Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
quinta-feira, 31 de maio de 2007
Guiné 63/74 - P1804: Bibliografia (8): Rumo a Fulacunda, de Rui Ferreira: Em defesa do bom nome dos velhos comandos (João Parreira)
Emblemas do Grupos de Comandos Fantasmas (1965/66) e Apaches ( 1966) .
Fotos: Tantas Vidas, blogue de Virgínio Briote (com a devida vénia).
1. Texto do João Parreira, ex-furriel miliciano comando dos Grupos de Comandos Os Fantasmas e Os Apaches (1965/66) (1).
Caro Camarada de Tertúlia, Coronel Rui Alexandrino Ferreira,
Sobre o seu livro Rumo a Fulacunda (2), extremamente interessante e elucidativo - e como tal faço votos para que sejam vendidos muitos exemplares - gostaria, se me permite, e por me parecer pertinente, fazer apenas algumas considerações, caso contrário não ficaria bem com a minha consciência (3). Para isso vou transcrevo algumas, breves, partes do livro.
Estive nos Comandos em Brá, oficialmente desde 11 de Fevereiro de 1965 (excepto entre 21 de Fevereiro e 14 de Março de 1965) no Grupo Fantasmas (1º. Curso) e, depois da sua extinção, no Apaches (2º. Curso).
Fiquei neste grupo também até à sua extinção uma vez que em 30 de Junho de 1966 chegou a Brá a 3ª Companhia de Comandos que recebeu instrução em Lamego, no CIOE, e foi mobilizada no RAL 1.
Ainda foi ministrado na Guiné um 3º Curso que terminou a 28 de Abril de 1966, ou seja 2 meses antes de chegar a 3ª CCmds, e no qual participaram 14 soldados, quatro 1ºs. Cabos, o Fur Jorge Ázera e o 2º Sgto Galileu Cordeiro.
Fiquei em Brá até 11 de Agosto de 1996, tendo regressado à Metrópole em 13 do mesmo mês.
Antes de ingressar no primeiro deles, de livre vontade, fui operacional da CART 730, onde fui colocado em 1964 após ter terminado com aproveitamento o treino físico do Curso de Operações Especiais (no CMEF) em Mafra e depois no CIOE em Penude (Lamego), e que na altura era referido como rangers.
1) Voltando ao livro, diz Rui Alexandrino Ferreira, na página 107: “Num à parte, para melhor compreensão da situação, refiro ter a dita Companhia de Comandos uma péssima fama entre a tropa macaca (era assim que estes se referiam às Companhias normais)".
1a) No que concerne à frade "para melhor compreensão da situação..... péssima fama", perdou-me o meu pensamento, mas não posso deixar de levar em conta que este nome depreciativo péssima foi muito provavelmente inventado para denegrir o bom nome dos Comandos e satisfazer eventuais ódios ocultos de meia dúzia de iluminados no contexto da Guiné.
Digo isto, salvo melhor opinião, porque tendo percorrido praticamente toda aquela Província, como é óbvio, e estado em contacto directo com imensas Companhias com as quais fizemos várias operações, nunca nenhum elemento dos meus Grupos sentiu qualquer inimizade, muito bem pelo contrário, pois não raras vezes foram enviados para reforçar Companhias que eram mais atingidas pelo IN.
1b) Tropa macaca: desconheço quem criou ou pôs a correr aquele nome, se é que de facto existiu; no entanto posso assegurar-lhe, se é que isso vale alguma coisa, que durante o período atrás referido, e como é natural, confraternizei em Bissau não só com camaradas doGrupos, desde alferes a soldados, como também de outras Unidades não só do Exército como da Marinha e da Força Aérea.
Nesses contactos nunca ouvi ninguém dos Grupos referir-se ou mencionar a tropa, que afinal éramos todos nós, como tropa macaca.
No que concerne aos outros dois ramos [, a Marinha e a Força Aérea,], nunca ouvi, igualmente, referirem-se ao Exército com aquele nome. Também em contacto directo nos aquartelamentos ou no mato com as imensas Companhias que nos fizeram ao longo do tempo a cobertura de ida e regresso, nunca ouvi no meu tempo, repito, qualquer elemento dos Grupos referirem-se a qualquer camarada do Exército como Vocês são tropa macaca;
2) Logo a seguir o autor do livro mencion: “Corria à boca cheia que num daqueles bambúrrios da sorte que acontecem uma vez na vida teve a dita cuja, a taluda, ou seja a inacreditável ajuda do acaso, ao dar de caras com uma mal protegida mas muito bem aprovisionada arrecadação turra, cheia de material de guerra” (página 107).
2a) Na realidade, quando às 19H00 se partiu para essa operação, a mesma estava devidamente referenciada e não a dita cuja, a taluda, ou seja a inacreditável ajuda do acaso, ao dar de caras...
2b) e, na mesma linha, com uma "mal protegida"... A informação emanada das Chefias Militares era que a referida base era composta por 80 homens bem armados ("mal protegida" ?).
De tal maneira estava a base mal protegida, como é mencionado, que o IN infligiu ao grupo, composto de 22 elementos, um morto, dois feridos graves que foram evacuados de heli para o Hospital de Bissau e mais 6 feridos ligeiros.
Tal como o Senhor Coronel, também fui ferido em combate não duas mas três vezes, tendo numa delas sido evacuado.
3) Seguidamente refere: “Guardadas, em recato, umas dezenas de armas que ali existiam, teriam entregue só uma parte e a partir de então, passou o Tenente Saraiva que a comandava e que foi no seguimento da Comissão promovido por distinção a Capitão, a afirmar alto e bom som, na messe de Oficiais, em Bissau que iria sair para o mato e só de lá regressava quando capturasse determinada quantidade de armamento, promessa que religiosamente cumpria” (página 107).
3a) “Guardadas em recato, umas dezenas de armas .....entregue só uma parte”... Acho muito difícil e pouco provável que o tenha feito sem o conhecimento dos elementos do Grupo, por outro lado como as transportaria escondidas, e onde as guardaria em recato e, por conseguinte sózinho, umas dezenas de armas: no armário do quarto, debaixo da cama, no QG, numa palhota secreta, em que lugar ?
3b)... “e a partir de então, passou o Tenente Saraiva que a comandava e que foi no seguimento da Comissão promovido por distinção a Capitão” (...) (página 107).
Para esse efeito o referido oficial deslocou-se a Portugal no dia 10 de Junho de 1965 (e foi também condecorado) tendo depois regressado à Guiné.
3c) “Afirmar alto e bom som, na messe Oficiais, em Bissau, que iria sair para o mato e só de lá
regressava quando capturasse determinada quantidade de armamento, promessa que religiosamente cumpria” (págima 107).
Parece-me injusto que na messe dos Oficiais lhe tenham posto na boca estas afirmações uma vez que nunca poderia satisfazer a promessa que religiosamente cumpria uma vez que o Grupo não efectuou mais operações em virtude de, pouco tempo depois, ter sido extinto.
Infelizmente, desde há 5 anos que o referido Oficial não se encontra no mundo dos vivos.
Respeitosos cumprimentos do tertuliano João Parreira
2. Comentário do editor do blogue:
João e Rui:
Estas questões do bom nome e da honra (do indivíduo ou do seu grupo de pertença), são deveras delicadas... Mas eu concordo que se venha a terreiro defender a memória dos camaradas com quem se conviveu e com quem se lutou... Acho bonito que o João venha defender a memória do seu camarada Saraiva, tanto mais que ele já não está cá, neste vale de lágrimas, para se defender...
Escusado será dizer que eu acho bem que que se cultive, no nosso blogue, o espírito crítico, a defesa da verdade ou valores como a liberdade de pensamento e de expressão... A regra é: podemos discordar, saudavelmente, uns dos outros, sem que isso descambe num conflito patogénico, disruptivo, disfuncional...
Em matéria de opiniões, cada um tem as suas e deve defendê-las, com elegância, inteligência, bom gosto, bom senso, etc. Já a verdade dos factos é um princípio fundamental do nosso blogue... A menos que se trate de textos ficcionados, devemos ser intransigentes neste ponto. É claro que hoje a memória pode atraiçoar-nos... E memso no passado, é bom não esquever que tínhamos uma visão parcelar das coisas... Quantas vezes não emprenhámos pelos ouvidos!
