sábado, 14 de novembro de 2015

Guiné 63/74 - P15366: In Memoriam (239): O Rui morreu, custa a crer, é triste (Francisco Baptista, ex-Alf Mil Inf)

1. Mensagem do nosso camarada Francisco Baptista (ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2616/BCAÇ 2892 (Buba, 1970/71) e CART 2732 (Mansabá, 1971/72), com data de 12 de Novembro de 2015:

Morreu faz hoje um mês, subitamente, de enfarte do miocárdio.

Pais, irmãos, sobrinhos, primos, tios, amigos, colegas, clientes, vizinhos, todos ficaram incrédulos e tristes.
Centenas de pessoas estiveram presentes no seu funeral, numa homenagem, sentida e amargurada, a esse grande homem que parecia não ter defeitos que se lhe pudessem apontar. Sem defeitos de origem física, moral ou psicológica. Tinha até feito, havia pouco tempo, exames médicos que atestavam o seu bom estado de saúde.

Morte cruel, súbita, estúpida que rouba a vida de um homem de 48 anos em pleno uso de todas as suas faculdades físicas, mentais, intelectuais e profissionais. Morte bárbara e cega que ceifa a vida indiscriminadamente sem atender às qualidades humanas, de alguns que por serem seus portadores em tão grande número deviam ter direito a uma vida muito longa para as propagarem, pelo seu exemplo, entre toda a sociedade.

Amizade, altruísmo, bondade, simpatia, alegria, honra, dedicação, cordialidade, estas e outras boas qualidades, fazem parte do retrato desse amigo que partiu e que nos deixou a todos mais pobres, porque ele era o melhor de todos e fazia-nos acreditar que há homens bons e que o homem não é o lobo do homem, como disse o filósofo.

Não há um Deus único nem muitos deuses que possam justificar esta injustiça que a fragilidade da natureza humana prega mesmo aos melhores, aos mais virtuosos, aos mais santos dos homens. Um misto de incompreensão e revolta cresce no coração das mulheres e dos homens que o amaram e foram tantos.
Morre jovem aquele que os deuses amam, porquê? Será para satisfazer a sede de sangue e a crueldade dos deuses. Há homens que irradiam tal bem-estar e simpatia entre os seus semelhantes, que são como cometas que quando passam nos nossos céus derramam um halo luminoso que embora breve nos arrebata e ao mesmo tempo acalma tanto o nosso espírito. Para todos os que te choramos, resta-nos a felicidade de te termos conhecido e ter apreciado a harmonia e boa disposição que criavas com a tua presença, com o teu eterno sorriso, com a tua bonomia inata.

Muito obrigado pela lição de vida que nos deste! O respeito pelo luto e pela dor da família mais próxima obriga-me a ser discreto em divulgar dados biográficos sobre ele. Toda a família próxima ficou em estado de choque, como é de calcular. Para os pais a morte de um filho é um sofrimento enorme, talvez a maior provação humana, pois a ordem natural, comum a todos os seres vivos, que preserva os mais novos, e condena os mais velhos, é subvertida.
Numa primeira reacção todos os pais nesta situação, duvidam de todas as leis e da apregoada harmonia do universo, porque para eles a Terra começa a girar ao contrário.

Este acontecimento triste faz-nos também reflectir sobre a dor imensa que tiveram os pais dos nossos camaradas que morreram na Guiné, muitas vezes ao nosso lado. Na Ilíada, Príamo, rei de Tróia e pai de Heitor, ajoelha-se em lágrimas aos pés do grego Aquiles, seu inimigo, a reclamar o corpo do filho, morto por ele, em duelo, para lhe dar uma sepultura condigna.
Há sentimentos que são eternos e universais.

O Rui morreu num dia aziago, 9 de Outubro de 2015, e deu-se conta do perigo iminente que corria. Era um veterinário, além de bom profissional muito sensível. Sei que chorou quando há alguns meses lhe morreu um cão já muito velho. Pertencia a uma família socialmente muito respeitada pelas suas qualidades morais e humanas. O pai dele, formado em economia, foi nosso camarada, como capitão miliciano, na administração militar, em Moçambique, onde o Rui e mais dois irmãos, ainda meninos estiveram na companhia dos pais.

Deixou viúva uma jovem senhora. A palavra camarada, todos vós o sabeis, reúne em si muitos predicados, amizade, lealdade, confiança e outros.

Meus caros camaradas deixai que partilhe convosco a morte deste amigo, que para mim foi também um grande camarada.
O Rui morreu, custa a crer, é triste.
Até sempre camarada!

Um abraço.
Francisco Baptista
____________

Nota do editor

Último poste da série de 30 de agosto de 2015 Guiné 63/74 - P15057: In Memoriam (238): Eduardo Veríssimo de Sousa Tavares (1947-2015), ex-1º cabo escriturário da CCAÇ 2590 / CCAÇ 12 (Contuboel e Bambadinca, 1969/71). O funeral é amanhã, às 10h20, em Oliveira do Douro, Vila Nova de Gaia... (Fernando Andrade de Sousa, Trofa / José Fernando Almeida, Óbidos)

Sem comentários: