quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Guiné 63/74 - P12777: Caderno de notas de um mais velho (Antº Rosinha) (32): Mário Coluna (1935-2014) na verdadeira nação "Arco-Íris" (Portugal e Ultramar e a sua selecção de futebol)

1. Mensagem de António Rosinha  [, foto atual à esquerda; fur mil em Angola, 1961/62, topógrafo da TECNIL, Guiné-Bissau, em 1979/93]:

Data: 26 de Fevereiro de 2014 às 18:56

Assunto: Mário Coluna na verdadeira nação "ARCO IRIS" (Portugal e Ultramar e a sua Selecção de futebol)


Luís, escrevo as duas linhas [, que me pediste], mas aí não será uma homenagem do Blog, mas apenas a minha memória do Homem nosso contemporâneo.

E será também uma saudação minha (,pessoal,) ao Mário Coluna e a todos os portugueses ultramarinos da nossa geração (combatentes do Minho a Timor) que não pegaram em armas contra o colon  e contra o próprio povo, antes pelo contrário. (Exceptuemos Caboverde e São Tomé.)

Qualquer cidadão natural das nossas antigas colónias ultramarinas que não pegaram em armas para lutar contra a colonização portuguesa, eram tão nacionalistas e independentistas como os turras que nos combateram.

Mário Coluna é mais um ultramarino contemporâneo dos antigos combatentes do ultramar que foi embora.

A propósito do desaparecimento deste grande e digno português e moçambicano que foi Mário Coluna, que, antes e durante a guerra colonial, nunca deixou de ser português e moçambicano, penso que não só o Benfica, mas todos os moçambicanos e portugueses da nossa geração nos sentimos saudosos ao ouvir o nome do grande capitão do Benfica e da Selecção Nacional de Futebol.

Portugueses do Ultramar como Mário Coluna, Eusébio, Matateu e Peyroteo etc. no futebol, e noutros campos (Raúl Indipo, Rui Romano, Óscar Ribas, ALMADA NEGREIROS etc.)  eram portugueses muito lúcidos.

Eram tão nacionalistas ou mais do que aqueles que usaram o terrorismo armado contra o próprio povo, merecem todo o respeito, nosso, dos portugueses, e dos seus países, porque no fundo todos eles queriam uma independência para os seus países.

A independência sem armas à "Guevara-terceiro-mundista" era a mobilização que estava na cabeça de toda aquela gente pronta a avançar, mas algo mais do que o Salazar ou as nossas armas ferrugentas os fez hesitar.

Foi aquele terrorismo com apoio internacional da guerra fria que fez a maioria dos estudantes do Império futebolistas do Império e artistas do Império.... e milhares de sobas e régulos que não queriam sangue. Nem pegar em armas.

Mário Coluna,  tanto em Moçambique como 
em Portugal, será sempre olhado com o maior
 respeito e a dignidade que só se deve a grandes Homens. 

[Mário Coluna,   capitão dos Magriiços de 1966, a seleção nacional de futebol que ficou  em 3º lugar no Campeonato Mundial de Futebol em Inglaterra... Foto editada do Público, com a devida vénia].

Sobre pegar em armas ou não, para quem viveu os 13 anos de guerra como eu, testemunhei ao lado de furriéis e alferes e cabos e soldados ultramarinos que estavam de mauser e fbp ao meu lado, eu como furriel, e verificava que eles só não iam para os turras porque aquilo era mau de mais. (como foi e …continua)

Vejam este caso: A PIDE apanha uma carta ao meu comandante do pelotão, Alferes mulato, meu conhecido da vida civil. A cópia da carta para a namorada (?) na Metrópole foi-nos lida, a furriéis e alferes pelo capitão da companhia, no seu gabinete (na ausência do autor, evidentemente) em que dizia mais ou menos às tantas: "Estuda bem e logo que termines o curso, regressa porque a pátria vai precisar de ti".

Isto, em 1962, em Angola, era o que a maioria dos ultramarinos pensavam, mas de armas na mão ao nosso lado, ou melhor. Nós ao lado deles.

Quando vou aos almoços anuais da guerra e da vida profissional ainda oiço notícias de muitos. Alguns ultramarinos de Angola e de Caboverde ainda comparecem a esses almoços.

Sabemos que Mário Coluna periodicamente também comparecia com os seus antigos companheiros e compatriotas. E a memória dele engrandece dois países, e a nossa geração teve o privilégio de ser contemporâneo desse "Monstro Sagrado",  como diziam os jornalistas.

Vi-o jogar nos finalmentes em Luanda, nos coqueiros, onde o novato Toni marcou um golão do meio campo e arrumou com o ASA para a taça de Portugal (1969?).