É claro que o livro do Rui, muito interessante e de leitura apaixonante em muitas das suas partes, foi concebido e elaborado num contexto que nada tem a ver com o nosso blogue ou a nossa tertúlia. É um livro, de memórias, está no mercado livreiro, está nas bibliotecas, pertence agora aos leitores e ao público...
É, de resto, nessa qualidade de leitor que o João aqui vem, a terreiro, pôr os pontos nos ii em relação dois ou três parágrafos referentes a um Grupo de Comandos. Se ele tiver razão, o Rui poderá ainda ir corrigir os parágrafos em causa (página 107), na 3ª edição, que eu espero esteja para breve... Mas o autor é sempre soberano...
Fiquem, os dois, com o meu apreço e a minha amizade. L.G.
PS - O João esqueceu-se que, entre camaradas, nesta caserna virtual, tratamo-nos todos por tu...
___________
Notas de L.G.:
(1) Vd. post anteriores do (ou referentes ao) João Parreira:
3 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74- CCCXXX: Velhos comandos de Brá: Parreira, o últimos dos três mosqueteiros
6 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXLI: O 'puto' Parreira, do grupo de comandos Apaches (1965/66)
20 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCXLIII: Com a CART 730 em Bissorã e Olossato (1965) (João Parreira)
12 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P868: Diabruras dos comandos (João Parreira)
13 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXIII: O baile dos finalistas do Liceu de Bissau de 1965 (João Parreira)
23 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCLXXXIV: Lista dos comandos africanos (1ª, 2ª e 3ª CCmds) executados pelo PAIGC (João Parreira)
19 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1381: Feliz Natal, Próspero Ano Novo, Adeus e Até ao Meu regresso (6): comandos de Brá em 1965, crime e castigo (João S. Parreira)
20 de Dezembro de 2006> Guiné 63/74 - P1384: Com o Alferes Comando Saraiva e com o médico e cantor Luiz Goes em Madina do Boé (António de Figueiredo Pinto)
21 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1389: Testemunhos sobre o Marcelino da Mata a pedido de sua filha Irene (5): Comandos A. Mendes & João S. Parreira
6 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1405: Antologia (56): Marcelino da Mata, o último guerreiro do Império (João Parreira)
4 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1493: Estórias de Madina do Boé (António Pinto) (2): Eu e o Furriel Comando João Parreira
12 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1584: Um choro no mato e as (des)venturas de um futuro comando em Bissorã (João Parreira)
29 de Abril de 2007 > Guiné 63/74: P1710: Tertúlia: Encontro de Pombal (2): Saudades (João Parreira / António Pinto / Vitor Junqueira)
(2) Vd. post de 17 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1285: Bibliografia de uma guerra (14): Rumo a Fulacunda, um best seller, de Rui Alexandrino Ferreira (Luís Graça)
(3) Vd. também a apreciação crítica do Virgínio Briote, ex-Alf Mil Comando :
1 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1718: Lendo de um fôlego o livro do Rui Ferreira, Rumo a Fulacunda (Virgínio Briote)
(...) "Do resto, emites algumas opiniões generalizadas sobre os cmds, opiniões a que tens evidentemente todo o direito. "Que corria à boca cheia que num bambúrrio de sorte....", que entraram numa arrecadação, coisa e tal, e que aquilo durou até ao fim da comissão...E perguntas-te a ti próprio se terá sido verdade. "Actuações terrivelmente confrangedoras..." "E se operacionalmente não era aquela CCmds um valor efectivo nem o podia ser nunca, pois ...., mal preparados..." Opiniões.
"A CCmds actuou de Jun 64 a Jun 66. Os efectivos rondaram os 200 homens. Tiveram 12 mortos e 19 feridos. Cerca de 70 armas capturadas, para falar só de armas. Foram estes os resultados. Não são opiniões.
"Àparte esta questão, repito, caro Rui, tive muito gosto em ler o livro. Rever aquelas terras, página a página, os nomes dos intervenientes quase todos meus conhecidos, foi uma leitura muito interessante.Caro Rui Ferreira, um grande abraço e até um dia destes" (...).
Guiné 63/74 - P1803: Tabanca Grande (9): António Bartolomeu, ex-Fur Mil da CCAÇ 2592 / CCAÇ 14 (Bolama, Contuboel, Aldeia Formosa, Cuntima, 1969/71)
Guiné > Zona Leste > Contuboel > CCAÇ 2592/CCAÇ 14 (1969/71) > O Fur Mil António Bartolomeu, que esteve a dar instrução de especialidade a um pelotão de mandingas, na mesma altura (Junho/Julho de 1969) em que estávamos a formar a CCAÇ 12, uma das unidades da nova força africana (1) (LG)
Foto: © António Bartolomeu (2007). Todos os direitos reservados.
1. Mensagem do António Bartolomeu, novo membro da nossa tertúlia
Caro Luís Graça (eu tratava-te por Henriques em Contuboel):
Fala o ex-furriel Bartolomeu, da Companhia de Caçadores 2592 que deu origem à CCAÇ 14.
A minha companhia foi para Bolama para formar a CCAÇ 14, só o meu pelotão é que foi par Contuboel na mesma LDG em que vocês [, CCAÇ 2590 / CCAÇ 12,] (2) foram até ao Xime, e depois em coluna Xime, Bambadinca, Bafatá e Contuboel. A CCAÇ 11 já estava em Contuboel (3).
Aí formámos um pelotão de Mandingas que eram da zona de Nova Lamego, durante 2 meses (Junho e Julho de 1969).
Guiné > Zona Leste > Contuboel > JUnho ou Julho de 1969 > "Junto á caserna dos furriéis, fazendo a higiene oral... O primeiro da esquerda sou eu, o Bartolomeu, com pessoal da CCAÇ 11. Lá atrás parece ser o Branquinho"...
Foto: © António Bartolomeu (2007). Todos os direitos reservados.
Depois vocês, [a CCAÇ 2590/CCAÇ 12,] foram para Bambadinca, a CCAÇ 11 para a zona de Nova Lamego (Buruntuma ou Piche, se não me engano) e o meu pelotão foi para a Aldeia Formosa 4 meses, depois regressámos à companhia, em Bolama.
De Bolama seguimos para o sector de Farim, destacamento de Cuntima até ao fim da comissão. Esta povoação ficava (e fica) a 1 Km da fronteira com o Senegal.
Lembras-te do ex-furriel Dores, o gajo das anedotas, que era do meu pelotão ? Era o máximo, nunca mais parava.
Eu tenho consultado o teu site desde o princípio, lembro-me da malta, dos ex-furriéis da tua companhia. Quando viemos da Guiné fui visitar o Marques (4), ao Anexo do Hospital da Estrela. Não estava bem, não, ainda bem que agora está catita.
Bem, não te chateio mais, vão aí umas fotos para avivares a memória.
Um grande abraço do amigo Bartolomeu.
Diz se recebeste bem as fotos.
2. Resposta do editor do blogue:
Bartolomeu:
Não imaginas a alegria que me dás, por te reencontrar, a ti e à malta da tua CCAÇ 2592, futura CCAÇ 14... Que saudades desses tempos de Contuboel, em que fomos dar instrução aos nossos queridos nharros que nem português falavam!…
Guiné > Zona Leste > Contuboel > CCAÇ 2590 / CCAÇ 14 > Junho ou Julho de 1969 > O Bartolomeu "recuperando de um ataque de paludismo, foi do caraças" (AB)...
Foto: © António Bartolomeu (2007). Todos os direitos reservados.
