quinta-feira, 1 de maio de 2014

Guiné 63/74 - P13078: O golpe militar de 26 de abril de 1974 no TO da Guiné: memorando dos acontecimentos, pelo cor inf António Vaz Antunes (1923-1998) (Fernando Vaz Antunes / Luís Gonçalves Vaz): Parte I


1. Mensagem, acabada de enviar hoje, às 14h50, pelo Luís Gonçalves Vaz, membro da nossa Tabanca Grande,  filho do Cor Cav CEM Henrique Gonçalves Vaz (último Chefe do Estado-Maior do CTIG, 1973/74), e que tinha 13 anos e vivia em Bissau quando se deu o 25 de abril de 1974, que derrubou o regime do Estado Novo:

Boa tarde, camarigo editor:

É com muita satisfação e "sentido do dever cumprido" que envio para publicação no nosso Blog, este artigo sobre um Documento manuscrito em 30 de abril de 1974, pelo Sr. Coronel António Vaz Antunes sobre a forma de um “Memorando dos acontecimentos de Bissau”, protagonizados pelo próprio em 25 e 26 de abril de 1974.


Trata-se, quanto a mim de um documento histórico-militar, de grande "relevância", e de um momento muito conturbado para a então Província Ultramarina Portuguesa da Guiné. Fez ontem 40 anos, que este oficial com grandes responsabilidades na altura, na defesa do perímetro militar da cidade de Bissau, escreveu este documento, não poderia haver melhor momento, para o publicar.

Forte Abraço, Luís Vaz




2. Golpe Militar de 26 de Abril de 1974 no TO da Guiné  > “Memorando dos acontecimentos de Bissau”

Pelo cor inf António Vaz Antunes [1923-1998]

A pedido do filho do Ilustre Sr. Coronel de Infantaria António Vaz Antunes, Fernando Vaz Antunes, elaborei este artigo para dar visibilidade nacional, neste nosso muito visitado blogue,  a um documento manuscrito em 30 de abril de 1974, sobre a forma de um “Memorando dos acontecimentos de Bissau”, protagonizados pelo próprio,  em 25 e 26 de abril de 1974, e registados em papel pela mão deste oficial, três dias depois de os mesmos terem decorrido.

Enfim trata-se, quanto a mim de um documento histórico-militar de uma altura muito conturbada e de mudança de paradigma politico e consequentemente de grandes mudanças para a então Província Ultramarina Portuguesa da Guiné. Este documento, em minha opinião contribuirá sem dúvida para a “Memória Histórica do Golpe de 26 de Abril na Guiné”. Achei que deveria Iniciar este artigo com uma pequena resenha biográfica sobre este oficial. 

António Vaz  Antunes

[consultar também o portal Ultramar Terrweb]

(i) nasceu na freguesia da Mata, Concelho de Castelo Branco, em 21 de Junho de 1923;

(ii) faleceu em 15 de Outubro de 1998;

(iii)  frequentou a Escola do Exército, onde se formou como oficial de Infantaria do Exército Português; 

(iv) no ano de 1959 realizou um estágio de oficiais do Exército Português, junto de tropas francesas na Argélia;

(v) passou pelo CIOE/Lamego, onde foi 2º comandante; 

(vi) passou também por por Angola onde foi 2º comandante do Batalhão de Caçadores 185/RMA (1961 e 1962);  e por Moçambique, onde foi 2º comandante do Batalhão de Caçadores 1918/RMM (1967) e comandante do Batalhão de Caçadores 17/RMM (1967 a 1968);

(vii) no CTIG, foi comandante do Batalhão de Caçadores 4512/72/CTIG (1972 a 1975);

(vii) neste teatro de operações, e na altura a que se reportam os acontecimentos relatados no “manuscrito” aqui publicado, o Coronel António Vaz Antunes era Adjunto do Comandante do CTIG e Comandante interino do COMBIS (Comando da Defesa Militar de Bissau), bem como Inspetor do CTIG;

Para que se perceba bem, este oficial tinha nesta altura, uma missão de muita responsabilidade na defesa militar de todos os quarteis no “perímetro militar de Bissau”, mesmo assim na reunião relatada no “documento histórico”, foi afastado destas funções pelo MFA da Guiné. 

Chamo à atenção que nesta altura não estavam em funções os 1º e 2º Comandantes do CTIG, pois encontravam-se de licença, o que elevava a responsabilidade deste oficial no quadro de comandos neste TO (Teatro de Operações). Pode-se ler,  por exemplo, no seu manuscrito, que no dia 25 de Abril recebeu por telefone e por mensagem indicações do CEM/CTIG, coronel cav Henrique Gonçalves Vaz, “recomendações para que o pessoal de guarda tivesse a máxima atenção na vigilância com vista a garantir a segurança dos quartéis contra qualquer tentativa do IN”, a situação era de facto explosiva, vulnerável e muito sensível …

Não quero de forma alguma, fazer aqui qualquer tipo de julgamento, apenas pretendo apresentar este “documento histórico”, de uma forma contextualizada, para que os leitores se inteirem do “ambiente deste momento histórico”, nunca deixando de se perceber que estavam em causa altos interesses “políticos, militares e de segurança”, neste teatro de operações, que era sem dúvida o pior, o mais “dramático”, o mais duro de todos os teatros de operações que mantínhamos naquele ano de 1974. 

Antes de apresentar o “documento manuscrito” do Sr. coronel António Vaz Antunes, quer a “transcrição” para melhor leitura, quer as imagens do “próprio original”, apresento uma pequena citação da autoria de um dos “oficiais revoltosos”, o então capitão Jorge Sales Golias, um dos protagonistas desse mesmo golpe, e que explica o que se teria passado “momentos antes desta mesma reunião”, que acabou por afastar o coronel António Vaz Antunes, a reunião que levou à “destituição/prisão" (?) do então Governador e Comandante-Chefe desta Província Ultramarina, general Bethencourt Rodrigues, a saber:

“Em Setembro de 1973, constitui-se uma primeira Comissão Coordenadora, que integrava o Major Almeida Coimbra, Capitão Duran Clemente, Capitão Matos Gomes e o Capitão Caetano.”

