segunda-feira, 21 de novembro de 2022

Guiné 61/74 - P23800: Memória dos lugares (445): O Xitole que eu conheci em 1971/72, no tempo da CART 3492 / BART 3873 e do "tio" Jamil Nasser (Joaquim Mexia Alves)


Foto nº 1



Foto nº 2


Foto nº 3


Foto nº 4



Foto nº 5


Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) > Xitole > 6 de abril de 1972  > Um almoço de chabéu que o Jamil (fotos nºs 1 e 4)  me ofereceu no dia dos meus anos,  precisamente no alpendre da frente da sua casa (Fotos nºs 2 e 3). .Foram convidados o Capitão Godinho e a sua mulher, bem como os alferes da companhia a que se juntou , por ter vindo em coluna do Saltinho,  o alf Armandino (meu camarada de curso de Operações Especiais), que veio a falecer escassos dias depois na célebre emboscada do Quirafo  [em 17 de abril de 1972]. Está sentado na ponta da mesa, juntamemte  com  o Chefe de Posto (Foto nº  2 e 4, aqui junto ao cap Godinho)..

Fotos (e legendas):  © Joaquim Mexia Alves  (2022). Todos os direitos reservados.Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné > Zona leste > Região de Bafatá >  Setor L1 (Bambadinca) > Xitole > c. 1970 > Uma coluna logística, vinda de Bambadinca, chega a Xitole, atravessando a ponte dos Fulas, sobre o rio Pulom, ao fundo. A viatura civil, em primeiro plano, podia muito bem ser do nosso conhecido comerciante libanês Jamil Nasser, amigo de alguns dos nossos camaradas que passaram pelo Xitole, como foi o caso do Joaquim Mexia Alves.  Nessas colunas logísticas integravam-se viaturas civis de diversos comerciantes da zona leste. Foto do álbum de Humberto Reis, ex-fur mil op esp, CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71).


Foto (e legenda):  © Humberto Reis (2006). Todos os direitos reservados.Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem do Joaquim Mexia Alves, ex-alf mil op esp / ranger, CART 3492/BART 3873, (Xitole/Ponte dos Fulas); Pel Caç Nat 52, (Ponte Rio Udunduma, Mato Cão) e CCAÇ 15 (Mansoa), 1971/73, régulo da Tabanca do Centro (Monte Real):

Data - 21 nov 2022 10:09

Assunto . - Xitole: Serração do sr. Henrique Martinho, amigo do Jamil, que deixou a Guiné em 1962 (*)

Caro Luís

Como sabes o Jamil e eu tínhamos uma forte relação de amizade. Tratava-o muitas vezes por Tio Jamil! (**)

Enquanto estive no Xitole, praticamente todos os dias ia a casa do Jamil ao fim da tarde e, sentados no seu alpendre, bebíamos whisky com água Perrier acompanhado de bocados de tomate só com sal.

Ele ouvia as notícias em árabe e comentava comigo o que se ia passando no seu Libano.

Tenho para mim que a casa que na foto tem o alpendre em ruínas, era a casa do Jamil, só que essa vista é de lado ou seja é do lado que dava para o quartel e assim o David Guimarães terá razão.

A frente da casa tinha a continuação desse alpendre e dava para a estrada que vinha de Bambadinca.

Do outro lado da estrada, mais ou menos em frente da casa, e um pouco afastado da estrada, ficava o armazém de venda do Jamil, que poderia muito bem ter sido a tal serração de que fala Maria Augusta Martinho Antunes.

Anexo fotos de um almoço de chabéu que o Jamil me ofereceu no dia dos meus anos em 6 de abril de 1972, precisamente no alpendre da frente da sua casa. Foram convidados o Capitão e a sua mulher, bem como os Alferes da Companhia a que se juntou por ter vindo em coluna do Saltinho o Alf Armandino, (meu camarada de curso de Operações Especiais), que veio a falecer escassos dias depois na célebre emboscada do Quirafo, sentado na ponta da mesa, e também o Chefe de Posto.

A minha amizade com o Jamil era tal que numas férias da Guiné em Lisboa, por coincidência ele estava também em Lisboa, (ficava num hotel encostado ao então cinema Tivoli, Hotel Condestável?), e então fomos almoçar juntos, se bem me lembro.

Depois perdi completamente o rasto ao Jamil Nasser, mas a sua amizade e a sua companhia foram um bálsamo naqueles primeiros meses de Guiné.

Podes, obviamente, servir-te deste email para o que quiseres.

A foto nº 4 somos o Jamil e eu no dia do almoço.

Um abraço para ti e para todos do
Joaquim Mexia Alves

_____________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 20 de novembro de 2022 > Guiné 61/74 - P23799: Memória dos lugares (444): Xitole, onde cresci desde bebé até 1957, quando vim para a metrópole estuda... O meu pai, Henrique Martinho, tinha lá uma serração, e era amigo do comerciante libanês Nasser Jamil... (Maria Augusta Martinho Antunes)

domingo, 20 de novembro de 2022

Guiné 61/74 - P23799: Memória dos lugares (444): Xitole, onde cresci desde bebé até 1957, quando vim para a metrópole estudar. O meu pai, Henrique Martinho, tinha lá uma serração, e era amigo do comerciante libanês Nasser Jamil... (Maria Augusta Martinho Antunes)


Guiné > Xitole > 1970 > Vista aérea do Xitole (aquartelamento, posto administrativo e tabanca), ao tempo da CART 2716 (Xitole, 1970/72)

Foto (e legenda): © Humberto Reis (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Comentário do David J. Guimarães (ex-fur mil at inf MA, CART 2716 / BART 2917, Xitole, 1970/72)

(...) "Esta foto aérea terá se ser comparada com outras, que eu tirei em 2001, já publicadas na página do Xitole, e que identificam os edifícios que ainda existem (ou exitiam). Vamos lá descrever o que vejo, possivelmente a bordo de uma DO 27 não sei, deverá ser...

"Da direita para a esquerda, os edifícios: em primeiro lugar, a cozinha das praças notando-se na esquina um abrigo subterrâneo - era nesse abrigo que dormia parte do 4º Grupo de Combate... 

Depois andando mais para a esquerda vemos outro abrigo e depois uma casa civil - era a casa do Chefe de Posto, hoje ainda existente... 

"Continuando, vemos uma casinha pequenina e à frente outro abrigo - aí era o ninho de um dos morteiros 81 e o abrigo da secção de armas pesadas que lá se encontrava...

"Depois mais à frente aparece um grande abrigo - sei que lá se instalava parte do 1º Grupo de Combate... 

"Continuando mais à frente vê-se uma casinha pequenina - era a capela da companhia (tenho eu que enviar uma fotografia onde eu estou na frente). Notem agora uma arvore frondosa - é a árvore grande ainda hoje existente - da parte de vê-se outro abrigo: também ele com o resto do 1º Grupo de Combate... 

"Por detrás da capela e debaixo dessa árvore grande verde, é exactamente o bar do soldado, aquele bar onde o Humberto e o Levezinho se encontram a conversar em fotografia que vem mais abaixo, neste poste...

"Mais à esquerda vemos outra árvore de bom porte: é o local da porta de armas... Seguindo agora desse modo no sentido da pista, vemos um edifício escuro: é a Oficina Mecânica, o depósito de armamento, enfermaria, etc... 

"Caminhamos mais para a direita e novo edifício e abrigo - messe e abrigo dos oficiais... Antes e bem junto nota-se para lá qualquer coisa: ninho da metralhadora Breda e abrigo... 

"Mais para à direita casa dos oficiais, surge então a sala de operações, a messe dos sargentos, a secretaria etc... Deixamos esse edifício comprido e logo vemos outro: depósito de géneros.... 

"Mais à frente e com árvores notam-se edifícios: são casas de banho... Mais um abrigo voltado para a pista e mais uma arrecadação... Enfim, era por ali que se instalou também e já coberto pelas árvores o ninho do morteiro 10.7 ...

"E estamos muito perto do ponto de partida, a cozinha dos soldados.... Aí existia outro abrigo idêntico àquele que se situa ao lado da cozinha... Bem ao fundo nota-se então a pista dos aviões e um quadrado bem definido que é o heliporto....

"Toda a área circundante ao quartel antes da pista tinha uma vala, como era de esperar.... Ela percorria toda a zona habitável do aquartelamento...

"Agora bem à esquerda do aquartelamento aí está o Xitole civil ... Em frente à pista e do lado do heliporto nota-se um trilho que nos levava à Ponte Marechal Carmona... 

"Pelo fundo da pista nota-se uma estrada que vai dar à que segue para o Saltinho... Pela frente e na zona mais arborizada existe um complexo: era onde havia um poço... 

"Mais à esquerda sim, e quem sai da porta de armas, vê-se uma estrada - bem à esquerda da fotografia... Exactamente era por aí que entravam as colunas logísticas que vinham ao Xitole" (...)


Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Xitole > 2001 > Restos do aquartelamento e povoação de Xitole. "Um antigo armazém do comerciante libanês Jamil Nasser", diz o David Guimarães. A nossa leitora, Maria Augusta Martinho Aunbtubes, que viveu aqui nos anos 40/50 antes de ir estudar para a metrópole, em 1959, diz que erradamente aqui no nosso blogue esta casa  "é referenciada como sendo um antigo armazém do sr. Jamil"... Pelo contrário,  foi "feita pelo meu pai e os trabalhadores da serração", e nela nasceram dois seus irmãos... O Jamil era visita assídua da casa. È possível que o c
omerciante libanês a tenha ocupado, no início da guerra, sob recomendação do pai da nossa leitora, que deixou o Xitole em 1962.   


Guiné-Bissau > Região de Bafatá  > Xitole  > 2001 > Restos do aquartelamento e povoação de Xitole > O antigo depósito de géneros: onde se guardava a bianda e o tudo o mais que era necessário à sobrevivência de uma companhia... O Xitole era abastecido através de colunas logísticas vindas de Bambadinca


Guiné-Bissau > Região de Bafatá  > Xitole  > 2001 > Restos do aquartelamento e povoação de Xitole > O David Guimarães, ao que parece erradamente,  diz que esta era a antiga casa do comerciante libanês,  com alpendre já em ruínas... A Maria Augusta Martinho Antunes tem outra versão:  "
não era nenhuma daquelas mencionadas no álbum de fotografias do Xitole, mas sim uma casa que ficava no cruzamento da estrada que, vinda de Bambadinca, passava pelas nossas e à entrada do Xitole virava para a estrada do Saltinho" (*).


Guiné-Bissau > Região de Bafatá  > Xitole  > 2001 > Restos do aquartelamento e povoação de Xitole >  A antiga casa do chefe de posto, vista do lado da parada do aquartelamento.


Guiné-Bissau > Região de Bafatá  > Xitole  > 2001 > Restos do aquartelamento e povoação de Xitole > Uma das árevores de grande porte. A direita os antigos aposentos dos oficiais.

Fotos (e legenda): © David J. Guimarães (2005). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
 

1. Mensagem, com data de 28/4/2022, 16:56, assinada por Maria Augusta Martinho, leitora do nosso blogue (e que nos chegou por via do Formulário de Contacto do Blogger). Descornimos que se trata de uma "amiga do Xitole", que já há largos anos nos contactou, sob o nome de Maria Augusta Antunes (*)-

Nascida em 1948, no concelho de Tomar, emigrou ainda bebé com os pais para a Guiné, donde regressou aos 12 anos, para estudar. Era filha de Henriqe Martinho, com serração no Xitole. O seu nome completo é Maria Augusta Antunes Martinho. Antunes deve ser apelido de casamento.

O Jorge Cabral identificou-a como mãe da sua aluna, Marta. Nunca chegou a responder ao nosso convite para integrar a Tabanca Grande.  Não nenhuma foto sua nem do tempo  em que viveu no Xitole, nos anos 40/50. Os pais deixaram o Xitole, por causa da guerra, em 1962 (*).

 
De quando em vez, venho aqui à Tabanca matar saudades... Não sei que feitiço aquele chon tem em nós.

