quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Guiné 63/74 – P5077: Fichas de Unidades (5): História do Pelotão de Morteiros Nº 980 (José Martins)


1. Como já vem sendo habitual quando necessitamos de reconstituir alguma “Ficha de uma Unidade” recorremos aos bons préstimos do nosso Camarada José Martins, que sempre nos responde como um eficaz e prestável “municiador” de dados, nesta importante matéria.

2. Breve apresentação do nosso Camarada José Martins: Foi Furriel Miliciano de Transmissões na CCAÇ 5 - Os Gatos Pretos -, em Canjadude, entre 1968 e 1970.

3. Agradecendo, desde já, a sua amigável e prestável colaboração, apresentamos seguir os resultados da sua melhor pesquisa, devidamente adaptada e condensada, para seguinte Unidade:

PELOTÃO DE MORTEIROS Nº 980

Ao ser folheado o sétimo volume (livro I) das Resenhas Histórico-Militar das Campanhas de
África - Mortos em Campanha, logo no inicio de 1966, depara-se com o registo de oito militares que faleceram afogados no Rio Cacheu.

Por ter estado bastante próximo do acidente com a jangada na travessia do Rio Corubal, junto ao destacamento do Cheche em 6 de Janeiro de 1969, aquando da retirada da companhia que ocupava o aquartelamento de Madina do Boé, talvez tenha despertado, em mim, a curiosidade de saber o que se tinha passado.

Desta Pequena Unidade, mobilizada no Regimento de Infantaria nº 7, ao tempo aquartelada em Leiria, não encontramos referências no Arquivo Histórico Militar, mas, por um feliz acaso, ao ler o livro “Golpes de Mãos” da autoria de José Eduardo Reis de Oliveira, que conta a história da sua “675”, encontrei referências a esta Pequena Unidade.

Um pelotão de morteiros, de acordo com a informação que solicitamos ao António Santos, soldado de Transmissões que pertenceu Pelotão de Morteiros nº 4574 (1972/74), tinha autonomia administrativa. Era comandado por um oficial subalterno (Tenente ou Alferes), tendo o apoio de um 1º Sargento na área administrativa. Do pessoal operacional, armas pesadas, dispunha de dois sargentos (2ºs Sargentos ou Furriéis), cinco Primeiros-cabos e trinta Soldados. Completavam a PU - Pequena Unidade - quatro praças com a especialidade de transmissões e cinco praças com a especialidade de condutores auto.

Pelas pesquisas efectuadas, deduzimos que este pelotão terá embarcado em 8 de Maio de 1964, tendo chegado a Bissau no dia 13 seguinte. Pelos dados obtidos teriam efectuado a viagem em conjunto com as seguintes unidades:

  • Comando de Agrupamento nº 16 – mobilizado no RI 1 (Lisboa)
  • Companhia de Caçadores nº 674 e 675 – mobilizadas no RI 16 (Évora)
  • Companhia de Artilharia nº 676 – mobilizada no RAP 2 (V. N. de Gaia)
  • Companhia de Cavalaria nº 677 – mobilizada no RC 7 (Lisboa)
  • Destacamentos de Intendência nºs 706, 707, 708 e 709 – mobilizados no 2º Grupo de Companhias de Administração Militar (Póvoa do Varzim)
  • Pelotões de Morteiros nºs 978, 979 e 980 – mobilizados no RI 7 (Leiria).

O Pelotão de Morteiros nº 980, comandado pelo Alferes de Infantaria Fernando Gonçalves Foitinho, foi atribuído ao Batalhão de Cavalaria nº 490 que comandava o Sector de Farim, em cujo dispositivo ficou integrado. Entre o dia 8 e o dia 30 de Agosto de 1964, o Alferes Foitinho comandou, interinamente, a Companhia de Caçadores nº 675, por impedimento do comandante titular, Capitão de Infantaria Alípio Tomé Pinto, ferido em combate e evacuado para o Hospital Militar nº 241/Bissau.

Posteriormente assumiu o comando do pelotão o Tenente de Infantaria José Pedro Cruz, ainda durante o ano de 1964.

Para se enfrentar a guerra em África, foram efectuadas algumas alterações na estrutura das Forças Armadas e, nomeadamente, no exército. Tornou-se necessário aligeirar as forças de infantaria e torná-las mais ágeis, tendo em conta as características das acções a desenvolver, as características do terreno e a forma de actuar das forças em confronto.