“Assim, no dia 26 de Abril, onze oficiais (1) dirigiram-se ao Gabinete do General Comandante e exigiram a sua demissão e o regresso a Lisboa. Foi um acto pacífico, civilizado, mas dramático. Com o General vieram também alguns oficiais que se lhe solidarizaram, nomeadamente o Brigadeiro Leitão Marques que o MFA julgava poder contar para o substituir.

"Por isso tivemos que solicitar ao Comodoro Almeida Brandão, o Comandante Marítimo, que assumisse as funções de Comandante-Chefe interino das Forças Armadas na Guiné-Bissau. Regista-se o facto de este oficial já ter reconhecido a Junta de Salvação Nacional (JSN). 

"Para as funções de Encarregado do Governo interino, o MFA indigitou um dos seus membros, o Tenente-Coronel Mateus da Silva que era Comandante do Agrupamento de Transmissões, o Quartel-General da conspiração, e um dos poucos oficiais superiores que integrava o Movimento dos Capitães (MOCAP). “

"Lisboa em 20 de Maio de 2005

"Jorge Sales Golias, Tenente-Coronel, MFA da Guiné-Bissau - 1974, Adjunto do CEME, General Carlos Fabião - 1974/75"

(1) Lista dos Oficiais revoltosos:

TCor [Eduardo] Mateus da Silva, Engº Trms
TCor Maia e Costa, Engº
Maj [Raúl] Folques,  Cmd
Maj [Manuel Joaqum Trigo Mira] Mensurado,  Pára [BCP 12]
Cap Simões da Silva,  Art
Cap [Jorge] Sales Golias, Eng Trms
Cap [Carlos] Matos GomesCmd
Cap Batista da Silva.  Cmd
Cap [Zacarias] Saiegh, Cmd (Africano)
Cap Ten Pessoa Brandão, Armada
Cap mil José Manuel Barroso



Como poderemos ler nesta citação, este Golpe Militar na Guiné, segundo um dos seus protagonistas, o então capitão Jorge Sales Golias, “foi um acto pacífico, civilizado, mas dramático”, mas que,  segundo me contaram à época, foi “duro na forma”, em que destituíram o então General Bethencourt Rodrigues…. 

Eu estava lá em Bissau na altura, e apesar de ser muito jovem (tinha 13 anos de idade), era filho de um militar com grandes responsabilidades neste TO e que presenciou também este “episódio histórico”, fiquei com essa ideia (bem como ao longo destes últimos 40 anos), embora se possa considerar que um “golpe militar é por natureza duro”. 

No entanto entre militares que viviam a guerra em conjunto, do mesmo lado da “trincheira”,  e que,  até o dia 25 de Abril, mantinham uma “cadeia hierárquica” sólida, liderada quiçá por um dos mais competentes e respeitados generais portugueses da altura [o gen Bethencourt Rodrigues], o momento seria inevitavelmente (seria mesmo ?) sempre “dramático” para quem é destituído das suas funções neste contexto político-militar. 

Esta ideia com que fiquei, será no entanto verosímil,  a ter em conta  o facto deste general ter ficado “tão tocado” com este episódio que,  passado muitos anos,  não quis dar entrevistas em direto para reportagens sobre a “A Guerra Colonial”, tanto quanto sei. Disse sempre que não se esquecia da “forma como o trataram” nessa manhã longínqua,  no Forte da Amura,  em Bissau.



Lisboa > Base Naval do Alfeite > 30 de abril de 1974 > Da esquerda para a direita: Coronel António Vaz Antunes, Brigadeiro Leitão Marques, General Bethencourt Rodrigues e Coronel Hugo Rodrigues, todos oficiais afastados no Golpe Militar de 26 de Abril em Bissau. Fotografia obtida já no Alfeite, em Lisboa no dia 30 de Abril de 1974.

Foto: © Fernando Vaz Antunes  (2014). Todos os direitos reservados. [Edição: L.G.]


Não irei aqui proceder a reflexões “técnico-militares”, se o Sr. General foi apenas “destituído das suas funções” pelos militares revoltosos, ou se foi mesmo “preso”, pois esse tipo de discussões não serão a razão principal deste mesmo artigo.

Sendo assim,   passo à apresentação do “documento histórico”, que justificou a elaboração deste mesmo artigo, o “manuscrito do Sr. coronel de Infantaria, António Vaz Antunes: primeiro apresentarei o original, escrito pelo seu próprio punho, logo dias após o seu afastamento das suas funções neste TO, e depois a “transcrição fiel”,  realizada pelo seu filho Fernando Vaz Antunes, onde apenas se procedeu à introdução / reorganização de notas de rodapé, para permitir uma melhor leitura, tendo também recorrido ao “Regulamento de Abreviaturas Militares” para um melhor esclarecimento dos acontecimentos relatados.


Guiné > Região do Oio > O Coronel António Vaz Antunes,  em Farim,  no ano de 1974. Fotografia do arquivo pessoal do coronel António Vaz Antunes.

Foto: © Fernando Vaz Antunes  (2014). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




Primeira parte da folha 1, do documento manuscrito do cor inf António Vaz Antunes, de 9 folhas. Trancrição da responsabilidade do seu filho Fernando Vaz Antunes.

3. Lisboa 30Abr74  > Memorando dos acontecimentos de Bissau  (Transcrição dos registos originais)  [Por decisão do editor, e para tornar a leitura mais fácil, e o blogue mais ágil, apresentam-se as imagens digitalizadas do documento manuscrito, nos dois postes a seguir]

Cor. António Vaz Antunes


Funções:

Desde 24Mar – Inspector do CTIG

13Abr – Adjunto do Cmdt do CTIG para parcial substituição do Brig. 2º Cmdt [1], de licença; Cmdt intº do COMBIS por licença do Comandante

Sequência cronológica

24Abr

Considerando que 26 era feriado em Bissau, e para aproveitamento de tempo, solicitei à Chefia Srvc Transportes passagem para Bolama, a partir das 09:30

Planeei assistir às cerimónias mais significativas de homenagem a Honório Barreto e seguir depois para Bolama, em visita ao BArt [2] em IAO.