Foram os meus melhores momentos da Guiné, os únicos em que fiz Férias & Turismo, em que me esqueci que estava na guerra e vinha para fazer uma guerra… Contuboel representou para nós - creio que para nós todos - a maravilhada descoberta da África, d@ african@s, da Guiné, d@s fulas, d@s mandingas… Foi um tempo maravilhoso, intenso e veloz (5)… Depois fomos lançados às feras… Ainda em farda nº 3, tivemos o nosso baptismo de fogo em finais de Junho, em Madina Xaquili (6)…
As recordações são sempre (re)construções: pelo teu apelido, já não ia lá, mas ao ver a tua chapa, sem pêra, acendeu-se uma luzinha cá na minha base de dados… Do Dores e das suas anedotas, tenho uma vaga ideia, mas não estou a ver-lhe a cara…
Quanto a ti, por que é que não apareceste mais cedo, meu malandro ? Até à data, fora o pessoal da minha CCAÇ 2590/CCAÇ 12 (o Levezinho, o Reis, o Marques, o Fernandes, o Sousa, o Martins, o Piça…), eu só tinha reencontrado o Renato Monteiro, da CCAÇ 11, mais antigo que nós em Contuboel (3)…
Tens uma foto dele, comigo, numa passeio, em canoa, pelo Rio Geba, no mesmo dia em que ele ia morrendo, depois de um mergulho, junto ao açude da ponte de madeira (que se ver ao fundo, na foto)… Ando em papos de aranha para descobrir quem nos tirou aquela mágica foto… De qualquer modo, lembras-te do Monteiro ? Talvez não, éramos os dois um bocado a puxar para o intelectual, sem desprimor…
Olha: vou de imediato patrocinar a tua entrada para a nossa tertúlia ou tabanca grande o teu nome vai aparecer na lista dos amigos e camaradas da Guiné (coluna do lado esquerdo do blogue)… As tuas fotos, em formato.bmp, chegaram bem, mas são pesadas, precisam de ser editadas… Não sei se terei tempo este fim de semana… Por ti e pela malta de Contuboel, farei um forcing… Diz-me só onde vives e o que fazes: pela foto actual, estás com óptimo aspecto… Manda-me também o teu contacto telefónico… Vou-te pôr também na nossa lista de e-mails… Fico à espera de estórias de Contuboel, essa terra maravilhosa sobre a qual temos falado tão pouco no nosso blogue (5)…
Um grande abraço do Henriques.
PS – Usa também os meus endereços de e-mail pessoais (casa e trabalho).
_________
Notas de L.G.:
(1) Vd. post de 2 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1640: A africanização da guerra (A. Marques Lopes)
CCAÇ 11
Foi contituída em Junho de 1972 (por alteração da designação da CART11). Foi extinta em Agosto de 1974. Era formada por quadros metropolitanos e pessoal natural da Guiné, de etnia fula. A CART 11 tinha sido formada em Janeiro de 1970 por alteração da designaçãoda CART 2479. Era composta por quadros metropolitanos e pessoal da Guiné de etnia fula.
CCAÇ 12
Alteração, em Junho de 1970, da designação da CCAÇ 2590 (que chegou à Guiné em finais de Maio de 1969, nio Niassa, juntamente om outras companhias independenets como CCAÇ 2591, do Carlos Fortunato, que irá dar origem à CCAÇ 13, e a CCAÇ 2592, do António Bartolomeu, futura CCAÇ 14. Foi extinta em Agosto de 1974. Era formada por quadros metropolitanos e pessoal natural da Guiné, de etnia fula, da zona leste (administração de Bafatá). A actual Região de Bafatá da Guiné-Bissau inclui toda a zona leste (Baftá e Gabu).
CCAÇ 14
Constituída em Janeiro de 1970, por alteração da designação daCCAÇ 2592. Foi estinta em Setembro de 1974. Era formada por quadros metropolitanos e pessoal natural da Guiné, das etnias mandinga e manjaca, com um pelotão de etnia felupe.
(2) A CCAÇ 2590/CCAÇ 12 foi também formada em Contuboel, a nordeste de Bafatá. A recruta do pessoal africana doi dada pela CART 2479. A especialidade foi já dada pela CCAÇ 2590 (quadros metropolitanos). Esteve como unidade de intervenção na Zona Leste, no Sector L1, em Bambadinca (até 1973) e depois no Xime, até ao fim da guerra.
Há numerosíssimos posts, no nosso blogue, com referência a esta unidade, que esteve ao serviço do comando de três batalhões: BCAÇ 2851 (1968/70), BART 2917 (1970/72) e BART 3873 (1972/74). E já foram identificadas "três gerações" de quadros metropolitanos da CCAÇ 12 (1969/71, 1971/73, 1973/74).
(3) A CCAÇ 11 (recruta, instrução de especialidade e IAO) foi formada em Contuboel.
Sobre esta unidade formada a partir da CART 11/CART 2479, há já também diversos posts (uma parte dos quais da autoria do meu amigo Renato Monteiro):
23 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P899: Diga se me ouve, escuto! (Renato Monteiro)
23 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P898: Saudades do meu amigo Renato Monteiro (CART 2479/CART 11, Contuboel, Maio/Junho de 1969)
28 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P1001: Estórias de Contuboel (i): recepção dos instruendos (Renato Monteiro, CART 2479 / CART 11, 1969)
30 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P1005: Estórias de Contuboel (ii): segundo pelotão (Renato Monteiro, CART 2479 / CART 11, 1969)
1 de Agosto de 2006 > Guiné 63/74 - P1015: CART 2479, CART 11 e CCAÇ 11 (Zona Leste, Gabu, subsector de Paunca)
2 de Agosto de 2006 > Guiné 63/74 - P1017: Estórias de Contuboel (iii): Paraíso, roncos e anjinhos (Renato Monteiro, CART 2479 / CART 11, 1969)
4 de Agosto de 2006 > Guiné 63/74 - P1026: Estórias de Contuboel (iv): Idades sem lembrança (Renato Monteiro, CART 2479 / CART 11, 1969)
4 de Agosto de 2006 > Guiné 63/74 - P1027: Estórias de Contuboel (V): Bajudas ou a imitação do paraíso celestial (Renato Monteiro, CART 2479 / CART 11, 1969)
19 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1612: Relembrando, com saudade, os nossos soldados fulas da CART 11 (Renato Monteiro / João Moleiro)
25 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1625: José Casimiro Carvalho, dos Piratas de Guileje (CCAV 8350) aos Lacraus de Paunca (CCAÇ 11)
(4) Fur Mil At Inf António Marques, gravemente ferido numa mina anticarro, em 13 de Janeiro de 1971, já no final da comissão (Maio de 1969/Março de 1971). Teve uma longa convalescença no HMP (Estrela, Lisboa). Vd. posts de:
2 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXXIX: E de súbito uma explosão (Luís Graça)
23 de Setembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCV: 1 morto e 6 feridos graves aos 20 meses (CCAÇ 12, Janeiro de 1971) (Luís Graça)
(5) Vd. post de 28 de Junho de 2005 > Guiné 63/74 - LXXXVI: No 'oásis de paz' de Contuboel (Junho de 1969) (Luís Graça)
(6) Vd. post de 29 de Junho de 2005 > Guiné 69/71 - LXXXVIII: O baptismo de fogo da CCAÇ 12, em farda nº 3, em Madina Xaquili (Julho de 1969) (Luís Graça)
quarta-feira, 30 de maio de 2007
Guiné 63/74 - P1802: Zé Neto (1929-2007): In Memoriam: Morreu um Homem Grande, adeus, amigo, adeus, meu capitão ! (Pepito)
Lisboa > Julho de 2005 > "Casa do nosso amigo comum, António Júlio Estácio... Foto tirada no dia em que conheci o Zé Neto. Ele a mostrar-me o seu álbum, que é de nós todos".
Foto: © Pepito / AD - Acção para o Desenvolvimento (2007). Direitos reservados
1. Mensagem do Pepito:
Luís:
Depois de regressar de Lisboa, abria todos os dias o meu computador e respirava de aliívio quando não via um email teu...como o de hoje (1).
Dizia para mim: O Zé Neto venceu mais um dia.
Diz-se que devemos estar preparados. Mas quem se prepara para a morte de um amigo?
Peço-te o favor de enviar aos nossos amigos do Blogue o que escrevi e envio em anexo.
abraços
2. Mensagem do Pepeito aos Amigos Tertulianos:
Prendi-me de amizade pelo Capitão Zé Neto já lá vão 2 anos, quando um amigo comum, o António Júlio Estácio, que o conheceu em Macau, fez questão de mo apresentar.
