou G681 (*)...

Fotos (e legendas): © Zeca Macedo (2013). Todos os direitos reservados. (Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné)


2. Resposta do editor LG:

Meu caro Zeca: É sempre bom ter notícias tuas. Obrigado, em meu nome e da minha família, pelos votos de pesar pela morte do meu cunhado Mário Rui Anastácio (1954 - 2022), natural da Lourinhã.

Eis, abaixo, os  elementos que apurei sobre as subunidades do Exército que passaram pelo Cacheu, entre 1970 e 1974. Mais concretamente, e respondendo à tua pergunta: a subunidade que, no teu tempo, foi render a CCAÇ 3460, foi a 1ª Companhia do BCAÇ 4615/73. 


Um alfabravo, Luís Graça
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Lista das subuniades  do Exército que passaram pelo  Cacheu, de 1970 a 1974:

(i) A CCaç 2659 / BCAÇ 2905 (Teixeira Pinto, 1970/71) seguiu em 14fev70 para Cacheu, a fim de efectuar o treino operacional e a sobreposição com a CCaç 2367 / BCAÇ 2845 (Teixeira Pinto, 1968/70).

Em 21fev70, assumiu a responsabilidade do respectivo subsector de Cacheu, ficando integrada no dispositivo e manobra do seu batalhão e depois directamente subordinada ao CAOP 1 (Teixeira Pinto).

(ii) Em 24nov71, foi rendida pela CCaç 3460  (Ccaheu, 1971/73) e recolheu seguidamente a Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso.

A CCaç 3460, que pertencia ao BCAÇ 3863 (Teixeira Pinto, 1971/73)  seguiu em 24out71 para a região de Cacheu, a fim de efectuar o treino operacional e sobreposição com a CCaç 2659. 

Em 24Nov71, assumiu a responsabilidade do referido subsector de Cacheu, com um destacamento em Bianga, inicialmente na dependência do CAOP 1 e depois integrada no seu batalhão.

(iii) Em 23Nov73, foi rendida pela 1ª Comp/BCaç 4615/73 e recolheu a Bissau para o embarque de regresso.

A 1ª Comp seguiu em 02nov73 para Cacheu, a fim de efectuar o treino operacional e a sobreposição com a CCaç 3460, tendo assumido, em 23nov73, a responsabilidade do subsector de Cacheu, com um pelotão destacado em Bianga.

Após desactivação de Bianga em 26ag074, efectuou, em 02Set74, a desactivação e entrega do aquartelamento de Cacheu e recolheu seguidamente a Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso.

A BCAÇ 4615/73 foi mobilizado pelo RI 16. Partida: 22/9/1973; regresso: 8/9/1974; sede: Teixeira Pinto, comandante: ten cor inf Nuno Cordeiro Simões. A 1ª C/BCAÇ 4615/73., por sua vez, esteve  sempre no Cacheu; comandantes: cap mil cav Germano de Amaral Andrade; cap mil inf António Miguel Seabra Nunes da Silva; e cap mil inf  Carlos José da Conceição Nascimento.


Fichas de unidade > Batalhão de Caçadores n." 3863

Identificação: BCaç 3863
Unidade Mob: RI 1 - Amadora

Cmdt: TCor Inf António Joaquim Correia | 2.° Cmdt: Maj Inf Joaquim Abrantes Pereira de Albuquerque | Maj Inf João José Pires
OInfOp/Adj: Maj Inf João José Pires (acumulava)

Cmdts Comp:

CCS: Cap SGE Manuel Ferreira de Amorim

CCaç 3459: Cap Mil Inf António Mendes Robalo da Silva | Cap Mil Inf Joaquim Mendes Teixeira Ribeiro

CCaç 3460: Cap Mil Inf Fernando Manuel de Araújo Lacerda Morgado

CCaç 3461: Cap Inf Abílio Dias Afonso | Cap Mil Inf Aires da Silva Gouveia

Divisa: "Honra e Glória"

Partida: Embarque em 16Set71; desembarque em 22Set71 | Regresso: Embarque em l6Dez73

Síntese da Actividade Operacional

Após realização da IAO, de 27set71 a 230ut71, no CIM, em Bolama, seguiu para o sector de Teixeira Pinto, em 240ut71, a fim de efectuar o treino operacional e a sobreposição com o BCaç 2905.

Em 24nov71, assumiu a responsabilidade do referido Sector 05, com sede em Teixeira Pinto e abrangendo, então, apenas o subsector de Teixeira Pinto, com subunidades instaladas com as sedes em duas áreas diferentes, em Bassarel e Teixeira Pinto. 

Em 01fev73, por transferência do CAOP 1 para outra área (Mansoa), o sector voltou a integrar os subsectores de Bachile e Cacheu. 

A partir de meados de set73, as áreas de Teixeira Pinto e Bassarel foram individualizadas e consideradas subsectores distintos. As suas subunidades mantiveram-se integradas no dispositivo e manobra do batalhão, com excepção, inicialmente, da CCaç 3460.

Desenvolveu prioritariamente uma actividade de controlo, coordenação e segurança dos trabalhos dos reordenamentos das populações e sua promoção socioeconómica, a par de constante vigilância e acções de patrulhamento e segurança de itinerários tendentes a impedir eventuais acções inimigas sobre as populações e respectivos aldeamentos.

Dentre o material capturado mais significativo, refere-se 1 morteiro e 1 espingarda.

Fonte: Excertos de Portugal. Estado-Maior do Exército. Comissão para o Estudo das Campanhas de África, 1961-1974 [CECA] - Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974). 7.º volume: Fichas das Unidades. Tomo II: Guiné. Lisboa: 2002,. pág. 157