25Abr

Conhecimento por camaradas, do Movimento das Forças Armadas em Lisboa: através da BBC ao fim da tarde, depois de actividades várias no CTIG e COMBIS, tive conhecimento do triunfo do Movimento. 

Às 18:00 horas comuniquei à Chefia Srvc Transp para anular ida a Bolama.

22:00 horas – como de hábito, desloquei-me para o COMBIS para pernoitar, depois de ter recebido comunicação telefónica do Chefe do Estado Maior do CTIG [3] para recomendar ao pessoal de guarda a máxima atenção na vigilância com vista a garantir a segurança dos quartéis contra qualquer tentativa do IN.

À chegada ao COMBIS recebi a mensagem escrita que repetia a recomendação telefónica. Dei as necessárias instruções ao Oficial de Dia. 

Pouco depois o Oficial de Dia batia à porta do quarto para me prevenir de que a Emissora Nacional (Lisboa) ia transmitir uma mensagem do Movimento. Desloquei-me para o Bar, onde ouvi a mensagem na companhia do Oficial de Dia e mais 2 alferes.

Logo de seguida voltei para o quarto e pouco depois ouvi a repetição da mensagem, feita agora por emissor da Guiné e mais tarde repetida pelo PFA [Programa das Forças Armadas]  , vulgo “PIFAS”.

26Abr

Às 08:00 dirigi-me para a Praça Honório Barreto, de uniforme nº1 (branco), acompanhado do Cor Lemos [4]

Terminada a cerimónia, voltei ao quarto e mudei de farda.

09:45 – Chegada ao QG/CCFAG para tomar parte no briefing diário. Enquanto aguardava no local habitual, juntamente com outros oficiais – nomeadamente Cor Vaz, Cor Pilav Amaral Gonçalves, Cmdt Ricou e Comodoro Brandão [5] –, o Cmdt Lencastre chegou conduzindo um Volkswagen muito apressadamente, travou bruscamente e dirigiu-se a correr ao Comodoro a quem comunicou qualquer coisa, de que eu só percebi “vêm aí pára-quedistas”. 

O Comodoro não reagiu, o Cor Amaral Gonçalves pareceu-me surpreendido e eu perguntei ao Ricou, também impassível, o que se passava.

Este informou-me que eram os pára-quedistas que estavam a cercar o QG. Perguntei qual a intenção, respondeu não saber. Perante a impassibilidade destes, dirigi-me à sala de reuniões para onde tinha visto entrar o Sub Chefe do Estado Maior – Ten Cor Monteny [6] –, disse-lhe o que se tinha passado e ele respondeu-me que não sabia de nada. 

Respondi que, nesse caso, o nosso General [7] também não devia saber. Confirmou-me que não. Nessa altura ordenei-lhe que fosse avisar o nosso General, o que se prontificou a fazer, tendo saído para o efeito [8]. 

Momentos depois o grupo de oficiais, que estava fora, dirigiu-se para a sala de reuniões. Fiz o mesmo e cada um ocupou o lugar habitual.

Faltavam o General Cmdt Chefe, o Brigadeiro Adjunto [9] e o CEM/QG/CCFAG [10]. Não estranhei, por supor que estariam ocupados – e não era a primeira vez que o Comodoro presidia à reunião.

Logo que todos tomaram lugares – e havia muito mais oficiais que era habitual em briefing de rotina, especialmente considerando que era feriado –, adiantou-se para a frente o Ten Cor Mateus da Silva [11] que pedia atenção e disse: 

“A Comissão na Guiné do Movimento das Forças Armadas, que está aqui presente, entendeu que o Sr. General Bethencourt Rodrigues não podia continuar no desempenho de funções. Foi-lhe dado conhecimento disso e destituiu-o. Em face disso nomeia o Sr. Comodoro, Comandante Chefe, e eu, que já desempenhava funções de direcção no Serviço das Obras Públicas, passo a desempenhar as de Secretário Geral” [12].

O Comodoro fez um gesto afirmativo de cabeça e disse: “Bem, vamos ao briefing!”. 

Houve uns curtos momentos de silêncio e passividade que me fizeram crer que só eu fora surpreendido, pelo que me levantei e pedi licença ao Comodoro para dizer: 

“Para mim é surpresa o que acabo de ouvir. Tenho uma missão de responsabilidade da defesa de Bissau. Desejo identificar os membros da Comissão da Junta que tomou tais decisões e conhecer a minha posição!” 

O Comodoro propôs que falássemos depois do briefing. Insisti para que se não adiasse porquanto não conhecia as novas estruturas criadas.

Além disso,  em 33 anos de Oficial nunca se me tinham deparado tais procedimentos dentro das estruturas militares, pelo que pedia o esclarecimento da situação. 

Enquanto falava, um capitão tentou intrometer-se, no que o impedi [13]. Mas logo que terminei, ele pediu licença ao Comodoro e sugeriu “que o senhor Coronel acompanhasse o Sr. General para Lisboa, no Boeing que o transportaria nessa tarde”.

Fiquei perplexo, o Comodoro não respondeu, mas fitava-me como esperando a minha reacção, e então retorqui: 

“Lamento que seja posto na situação de aceitar uma sugestão apresentada por um Capitão que não conheço, mas se o Sr. Comodoro a aceitar eu aceito-a também!”.

 O Comodoro respondeu: “Sim, é melhor, vai com o Sr. General para Lisboa!”. 

Perguntei se podia contactar com o Sr. General, a fim de lhe perguntar se dava licença que o acompanhasse. Perante resposta afirmativa, pedi licença e retirei-me. Dirigi-me de imediato ao gabinete do Comandante Chefe e perguntei ao Sr. General Bethencourt Rodrigues se autorizava que o acompanhasse no avião que o transportaria para fora de Bissau. 

Respondeu-me que não tinha que se pronunciar sobre isso porque fora forçado por um grupo de oficiais, que invadiram o seu gabinete, a abandonar o cargo. Esclareci que apenas pedia licença para o acompanhar, porquanto a ordem para embarcar tinha-me sido dada no briefing nas circunstâncias que atrás referi.