Começava a Iniciativa de Guiledje a dar os seus primeiros passos e as dúvidas históricas [eram] muitas.
Pelo álbum de fotografias que logo me disponibilizou, comecei a conhecer melhor o homem que, por detrás de uma figura austera e séria, tinha um coração enorme e que amava as coisas simples da vida como aquelas que viveu em Guiledje.
Tive o privilégio de o ouvir falar dos amigos que cá deixou, do Viegas, criança abandonada que ele salvou durante um bombardeamento cobrindo-o com o seu próprio corpo, um dos seus grandes amores da vida. Da Fatumata, sua lavadeira que me perguntava sempre quando é que o Capitão Neto ia voltar e eu a dar-lhe o recado: “Oh Capitão, olhe que à sua custa como uma galinha cada vez que lá passo. Imagino como os seus amigos o irão receber...”. E o sorriso de saudade a abrir-se no seu rosto sério.
Falou-me frequentemente com orgulho da esposa, da força que ela lhe tinha sempre transmitido quando ele estava em Guiledje e do quanto isso tinha sido determinante para ele.
Chamou-me a atenção para a eventual dificuldade em obter água de um furo que pretendíamos fazer em Guiledje. Partilhámos vários meses e em conjunto esta incerteza. Por isso, foi ele o primeiro a saber que já “corria água em Guiledje”. Respondeu-me de imediato a dizer “olhe que essa frase soa-me como poesia...”
Recordo a última vez que estivemos juntos, há duas semanas, no Hospital Militar, acarinhado pela esposa e família, o Nuno Rubim e eu, no momento da despedida, quando prendendo com força e determinação a sua mão à minha, me disse e repetiu duas vezes: “hei-de voltar a Guiledje”.
Lembro a emoção que se apoderou de mim, por lhe ter sempre prometido esta viagem de regresso e pelos poucos meses que faltavam para se concretizar.
Tanta coisa para contar e uma angústia enorme que me sufoca. Como nós guineenses dizemos, perdemos hoje um Homem Grande.
Aceita, Zé Neto, esta lágrima que me corre pela face.
Adeus, Amigo. Adeus, Meu Capitão.
Pepito
__________
Notas de L.G.:
(1) Vd. post de 30 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1801: Capitão José Neto (CART 1613, Guileje, 1967/68), a última batalha
(2) Acabei de mandar à tertúlia a seguinte mensagem:
Amigos & camaradas: O funeral do nosso camarada é amanhã às 16h, no cemitério dos Olivais. O corpo estará em câmara ardente na Igreja de São João de Deus, Praça de Londres, Lisboa, a partir das 16h30. Aqui vai uma pequena biográfica que encontrei sobre ele no portal Projecto Memória Macaense, onde enconteri pelo menos um escrito seu (sobre o Restaurante Cecília.
José A.S. Neto, ou, simplesmente Zé Neto, como diz ser mais conhecido entre os amigos macaenses, nasceu em Leiria em 1929.
Desembarcou em Macau como praça de Artilharia, em Setembro de 1951. No Colégio Dom Bosco, completou dois cursos de habilitação literária e cursou o inglês por um ano no Saint John´s School.
Durante a permanência em Macau, foi promovido a Furriel e a 2° Sargento. Tem uma filha nascida em Macau, no Hospital São Rafael, em Agosto de 1960, do casamento com uma metropolitana, ocorrido também na cidade do Santo Nome de Deus.
Após 10 anos, em Dezembro de 1961, deixou Macau. Com muita saudade, diz “trouxe Macau no coração, pelo muito que lhe fiquei a dever”.
Antes da reforma como Capitão, ainda fez três comissões em África, em Cabinda, Guiné e Angola, conseguindo ainda completar o Curso de Oficiais do Exército em 1973.
O Zé Neto também escreve para o Boletim da Casa de Macau – Portugal
Foto: © Pepito / AD - Acção para o Desenvolvimento (2007). Direitos reservados
1. Mensagem do Pepito:
Luís:
Depois de regressar de Lisboa, abria todos os dias o meu computador e respirava de aliívio quando não via um email teu...como o de hoje (1).
Dizia para mim: O Zé Neto venceu mais um dia.
Diz-se que devemos estar preparados. Mas quem se prepara para a morte de um amigo?
Peço-te o favor de enviar aos nossos amigos do Blogue o que escrevi e envio em anexo.
abraços
2. Mensagem do Pepeito aos Amigos Tertulianos:
Prendi-me de amizade pelo Capitão Zé Neto já lá vão 2 anos, quando um amigo comum, o António Júlio Estácio, que o conheceu em Macau, fez questão de mo apresentar.
Começava a Iniciativa de Guiledje a dar os seus primeiros passos e as dúvidas históricas [eram] muitas.
Pelo álbum de fotografias que logo me disponibilizou, comecei a conhecer melhor o homem que, por detrás de uma figura austera e séria, tinha um coração enorme e que amava as coisas simples da vida como aquelas que viveu em Guiledje.
Tive o privilégio de o ouvir falar dos amigos que cá deixou, do Viegas, criança abandonada que ele salvou durante um bombardeamento cobrindo-o com o seu próprio corpo, um dos seus grandes amores da vida. Da Fatumata, sua lavadeira que me perguntava sempre quando é que o Capitão Neto ia voltar e eu a dar-lhe o recado: “Oh Capitão, olhe que à sua custa como uma galinha cada vez que lá passo. Imagino como os seus amigos o irão receber...”. E o sorriso de saudade a abrir-se no seu rosto sério.
Falou-me frequentemente com orgulho da esposa, da força que ela lhe tinha sempre transmitido quando ele estava em Guiledje e do quanto isso tinha sido determinante para ele.
Chamou-me a atenção para a eventual dificuldade em obter água de um furo que pretendíamos fazer em Guiledje. Partilhámos vários meses e em conjunto esta incerteza. Por isso, foi ele o primeiro a saber que já “corria água em Guiledje”. Respondeu-me de imediato a dizer “olhe que essa frase soa-me como poesia...”
Recordo a última vez que estivemos juntos, há duas semanas, no Hospital Militar, acarinhado pela esposa e família, o Nuno Rubim e eu, no momento da despedida, quando prendendo com força e determinação a sua mão à minha, me disse e repetiu duas vezes: “hei-de voltar a Guiledje”.
Lembro a emoção que se apoderou de mim, por lhe ter sempre prometido esta viagem de regresso e pelos poucos meses que faltavam para se concretizar.
Tanta coisa para contar e uma angústia enorme que me sufoca. Como nós guineenses dizemos, perdemos hoje um Homem Grande.
Aceita, Zé Neto, esta lágrima que me corre pela face.
Adeus, Amigo. Adeus, Meu Capitão.
Pepito
__________
Notas de L.G.:
(1) Vd. post de 30 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1801: Capitão José Neto (CART 1613, Guileje, 1967/68), a última batalha
(2) Acabei de mandar à tertúlia a seguinte mensagem:
Amigos & camaradas: O funeral do nosso camarada é amanhã às 16h, no cemitério dos Olivais. O corpo estará em câmara ardente na Igreja de São João de Deus, Praça de Londres, Lisboa, a partir das 16h30. Aqui vai uma pequena biográfica que encontrei sobre ele no portal Projecto Memória Macaense, onde enconteri pelo menos um escrito seu (sobre o Restaurante Cecília.
José A.S. Neto, ou, simplesmente Zé Neto, como diz ser mais conhecido entre os amigos macaenses, nasceu em Leiria em 1929.
Desembarcou em Macau como praça de Artilharia, em Setembro de 1951. No Colégio Dom Bosco, completou dois cursos de habilitação literária e cursou o inglês por um ano no Saint John´s School.
Durante a permanência em Macau, foi promovido a Furriel e a 2° Sargento. Tem uma filha nascida em Macau, no Hospital São Rafael, em Agosto de 1960, do casamento com uma metropolitana, ocorrido também na cidade do Santo Nome de Deus.