Obrigada por me proporcionarem uns bocadinhos de boas memórias. 

Não nasci no Xitole, mas vivi lá desde bebé até 1957 quando vim para a metrópole para estudar.

 Lá nasceram dois dos meus irmaõs, mas um, o Luis Manuel ficou para sempre lá por altura do Natal de 1954. Está sepultado em Farim.  Veio o Zeca que nasceu em outubro de 1955 de quem o sr. Jamil era padrinho, e continua felizmente connosco. 

Esses dois meus irmãos nasceram no Xitole na casa feita pelo meu pai e os trabalhadores da serração, o meu pai trabalhava com o sr. Pires e também com o sr. Toscano de Almeida. 

Erradamente aqui na Tabanca  Grande [essa casa ] é referenciada como sendo um antigo armazém do sr. Jamil. (Não sabemos se ele a ocupou depois do meu pai embarcar para Portugal Continental.) 

Havia, sim, um armazém também feito nessa época, para guardar o arroz que servia de complemento de pagamento para os empregados nativos que trabalhavam na serração.

E sim, sr. Luis Graça, tem razão a casa do sr Jamil, que era libanês e visita assidua de nossa casa e nós da dele, tinha efectivamente um alpendre onde ele gostava de tomar uma bebida com os amigos e o meu pai viciou-o no tomate com sal, que usávamos muito na nossa aldeia, e o meu pai mandava plantar e colher numa horta que mandou fazer junto da serração e que, além de mancarra, tinha também muitos ananases. 

Se não estou em erro era a primeira casa com um muro e com uma escada com poucos degraus aonde estava o gerador... e ficava na estrada que seguia para o Saltinho... Será??? 

Já cá não tenho os meus pais,  infelizmente,  para lhes perguntar. O meu pai faleceu com a Guiné na garganta, gostaria de ter lá voltado mas não foi possivel devido à guerra.

Atravessamos muitas vezes uma mas não me recordo do nome e também na jangada.
Também o meu tio João Martinho esteve muitos anos estabelecido em Nhacra e trabalhava para o sr Toscano. O outro meu tio por afinidade tambem ai ficou sepultado depois de ter sido atropelado por um nativo e ficar colado a um bissilon.

Tenho muitas saudades do Xitole que deixei, e tenho conhecimento que por ai ficou também um irmão que o meu pai nos deu, mas que nunca conhecemos, que julgo ter nascido em 1957/8... 

Sabe Deus se ainda a vou visitar ou se devo continuar com a ideia da linda terra que deixei , pois temo apanhar uma grande desilusão com o Xitole actual.

Desculpem a maçada, mas a saudade tem destas lamechices. Boa tarde a todos. (**)



Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Xitole > Janeiro de 2006 > Casa, em ruínas,  de Jamil Nasser, comerciante de origem libanesa. Fotos do Dr. Rui  Fernandes, médico.

Fotos: Cortesia de  © Rui Fernandes / Carlos Silva  (indelizmente a página do Carlos Silva já n
ão está disponível "on line": http://carlosilva-guine.i9tc.com/ )


Guiné >Região de Bafatá > Carta de Xitole (1955) (Escala 1/50 mil) > Posição relativa do Xitole, na margem direita do Rio Corubal, na estrada Bambadinca - Saltinho - Aldeia Fomosa... Era então posto administrativo, possuindo  serviços sanitários e telegráfico-postais... Sinalizam-se também as ruinas da antiga ponte sobre o rio Corubal e os rápidos de Cusselinta.

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2022)
__________

Notas do editor:

(*) Vd. postes de:

7 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6549: O Nosso Livro de Visitas (92): O Xitole que eu e os meus pais conhecemos até 1962 (Maria Augusta Antunes, filha de Henrique Martinho, antigo madeireiro)

(...) Sou Maria Augusta Antunes Martinho, e fui para a Guiné ainda bebé com a minha mãe e irmão ao encontro do meu pai, Henrique Martinho, madeireiro e colono então no Cumeré.

Mais tarde montaram a serração no Xitole, para onde nos mudamos. Com o meu pai estava também o sr. Pires. Fizeram ambos as suas casas de raíz e também a casa aonde guardavam o arroz e o sal, que faziam parte do pagamento do trabalho diário dos negros, trabalhadores da serração.

Pois a razão deste mail é exactamente o desejo que tenho de corrigir uma informação do seu blogue.

Na verdade, a casa do sr. Jamil (se a memória não me trai, de seu nome completo Jamil Nene Nasser), compadre dos meus pais, (pois foi o padrinho de baptizado de um dos meus irmãos, nascidos naquela casa), não era nenhuma daquelas mencionadas no álbum de fotografias do  Xitole, mas sim uma casa que ficava no cruzamento da estrada que, vinda de Bambadinca, passava pelas nossas e à entrada do Xitole virava para a estrada do Saltinho. Vi a verdadeira casa do sr. Jamil no blogue do sr. Carlos Silva. Como eu a conheço bem!

Quando em 1962 o meu pai veio da Guiné, pediu ao compadre Jamil que olhasse pela casa na esperança de um dia voltar e para evitar ela ser ocupada pelos negros. Assim também sucedeu com a do Sr. Pires.

Vivi e cresci a ouvir falar da Guiné. Transmito isso aos meus filhos e neto. Os meus queridos pais faleceram sem lá poder voltar. Mas isso são outras histórias.....

Como deve calcular posso falar do sr. Jamil, pois que era visita constante de nossa casa.
Se estiver interessado dar-lhe-ei os pormenores que souber.

A minha casa é a que tem os 2 anexos juntos, um era a cozinha e a casa aonde o meu pai punha a caça quando vinha do mato, e o outro era a casa de banho. (...)

Vd. também postes de:

Guiné 61/74 - P23798: Os nossos seres, saberes e lazeres (541): Trabalhos de pintura da autoria de Jaime Machado, ex-Alf Mil Cav, CMDT do Pel Rec Daimler 2046 (7)



1. Publicamos hoje mais cinco trabalhos de pintura de autoria do nosso camarada Jaime Machado, ex-Alf Mil Cav, CMDT do Pel Rec Daimler 2046 (Bambadinca, 1968/70), enviados ao nosso blogue em 19 de Novembro de 2022,  que estamos a mostrar na série "Os nossos seres, saberes e lazeres".