Entretanto entraram no gabinete o Comodoro, o Cor Vaz, o Cmdt Ricou e o Cmdt Lencastre. Após breves palavras que o primeiro disse ao Sr. General, em termos de lamentação (que eu não entendia… ), esclareci-o que o Sr. General autorizava que eu o acompanhasse. Perguntei por guia de marcha, e disse-me que não era precisa. Indaguei sobre hora e local de reunião e fui informado que podia reunir-me no Palácio, ao Sr. General, até às 13 horas. 

Logo de seguida – cerca das 10:15 –, dirigi-me ao COMBIS para recolher os meus haveres pessoais e informar o meu Chefe do Estado Maior, de que devia entrar em contacto com o Cmdt Chefe para lhe definir a situação e missões.

Quando chegava à entrada do Depósito de Adidos, acesso ao COMBIS, estava a formar junto à porta, muito apressadamente, um Pelotão do Batalhão de Comandos Africanos, transportado para ali numa viatura pesada estacionada em frente. O Pelotão estava completamente armado, inclusive com LGF e armas automáticas, equipado e municiado.

Deduzi que seria por minha causa, mas nem parei nem interferi. Rapidamente reuni os meus haveres após o que chamei o Ten Cor Altinino e o Cap Bicho para os informar que deixava o COMBIS, mas não tinha dados que me permitissem transmitir o Comando.

Cerca das 12:45 cheguei ao Palácio com a minha bagagem. Cerca das 14h, quando vi chegar a guia de marcha para o Brig. Leitão Marques e Cor. Hugo Rodrigues da Silva, telefonei ao Cor Vaz, Chefe do EM/CTIG solicitando uma guia também para mim. Às 15:30 o Cor Vaz e o Ten Cor Monteny disseram-me que o Comodoro não assinava a guia e não autorizava que eu saísse.

Surpreendido por esta nova versão, procurei o Comodoro para que me esclarecesse. Estava num dos corredores do Palácio para tomar parte na cerimónia de tomada de posse do novo Governo da Província. Respondeu que não estava na disposição de autorizar que saísse quem pedisse. Lembrei-lhe que eu não o pedira – ele é que o ordenara. Reagiu atirando-se para um sofá e declarando que se quisesse embarcar que embarcasse, mas que não me passava guia.

Mais tarde, já no aeroporto, pedi-lhe para me atender em particular, e solicitei que recordasse o que se tinha passado e a ordem que me dera, e a situação em que me colocara na presença de dezenas de oficiais. Decidiu então que me enviaria a guia pelo correio e autorizou que embarcasse.

Chamei o Cor Vaz e o Ten Cor Monteny e, estando também presente o Cmdt Ricou, o Comodoro deu ordem ao Cor Vaz para me enviar a guia para o DGA [14] no dia seguinte.

Nessa mesma ocasião, disseram (não me lembro quem) ao militar que fazia policiamento à porta de passagem para a gare, que eu podia embarcar.


(24-26Abr1974) – Cor. António Vaz Antunes

Fernando Vaz Antunes, documento inédito, cedido pelo autor ao Luís Gonçalves Vaz e ao blogue  Luís Graça & Camaradas da Guiné

Fonte: © Fernando Vaz Antunes (2014).  Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Guiné > Bissau > Quartel-General > O velho forte da Amura > Entrada principal



Foto: © João Martins  (2012). Todos os direitos reservados. [Edição: L.G.]


E no ainda Império Português, decorria aqui, neste antigo forte colonial (Forte da Amura), mais um Capítulo da História Colonial Portuguesa. No entanto ainda seriamos “senhores deste território”, desta Província Ultramarina,  por mais seis meses, já que o acantonamento e a retirada dos 42 000 militares portugueses (número máximo de militares presentes neste TO) , bem como as negociações com o PAIGC, iriam levar o seu tempo e conhecer a sua “turbulência”.

 Nesta fase final, ainda houve “pressões por parte do PAIGC” e por parte de alguns sectores políticos para que todo o processo de descolonização na Guiné fosse célere. Como tal em 14 de Outubro de 1974 saem os últimos militares portugueses por via aérea, e no dia 15 saem os últimos militares portugueses, por via marítima, estes já ao largo, desde o dia 14 de Outubro.

Espero assim ter contribuído mais um pouco, para a elaboração da “Memória Futura do Golpe Militar de 26 de Abril de 1974”, na antiga Província Ultramarina Portuguesa da Guiné. 

Resta-me agradecer ao Sr. Fernando Vaz Antunes, filho do Sr. Coronel António Vaz Antunes, a amabilidade em me ter confiado esta missão de divulgação deste importante “documento histórico”, de que é proprietário e legítimo herdeiro. Como a História se faz a partir do estudo de documentos e vestígios do passado, aqui ficou mais um, com grande valor para que historiadores e investigadores se possam debruçar sobre estes acontecimentos marcantes da nossa vivência colectiva.


Braga, 29 de Abril de 2014

Luís Beleza Gonçalves Vaz

____________

Notas de AVA/FVA/LGV:

[1] - Brigadeiro Octávio de Carvalho Galvão de Figueiredo, 2º Comandante do CTIG e, por inerência, Comandante do COMBIS (Comando da Defesa Militar de Bissau).

[2] - Batalhão de Artilharia nº 6520/73, mobilizado pelo RAL5-Penafiel e aerotransportado entre 01 e 04Abr74, do AB1-Portela para a BA12-Bissalanca, de onde marchou para o CIM-Bolama.

[3] - Coronel de cavalaria CEM Henrique Manuel Gonçalves Vaz (CEM/QG-CTIG desde 07Jul73 até 14Out74)

[4]  -«A cerimónia começou mais tarde porque se aguardou, em vão, a chegada do Gen Cmdt Chefe. A dada  altura, por decisão do Comodoro Brandão que estava presente, deu-se início à cerimónia com uma alocução  do então Maj de infantaria Alípio Emílio Tomé Falcão, Comissário Provincial da MP na Guiné.» [AVA]

[5] - António Horta Galvão de Almeida Brandão, Comandante do ComDefMarG (Defesa Marítima da Guiné).