Após 10 anos, em Dezembro de 1961, deixou Macau. Com muita saudade, diz “trouxe Macau no coração, pelo muito que lhe fiquei a dever”.
Antes da reforma como Capitão, ainda fez três comissões em África, em Cabinda, Guiné e Angola, conseguindo ainda completar o Curso de Oficiais do Exército em 1973.
O Zé Neto também escreve para o Boletim da Casa de Macau – Portugal
Guiné 63/74 - P1801: In Memoriam: Capitão José Neto (CART 1613, Guileje, 1967/68), a última batalha
1. Mensagem da Leonor [Léo Neto], neta do Zé Neto, com data de hoje, enviada às 7h29. Assunto: Notícias tristes.
Caros amigos: É com enorme dor que vos escrevo para comunicar o falecimento do meu querido avô, Zé Neto. Ainda não sei grandes pormenores, pois soube ontem por volta das 23.45h e a minha mãe foi de seguida para casa da minha avó e passou lá a noite. Não sei se me será possível comunicar-vos via e-mail outros detalhes como o velório e funeral, sendo assim deixo-vos o meu contacto telefónico que estará à vossa inteira disposição: 937317762.Um abraço, Leonor.
2. Mensagem do editor do blogue (que acaba de circular pela nossa tertúlia, por e-mail):
Amigos e camaradas:
O camarada Zé Neto faleceu esta noite, no Hospital Militar. Enfrentou com coragem este difícil período da sua vida mas perdeu a sua última batalha, a mais terrível de todos que enfrentou, a batalha contra o cancro do pulmão... A sua neta, Leonor, deu-me a notícía, a mim e a mais alguns camaradas, logo de manhã... Ela tem 17 anos e está desolada... Tinha uma belíssima relação com o avô. Mas aos 17 anos é difícil perceber e aceitar a morte de um ente querido.
O Zé estava em grande sofrimento. Foram quatro meses de luta, desigual. A viúva acaba também de me telefonar. Esteve com ele até cerca das 23h. O Zé morrreu às 23.45h, em pleno sono. O corpo vai ser cremado, possivelmente amanhã. O velório é na Igreja de São João de Deus, à Praça de Londres. Espero lá poder ir, logo à noite.
Façamos um minuto de silêncio à memória do primeiro membro da nossa tertúlia que nos deixa, pelas leis imperativas da vida. O Zé era o nosso patriarca. Estive com ele apenas uma vez, na minha escola. Almoçámos juntos, eu, o Nuno Rubim e o Pepito (O PIpo, como ele carinhosamente o chamava). De resto, contactámos-nos durante um ano por e-amail e por telefone. A Guiné aproximou-nos e tornou-nos amigos...
E o seu contributo, em termos de blogue, foi reconhecidamente importante para o trabalho de reconstituição da memória de Guileje que está a ser feito pelo Pepito, pelo Nuno Rubim e por outros camaradas, também com a nossa participação. Os seus escritos e as fotos começaram por dar visibilidade a Guileje. Ele também tinha muito apreço pelo Pepito e pelo projecto de Guileje. É também uma notícia triste, esta, para os nossos amigos da Guiné-Bissau.
Em jeito de pequena homenagem, irei republicar as suas memórias de Guileje, originamente publicadas na anterior versão, menos amigável, do nosso blogue, entre 10 de Janeiro e 25 de Fevereiro de 2006 (num total de 10 posts) (1)... Vou aproveitar para divulgar mais fotos do seu álbum de Guileje, a partir dos seus slides (graças às diligências do nosso Albano Costa, foi melhorada a qualidade destas fotos, que inicialmente ficaram muito azuladas).
O Zé era um homem que se integrava muito bem, no seio das comunidades em que vivia. E Guileje foi um exemplo disso: ele também achava que havia mais vida para além da tropa, da burocracia e da guerra... Era, além disso, um homem com grande sentido de humor, com sentido de justiça e com coragem, física e moral...
Como muitos homens da sua geração e da sua classe socioprofissional, fumava muito... Não sei quantas comissões de serviço terá feito no Ultramar... Sei que esteve em Macau, de que falava com saudade...
Quando conseguiu deixar de fumar, começaram a surgir os seus problemas de saúde... Andava irritado, como qualquer ex-fumador... Mas conseguiu, com a sua enorme força de vontae, deixar o cigarro de vez... Infelizmente, tarde de mais... Recordo-me da penúltima vez que lhe falei, ao telefone, já numa fase mais avançada da doença:
- Então, Zé, como vai isso ?
- Olha, entregue aos médicos, que agora me querem tirar um pulmão... Estão aqui reunidos em junta médica...
- Tu és forte e ainda vais vencer essa batalha.
- Eu quero é viver, mesmo com um pulmão a menos...
- Pois...
- Sabes, fui estúpido...Quando era novo, vendia saúde... Lembras-me da minha fotografia no Saltinho ? Eu era um atleta... Mas cheguei a fumar cinco maços!... A gente pensa que a doença só acontece aos outros... – rematava ele, sem mágoa, com lucidez, com coragem, e ainda com esperança.
Grande Zé, até sempre! Privei pouco tempo contigo, mas gostei de te conhecer. Vamos ter saudades tuas. Mas não te esqueceremos, na blogosfera e fora dela... Tens uma neta fantástica que vai pôr em ordem os teus escritos e cultivar a tua memória.
Luís Graça & Camararadas da Guiné
PS – Leonor: Um beijinho muito grande dos camaradas do teu querido avô. Um abraço também para o teu primo Afonso. Tens o nosso blogue para escrever, se te apetecer. Ou para publicar outras coisas do teu avô... Tu podes continuar a representá-lo, na nossa tertúlia, colmatando de algum modo o tremendo e difícil vazio que fica sempre com a morte de alguém que nos é querido... Dá também um beijinho nosso à tua mãe, e às tuas duas tias, bem como à tua avó que muito sofreu nestes últimos quatro meses...
Com os melhores cumprimentos, Leonor Neto.
Guiné > Região de Tombali > Guileje > CART 1613 (1967/68) > O 2º sargento Neto, que fazia as funções de 1º sargento da companhia, fotogrado junto a um abrigo e à viatura blindada Fox.
Foto: © Zé Neto / AD - Acção para o Desenvolvimento (2007). Direitos reservados .
4. Resposta à Leonor, por e-mail de 14 de Maio último:
Leonor: O seu avô é o mais velho de todos nós, membros desta caserna virtual, tertúlia ou tabanca grande, como queira... Formamos um grupo de amigos e camaradas que hoje já são, também, velhos amigos e conhecidos...
Guiné > Região de Tombali > Guileje > CART 1613 (1967/68) > O Zé Neto fotografado entre os putos da tabanca.
Foto: © Zé Neto / AD - Acção para o Desenvolvimento (2007). Direitos reservados .
Todos apreciámos, muito, o contributo do seu avô para a preservação da memória de Guileje... Publicámos o seu diário, divertimo-nos com os seus apontamentos bem humorados sobre as misérias e grandezas dos seus camaradas de armas, admirámos a sua frontalidade, invejámos a sua juventude de espírito... Com os melhores cumprimentos, Leonor Neto.
Falo do passado, por que ele há meses que já não escreve para o blogue... Conheci-o depois, pessoalmente. Teve a gentileza de visitar-me ao meu local de trabalho, no verão passado, juntamente com o coronel Nuno Rubim e o Eng. Carlos Schwarz (Pepito), todos irmanados no mesmo entusiasmo, o Projecto Guileje.
E de vez em quando eu telefonava-lhe. Apoiei-o bastante quando decidiu deixar de fumar... Infelizmente demasiado tarde. Aqui ficam alguns excertos de mensagens que trocámos (em dois deles, fala dos netos com ternura, incluindo a Leonor). A última vez que lhe falei disse:
- Zé, travaste muitas batalhas, não serás desta que te vais deixar ir abaixo...
Senti-o bem agarrado à vida... Quero ver se o visito no Hospital Militar... Infelizmente esta semana vou estar fora, na Madeira, em trabalho... Leonor: Vá estando em contacto comigo/connosco...