Lírios: acrílico sobre papel 30x42
Cidade: acrílico sobre papel 30x42
Paisagem: pastel de óleo sobre papel 30x42
Abstrato: acrílico sobre papel 30x42
Abstrato: acrílico sobre papel + colagem 30x42
____________

Notas do editor:

Vd. poste anterior de 25 DE OUTUBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23737: Os nossos seres, saberes e lazeres (535): Trabalhos de pintura da autoria de Jaime Machado, ex-Alf Mil Cav, CMDT do Pel Rec Daimler 2046 (6)

Último poste da série de 19 DE NOVEMBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23797: Os nossos seres, saberes e lazeres (540): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (77): De Sines para Miróbriga, de Miróbriga para o Badoca Safari Park (Mário Beja Santos)

sábado, 19 de novembro de 2022

Guiné 61/74 - P23797: Os nossos seres, saberes e lazeres (540): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (77): De Sines para Miróbriga, de Miróbriga para o Badoca Safari Park (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 5 de Outubro de 2022:

Queridos amigos,
A idade não perdoa, sou cada vez mais confrontado com o desaparecimento de papéis, notas de leituras, esqueço-me de certas viagens e subitamente abro a pasta das imagens e fico de boca aberta, como foi possível ter-me esquecido daqueles dias na região de Sines, um imperativo por vontade soberana da neta. E, pior do que tudo, deve estar afundado entre toneladas de papel, o amontoado de brochuras que, isso sim, não deixo de trazer em qualquer surtida, são textos e imagens que sempre ajudam, paciência, escarafuncha-se até aos escaninhos da memória. Confesso que tive imenso prazer em encontrar as imagens da visita ao Museu do Tesouro Real e ao Museu da Presidência, a seu tempo, e sempre com a maior satisfação, aqui se lavrará o relato.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (77):
De Sines para Miróbriga, de Miróbriga para o Badoca Safari Park

Mário Beja Santos

A região de Sines é paragem obrigatória na vilegiatura, decisão irrefragável da neta. Encontra-se pouso, a escassos quilómetros de Sines, no Paiol, assim que a neta vê que há uma piscina secreta que a água do mar é muito fria, é por ali que ela quer esvoaçar, como aconteceu, sai-se pouco, sobretudo para amesendar no inesquecível tasquinho da Anabela, sempre disponível para fazer tomatada, açorda, pratinhos especiosos com bacalhau. Pré-adolescente, a neta exige negociar qualquer saída, seja a Porto Covo seja a Sines. Condescende, aceita passear-se na cidade, aprecia o Centro de Artes e visitar o amigo Joaquim na livraria, como aconteceu.

Centro de Artes de Sines/Biblioteca Municipal de Sines, obra do Atelier Aires Mateus & Associados

É nessa atmosfera de negociação, a neta pôs ênfase em visitar o Badoca Safari Park, sugestão arrematada, foi a vez do avô pôr uma contraposição, visitar Miróbriga, há para ali uma estrada poeirenta que sai do Paiol até Santiago do Cacém, um salto até Miróbriga. Exigem-se explicações, lá estás tu a pores-me nesses enfiamentos de pedra, houve que explicar que Miróbriga não só é um dos sítios arqueológicos melhor preservados da região como guarda indícios da Idade do Ferro, o período romano está pujantemente marcado, e posteriormente há ali fortes indícios das chamadas invasões bárbaras. Fala-se do génio romano, um dos pilares da nossa cultura e da nossa civilização, vais ver, neta, a natureza dos pavimentos, a organização do espaço doméstico, o gosto pelas termas, os santuários, a região do fórum, um ponto de encontro. Bom, vamos lá dar esse passeio, depois quero lanchar. E aqui ficam as imagens destes caminhos, alguns parece que foram acabados ontem, obviamente que este arvoredo é decoração posterior, é impressionante este legado da zona termal, circunda-se todo este vasto património até se chegar à ponte romana, para minha surpresa a neta não se cala e faz perguntas sobre as águas quentes e frias, a vida social nas termas, a higiene como imperativo civilizacional romano. Parece que fica satisfeita com as respostas.
Temos agora uma subida até uma área habitacional e ao fórum, há vestígios de pintura numa casa, toca de os registar, temos depois registos de dedicatórias, os romanos caracterizaram-se pelas suas memórias deixadas em lápides, e aqui se mostra também o que fica do fórum. A neta põe perguntas intrigantes, porque é que se fixaram aqui?, havia minas?, donde vinham estes romanos?, disfarço a resposta lembrando-lhe que a cidadania romana se estendeu a povos fora da Península Itálica, que aquela Itálica que ela viu escrita no registo ao cidadão Gaio Ágrio Rufo tinha a ver com a Itálica que é junto a Sevilha, que houve imperadores nascidos no que é hoje a Croácia, também na Hispânia ou na Líbia, lembro-lhe Troia, a que fica perto de Setúbal, donde saía muito peixe em salmoura para todas as regiões do império. Terá ficado satisfeita com a resposta. E depois de visitarmos Santiago do Cacém, a neta apresenta a fatura, quer ir ao circo e ao Badoca Safari Park. Como aconteceu.
(continua)
____________

Notas do editor

Poste anterior de 12 DE NOVEMBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23778: Os nossos seres, saberes e lazeres (538): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (76): Do Luso para o Bussaco (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 15 DE NOVEMBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23786: Os nossos seres, saberes e lazeres (539): Pêro Alvito e Pedro Alvito, ou, Pêro Alvito é Pedro Alvito? (José Martins)

Guiné 61/74 - P23796: Recordando o Amadu Bailo Djaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015), um luso-guineense com duas pátrias amadas, um valoroso combatente, um homem sábio, um bom muçulmano - Parte IX: "Amadu, que vamos fazer ao puto ?"... "Meu alferes, vou levá-lo para Bafatá, a minha irmã cuidará dele!"... A história do puto, "turra", Malan Nanque, que o Amadu salvou e adotou como sobrinho...