[6] - António Hermínio de Sousa Monteny, Tenente-Coronel CEM

[7] - José Manuel de Bethencourt Conceição Rodrigues, desde 29Set73 Governador e CCFAG.

[8] - «Houve entretanto um curto impasse: o Monteny continuava a escrever uns papéis, que eu lhe retirei da secretária repetindo-lhe que fosse de imediato – e ele foi. Isto passou-se na sala, enquanto o resto do pessoal estava fora. Quando o Monteny saiu, vim atrás dele, mas ao chegar à porta vi que os que estavam fora, incluindo o Comodoro, vinham entrando para o briefing, e eu fiz o mesmo, enquanto o Monteny descia o jardim.» [AVA]

[9] - Brigadeiro Manuel Leitão Pereira Marques.

[10] - Coronel CEM Hugo Rodrigues da Silva. [O QG/CTIG era o Quartel General do Exército (situado nas instalações militares de Santa Luzia), enquanto o QG/CCFAG era o Quartel General de todas as Forças Armadas em serviço naquele território (situado no antigo Forte da Amura, mesmo em frente ao cais de Bissau). O coronel Henrique Gonçalves Vaz, CEM/CTIG na altura destes acontecimentos, irá desempenhar as funções de Chefe do Estado-Maior do CTIG/CCFAG (Comando Unificado), após este Golpe Militar.]

[11] - António Eduardo Domingos Mateus da Silva, TCor Engº Trms, desde Jul72 Comandante do AgrTmG.

[12] - «O Mateus da Silva propôs-se ocupar os cargos de Secretário Geral e Encarregado do Governo – o que veio a acontecer –, tendo sido “empossado” cerca das 12h quando nós estávamos ainda no Palácio do Governo (e residência do Governador).» [AVA]

[13] - «O Capitão era o José Manuel Barroso, miliciano, que dirigia o semanário “Voz da Guiné” (e mais nada); era casado com a “fulana” que estava em Bissau para estudar a instalação da Universidade de Bissau, recebendo por isso 15 contos X mês (naquele tempo… ).» [AVA]

[14] - Depósito Geral de Adidos (Calçada da Ajuda, em Lisboa).

(Continua)

14 comentários:

jpscandeias disse...

Estava em Bolama no dia 25 do quatro e dias seguintes onde pude aperceber-me da confusão, isto é da falta de informação que chegava pelo menos aos furriéis. Assim ficamos durante largos dias, vivendo de boatos, alguns mais tarde confirmados como a prisão do Comandante Chefe. Recordo que uns dias mais tarde, não é para rir, fomos informados pelo major Lima, uma bela peça, que poderíamos, se o quiséssemos, participar numa manifestação do PAIGC. Que me recorde tal sugestão não teve aderência.
Depois a bagunça que veio afectar, os que como eu, aguardavam a chegada do periquito. Acabou por não chegar. A muito custo e depois de alguma insubordinação lá fui para Bissau onde aguardei alguns dias no QG embarque nos TAM. No dia aprazado eu e muitos outros militares fomos informados de que não tínhamos lugar no avião porque este estava ocupado pelo pessoal da DGS e família. Eu mais dois furriéis, um deles de nome Spínola, fomos ao QG e obtivemos uma autorização escrita do Major Freitas, responsável pelas companhias africanas, para regressarmos a Lisboa a extensas próprias, documento que ainda hoje tenho. Fomos a TAP compramos o bilhete e no dia seguinte, já em meados de Maio, aterramos em Lisboa.
Penso não haver muitos militares que fizeram a viagem de regresso a sua casa pagando do seu bolso. Foi a primeira benesse que o 25 de Abril me ofereceu.

João Silva ex-furriel mil, Ccav. 3404, Cabuca, Ccaç 12, Bambadinca e Xime, CIM, Bolama.

JD disse...

O documento transcrito é, naturalmente, curioso, mas pouco acrescenta à sucessão de acontecimentos gerados na ocasião.
A primeira curiosidade prende-se com a coincidência de licenças do 1º e 2º. comandantes do CTIG. De tal situação pode inferir-se que a máquina estava "oleada" e que a presença daqueles senhores não seria indispensável para o cabal desempenha das funções do CTIG.
A segunda curiosidade evidencia o espírito de abertura ao golpe manifestado por altos comandos da Guiné. Pode inferir-se que os zum-zuns deram tempo para reflectir sobre a posição a tomar, e que em off cada um tratou de acautelar carreiras.
Daqui resulta, necessariamente, uma quarta curiosidade, a da "versatilidade" do conceito de lealdade e dedicação à hierarquia, como é recorrentemente mencionada pela formação militar. Tal registo é tão mais evidente, quanto o MFA agregava capitães com simpatias por todo o espectro dito pensante, sendo que alguns dos seus membros, sem experiência política, nem avaliavam no que iam meter-se.
A quinta curiosidade tem a ver com a importância (e liderança) de um miliciano que tinha suficiente conforto para dar ordens (sob a forma de sugestão, mas ele contaria com os necessários apoios), aos comandos de Bissau. Por acaso, foi o mesmo oficial que ajudou Spínola na publicação de um livro, que veio a desencadear uma onda irrequieta sobre o estado da Nação, e que punha em causa o princípio do integracionismo territorial português, e mais tarde, veio a saber-se, é sobrinho de outro descolonizador que a História vai registar, e disse o seguinte: "Como é que se exerce o direito de autodeterminação nas colónias? Esse é o problema. Através de uma votação democrática em que cada homem terá um voto? Em quase todos os regimes africanos actiuais, existe um partido único.Esse partido único existe em Moçambique. Nós tínhamos assim duas possibilidades a seguir: ou impunhamos um referendo, e então íamos dar a possibilidade a certos grupos fantoches, que não existiam antes do 25 de Abril, de poderem aparecer a público, ou íamos reconhecer aquele movimento nacionalista que conduziu uma guerra durante treze anos em Moçambique. Mós seguimos o segundo caminho por razões programáticas" - Mário Soares, "Democratização e Descolonização - Dez Meses no Governo Provisório", pg.150. Até parece que foi outro quem reclamou contra o regime único de Salazar, e apontava a democracia como o caminho a seguir.
Por fim, a última curiosidade resulta do comentário do João Silva, que refere o convite à tropa para particuipar numa "manif" a favor do PAIGC. Não terá correspondido a uma traição, ou também teremos que levar a convocatória à conta da solidariedade internacional?
JD


Luís Graça disse...