Um beijinho grande para si, força para a sua mãe, tias, avó e primos. Luís Graça
5. Excertos de e-mails do e para o Zé Neto (selecção de L.G.)
Zé Neto > 8/1/06 > Memórias de Guilege >
"Meu caro Luis: Depois de muito meditar cheguei à conclusão de que, pelo menos tu, mereces a minha confiança para partillhar contigo uma parte muito significativa das memórias da minha vida militar.
"São trinta e três páginas retiradas (e ampliadas) das 265 que fui escrevendo ao correr da pena para responder a milhentas perguntas que o meu neto Afonso, um jovem de 17 anos, que pensava que o avô materno andou em África só a matar pretos enquanto que o paterno, médico branco de Angola, matava leões sentado numa esplanada de Nova Lisboa (Huambo). Coisas de família...
"Já cedi este modesto trabalho à AD do Pepito e conto não o fazer mais, por enquanto. É, como já te disse, uma perspectiva um tanto diferente dos relatos do blogue, mas é assim que sei contar as minhas angústias e sucessos. Diz qualquer coisa. Até breve. Um abraço do patriarca Zé Neto”.
Guiné > Região de Tombali > Guileje > CART 1613 (1967/68) > Um aspecto do interior da tabanca.
Foto: © Zé Neto / AD - Acção para o Desenvolvimento (2007). Direitos reservados .
Luís Graça > 8/1/06 > Memórias de Guilege >
“Já recebi o teu texto, acabo de fazer uma primeira leitura em diagonal, fiquei entusiasmo... Peço autorização de divulgá-lo no nosso blogue para que os meus netos, quando os tiver, também possam ter o privilégio, como os teus, de conhecer o grande homem e militar que tu és, bem como as misérias e as grandezas dos tugas e dos turras em terras da Gioné...
"É um magnífico documento que deves partilhar com os teus ex-camaradas e amigos da Guiné... Dás-me autorização para publicar isto, em quatro ou cinco partes ? Um grande abraço. Luís”.
Zé Neto > 9/1/06 > Memórias de Guilege
“Meu caro Luis: Concordo com a tua sugestão. Não quero ofender o homenzinho Santana. Mesmo se tiveres de fazer arranjos, confio na tua técnica avançada para a coisa sair decente. Avança !!!
“Acabei de ler a odisseia do Pepito a contar-nos as prepotências dos novos sobas de S. Domingos. O Pepito, com quem conversei demoradamente quando fomos apresentados pelo seu colega, conterrâneo e condiscípulo Estácio, tem um espírito puro de mais para enfrentar os viciados que nós, portugueses, lá deixamos, infelizmente. Isto a brincar... Aos ingénuos africanos basta pendurar-lhes no peito e nos ombros uns emblemas dourados, bem polidos, para termos um ditador em potência. Era a nossa técnica!
“Vou a seguir consolar o nosso Pepito. Até breve. Zé Neto”.
Luís Graça > 10/1/06 > Memórias de Guileje >
“Zé, obrigado, pela tua confiança em mim... Vou fazer o melhor que sei, fica descansado, que vais ficar bem na fotografia...
"Quanto à Guiné-Bissau e o que lá se passa hoje: não devemos interferir nos assuntos internos dos guineenses, mas também não podemos deixar passar em claro tudo o que tiver a ver com violação de direitos e garantias dos cidadãos... A Guiné-Bissau vai conquistar o deu direito a ser um país respeitado no concerto das Nações, mas para isso o Estado, o poder político, vai ter que garantir o respeito pelos direitos humanos dos guineenses... Este assunto ultrapassa a esfera do nosso blogue: se nos pusermnos a discutir política (a nossa e a dos outros...), a tertúlia desfaz-se... O que não quer dizer que não possamos exercer alguma influência, individualmente, como cidadãos e amigos da Guiné. Um abraço. Luís”.
Zé Neto > 12/1/06 > As malditas formigas pretas do José Teixeira >
“Luis: A minha intenção era ficar aqui caladinho no meu canto para não entupir a formidável sequência de factos das campanhas da Guiné. (Creio que estamos a construir um monumento histórico e inédito). Mas o José Teixeira tem o condão de me despertar recordações dispersas, pois fala de sítios por onde andei. Admiro-o muito” (…).
Zé Neto > 10/1/06 > Envio de foto >
“Luís: Falaste em eu não ficar mal na fotografia e lembrei-me que ainda nbinguém, no blogue, conhece a minha cara. Do tempo da Guiné não tenho, por enquanto, porque, como já disse, estão todas em Leiria [ na Escola Supetrior de Educação de Leiria,]para digitalizar. Das recentes tenho para aqui umas, mais engravatado, menos retocado, mas escolhi esta que é mais retrato do que foto que a minha neta Leonor captou e usa no ecrã do telelé. Guarda aí até virem as outras. Um abraço do Zé Neto”
Luís > 10/1/06 > Envio de foto >
“Zé: Estás todo janota... Já percebi que és um sortudo, tens uns netos amorosos... Comecei hoje a publicar as tuas memórias de Guileje (eu escrevo Guileje e não Guilege, como tu, ou Guiledje, como o Pepito; Guileje de acordo com a grafia usada pelos Serviços Cartográficos do Exército” (...).
Zé Neto > 14/1/06 > Gato escondido com o rabo de fora >
“Luís: Estive agora a ver a segunda parte das minhas memórias de Guilege e... falhou o nosso compromisso. Estava combinado que não apareceria o nome do Santana, mas sim S., porém deixaste escapar a verdade no parágrafo : O Santana lá foi vendendo uns quilos de de farinha... Emenda lá isso por favor. Um abraço do Zé Neto”.
Guiné > Região de Tombali > Guileje > CART 1613 (1967/68) > A Maria de Guileje,a lavadeira... (Luís: E a propósito vou meter uma cunha para meteres a minha lavadeira, Maria (não é o nome dela, mas eu baptizava todas as minhas lavadeiras com este nome por comodidade de comunicação e elas gostavam. A de Colibuia já não queria ser tratada de outra maneira). A Maria de Guileje é a que está rigorosamente vestida com trajo local e com um guarda-sol verde que eu lhe ofereci. Pode ser?"... Zé: Eu acho que troquei as tuas Marias e nunca cheguei a colocar no blogue a foto da verdadeira Maria de Guileje, toda vaidosa com o o seu chapéu verde, oferecido pelo senhor sargento da companhia... Desculpa o lapso. Aqui fica a Maria para a história"... (Luís:
Foto: © Zé Neto / AD - Acção para o Desenvolvimento (2007). Direitos reservados .
Zé Neto > 14/2/06 > Notícias >
“Meu caro Luís: Amanhã às 10h00 vou estar com o Pepito no Instituto Marquês Valle Flôr, Rua de S. Nicolau, 105, para uma sessão de trabalho com o arquitecto que está a colaborar na reconstituição do Quartel e Tabanca de Guileje. Entretanto espero combinar com o Pepito um encontro entre nós os três, ou quatro, ou cinco. Quem aparecer é benvindo.
“Estou a gostar da tua inserção dos meus slides no blogue. E a propósito vou meter uma cunha para meteres a minha lavadeira, Maria (não é o nome dela, mas eu baptizava todas as minhas lavadeiras com este nome por comodidade de comunicação e elas gostavam. A de Colibuia já não queria ser tratada de outra maneira). A Maria de Guileje é a que está rigorosamente vestida com trajo local e com um guarda-sol verde que eu lhe ofereci. Pode ser? Um abração e até breve. Zé Neto”
Zé Neto > 10/4/06 > Mudança de e-mail >
"Luís: O meu Endereço mudou porque passei para a Clix o mês passado. Julgava que tinhas recebido a mensagem que enviei a todos os meus correspondentes. Falhou... Mas não foi só a tua. Ando muito chocho com a falta dos cigarros e não tenho cabeça para nada. Mas hei-de conseguir!!! Um abraço do Zé Neto".
Zé Neto > 11/4/06 > Apelo do Pipo >
“Por agora é tudo, não esquecendo o meu agradecimento pelas muitas mensagens de força Zé, resiste ao cigarro que tu, Luis, desencadeaste na malta do blogue. Abraça-vos o velho Zé Neto”.