 


Angola > CIC - Centro de Instrução de Comandos > 1963  > O alferes mil Maurício Saraiva em Angola, em 1963, aquando da frequência do curso de Cmds; No CTIG  será depois promoviodo, por mérito, a tenente e a capitão.. (*)





Guiné > Brá > Comandos do CTIG > Junho de 1965 > Cap Mil 'Comando' Maurício Saraiva > Idolatrado por uns, odiado por outros, foi um mal amado, diz o Virgínio Briote... O Amadu Djaló, por sua vez,  foi um dos oito "negros" (sic) - a par do Marcelino da Mata, do Tomás Camará e outros - a participar "no 1º curso de quadros para os Comandos do CTIG", que teve início em 3 de Agosto de 1964  (Amadu Bailo Djaló - Guineense, Comando, Português. Lisboa: Associação de Comandos, 2010, p. 82). O seu primeiro comandante, no Grupo Fantasmas, foi o Alferes Saraiva (entretanto promovido a tenente e depois capitão).



Guiné > Brá > Comandos do CTIG > c- 1964 > Emblema de braço do Grupo Fantasmas, que pertenceu ao alferes  'mil comando ' Saraiva.  


Fotos (e legendas): © Virgínio Briote (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné > Região de Bafatá > Sector L1 ( Bambadinc) > Xime > Porto fluvial

Foto cedida por Torcato Mendonça


1. Continuamos a reproduzir excertos das memórias do Amadu Djaló, que a morte infelizmente já nos levou, há 7 anos,  em 2015, ainda antes de completar os 75 de idade.  Os seus filhos, por sua vez, vivem (ou viviam até há uns anos) no Reino Unido.

A fonte continua a ser o ser livro "Guineense, Comando, Português" (Lisboa, Associação de Comandos, 2010, 229 pp.), de que o Virgínio Briote nos disponibilizou o manuscrito em formato digital. A edição, que teve o apoio da Comissão Portuguesa de História Militar, está há muito esgotada. E muitos dos novos leitores do nosso blogue nunca tiveram a oportunidade de ler o livro, nem muito menos o privilégio de conhecer o autor, em vida.


O nosso coeditor jubilado, Virgínio Briote (ex-alf mil, CCAV 489 / BCAV 490, Cuntima, jan-mai 1965, e cmdt do Grupo de Comandos Diabólicos, set 1965 / set 1966) fez generosa e demoradamente as funções de "copydesk" (editor literário) do livro do Amadu Djaló, ajudando a reescrever o livro, a partir dos seus rascunhos.

Temos vindo a introduzir pequenas correcções,  toponímicas e outras, ao texto  impresso, a ter em conta numa eventual (se bem que pouco provável) 2ª  edição.  Mantemos a ortografia original.

Recorde-se, aqui o último poste: o sold cond auto Amadú Djaló (1940-2015) alistou-se nos comandos do CTIG, a convite do alferes mil 'comando' Maurício Saraiva, angolano. Frequentou o 1º Curso de Comandos da Guiné, que decorreu entre 24 de Agosto e 17 de Outubro de 1964. 

 Deste curso fizeram parte 8 guineenses: além do Amadu Djaló, o Marcelino da Mata, o Tomás Camará e outros. Deste curso sairam ainda  os três primeiros grupos de Comandos, que desenvolveram a actividade na Guiné até julho de 1965: Camaleões, Fantasmas e Panteras

O Amadu passou a pertencer ao Grupo Fantasmas, comandado pelo alf mil 'comando' Maurício Saraiva. Logo no fim do curso, os três grupos participaram na primeira operação, a Op Confiança, realizada entre 25 de Outubro e 4 de Novembro de 1964 no Oio,   na área atribuída ao BCav 705, tendo por objectivo a reabertura do itinerário entre Mansabá e Farim.

  


Capa do livro de Bailo Djaló (Bafatá, 1940- Lisboa, 2015), "Guineense,  Comando, Português: I Volume: Comandos Africanos, 1964 - 1974", Lisboa, Associação de Comandos, 2010, 229 pp, + fotos, edição esgotada.


A história do puto "turra" do Buruntoni, Xime, de nome Malan Nanque

(pp. 90-94)

por Amadu Bailo Djaló



Dias depois, nova saída, para Buruntoni, no Xime. Saímos de Bissau, de barco, para o Xime.

Logo que chegámos, instalámo-nos no quartel, até ao fim do jantar. Forneceram-nos um guia e marchámos directos a Burontoni.

Nesta operação [1], eu ia integrado na 3ª equipa, a meio do grupo. Toda a noite a andar, a corta-mato. Perdermo-nos já era uma sina, andámos, sempre com o guia à frente, sem darmos com o caminho que nos levava para o acampamento. Quando chegámos à zona, o sol ia alto, eram para aí 7h00 [2].

Encontrámos um rapazito de 8 ou 9 anos. Interrogado disse que ia para o campo de lavra dos pais. Sobre o acampamento da guerrilha que procurávamos[3], disse que ficava na outra margem do rio Burontoni. Seguimos até à margem. O alferes ia falando com ele, fazendo-lhe perguntas. Se o acampamento tinha pessoal, respondeu que nessa manhã, o Suleimane Djaló tinha avisado a população para abandonar o acampamento, porque tinha andado uma avioneta a sobrevoar e isso não era bom sinal, que podia acontecer qualquer coisa a todo o momento. 

Sobre o local, onde costumava ficar a sentinela, o rapazito disse que ficava atrás de nós. Então, o alferes deu instruções para voltarmos atrás, para ver se conseguíamos apanhar a sentinela.

O alferes Saraiva passou para a frente e fomo-nos aproximando do local, onde julgámos que ela estava. Estava numa árvore. O alferes abriu fogo e ele caiu imediatamente. Corremos para ele, e quando lá chegámos já estava moribundo. 