Luís Vaz, tens razão, o gen Bethencourt Rodrigues (e não Bettencourt, como habitualmente se escreve), foi avaro em palavras (e emoções) ao referir-se, ao de leve, o “golpe militar de 26 de abril" no seu depoimento no âmbito dos Estudos Gerais da Arrábida...

Relê o depoimento dele…

In: Estudos Gerais da Arrábida A DESCOLONIZAÇÃO PORTUGUESA
Painel dedicado à Guiné (29 de Julho de 1997)

Depoimento do general Bettencourt Rodrigues (…)

(…) Manuel de Lucena: Mas o MFA na Guiné, ao nível dos quadros, aparentava estar bem organizado, tinha um número muito significativo de adesões. Qual era a sua percepção?

General Bettencourt Rodrigues: Não tive conhecimento disso, Que as condições eram terríveis, não contesto. Agora dizer que a tropa estava desmoralizada, de maneira nenhuma! Em Angola podia cumprir-se uma comissão alternando sítios fáceis com difíceis. Na Guiné não; vivia-se num sobressalto permanente. Por isso é que na Guiné as comissões duravam 21 meses e em Angola 24. Só quando os strelas entraram em cena é que as comissões passaram a 24 meses. O general Spínola deixou ficar os que lá estavam e aumentou o contingente com tropas frescas.

Manuel de Lucena: O 25 de Abril foi então uma surpresa para si?

General Bettencourt Rodrigues: Tanto foi que me assaltaram o gabinete! Embora quase tivesse assistido ao golpe das Caldas, quando vim a Lisboa em Março de 1974, não dei por nada. Quando a Revolução estalou, estava perfeitamente inocente. (…)

http://www.ahs-descolonizacao.ics.ul.pt/docs/guine_1997_07_29.pdf

Antº Rosinha disse...

Essa do combatente Jpscandeias regressar a casa com passagem paga por ele nem os Retornados da Ponte Aérea à última hora que só pagaram a ida.

Este é um pormenor bem caricato da descolonização exemplar.

Luís Gonçalves Vaz disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
antonio graça de abreu disse...

Meu caro Luís Vaz

Regressei de Bissau a Lisboa no dia 20 de abril de 1974, após onze meses duros e difíceis no sul da Guiné, Cufar e arredores.

Dizes que logo a seguir ao 25 de Abril (estavas em Bissau onde o medo do PAIGC sempre foi grande e muito exagerado) que:

"Eu penso que em Bissau, nesta mesma altura, corremos riscos de um Ataque à Cidade e aos QGs ..."

Não acredito. O PAIGC, 1974, não tinha força militar para atacar Bissau e os Quartéis generais portugueses, nem seria essa a sua táctica,como a História comprova. Venceram a guerra na Guiné por desistência de uma das partes, cansada, desmoralizada, farta da guerra e com uns senhores em Lisboa a prometerem mundos novos, sociedades mais justas.
Mas registo a inevitável confusão revolucionária dos capitães na Guiné, e como depois se combateram e comeram uns aos outros.
Resta-nos hoje a clarividência,o desassombro, a inteligência superior do nosso camarada de armas Vasco Lourenço.

Abraço,


António Graça de Abreu

Luís Gonçalves Vaz disse...

Olá Graça de Abreu:

Já tinha saudades de trocar opiniões contigo! O meu comentário é "mais um exercício teórico" sobre eventuais consequências de um "desabamento da cadeia de comando" na altura .... o que felizmente não aconteceu e ainda bem. De qualquer forma eu na altura sentia-me seguro, a "Máquina Militar Portuguesa" estava bem implantada e "Oleada", claro que á custa do sofrimento de muita juventude portuguesa, eu lembro-me bem daqueles tempos, foram também marcantes para mim! Mas posso dizer-te que a "Estrutura do MFA na Guiné Portuguesa de então", estava muito bem montada, e "acho que se aqui o 25 de Abril desse para o torto" na Guiné, o "Golpe Militar"(Não Revolução)iria sempre para a frente, concordarás comigo? Muito poucos quereriam ali continuar a Lutar ........ Brevemente iremos ter "Versões oficiais" de alguns dos oficiais revoltosos intervenientes neste "Golpe Militar de 26 de Abril de 1974" ... e que felizmente estão vivos e aqui irão dar "A sua visão destes mesmos momentos Histórico-Militares.

Grande Abraço

Luís Gonçalves Vaz

JD disse...

Caro Luís Vaz,
Tens prendado o blogue com informações muito interessantes da vida militar na Guiné.
referes no teu último comentário referes que a "estrutura do MFA na Guiné Portuguesa de então estava muito bem montada".
Todavia, lembro que o Programa do MFA estabelecia que o futuro das colónias seria alcançado pela autodeterminação dos povos de cada território, através de referendu, nos termos do Artº. 73º. da Carta das Nações Unidas. Ora, refere o João Silva que poucos dias após, foi informado pelo major Lima, "uma bela peça", de que poderia participar numa manifestação do PAIGC, situação que, obviamente, contraria aquela disposição do Programa.
Também a "bagunça" declarada não parece ajustar-se "à estrutura muito bem montada", tal como não se perecebe que um miliciano se tenha destacado a sugerir o repatriamento de um oficial superior, que agia com grande dignidade em correspondência ao seu juramento e sentido ético, perante a passividade dos restantes oficiais que compunham o ramalhete. Provavelmente todos tinham medo de todos, e, a assim ser, o ambiente era de falsidade.
Do que aconteceu a seguir, já aqui temos inumeros testemunhos de repugnância sobre os destinos de tantos portugueses que foram passados a pente fino, ou a hipócrisia dará para darmos o dito por não dito? E a responsabilidade desses acontecimentos, com repetição ainda mais bárbara noutros territórios, que incluíu a destruição de vidas, bens económicos e estruturas patrimoniais que garantiam o progresso civilizacional, não terá decorrido da "bagunça" da aliança de um certo MFA com as forças descolonizadoras principalmente relacionadas com M. Soares, que se ufanou de liderar o preocesso descolonizador (vide O Livro Negro da Descolonização), deixando as novas nações à mercê dos grandes colonizadores? E se estava tão bem "montada", como se pode compreender que após o golpe, se tenham verificado inúmeras controvérsias entre os revoltosos? Finalmente, poderemos considerar o momento actual como a consolidação dos objectivos do MFA? Ou os militares andaram aluados com as progressões nas carreiras, e só agora com a aplicação de impostos e restrições sentiram alguma deriva àqueles objectivos?
Com um abraço
JD

