Cambridge
1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) com data de 4 de Novembro de 2016:
Queridos amigos,
Bem gostaria de saber transmitir a emoção desta viagem a Lavenham e entrada em Cambridge, visitei salvo erro há nove anos atrás. A rivalidade entre Oxford e Cambridge vê-se nos filmes e na literatura: os de Oxford ufanam-se pela plêiade de políticos e intelectuais que saíram daqui às fornadas, os de Cambridge põem em cima da mesa os cientistas ao longo dos séculos e até agora, naquele preciso em que aqui cheguei anunciava-se o Prémio Nobel da Física para três cientistas de Cambridge. E à entrada do Christ College lá estava a imagem de Darwin. E no meio da discussão os de Cambridge jogam pleno quando falam na mais esplendorosa capela que existe no Reino Unido, a King's College Chapel, o suprassumo do gótico final.
Um abraço do
Mário
Central London, em viagem low-cost (5)
Beja Santos
O viandante trazia o firme propósito de conhecer uma aldeia medieval bem preservada, com todos os condicionamentos que a atração turística impõe. Lavenham, no Suffolk, ganhou a sua prosperidade graças à lã, viveu a Guerra das Rosas, e desde a era Tudor até à Restauração de Carlos II pôde manter os seus sinais de glória. Caiu depois na obscuridade, de que não mais se recompôs. Mas ficou-lhe a fama e o proveito do passado, percorre-se a povoação e sente-se que há gosto em preservar os fumos dessa glória. Um dia, caso possa, regresso aqui com a mesma satisfação com que aqui cheguei.
Chega-se a Cambridge por comboio ou autocarro. Lavenham perdeu comboio em 1965, o viandante não tinha alternativa, foi uma bela viagem de autocarro. Cambridge é a cidade universitária rival de Oxford. Esta fala grosso com os primeiros-ministros que deu ao Reino Unido. Cambridge arroga-se à ciência, à teologia, à arqueologia e tem de facto a mais capela de toda a ilha, King’s College Chapel, não há termo de comparação possível. Há colégios que vêm da Idade Média, dos inícios da era Tudor, outros são mais modernos, como este que aqui se mostra, maciço e com frontão a copiar a arte grega, chama-se Downing, é do século XIX. Valeu a pena começar por aqui.
Entardeceu, andou-se a referenciar o perímetro que amanhã será palmilhado. Reteve-se este céu com lembranças de um aguarelista que o viandante superlativa, Turner. E agora vai-se descansar para a grande aventura de andar a espreitar colégios.
A artéria principal começa por ter o nome de Regent Street, foi aqui que se deparou este monumento, tão belo e tão singelo. Não há localidade que não guarde memória dos seus mortos nas diferentes guerras do século XX. Fixe-se a imagem deste jovem que parece lançado pela esperança de ir trazer paz rapidamente para a sua pátria, e por ironia ele parece avançar para a cidade universitária, ele que traja como quem vai para as trincheiras da Flandres, parte incauto e confiante, não sabe o inferno que o espera.
É impossível ficar insensível a estes memoriais, nestas lápides estão afixados todos aqueles que frequentaram Pembroke College e que morreram nas guerras.
Chama-se pois Pembroke College, os alunos chegaram há uma semana, andam ufanos a exibir o seu traje académico (gown), obrigatório ao fim da tarde ou quando vão visitar o tutor ou participam em sessões solenes. Um colégio identifica-se na frontaria, onde há uma receção, abre para um primeiro jardim cercado de edifícios onde, separadamente, vivem professores e alunos. Tudo vai da riqueza e da extensão do colégio, se tem bibliotecas valiosas, piscinas e espaços lúdicos. As atividades desportivas decorrem à parte, desde a esgrima ao remo. O colégio é o colégio, à mesa senta-se o aluno de filologia clássica ao lado do futuro engenheiro informático, o que os irmana é puderem dizer para toda a vida: o meu colégio foi o Pembroke.
Os colégios também se distinguem pelas suas capelas e pelos seus refeitórios. A capela do Pembroke começou a ser construída no século XVI, é sóbria e elegante dentro das linhas do mais puro classicismo. À entrada, o viandante pode recolher uma pagela com oração, é muito antiga e o seu autor por aqui andou entre 1589 e 1605: “We commend unto thee, O Lord,/Our souls e our bodies,/Our minds and our thoughts,/Our prayers and our hopes,/Our health and our work,/Our life and our death,/Our brothers and sisters,/Benefactors and friends,/Household, neighbours,/ Country and all God’s folk,/This day and always. Amen”.
Esta é a fachada do mais importante museu de Cambridge, The Fitzwilliam, tem um património incalculável em arte antiga e arte oriental, armaria, o seu primeiro andar é esplendidamente ornamentado e decorado com salas e galerias onde tudo se pode encontrar desde arte flamenga e espanhola e italiana até à arte contemporânea. O viandante entrou de raspão, amanhã andará por aqui mais a preceito até porque está sedento de visitar uma exposição de iluminuras, promete ser um deslumbramento.
Esta é a fachada de Christ’s College, terá sido criado pela mãe de Henrique VII. Um colégio também é importante pelas personalidades que o frequentaram. O Christ mostra logo à entrada um nome transcendente: Darwin. E lá dentro fala-se num grande poeta inglês, Milton.
Este é o refeitório do Christ’s, é a imagem que vemos em muitos filmes: os professores do pódio, há por ali decantadores de vinho do Porto, os alunos aguardam um sinal para se atirar à comida, então os criados circulam, com pompa e circunstância. Este é o ritual do jantar, ao almoço haverá maior descontração, cada serve-se à hora que chega. Convém recordar que o ensino distingue-se bastante do nosso, há inúmeras palestras e uma regra implacável: chumbar numa disciplina é chumbar automaticamente o ano. Daí o papel do tutor, é o vigilante que acompanha regularmente a evolução dos conhecimentos.
Faz-se uma pausa à circulação pelo meio universitário, a cidade também deslumbra pelo caráter da sua arquitetura, aqui fica imagem comprovante. Foi um dia e peras. O viandante quer descansar os pés, amanhã há o Fitzwilliam, mais colégios e a King’s College Chapel. Bendita a hora em que me passou pela cabeça este itinerário entre Londres e Cambridge.
(Continua)
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Nota do editor
Último poste da série de 8 de março de 2017 > Guiné 61/74 - P17118: Os nossos seres, saberes e lazeres (202): Central London, em viagem low-cost (4) (Mário Beja Santos)
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