Com a arma do sentinela nas nossas mãos, continuámos a marcha para o Xime, até que demos com uma tabanca abandonada, que se chamava Gundagué Beafada

Perto deste local encontrámos a tropa de Bambadinca que estava com a missão de nos recolher. Encontrei alguns companheiros da minha incorporação e, quando estava a abraçá-los vi o alferes, de arma ao ombro, e o menino com a mão na nuca, de olhar fixo no alferes. Cheguei-me para junto do alferes e ele disse-me:

– Amadu, que vamos fazer ao puto?

– Levá-lo, meu alferes?

– Ele é turra, Amadu!

– O meu alferes tem mais formação e conhecimento que eu, mas parece-me que com esta idade, o menino não é inimigo nem amigo.

– Então, por que vivia no mato, Amadu?

– Porque os pais vivem no mato, meu alferes!

– E tu, o que queres fazer com ele, Amadu?

– Deixamo-lo no quartel de Bambadinca.

O capitão da companhia de recolha estava junto de nós. O alferes perguntou se eles queriam ficar com o miúdo. Negativo, respondeu o capitão. O alferes ficou a olhar para mim e eu disse:

– Levamo-lo connosco para o quartel. Se o meu alferes não quiser que ele fique no quartel, eu fico com ele na minha casa.

– Não tens mulher, como é que vais tomar conta dele?

– A minha irmã toma conta!

– Tens a certeza, Amadu? Fica à tua responsabilidade!

– Inteiramente, meu alferes.

Agarrei no menino e começámos a andar até ao Xime e depois para Bambadinca.

Em Bambadinca, eram para aí 18h00, estava um barco no cais, a preparar-se para partir para Bissau. Aproveitámos o transporte no barco que ia carregado com laranjas, limões, ananás, bananas, muita fruta. Mas não era o que nós precisávamos, o que nos fazia falta era uma refeição quente.

O barco levava também batata-doce e abóboras. O furriel Artur tinha só 5 escudos e o alferes, que tinha uma nota de 500 escudos, pediu para lhe venderem batata-doce e abóboras, ao preço que se vendiam em Bissau. A batata-doce era vendida ao quilo, a abóbora era conforme o tamanho. Começámos a pesar as batatas e ninguém no barco tinha troco. Então, nós dissemos que, logo que chegássemos a Bissau, no dia seguinte um de nós ia ao mercado pagar. Mas não aceitaram.

Então pedimos uma panela grande, descemos ao porão e pusemo-nos a cozinhar a abóbora que tínhamos comprado. Mas uma abóbora não dava para o grupo todo. Enquanto o cabo Cruz, sentado em cima de um saco, cantava fados, íamos roubando batatas, uma a uma. Quando o Cruz assobiava parávamos de tirar batatas e assim fomos enchendo a panela. Quando o cozido ficou pronto, chamámos o grupo todo para comer.

Eram para aí 21h00 quando acabámos. Quando chegámos a Brá, já depois da meia-noite, ainda comemos uma refeição quente, de peixe cozido e depois retirei-me para a minha casa.

Eu estava muito satisfeito comigo próprio e com o alferes. Assim que ele aceitou o meu pedido de ficar com o miúdo, que se chamava Malan Nanque [4], um companheiro europeu do meu grupo, o Mendes, que tinha apanhado uma maleta com quatro cortes de fazenda, ofereceu-ma para fazer roupa para o rapazito. 

Quando chegámos a Bissau, levei-o ao alfaiate, e os cortes de tecido deram para fazer 3 calções e 2 camisas. Ainda lhe comprei um par de sapatos e uns chinelos.

Agora, que estou a escrever e a recordar este episódio, tenho os olhos húmidos. Estou a ver o miúdo à frente da arma com a mão na nuca, a tremer todo, a olhar para o matador. Ele, o menino, tinha acabado de ver o alferes matar a sentinela e devia pensar que agora era a vez dele. (**)

(Continua)

__________

Notas do autor Amadu Djaló e/ou do "copydesk" Virgínio Briote:


[1] Nota do editor: “Vai à Toca”

[2] Nota do editor: 11 de Novembro de 1964

[3] Em Darsalame Baio

[4] O rapazito, Malan Nanque, biafada, mudou de apelido, para poder frequentar a escola. Passou a ser meu sobrinho e viveu com a minha família em Bafatá. Durante muitos anos ninguém da nossa família soube que o Malan Djaló era o miúdo que tinha sido capturado pelos Fantasmas, numa manhã de Novembro de 1964.

Anos depois, em 1973, levei-o a ver a mãe, em Bissau. Mas Malan continuou a viver na nossa casa. Uns anos mais tarde, já com a Guiné independente, deu aulas de português em quartéis do PAIGC. Casou, teve um filho, adoeceu e morreu pouco tempo depois no hospital de Bafatá. O único filho que teve, uma menina, também sobreviveu pouco tempo. Morreu, ainda não tinha dois anos.

__________

Notas do editor:

(*) Sobre o Mauricio Saraiva (1939-2003) e o seu Grupo Fantasmas, Vd.

24 de abril de 2013 > Guiné 63/74 - P11457: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (66): Cap Cmd Maurício Saraiva, aqui evocado pela sua sobrinha Luciana Saraiva Guerra (Florianópolis, Santa Catarina, Brasil) e pelo nosso coeditor Virgínio Briote

27 de abril de  2010 > Guiné 63/74 - P6257: O segredo de... (12): O meu sobrinho Malan Djaló, aliás, Malan Nanque, o rapazito de 8 ou 9 anos anos, apanhado pelo Grupo Fantasmas, do Alf Mil Comando Saraiva, em 11 de Novembro de 1964, em Gundagué Beafada, Xime... (Amadú Djaló

Ver o que escreveu, sobre o Maurício Saraiva,  o Luis Rainha,  em poste de 31 de marco de 2010, no blogue Comandos Guine 1964 a 1966 (que deixou de estar dospinível na Net, não está sequer no Arquivo.pt, o que é pena:  http://comandos-guine-1964a1966.blogspot.pt/ ):


(…) Não querendo menosprezar ninguém, até porque sou Comando Centurião, quero aqui afirmar que o Grupo  Fantasmas foi de todos os Grupos formados e existentes na Guiné que mais louvores e condecorações teve. Teve um Chefe excepcional, que foi um belissimo condutor de  homens, um guerrilheiro fantástico e um exímio estratega.