Luís Gonçalves Vaz disse...

Boa noite:
Para melhor comunicação, resolvi apagar o primeiro comentário e melhorar alguns pormenores, a saber:
Caros camarigos, tanto quanto sei (a ideia que ainda me ficou ao fim destes 40 anos), o "assalto ao gabinete" do Comandante em Chefe, general Bethencourt Rodrigues ... deve ter sido "muito desagradável", já que decorreu de um Golpe Militar! E quanto a mim os oficiais revoltosos do MFA, não admitiriam retorno, obviamente, estavam muito bem organizados, e deles faziam também parte alguns oficiais superiores, Majores e pelo menos um Tenente-coronel (que até seria familiar do então Comandante do CTIG, o sr. Brigadeiro Banazol, de que me lembro muito bem e até boleias me deu no seu mercedes, entre a cidade de Bissau (Liceu Honório Barreto) e santa Luzia, onde morava, mesmo em frente ao clube de oficiais.
Não entendo mesmo é a "destituição do sr. Coronel António Vaz Antunes", muito menos pelas razões aparentes, que o documento da sua autoria nos dá, nomeadamente por questionar quem eram os representantes dos MFA… Haveria outras razões? Será que devido ás funções dele (comandante Interino do COMBIS) poderia “Travar a evolução do golpe em curso? Brevemente deveremos saber mais, já que estes oficiais do MFA de então poderão “dar luz” a estas questões. Acho que será quase uma obrigação …………………
De qualquer forma, considero que ao afastá-lo das suas funções (ao sr. cor Vaz Antunes), os representantes do MFA criaram um vazio na Defesa de Bissau: para todos os efeitos era ele quem estava à frente do COMBIS (Comando da Defesa de Bissau). Eu penso que em Bissau, nesta mesma altura, corremos alguns riscos de um Ataque à cidade e aos QGs (ainda que de baixo nível) ..... Eu estava lá e senti isso mesmo! Não “Pânico”, mas havia muitos Boatos que iriamos sofrer um “Ataque aéreo” por exemplo! Mas no fundo eu senti-me sempre seguro, apesar desses mesmos boatos.
Continua ......

Luís Gonçalves Vaz disse...

Continuação .......
No entanto, fazendo agora uma análise (passado 40 anos), as quebras de "cadeias de comando", os saneamentos/afastamentos (alguns seriam imprescindíveis), a bandalheira nalguns sectores militares, etc., poderiam ter criado "graves prejuízos em termos de segurança". Tal não aconteceu, pois a necessária “Cadeia de Comando”, reorganizou-se e foram tomadas “as medidas certas” para mantermos a “Segurança quer em Bissau, quer a gestão da frente de combate, que sei que aconteceu ainda durante uns tempos, antes de os nossos militares iniciarem convívios com os guerrilheiros do PAIGC.
Mas relativamente ao “Golpe em si, o de 26 de Abril”, que me fez levar a realizar estes artigos agora postados, felizmente tudo correu em Bissau sem sangue, nesse aspeto, foi à "boa maneira portuguesa", com brandos costumes! Sendo assim não fomos atacados pelo IN, pois se calhar, os seus “Serviços de Inteligência” (do PAIGC), não estariam a par dos “nossos golpes internos”, tal qual o general Bethencourt Rodrigues, que também foi apanhado de surpresa . Ainda bem, foi um “golpe palaciano”, sem “fogo real, sem vítimas mortais, (já havia muitas nas várias frentes de combate) … e assim estou aqui, de boa saúde para poder contar alguns destes episódios, parte dos quais foram-me “avivados na memória” através da minha mãe, já que o meu pai, não falava sobre estes assuntos com os filhos ….
Quanto ao "assalto ao gabinete do CMDT CHEFE, alguns dos revoltosos teriam sido "menos corretos" com o Sr. General Bethencourt Rodrigues (segundo ele e outras opiniões...), já que “jovens capitães” teriam de ser “contundentes e muito firmes …. Para imporem uma destituição de UM GENERAL CMDT CHEFE com muita CLASSE e muita influência no meio dos seus homens (sempre foi pacífico que este general era muito admirado pela maioria dos seus oficias) e houve mesmo “aspetos Dramáticos”, segundo o então capitão Jorje Sales Golias, um dos oficiais “revoltosos do MFA na Guiné”, ao ponto de o CEM/CTIG, que não fazia parte do MFA da Guiné ( mas com o qual acabou por se solidarizar naturalmente), se impor no sentido de que aqueles oficiais teriam de "respeitar o Sr. general" em todo aquele processo (repito que ele aderiu sem pensar muito), sob a pena de não aceitar continuar nas suas funções (acabou por vir a ser o CEM/CTIG e CCFAG do Comando Unificado, já que desde 17 de Agosto de 74, que oficialmente se constitui no TO da Guiné, um Q. G. unificado para o C. C. (Comando Chefe) e CTIG, Publicado em Ordem de Serviço do Comando Chefe.
O CEM/CCFAG já estava afastado (Coronel Hugo Rodrigues), o sr. Brigadeiro Leitão Marques (gostava de perceber a razão deste afastamento, já que o MFA da Guiné contava com ele!!!), o General Bethencourt Rodrigues, o Coronel António Vaz Antunes (Comandante do COMBIS),enfim todos oficiais afastados no Golpe Militar de 26 de Abril em Bissau!

continua ......