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Nota do editor:

Ultimo poste da série > 3 de fevereiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12668: Caderno de notas de um mais velho (Antº Rosinha) (31): Natália Correia e os filhos dos retornados (vingativos)

7 comentários:

Luís Graça disse...

Excerto, com a devida vénia, do artigo do Públcio:

Mário Coluna, um marionetista para a história
NUNO SOUSA 25/02/2014 - 19:04

(...) Filho de pai português e de mãe moçambicana, Mário Coluna nasceu em Magude, Moçambique, e cresceu num bairro pródigo em produzir futebolistas de eleição, cujas ruas já haviam sido palmilhadas por Vicente, Hilário ou Matateu. O sonho de ser mecânico de automóveis, porém, seria largamente ultrapassado por um talento invulgar para o desporto.

Mas o futebol não foi amor à primeira vista. Ainda adolescente, começou por participar em combates amadores de boxe e, aos 15 anos, ingressou num clube local que promovia a modalidade, o João Albasini. Depois, arriscou no atletismo e chegou a bater o recorde de Moçambique do salto em altura, com uma marca de 1,825m, antes de se fixar definitivamente no futebol.

“Só comecei a jogar futebol calçado aos 15 anos”, revelou há tempos em declarações à Benfica TV. E fê-lo justamente no João Albasini, que agrupava um conjunto diversificado de desportos. “Quando era júnior, no Lourenço Marques, jogava de manhã nos juniores e à tarde ia jogar nos seniores no João Albasini”, recordou.

Por essa altura, o talento de Coluna já não passava despercebido. De tal modo que começou a despertar atenções fora de portas. De Portugal, chegava uma proposta do FC Porto de 90 contos por dois anos de contrato. Ao saberem da oferta do rival, Sporting e Benfica contrapuseram 100 contos. “Se fosse para vir para o Sporting, o meu avô não o deixava vir de maneira nenhuma”, adiantou a filha do jogador. “Ele era menor e, sem a autorização do pai, não podia viajar para a metrópole”.

Depois de uma viagem de 34 horas, Mário Coluna aterrou em Lisboa em Agosto de 1954, com 19 anos. “Quando cheguei ao aeroporto, estava lá um dos meus tios à espera. O Benfica quis mandar-me para uma pensão. E o meu tio disse: ‘Não, não, ele vai para minha casa”, explicou. Ele, que rapidamente passaria a integrar o lar do jogador.

Foram tempos difíceis, os que marcaram os primeiros passos na Luz. Com o lugar no ataque barrado por José Águas, Coluna sentiu dificuldades de adaptação e chegou a pensar em voltar para Moçambique, mas os funcionários que então trabalhavam no lar do jogador tinham ordens para não o deixar sair. O sacrifício inicial acabaria por dar frutos. (...)

http://www.publico.pt/desporto/noticia/mario-coluna-um-marionetista-para-a-historia-1626176

Luís Graça disse...

Rosinha:

C/ um abraço e aplauso pela ideia de homenagear o "capitão" Mário Coluna...

No blogue, não deve haver postes "coletivos"... O blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné não deve "tomar posições" enquanto coletivo...

Estamos sempre dependentes dos contributos de cada um de nós, a título individual... Mas tua homenagem ao africano, ao português, ao futebolista, ao homem, também é a minha... LG

JD disse...

Olá Rosinha,
Afinal pegas agora na deixa de que a autodeterminação das provincias já estava em curso. Eu apontei a data de 1961, quando apesar do terrorismo todos os portugueses das diferentes raças de Angola se uniram na construção de uma sociedade virada para o progresso. Porém, quem sabe, essa data poderia ser anterior, se atendermos aos desejos emancipalistas (para evitar a asfixia do Estado centralizador) dos que antes já lá residiam, trabalhavam, e aplicavam o produto dos seus esforços.
E a carta que referes pode ser uma amostra.
Um abraço
JD

Luís Graça disse...

1. Rosinha, cito-te:

"Vejam este caso: a PIDE apanha uma carta ao meu comandante do pelotão, Alferes mulato, meu conhecido da vida civil. A cópia da carta para a namorada (?) na Metrópole foi-nos lida, a furriéis e alferes pelo capitão da companhia, no seu gabinete (na ausência do autor, evidentemente) em que dizia mais ou menos às tantas: "Estuda bem e logo que termines o curso, regressa porque a pátria vai precisar de ti". (...)

2. Comentário:

Em 1962, ainda não (ou já ?) havia guerra na Guiné, pelo que o teu comandante de pelotão, alf mil, "mulato" [leia-se: filho de português e de angolana, tal como o Coluna e Eusébios, filhos de pais portugueses e de mães moçambicanas; o contrário seria menos verosímil...], foi obrigado a fazer a tropa (e a guerra) na sua terra...