Foi ele, Capitão Maurício Leonel Sousa Saraiva, dos militares Portugueses mais condecorados de todos os tempos e quiçá dos tempos vindouros. Este Homem, de H grande, grande Português e grande Patriota, ainda estava para sofrer os horrores da guerra não convencional. (…) [Era] um homem tremendamente marcado pela guerra em Angola, onde assistiu à morte de Familiares seus. (…)

Sobre o seu comandante, com quem esteve nove meses (até Maio de 1965), e por quem nutria respeito, admiração e afecto, o Amadú Djaló é parco em pormenores, nomeadamente sobre aspectos, eventualmente mais controversos, do seu comportamento como homem e militar. 

Aliás, ele é, quase sempre, de uma grande discrição e até deferência em relação aos seus "companheiros europeus" (sic). Só é crítico quando vê "europeu" a tratar, com menos respeito, bajuda e mulher grande... 

Perante umn capitão manifestamente racista, que ele conheceu no CICA/BAC, em Bissau, em 1962 ("Preto é como tartaruga, só quando lhe chegamos fogo ao cu, é que tira cabeça!", p. 41), Amadú é condescendente, compreensivo e caridoso: "Pela minha parte, ele era um diabo, não era um ser humano. Um homem com tanta cultura, oficial do Exército Português, não deveria trata deste modo os subordinados", p. 41).

Guiné 61/74 - P23795: Parabéns a você (2116): Mário Migueis da Silva, ex-Fur Mil Rec Inf da CCS/QG/CTIG, BART 2917 e CCAÇ 2701 (Bissau, Bambadinca e Saltinho, 1970/72)

____________

Nota do editor

Último poste da série de 14 DE NOVEMBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23782: Parabéns a você (2115): César Dias, ex-Fur Mil Sapador Inf da CCS/BCAÇ 2885 (Mansoa e Mansabá, 1969/71); Jacinto Cristina, ex-Soldado At Inf da CCAÇ 3546/BCAÇ 3883 (Piche e Camajabá, 1972/74) e Enfermeira Maria Arminda Santos, ex-Tenente Enfermeira Paraquedista (1961/1970)

sexta-feira, 18 de novembro de 2022

Guiné 61/74 - P23794: Notas de leitura (1519): "O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume I: Eclosão e Escalada (1961-1966)", por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2022 (4) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 8 de Novembro de 2022:

Queridos amigos,
Temos agora o repositório das aeronaves que a FAP foi adquirindo (ou procurou adquirir) para as três frentes da guerra de África. Recordo que me limito à recensão de factos que reputo de relevantes, julgo não ter aqui cabimento entrar em detalhes técnicos, em que os autores são competentes e rigorosos. Temos aqui o histórico das compras, uma boa parte delas bem-sucedidas, recusas e tentativas de aquisições a vendedores privados.Com o andar da guerra, foram crescendo as dificuldades, noto como curiosidade que perto do 25 de Abril o ministro Rui Patrício parecia estar a ter sucesso na compra de aviões Mirage, nessa altura já estava adquirido um sistema de defesa antiaérea para Bissalanca, o Crotale, admitia-se a probabilidade de ataques aéreos, o Crotale fora o sistema aprovado. Com o 25 de Abril, foi revendido.

Um abraço do
Mário



O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974
Volume I: Eclosão e Escalada (1961-1966), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2022 (4)


Mário Beja Santos

Este primeiro volume d’O Santuário Perdido, por ora só tem edição inglesa, dá-se a referência a todos os interessados: Helion & Company Limited, email: info@helion.co.uk; website: www.helion.co.uk; blogue: http://blog.helion.co.uk/.

Depois de sumariar o prefácio, entrámos no primeiro capítulo intitulado “O Vento da Mudança”, verificaram-se as alterações operadas no início da era de descolonização e as consequências que vieram a ter na colónia da Guiné. Começou a luta armada na Guiné, já se verificou que a NATO se recusou em ceder meios, considerou que as guerras de África excediam a defesa atlântica; o que obrigou a uma reviravolta substancial das prioridades do regime na área da defesa. Referiu-se que em 1957, Kaúlza de Arriaga, então Subsecretário de Estado da Aeronáutica, ordenou à Força Aérea que se preparasse para a sua implantação em África. Em conformidade, a FAP iniciou em 1958 um conjunto de missões para determinar quais os requisitos organizacionais nos territórios africanos. Em 1960, o Conselho Superior de Defesa Nacional decidiu as prioridades no planeamento num contexto exterior ao da NATO. No que respeita à Guiné portuguesa, a missão fundamental das Forças Armadas tinha dois objetivos: manter a ordem e a paz no território e garantir, a todo o custo, a manutenção da nossa soberania. Articularam-se três prioridades imediatas: formação de uma eficaz vigilância interna e das fronteiras, deu-se o reforço da presença da PIDE; disseminação das forças de segurança ao longo das fronteiras e em pontos estratégicos; estreitamento da cooperação civil-militar.

Peixoto Correia, governador, assumiu o comando das duas companhias de infantaria e tinha o apoio de uma bateria de artilharia, meios manifestamente insuficientes para a nova realidade; o Estado-Maior recomendou o reforço imediato e foram despachados contingentes militares, entre eles um pequeno quadro de aviadores, paraquedistas e pessoal de apoio – eles irão travar a campanha aérea mais intensa da história de Portugal.

Entramos agora no segundo capítulo “Aviões com a Cruz de Cristo”. Os autores recordam que a FAP foi formalmente constituída em 1 de julho de 1952, tinha dois serviços, o Serviço Aeronáutico Militar e o Serviço de Aviação da Armada. Foram adquiridas aeronaves atribuídas a cinco aeródromos operacionais, perto de trezentos aviões, é explicada a natureza e a utilização de tais aeronaves, detalha-se a sua fixação em aeródromos e composição orgânica. A FAP foi afetada por lhe ter sido alocada um equipamento obsoleto, manifestamente inadequado para uma guerra aérea moderna, mesmo para padrões da década de 1950.