Luís Gonçalves Vaz disse...

Continuação .....

O 1º Comandante estava de licença, o segundo parece que também ..... Ficaríamos sob o Comando dos Comandantes da Marinha? Agora percebo melhor “que o melhor para mim e para outro dos meus irmãos”, foi vir nos TAM [Transportes Aéreos Militares] logo no mês de Maio .... O Liceu Honório Barreto finalizou o ano lectivo em Maio/Junho. E o meu pai que levou três filhos menores para Bissau em 1973, contra muitas opiniões, tratou de nos enviar para a Metrópole logo a seguir ao 25 de Abril, talvez porque temesse (ou não?) "um ataque em massa a Bissau", não sei, mas não deve ter sido, pois o meu irmão mais pequeno ficou lá.
Mas agora depois destas "análises após 40 anos", acho que fez muito Bem, a "coisa podia ter corrido para o torto" .... já que o IN, o PAIGC poderia ter aproveitado …. Mas pelos vistos não tinham “competência militar” para isso, a “Nossa Máquina Militar estava Bem Montada e Oleada”, ainda que ao custo do sofrimento de muitos jovens Portugueses nas várias frentes de combate, neste TO (Teatro de Operações), sem dúvida alguma, o pior, o mais duro de todos os nos TO da altura.
Para finalizar, e ainda relativamente ao “Golpe Militar de 26 de Abril no TO da Guiné”, apenas gostaria de dizer, que quanto eu sei, e aliás como o tenente-coronel Jorje Sales Golias diz “Foi um acto pacífico, civilizado, mas dramático”, foi de facto em minha opinião, pois apesar das “cenas dramáticas”, que mais tarde ou mais cedo iremos ser esclarecidos, os “Altos Comandos deste TO” foram parcialmente substituídos, tendo o meu falecido Pai, na altura CEM/CTIG acompanhado o sr. general Bethencourt Rodrigues ao avião (penso que nesse mesmo dia ?) e despediu-se dele com um abraço, tendo o próprio general agradecido a “forma altamente digna com que foi tratado, e tanto quanto eu sei as queixas/mágoa que o sr. general se referia durante estes anos todos, se relacionava especificamente com “a forma como o destituíram naquela manhã no Comando Chefe”, e como não assisti a esses momentos dramáticos, mais não poderei dizer ………
Abraço

Luís Gonçalves Vaz

Luís Gonçalves Vaz disse...

Camarigo J. D. .

Quando dizes: "tal como não se perecebe que um miliciano se tenha destacado a sugerir o repatriamento de um oficial superior, que agia com grande dignidade em correspondência ao seu juramento e sentido ético..", ser, o ambiente era de falsidade.
Eu posso ajudar-te a compreender esse facto, ou melhor, tu já admites no resto da tua reflexão, é claro que os "oficiais revoltosos do MFA" tiveram receio que o Comandante do COMBIS, fosse neutraliza-los com as suas forças! Só assim se percebe que para além dos Paraquedistas e Polícia Militar, alguns comandos africanos estavam à espera do sr. Coronel Vaz Antunes no COMBIS, está muito clara essa ideia, ou não? Mas espera mais um pouco .... os "meus serviços de inteligência" dizem-me que em breve vamos ver essas e mais algumas "questões esclarecidas", o Artigo sobre o Golpe de 26 de Abril, por mim realizado, com a colaboração fundamental do Fernando Vaz Antunes, quase que "obriga" a que algum dos oficiais revoltosos do MFA da Guiné, apareçam ou enviem através de "alguém", uma Resposta a todas as nossas dúvidas! É a "Verdade dos Acontecimentos" ou a "Versão mais Próxima da Verdade Histórica-Militar" que todos Almejamos conhecer .....

Forte Abraço

Luís Gonçalves Vaz

Anónimo disse...

Caros João Silva (jpscandeias) e António Rosinha:

Caro João Silva, penso já termos chegado à conclusão que ainda fomos contemporâneos em Bolama, embora por pouco tempo. As tuas fotos daquele tempo avivaram-me a memória.

Dizes no teu comentário acima:

"Penso não haver muitos militares que fizeram a viagem de regresso a sua casa pagando do seu bolso. Foi a primeira benesse que o 25 de Abril me ofereceu".

Olha que não é bem assim!

Gostava que lesses o Poste 9198, do camarada Adriano Neto, o qual também comentei.

Poderás constatar que:

Em Janeiro de 1974, portanto 3 meses ANTES DO 25 de ABRIL e da "bagunça" que referes, já havia camaradas (muitos) a pagar do seu bolso a viagem de regresso a casa na TAP.
Eu fui um deles, entre muitos outros, e já com 25 meses de comissão.

Como vês, parece que a tal "bagunça" e a tal "primeira benesse" que o 25 de Abril te ofereceu, já existiam muito antes daquela data.

Dizes que aterraste em Lisboa em meados de Maio (3 semanas após o 25 de Abril).

Vá lá, vá lá! Querias que um sistema fortemente implantado e arreigado (não sei por quem nem a favor de quem), mudasse em apenas 3 semanas?

Caro António Rosinha, dizes também no teu comentário:

"Essa do combatente Jpscandeias regressar a casa com passagem paga por ele nem os Retornados da Ponte Aérea à última hora que só pagaram a ida.

Este é um pormenor bem caricato da descolonização exemplar".

Agradeço que também leias o Poste que indico (P 9198).
Chamas-lhe "um pormenor bem caricato". Verás que a "caricatura" já existia ANTES do 25 de Abril.

Sempre foi minha convicção que as "descolonizações exemplares" foram um reflexo das "colonizações exemplares".

Um abraço para o João Silva e para o António Rosinha, extensivo a todos os camaradas.

José Vermelho










JD disse...

Caro Lúís Vaz,
Esperemos que o repto que lanças na parte final do comentário que me diriges, possa ter correspondência prática, e venham a terreiro outras importantes e claras informações.
Com um abraço
JD