A constituição de pelotões de armas pesadas – morteiros e canhões sem recuo - destinavam-se a reforçar os batalhões que se encontravam em quadrícula, sendo os seus elementos destacados para as companhias que se encontravam nas suas zonas de acção e responsabilidade operacional, atribuindo, a cada uma, secções ou esquadras, de acordo com planos de defesa de cada aquartelamento.

Porém, na história deste pelotão, aconteceu algo um pouco diferente, decerto ditado pelas necessidades operacionais do sector. Esta PU actuou como um normal grupo de combate, alinhando em diversas operações.

Uma delas, a “Operações Panóplia”, teve início no dia 5 de Janeiro, cujo objectivo era Sambuiá, uma base IN instalada na área do batalhão.

Acompanhemos o texto da página 193, do livro acima citado:
  • “Á «675» caberia a «parte de leão».
  • Apoiada pela Companhias «487» (instalada na região Simbor ao longo do rio Sambuiá) e «461» (ataca Talicó e instala-se) e ainda pelo pelotão de morteiros «980» (vem pelo rio Cacheu, desembarca e instala-se a sul de Malibolon) a tropa de Binta actuaria na «península» de Sambuiá, reforçada pela guarnição do Posto de Guidage, (1 grupo de combate da «461») devendo destruir os objectivos principais - Sambuiá – Sambuiadim – Malibolon – e já no regresso, Uália e as suas casas de mato.”
Na ordem de operações, o «grupo de combate» do Pelotão de Morteiros 980, num total de 34 homens, partindo de Farim, tinha como missão descer o rio Cacheu num bote de borracha (zebro), que seria rebocado pela LFG «Cassiopeia» [1] que, sem abrandar a marcha e mantendo o ruído dos motores, permitiria um desembarque, não denunciado, na península. Era uma operação que combinava o transporte por via fluvial de tropas, não preparadas para tal actuação, até ao local em que iniciariam a progressão no terreno. No entanto, não podemos esquecer que se tratava de uma força que, apesar de ser de infantaria, a sua preparação técnica e táctica, era para actuar em posição fixa e não de movimento.

O cabo que prendia e rebocava o bote, a determinada altura partiu, pelo que foi necessário utilizar outro “esquema” de ligação. Apesar do desnível das duas embarcações – LFG versus bote – ser de cerca de 2 metros, foi adoptado o sistema de o cabo ser segurado pelos homens que seguiam no zebro. O ângulo formado pelo cabo de reboque, puxava o bota para baixo, pelo que poucos metros depois, se virou.
  • “Soube-se no dia seguinte da tragédia acontecida ao Pelotão de Morteiros «980» que, antes do local de desembarque, sofreu um acidente de consequências gravíssimas, por se ter virado o bote de borracha em que seguiam rebocados pela Vedeta de Guerra. Caíram à água todos os ocupantes do bote, em número superior a duas dezenas, morrendo afogados 8 homens que não conseguiram livrar-se do capacete e outro material que lhes dificultou os movimentos, perdendo-se ainda as armas que transportavam.”
Foi assim que em 05 de Janeiro de 1965 faleceram, por afogamento no Rio Cacheu [2]:
  • o Soldado Apontador de Morteiro ANTÓNIO DOMINGOS FÉLIX ALBERTO, solteiro, filho de José Alberto e Maria Vitória da Conceição Félix, natural da freguesia de Ramalhal, concelho de Torres Vedras. Foi inumado no cemitério do Ramalhal.
  • o Soldado Apontador de Morteiro – ANTÓNIO FERREIRA BATISTA, solteiro, filho de Augusto Gaspar Baptista e Francisca da Conceição, natural da freguesia de Aldeia Gavina, concelho de Alenquer. Foi inumado no cemitério de Aldeia Gavina.
  • o Soldado Transmissões ANTÓNIO JOSÉ PATRONILHO FERREIRA, solteiro, filho de Luís Faca Ferreira e Gertrudes Maria Patronilho, natural da freguesia de Torrão, concelho de Alcácer do Sal. O corpo não foi recuperado.
  • o Soldado Apontador de Morteiro ANTÓNIO MARIA FERREIRA, casado com Maria de Jesus, filho de Maria de Jesus Ferreira, natural da freguesia de Santa Maria de Viseu, concelho de Viseu. Corpo não recuperado.
  • o 1º Cabo Apontador de Morteiro ARLINDO SANTOS CARDOSO, solteiro, filho de Armindo Nunes Cardoso e Carminda Ferreira dos Santos, natural da freguesia e concelho de Oliveira do Bairro. Inumado no cemitério de Vila Verde, conselho de Oliveira do Bairro.
  • o Soldado Apontador de Morteiro – JOÃO JOTA DA COSTA, solteiro, filho de José Gonçalves da Costa e Maria do Rosário, natural da freguesia de Vila do Carvalho, concelho de Covilhã. Inumado no cemitério a sul de Binta (Guiné), na margem esquerda do rio Cacheu. Foi sepultado pela tripulação da LDG Orion.
  • o 1º Cabo Apontador de Morteiro JOÃO MACHADO, solteiro, filho de Francisco de Freitas e Antónia Machado, natural da freguesia de Creixomil, concelho de Guimarães. Corpo não recuperado.
  • o Soldado Apontador de Morteiro JOAQUIM GONÇALVES MONTEIRO, solteiro, filho de Joaquim Monteiro e Guilhermina Gonçalves, natural da freguesia e concelho de Pombal. Inumado no cemitério de Pombal.
Com a substituição do Batalhão de Cavalaria n º 490 pelo Batalhão de Artilharia nº 733, em 15 de Junho de 1965, a “missão” do «980» não se alterou. Continuou a ser uma PU operacional, fazendo as colunas de reabastecimento aos destacamentos de Jumbembem e Cuntima, além de patrulhamentos de combate, até ao seu regresso à metrópole.

