segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Guiné 63/74 – P5051: Estórias do Mário Pinto (Mário Gualter Rodrigues Pinto) (23): Os malditos fornilhos

1. O nosso Camarada Mário Gualter Rodrigues Pinto, ex-Fur Mil At Art da CART 2519 - "Os morcegos de Mampatá" (Buba, Aldeia Formosa e Mampatá - 1969/71), enviou-nos a sua 23ª estória:

Camaradas,

Sempre que os meus afazeres profissionais e familiares mo permitem, continuo a vasculhar o meu velho baú de recordações e vou passando, para o PC, alguns textos que rabisquei durante a minha comissão.
Como penso que são de interesse geral, dadas as matérias tratadas (por todos nós conhecidas), mas muitas delas já a caminho do esquecimento vou-oas enviando, com alguma nostalgia, para publicação no blogue.

Hoje abordo um dos nossos maiores pesadelos diários, a par com as assassinas minas, em cada uma das nossas saídas dos aquartelamentos:

OS MALDITOS FORNILHOS

Numa guerra traiçoeira, inúmeras vezes sem inimigo á vista, que procurava por todos os meios causar baixas às NT, tudo valia para levar adiante os seus fins.
Talvez a mais traiçoeira e eficaz de todas as armas utilizadas pelo IN, contra as nossas forças armadas, foram os amaldiçoados fornilhos.

Nas picadas e estradas, por nós percorridos, os nossos experientes picadores, descobriam imensas minas (A/C e A/P), mas os fornilhos poucos conseguiam detectar.

Os fornilhos eram montados em buracos feitos nas estradas, ou nas picadas, que eram preenchidos com material de guerra obsoleto e eram detonados á distância, semeando o pânico e o inferno entre o nosso pessoal.
Foram os causadores do maior número de mortes, estropiados e feridos nas NT, sofrendo alguns de nós, ainda hoje, de graves efeitos físicos e psíquicos dos mesmos.

Numa guerra cruel e desumana como foi a da frente da Guiné, nós também utilizamos fornilhos, nomeadamente em defesa dos nossos aquartelamentos. Em Mampatá haviam vários á volta do arame farpado.

No dia 17 de Agosto de 1970, aquando do grande ataque de surpresa do PAIGC, à Tabanca de Mampatá, o nosso principal meio de defesa foram os ditos fornilhos. O IN só retirou da sua acção agressiva que desenvolveu sobre nós, quando os mesmos rebentaram.

Constatou-se então que o inimigo tinha sofrido fortes baixas devido às explosões dos mesmos.
Também utilizamos fornilhos, em acções de emboscadas, mais precisamente no corredor de Missirã, tanto mais não tivessem servido, pelo menos foi uma forma psicológica de nos sentirmos mais seguros.

Era a lei de “quem com ferro mata… com ferro morre”. Na maior parte das vezes quem morria eram os carregadores dos equipamentos do IN, muitos deles obrigados pelo PAIGC a seguirem à frente das suas colunas.

De tanto picar estradas e trilhos, aqui deixo este verso da autoria do meu camarada Fur Mil Edmundo:

De pica na mão
lá ia a maralha
com toda a metralha
de olhos no chão
p’ra não haver falha
piquem bem o trilho
tomem atenção
sou de opinião
que se houver FORNILHO
ai que Deus nos valha


Um abraço,
Mário Pinto
Fur Mil At Art

Fotos: Mário Pinto (2009). Direitos reservados.
____________
Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em:

1 comentário:

TELES CLAUDINO disse...

Os fornilhos de Mampata, que explodiram em 1970 , fui eu que os montei em maio de 1969 , como não havia explosor foram detonados com uma pilha do radio Racal que dava 14 ou 18 volts, felizmente quando os fornilhos foram explodidos eu estava na metropole de férias .