Mais tarde, o exército passou a trocar as voltas, "não fosse o dibao tec~e-las": os de Angola iam para a Guiné (caso do nosso Ruizinho, o alf e depois capitão Rui Alexandrino Ferreira...), os da Guiné para a Angola (caso do nosso António Estácio...), os de Moçambique também vinham parar à Guiné (caso do infortunado alf mil Mário Sasso, um dos "palmeirins de Catió", da CCAÇ 728, 1964/66)... E até dos de Macau vieram molhar o cu nas bolanhas da Guiné...

3. Pergunta:

o que aconteceu ao teu alferes ? A PIDE prendeu-o ? Ele desertou ? O capitão deu-lhe uam porrada ? Que raio de capitão era esse que violava a correspondência (ou aceitava que a PIDE violasse a correspondência dos seus homens), e que depois lia as cartas, pessoais, dos seus oficiais, em voz alta, perante os restantes oficiais e sargentos ?!...

Em suma, o que é que o homem, o teu capitão, pretendia ? Dar-vos uma lição de patriotismo ? Intimidar-vos ? Lançar a suspeita em relação a um dos seus oficiais, de que era "turra" ou "suspeito de ter ligações aos turras", por incemtivar a sua namorada, na metrópole, a estudar, ter bom aproveitamento e regressar logo a Angola, porque "a Pátria" (sic) iria precisar dela... ?!

Naturalmente, podes (e deves) responder, sem identificar ninguém... de acordo com as regras (de bom gosto e bom senso) do nosso blogue.

Um grande abraço para o nosso "mais velho" (... eu tinha 14 anos quando tu andavas de FBP...).

Antº Rosinha disse...

Pois é Luís Graça, quem me dera raciocinar hoje como raciocinava naquele tempo, embora vá sair a lei de que quem frequentar o "Pilon" é multado, não me importava de ir à falência por frequentar as rebitas do B.O em Luanda à antiga com 20 anos.

Agora andamos todos aqui a viver só de recordações.

Luís, respondendo ao teu "questionário" esse alferes, "vítima do fascismo" já seria de famílias antigas angolanas.

Esse alferes era topógrafo, na vida civil.

Pelo que me recordo foi transferido.

O raio do capitão recentemente soube por um primo dele que ainda é vivo, muito doente e era um raio de um capitão que não me deu nenhuma porrada ao contrário de outros dois que tive na recruta e como cabo milº em paz, e outros que me perseguiram e ameaçaram por pouca disciplina minha.

Mas sobre a PIDE, soube mais tarde, até pela minha passagem pela GUINÉ, esses agentes sabiam interpretar melhor o morse em português legítimo nos telex do correio do que atravez de batuque balanta ou bailundo, daí lerem as cartas e tirarem cópias delas que era mais fácil.

E sobre os capitães, a escola era a mesma de todos, e todos recebiam directa ou indirectamente contactos da PIDE.

Aí,a minha história de guerra é tão completa que seria preciso fazeres um blog só para mim devido a tanta cena que presenciei.

Ainda sobre a PIDE e suas vítimas, tive colegas, chefes e amigos e até jogadores de bola, amigos uns, conhecidos públicos outros, angolanos de 1ª e segundas gerações, brancos de todas as raças e pretos de todas as cores, que se "queixaram" daqueles malandros.

E como cá, lá, também, ao contrário da Espanha em que as vítimas querem julgar os fascistas, se põem em bicos de pés de dedo no ar, uns a passar à frente dos outros, eu fui mais vezes preso do que tu, eu estive mais anos presos que tu, enfim, alguns até parecem mais gabarolas que vítimas.

E no 26 de Abril todos os PIDES foram protegidos pelo MFA. (Capitães de Abril)

Luís,também escrevi que penso que nós é que estivemos de arma na mão ao lado desses angolanos como esse alferes e muitos régulos.

Não tenho outra explicação para a nossa resistência tão prolongada, depois de se ter partido a cadeira do Salazar.

Claro que depois da guerra tive algumas explicações que me deram os guineenses em Bissau.

Gostava de dizer umas coisas a JD e ao seu entusiasmo por Norton de Matos e Cunha Leal, mas terá que ser com o tempo.

Luís Graça disse...

Obrigado, Rosinha, tens uma vida para contar a(s) tua(s) histórias, a menos que sejas budista e acredites que vais ter mais vidas depois detsa...

De qualquer modo, tens uma série só para ti, que já vai em 32 postes... Nunca te pus limites, até porque as nossas histórias são como as picadas da Guiné, com mil e um atalhos, e nunca se lhes vê o fim...

Que Deus, Alá e os bons irãs te deem saúde e longa vida e vontade de escrever...

Um kandandu... Aceitas, em kimbundu ?


JD disse...

Caro Rosinha,
Muito obrigado pela boa vontade que manifestas. Tens o meu contacto, e podes dispor em qualquer ocasião.
Um abraço
JD