Zé Neto > 22/5/06 > Gandembel >
“Meu caro Luís: Não. Não desapareci. Apenas hibernei para vencer o tabágico vício. E estou a conseguir. Vou a caminho do quarto mês sem cigarro. Mas o assunto é a chegada do Idálio Reis ao blogue” (...).
_________
Notas de L.G.:
(1) Vd. posts de:
10 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXXXVII: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto) (1): Prelúdio(s)
13 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXLVII: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto) (2): Ordem de marcha
21 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDLXVII: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto) (3): Dauda, o Viegas
23 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDLXXIII: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto)(4): os azares dos sargentos
3 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXCVII: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto)(5): ecumenismo e festa do fanado
8 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DVII: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto)(6): dos Lordes e das bestas
11 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXXI: Memórias de Guileje (Zé Neto, 1967/68) (7): Francesinho e Cavaco, o belo e o monstro
14 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXXXIV: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto) (8): Gazela com chouriço à moda do Celestino
16 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXLIV: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto) (9): a Operação Bola de Fogo
25 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DLXXXV: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto) (Fim): o descanso em Buba
Caros amigos: É com enorme dor que vos escrevo para comunicar o falecimento do meu querido avô, Zé Neto. Ainda não sei grandes pormenores, pois soube ontem por volta das 23.45h e a minha mãe foi de seguida para casa da minha avó e passou lá a noite. Não sei se me será possível comunicar-vos via e-mail outros detalhes como o velório e funeral, sendo assim deixo-vos o meu contacto telefónico que estará à vossa inteira disposição: 937317762.Um abraço, Leonor.
2. Mensagem do editor do blogue (que acaba de circular pela nossa tertúlia, por e-mail):
Amigos e camaradas:
O camarada Zé Neto faleceu esta noite, no Hospital Militar. Enfrentou com coragem este difícil período da sua vida mas perdeu a sua última batalha, a mais terrível de todos que enfrentou, a batalha contra o cancro do pulmão... A sua neta, Leonor, deu-me a notícía, a mim e a mais alguns camaradas, logo de manhã... Ela tem 17 anos e está desolada... Tinha uma belíssima relação com o avô. Mas aos 17 anos é difícil perceber e aceitar a morte de um ente querido.
O Zé estava em grande sofrimento. Foram quatro meses de luta, desigual. A viúva acaba também de me telefonar. Esteve com ele até cerca das 23h. O Zé morrreu às 23.45h, em pleno sono. O corpo vai ser cremado, possivelmente amanhã. O velório é na Igreja de São João de Deus, à Praça de Londres. Espero lá poder ir, logo à noite.
Façamos um minuto de silêncio à memória do primeiro membro da nossa tertúlia que nos deixa, pelas leis imperativas da vida. O Zé era o nosso patriarca. Estive com ele apenas uma vez, na minha escola. Almoçámos juntos, eu, o Nuno Rubim e o Pepito (O PIpo, como ele carinhosamente o chamava). De resto, contactámos-nos durante um ano por e-amail e por telefone. A Guiné aproximou-nos e tornou-nos amigos...
E o seu contributo, em termos de blogue, foi reconhecidamente importante para o trabalho de reconstituição da memória de Guileje que está a ser feito pelo Pepito, pelo Nuno Rubim e por outros camaradas, também com a nossa participação. Os seus escritos e as fotos começaram por dar visibilidade a Guileje. Ele também tinha muito apreço pelo Pepito e pelo projecto de Guileje. É também uma notícia triste, esta, para os nossos amigos da Guiné-Bissau.
Em jeito de pequena homenagem, irei republicar as suas memórias de Guileje, originamente publicadas na anterior versão, menos amigável, do nosso blogue, entre 10 de Janeiro e 25 de Fevereiro de 2006 (num total de 10 posts) (1)... Vou aproveitar para divulgar mais fotos do seu álbum de Guileje, a partir dos seus slides (graças às diligências do nosso Albano Costa, foi melhorada a qualidade destas fotos, que inicialmente ficaram muito azuladas).
O Zé era um homem que se integrava muito bem, no seio das comunidades em que vivia. E Guileje foi um exemplo disso: ele também achava que havia mais vida para além da tropa, da burocracia e da guerra... Era, além disso, um homem com grande sentido de humor, com sentido de justiça e com coragem, física e moral...
Como muitos homens da sua geração e da sua classe socioprofissional, fumava muito... Não sei quantas comissões de serviço terá feito no Ultramar... Sei que esteve em Macau, de que falava com saudade...
Quando conseguiu deixar de fumar, começaram a surgir os seus problemas de saúde... Andava irritado, como qualquer ex-fumador... Mas conseguiu, com a sua enorme força de vontae, deixar o cigarro de vez... Infelizmente, tarde de mais... Recordo-me da penúltima vez que lhe falei, ao telefone, já numa fase mais avançada da doença:
- Então, Zé, como vai isso ?
- Olha, entregue aos médicos, que agora me querem tirar um pulmão... Estão aqui reunidos em junta médica...
- Tu és forte e ainda vais vencer essa batalha.
- Eu quero é viver, mesmo com um pulmão a menos...
- Pois...
- Sabes, fui estúpido...Quando era novo, vendia saúde... Lembras-me da minha fotografia no Saltinho ? Eu era um atleta... Mas cheguei a fumar cinco maços!... A gente pensa que a doença só acontece aos outros... – rematava ele, sem mágoa, com lucidez, com coragem, e ainda com esperança.
Grande Zé, até sempre! Privei pouco tempo contigo, mas gostei de te conhecer. Vamos ter saudades tuas. Mas não te esqueceremos, na blogosfera e fora dela... Tens uma neta fantástica que vai pôr em ordem os teus escritos e cultivar a tua memória.
Luís Graça & Camararadas da Guiné
PS – Leonor: Um beijinho muito grande dos camaradas do teu querido avô. Um abraço também para o teu primo Afonso. Tens o nosso blogue para escrever, se te apetecer. Ou para publicar outras coisas do teu avô... Tu podes continuar a representá-lo, na nossa tertúlia, colmatando de algum modo o tremendo e difícil vazio que fica sempre com a morte de alguém que nos é querido... Dá também um beijinho nosso à tua mãe, e às tuas duas tias, bem como à tua avó que muito sofreu nestes últimos quatro meses...
Com os melhores cumprimentos, Leonor Neto.
Guiné > Região de Tombali > Guileje > CART 1613 (1967/68) > O 2º sargento Neto, que fazia as funções de 1º sargento da companhia, fotogrado junto a um abrigo e à viatura blindada Fox.
Foto: © Zé Neto / AD - Acção para o Desenvolvimento (2007). Direitos reservados .
4. Resposta à Leonor, por e-mail de 14 de Maio último:
Leonor: O seu avô é o mais velho de todos nós, membros desta caserna virtual, tertúlia ou tabanca grande, como queira... Formamos um grupo de amigos e camaradas que hoje já são, também, velhos amigos e conhecidos...
Guiné > Região de Tombali > Guileje > CART 1613 (1967/68) > O Zé Neto fotografado entre os putos da tabanca.
Foto: © Zé Neto / AD - Acção para o Desenvolvimento (2007). Direitos reservados .
Todos apreciámos, muito, o contributo do seu avô para a preservação da memória de Guileje... Publicámos o seu diário, divertimo-nos com os seus apontamentos bem humorados sobre as misérias e grandezas dos seus camaradas de armas, admirámos a sua frontalidade, invejámos a sua juventude de espírito... Com os melhores cumprimentos, Leonor Neto.
Falo do passado, por que ele há meses que já não escreve para o blogue... Conheci-o depois, pessoalmente. Teve a gentileza de visitar-me ao meu local de trabalho, no verão passado, juntamente com o coronel Nuno Rubim e o Eng. Carlos Schwarz (Pepito), todos irmanados no mesmo entusiasmo, o Projecto Guileje.