José Martins – 5 de Outubro de 2009

Notas:
[1] - LFG «Cassiopeia»
A classe Argos foi uma classe de lanchas de fiscalização grandes (LGF), ao serviço da Marinha Portuguesa, entre 1963 e 1975.
As lanchas foram construídas entre 1963 e 1965 no Arsenal do Alfeite, e nos Estaleiros Navais de Viana do Castelo.
As unidades desta classe foram baptizadas com o nome de constelações.
As Argos tiveram origem no Projecto de Lancha para Timor, resultante de um requisito da Capitania do Porto de Dili, para um tipo de lancha com capacidade para ser empregue na fiscalização das águas territoriais de Timor Português. Em virtude da Guerra do Ultramar, nenhuma das lanchas acabou por ir para Timor, sendo enviadas para África, onde foram empregues em operações militares.
A maioria delas foi transferida em 1975 para a República Popular de Angola, e as restantes afundadas ao largo da Guiné-Bissau no mesmo ano.
De notar que a Marinha Portuguesa voltou a utilizar o nome de Classe Argos para denominar uma nova classe de Lanchas de Fiscalização lançadas ao mar em 1991.

Unidades

Número de amura - Nome ------- Comissão ------------------- Estado
P 372..................NRP Argos....14 de Junho de 1963........Abatida em Luanda em 28 de Maio de 1975
P 374 NRP.............Dragão .......17 de Julho de 1963 ........Abatida em Luanda em 28 de Maio de 1975
P 375 NRP.............Escorpião ....21 de Agosto de 1963 ......Abatida em Luanda em 30 de Setembro de 1975
P 373 NRP............Cassiopeia...13 de Janeiro de 1964....Abatida em 7 de Setembro de 1974 e afundada em .........................................................................21 Setembro 1974, 104 milhas a Oeste de Bissau
P 376 NRP.............Hidra.........11 de Abril de 1964..........Abatida em Luanda em 28 de Maio de 1975
P 379 NRP.............Pegaso.......16 de Outubro de 1963......Abatida em Luanda a 4 de Outubro de 1975
P 361 NRP.............Lira...........19 de Junho de 1964........Abatida em Luanda a 30 de Setembro de 1975
P 362 NRP.............Orion.........24 de Outubro de 1964......Abatida em Luanda em 30 de Setembro de 1975
P 1130 NRP...........Centauro......23 de Abril de 1965..........Abatida em Luanda em 30 Setembro de 1975
P 1131 NRP..........Sagitário.....04 de Setembro 1965.......Abatida em 7 de Setembro de 1974 e afundada em ......................................................................... 21 de Setembro 1974, 104 milhas a Oeste de Bissau

[http://pt.wikipedia.org/wiki/Classe_Argos_(1963)]

[2] – Elementos retirados das paginas 103 a 105 do 8º Volume – Tomo II - Livro 1 da Resenha Histórica Militar das Campanhas de África (1961-1974) – Guiné - Mortos em Campanha.

(José Martins)
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Notas de M.R.:

Vd. último poste desta série em:

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