Como membro fundador da NATO, Portugal obteve acesso a novas fontes de material e a formação compatível. Chegaram em 1952 dois aviões britânicos de treino Havilland Vampire T.55; no ano seguinte, os EUA enviaram cem novos caças-bombardeiros F-84G, a FAP entrava na era do jato, criaram-se dois esquadrões, era na Ota e em Tancos que se dava instrução complementar. Em 1954, a FAP recebeu o seu primeiro helicóptero, um Sikorsky YH-19 Chickasaw e 65 aviões Sabre F-86F. Estas aquisições custaram cerca de 348 milhões de dólares, qualquer coisa com um quarto dos gastos da defesa de Portugal nesse período.

A FAP está nesta altura sob a tutela do Subsecretário de Estado da Aeronáutica Kaúlza de Arriaga, que também criou o Batalhão de Caçadores de Pára-quedistas. Apesar destas novas aquisições, era manifesto o atraso da FAP face aos seus homólogos da NATO, isto no final da década de 1950. Na verdade, a maioria das forças aéreas aliadas já voavam em aviões de combate supersónicos, Portugal tinha acabado de receber o F-86F que tinha sido o avião de caça mais usado na Guerra da Coreia. Estes F-86F chegaram a servir em África, bem como os F-84G. Eram estes os aviões que estavam na linha da frente em Portugal e na Turquia. Com a eclosão da guerra em Angola, em fevereiro de 1961, a FAP levou para Luanda os F-84G. Este contingente F-84G representou o primeiro destacamento operacional de aviões militares portugueses para a África, desde o período imediatamente a seguir à Primeira Guerra Mundial.

Com a guerra de África em três frentes, a FAP adaptou as aeronaves de que dispunha às necessidades operacionais. O PV-2 Harpoon foi despachado para África para combater a guerrilha. Vários modelos da família T-6 foram adaptados para transportar armamento ofensivo. À medida que a década de 1960 avançava, a FAP procurou melhorar as suas capacidades adquirindo novas aeronaves, mas manteve uma frota largamente obsoleta na guerra de África. O F-86 era um avião de sucesso, mesmo na era pós-1945. Os pilotos gostavam deste avião de caça pela sua agilidade. Foi muito importante na guerra da Coreia e mostrou-se superior ao MiG-15 soviético e mesmo sobre o MiG-17. Teve uma apreciável carreira, até se “aposentar” ao serviço da Força Aérea Boliviana, em 1994. Portugal adquiriu 65 aviões em segunda mão aos Estados Unidos e à Noruega, deu origem aos “Falcões”, sediados na base aérea de Monte Real, foram entregues como parte do rearmamento da NATO e destinados ao uso na “Área da NATO”, o que os excluía dos territórios africanos.

Centenas de milhares de aviadores norte-americanos e aliados aprenderam a voar em T-6 norte-americanos, chamados SNJ na Marinha dos EUA e Harvard no Reino Unido, no decurso da Segunda Guerra Mundial. Com licença dos EUA, estiveram ao serviço nas forças armadas de 55 nações, participaram em 40 guerras, conflitos e revoltas. A FAP recebeu um total de 251 T-6.

O Fiat G.91 entrou em funções na NATO para apoio terrestre e reconhecimento de ataque. Só a Itália e a Alemanha Federal aceitaram o G.91. EM 1966, quando Portugal se apercebeu da inviabilidade em adquirir novos aviões de combate nos EUA e Reino Unido, recorreu à Alemanha Federal para obter o Fiat G-91. Portugal adquiriu 12 aviões para patrulha marítima Neptune construídos nos EUA, foram comprados em segunda mão através da Holanda, em 1960. Era originalmente destinado à vigilância marítima e à guerra submarina, foi depois adaptado para missões ar-terra, mas detetou-se a falta de um sistema de precisão que limitava a sua utilidade em ataque terrestre; podia transportar até 6 toneladas de bombas, rockets, torpedos ou cargas de profundidade. O último Neptune foi retirado do serviço de Portugal no ano de 1977.

O Douglas B-26 Invader fez uma breve aparição na Guiné. Era capaz de transportar grandes cargas, entrou em combate em 1944, fez a guerra do Pacífico e a da Coreia, destruindo dezenas de milhares de estradas e ferrovias inimigas, esteve presente na crise do Congo, na invasão da Baía dos Porcos e na guerra do Biafra. Portugal começou por pedir para comprar 24 B-26, mas foi-lhe recusado, tentou-se a sua compra através de um fornecedor privado norte-americano, apenas 7 foram entregues antes dos restantes terem sido apreendidos pelas autoridades norte-americanas. Dois B-26 foram enviados para a Guiné em 1971 para uma avaliação operacional antes de seguirem para a Angola. Na Guiné realizaram 55 missões de combate, incluindo três dúzias de bombardeamentos.

Vamos seguidamente falar do Alouette II.


Salazar conversa com Dirk Stikker, Secretário-Geral da NATO, 1961, os dois primeiros à direita são Gomes de Araújo e Franco Nogueira
Kaúlza de Arriaga, Subsecretário de Estado da Aeronáutica
A Base das Lajes nos Açores, em meados de 1950, veem-se aviões da FAP e da Força Aérea dos Estados Unidos
As bases da Força Aérea em 1952-1959
Um dos aviões de treino Havilland Vampire T-55 entregues a Portugal

(continua)
____________

Notas do editor:

Poste anterior de 11 DE NOVEMBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23776: Notas de leitura (1515): "O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume I: Eclosão e Escalada (1961-1966)", por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2022 (3) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 18 DE NOVEMBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23793: Notas de leitura (1518): "Uma longa viagem com Pulido Valente", de João Céu e Silva (Lisboa, Contraponto, 2021, 2924 pp) - O Estado Novo, a guerra colonial, o Exército e o 25 de Abril (Luís Graça) - Parte II: A guerra de África não foi nada parecido como o trauma da I Grande Guerra...