Dos terçados (*) e cavadores (**) ao fornilho, à mina A/C e às metralhadoras ligeiras (ou a evolução do armamento do então IN entre 1961 e 1963).
Continuação da transcrição do documento
Uma síntese cronológica dos movimentos independentistas na Guiné, elaborado em 31 de Outubro de 1967 pela 2ª Rep /CTIG (1).
Fixação do texto: vb
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1961
Em Abril reúnem-se em Casablanca os representantes de algumas organizações clandestinas de Angola, Moçambique, Goa, Guiné, Cabo Verde e S. Tomé e Príncipe (a UPA de Angola e outros movimentos que não gozavam de simpatias dos países do bloco de Leste não compareceram).
Desta reunião resultou a dissolução da FRAIN, que foi substituída por outra nova organização que passou a funcionar naquela cidade marroquina e que adoptou a designação de
Conferência das Organizações Nacionalistas das Colónias Portuguesas (CONCP).
Em Maio, François Mendy consegue fundir, pelo menos transitoriamente, o RDAG com o seu MLG no seio da
Frente da Libertação da Guiné (FLG).
Em 27 e 28 de Maio, foi feita em Bissau a distribuição de grande quantidade de panfletos com propaganda subversiva.
Na noite de 17/18 de Julho um pequeno grupo de elementos do MLG, por decisão de François Mendy que pretende passar à luta armada, possivelmente para chamar a si as atenções mundiais, cortou a linha telefónica entre S. Domingos e a tabanca de Beguingue e tentou incendiar a ponte de Campada.
Na noite de 20/21 de Julho um outro grupo mais numeroso atacou o aquartelamento de S. Domingos fazendo uso de terçados (*), armas de caça, espingardas, garrafas de gasolina e
cavadores (**). Na maioria envergavam camisas e calções pretos.
Em 25 de Julho um outro grupo provocou danos materiais na zona de turismo de Varela e em Susana, fazendo depredações e pilhando a maioria dos edifícios públicos, inclusive num posto sanitário.
No decorrer de todo o ano o
PAIGC envia para a China (Pequim), Checoslováquia (Praga) e Gana grupos de elementos seus, a fim de frequentarem cursos de guerra subversiva e decide
“passar da luta política à acção directa” em toda a Província sob o controle do “Bureau Político de Bissau”.
Verifica-se ainda a saída de muitos nativos para a República da Guiné e para o Senegal.
Entretanto, é criada a
União Nacional dos Trabalhadores da Guiné (UNTG) que é uma organização sindicalista subsidiária do PAIGC sendo seu Secretário-Geral Luís Cabral, irmão de Amílcar Cabral.
1962Em Janeiro, era anunciada em Dakar a constituição entre a UPA e o MLGC da
Frente Africana contra o Colonialismo Português (FACP), réplica à FRAIN.
Apesar do acordo então estabelecido prever o desencadeamento de acção armada na Guiné, prestando a UPA, para o efeito, assistência técnica relativa à guerra de guerrilhas e fornecendo armas e munições, nunca mais se ouviu falar em tal Frente.
Em Março, são detidos em Bissau, o Presidente do Comité Central do PAIGC,
Rafael Paula Gomes
Barbosa (foto nos anos 90, da autoria de Leopoldo Amado, com a devida vénia), que vivia na clandestinidade e outros elementos responsáveis do “Bureau Político de Bissau”.
É ainda apreendida propaganda e variadíssima documentação, incluindo o planeamento de acções em pontos importantes de Bissau.
Nos meses de Junho, Julho e Agosto são desmanteladas várias redes do PAIGC espalhadas por toda a Província: Binar, Teixeira Pinto, Calequisse, Pelundo, Pecixe, Cacheu, S. Domingos, Suzana, Sedengal, Bafatá, Geba, Nova Lamego, Contuboel, Sonaco, Empada, Darsalame, Fulacunda, Bolama e Arquipélago dos Bijagós.
Além da captura de activistas e suspeitos foi apreendida numerosa documentação, armas e munições.
Através das declarações dos elementos detidos, verifica-se que agitadores e propagandistas tinham “trabalhado” já com uma certa profundidade as populações nativas “tabanca por tabanca”, “homens grandes”, mulheres e crianças.
Em 3 de Agosto, François Mendy conseguiu finalmente a fusão do seu MLG com a UPG, o RDAG e a UPLG no seio da
Frente da Luta pela Independência da Guiné (FLING) – “a autêntica emanação do povo da Guiné-Bissau e único instrumento revolucionário para a libertação nacional”.
Nesta frente integram-se, por conseguinte, a quase totalidade dos guineenses radicados no Senegal, com excepção dos Manjacos do MLG-Dakar, que recusam aderir.
O PAIGC recusou o convite para fazer parte da FLING.
Na sua decisão de
“passar da luta política à acção directa”, o PAIGC desenvolve intensa acção de propaganda e de aliciamento das populações do Sul da Província. Apesar da acção desenvolvida pelas nossas autoridades, o PAIGC desencadeia no segundo semestre deste ano, as suas primeiras acções violentas, em especial terrorismo selectivo visando autoridades tradicionais e agentes da ordem, em especial no sector Sul.
São apreendidas as primeiras pistolas (calibres 9 e 7,65 m/m) e destruídas diversas “casas de mato” já com camaratas, carreiras de tiro e pistas para treino físico.
Em Outubro, são referenciados os primeiros sobrevoos suspeitos, em especial de helicópteros.
Conakry nos finais dos anos 60 (?). A devida vénia ao autor desconhecido da foto.
Entretanto, partidários do PAIGC continuam a receber instrução de guerra subversiva na Checoslováquia, no Gana, em Marrocos, no Mali e na República da Guiné, onde em Conakry um grupo de instrutores argelinos (FLN) (***) se encontra desde Maio deste ano.
Em Dezembro, Amílcar Cabral apresentou-se como peticionário perante a Comissão de Curadorias da ONU, onde, além de pedir a independência da Província da Guiné, declarou que os seus partidários deveriam ser considerados soldados da ONU pois desempenhariam funções semelhantes às dos “capacetes azuis” que se encontravam no Congo.
1963
Em Janeiro, recrudesce a actividade IN no Sector Sul havendo a registar um ataque ao aquartelamento de Tite em que faz largo uso de PM, P e GM e ainda a execução das primeiras emboscadas na região de Bedanda. Simultaneamente, faz-se sentir a sua presença no Sector Oeste.
Em Março, roubou os navios “Mirandela” e “Arouca” perto de Cafine (Sector Sul), que mais tarde utilizou para transporte de pessoal e material da República da Guiné.
Em Junho, elementos do PAIGC desencadeiam actividades no Sector Leste, em especial na área de Xime.
Em Julho, faz explodir pela primeira vez um fornilho (****) à passagem de uma viatura no Sector Sul (estrada S. João - Fulacunda) e tentou efectuar sabotagens no Sector Leste (Paunca e Pirada).
Em Agosto, registaram-se as primeiras acções violentas no Sector Oeste (Oio) e o emprego da primeira mina A/C no Sector Sul (S. João).
Em meados deste ano, o IN começou a utilizar MLs.
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Notas:
(*) espada de folha curta, recta e larga.
(**) paus com ponta afiada em forma de trapézio.
(***) FLN, Frente de Libertação Nacional, o movimento independentista que levou De Gaulle, num célebre referendo, a "dar" a independência à Argélia.
(****) carga explosiva colocada numa cova de um percurso, frequentemente misturada com todo tipo de material dilacerante (pregos, granadas, bombas de avião não detonadas...)
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Nota do co-editor vb:
(1) Vd. posts de:
4 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2240: Como a 2ª REP/CTIG via os acontecimentos em 1967 (I): Período de 1947 a 1960
22 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DLXXV: Simbologia de Pindjiguiti na óptica libertária da Guiné-Bissau (Leopoldo Amado) - I Parte
25 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DLXXXVII: Simbologia de Pindjiguiti na óptica libertária da Guiné-Bissau (Leopoldo Amado) - II Parte
26 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DLXXXVIII: Simbologia de Pindjiguiti na óptica libertária da Guiné-Bissau (Leopoldo Amado) - III (e última) Parte