E de vez em quando eu telefonava-lhe. Apoiei-o bastante quando decidiu deixar de fumar... Infelizmente demasiado tarde. Aqui ficam alguns excertos de mensagens que trocámos (em dois deles, fala dos netos com ternura, incluindo a Leonor). A última vez que lhe falei disse:
- Zé, travaste muitas batalhas, não serás desta que te vais deixar ir abaixo...
Senti-o bem agarrado à vida... Quero ver se o visito no Hospital Militar... Infelizmente esta semana vou estar fora, na Madeira, em trabalho... Leonor: Vá estando em contacto comigo/connosco...
Um beijinho grande para si, força para a sua mãe, tias, avó e primos. Luís Graça
5. Excertos de e-mails do e para o Zé Neto (selecção de L.G.)
Zé Neto > 8/1/06 > Memórias de Guilege >
"Meu caro Luis: Depois de muito meditar cheguei à conclusão de que, pelo menos tu, mereces a minha confiança para partillhar contigo uma parte muito significativa das memórias da minha vida militar.
"São trinta e três páginas retiradas (e ampliadas) das 265 que fui escrevendo ao correr da pena para responder a milhentas perguntas que o meu neto Afonso, um jovem de 17 anos, que pensava que o avô materno andou em África só a matar pretos enquanto que o paterno, médico branco de Angola, matava leões sentado numa esplanada de Nova Lisboa (Huambo). Coisas de família...
"Já cedi este modesto trabalho à AD do Pepito e conto não o fazer mais, por enquanto. É, como já te disse, uma perspectiva um tanto diferente dos relatos do blogue, mas é assim que sei contar as minhas angústias e sucessos. Diz qualquer coisa. Até breve. Um abraço do patriarca Zé Neto”.
Guiné > Região de Tombali > Guileje > CART 1613 (1967/68) > Um aspecto do interior da tabanca.
Foto: © Zé Neto / AD - Acção para o Desenvolvimento (2007). Direitos reservados .
Luís Graça > 8/1/06 > Memórias de Guilege >
“Já recebi o teu texto, acabo de fazer uma primeira leitura em diagonal, fiquei entusiasmo... Peço autorização de divulgá-lo no nosso blogue para que os meus netos, quando os tiver, também possam ter o privilégio, como os teus, de conhecer o grande homem e militar que tu és, bem como as misérias e as grandezas dos tugas e dos turras em terras da Gioné...
"É um magnífico documento que deves partilhar com os teus ex-camaradas e amigos da Guiné... Dás-me autorização para publicar isto, em quatro ou cinco partes ? Um grande abraço. Luís”.
Zé Neto > 9/1/06 > Memórias de Guilege
“Meu caro Luis: Concordo com a tua sugestão. Não quero ofender o homenzinho Santana. Mesmo se tiveres de fazer arranjos, confio na tua técnica avançada para a coisa sair decente. Avança !!!
“Acabei de ler a odisseia do Pepito a contar-nos as prepotências dos novos sobas de S. Domingos. O Pepito, com quem conversei demoradamente quando fomos apresentados pelo seu colega, conterrâneo e condiscípulo Estácio, tem um espírito puro de mais para enfrentar os viciados que nós, portugueses, lá deixamos, infelizmente. Isto a brincar... Aos ingénuos africanos basta pendurar-lhes no peito e nos ombros uns emblemas dourados, bem polidos, para termos um ditador em potência. Era a nossa técnica!
“Vou a seguir consolar o nosso Pepito. Até breve. Zé Neto”.
Luís Graça > 10/1/06 > Memórias de Guileje >
“Zé, obrigado, pela tua confiança em mim... Vou fazer o melhor que sei, fica descansado, que vais ficar bem na fotografia...
"Quanto à Guiné-Bissau e o que lá se passa hoje: não devemos interferir nos assuntos internos dos guineenses, mas também não podemos deixar passar em claro tudo o que tiver a ver com violação de direitos e garantias dos cidadãos... A Guiné-Bissau vai conquistar o deu direito a ser um país respeitado no concerto das Nações, mas para isso o Estado, o poder político, vai ter que garantir o respeito pelos direitos humanos dos guineenses... Este assunto ultrapassa a esfera do nosso blogue: se nos pusermnos a discutir política (a nossa e a dos outros...), a tertúlia desfaz-se... O que não quer dizer que não possamos exercer alguma influência, individualmente, como cidadãos e amigos da Guiné. Um abraço. Luís”.
Zé Neto > 12/1/06 > As malditas formigas pretas do José Teixeira >
“Luis: A minha intenção era ficar aqui caladinho no meu canto para não entupir a formidável sequência de factos das campanhas da Guiné. (Creio que estamos a construir um monumento histórico e inédito). Mas o José Teixeira tem o condão de me despertar recordações dispersas, pois fala de sítios por onde andei. Admiro-o muito” (…).
Zé Neto > 10/1/06 > Envio de foto >
“Luís: Falaste em eu não ficar mal na fotografia e lembrei-me que ainda nbinguém, no blogue, conhece a minha cara. Do tempo da Guiné não tenho, por enquanto, porque, como já disse, estão todas em Leiria [ na Escola Supetrior de Educação de Leiria,]para digitalizar. Das recentes tenho para aqui umas, mais engravatado, menos retocado, mas escolhi esta que é mais retrato do que foto que a minha neta Leonor captou e usa no ecrã do telelé. Guarda aí até virem as outras. Um abraço do Zé Neto”
Luís > 10/1/06 > Envio de foto >
“Zé: Estás todo janota... Já percebi que és um sortudo, tens uns netos amorosos... Comecei hoje a publicar as tuas memórias de Guileje (eu escrevo Guileje e não Guilege, como tu, ou Guiledje, como o Pepito; Guileje de acordo com a grafia usada pelos Serviços Cartográficos do Exército” (...).
Zé Neto > 14/1/06 > Gato escondido com o rabo de fora >
“Luís: Estive agora a ver a segunda parte das minhas memórias de Guilege e... falhou o nosso compromisso. Estava combinado que não apareceria o nome do Santana, mas sim S., porém deixaste escapar a verdade no parágrafo : O Santana lá foi vendendo uns quilos de de farinha... Emenda lá isso por favor. Um abraço do Zé Neto”.
Guiné > Região de Tombali > Guileje > CART 1613 (1967/68) > A Maria de Guileje,a lavadeira... (Luís: E a propósito vou meter uma cunha para meteres a minha lavadeira, Maria (não é o nome dela, mas eu baptizava todas as minhas lavadeiras com este nome por comodidade de comunicação e elas gostavam. A de Colibuia já não queria ser tratada de outra maneira). A Maria de Guileje é a que está rigorosamente vestida com trajo local e com um guarda-sol verde que eu lhe ofereci. Pode ser?"... Zé: Eu acho que troquei as tuas Marias e nunca cheguei a colocar no blogue a foto da verdadeira Maria de Guileje, toda vaidosa com o o seu chapéu verde, oferecido pelo senhor sargento da companhia... Desculpa o lapso. Aqui fica a Maria para a história"... (Luís:
Foto: © Zé Neto / AD - Acção para o Desenvolvimento (2007). Direitos reservados .
Zé Neto > 14/2/06 > Notícias >
“Meu caro Luís: Amanhã às 10h00 vou estar com o Pepito no Instituto Marquês Valle Flôr, Rua de S. Nicolau, 105, para uma sessão de trabalho com o arquitecto que está a colaborar na reconstituição do Quartel e Tabanca de Guileje. Entretanto espero combinar com o Pepito um encontro entre nós os três, ou quatro, ou cinco. Quem aparecer é benvindo.
“Estou a gostar da tua inserção dos meus slides no blogue. E a propósito vou meter uma cunha para meteres a minha lavadeira, Maria (não é o nome dela, mas eu baptizava todas as minhas lavadeiras com este nome por comodidade de comunicação e elas gostavam. A de Colibuia já não queria ser tratada de outra maneira). A Maria de Guileje é a que está rigorosamente vestida com trajo local e com um guarda-sol verde que eu lhe ofereci. Pode ser? Um abração e até breve. Zé Neto”
Zé Neto > 10/4/06 > Mudança de e-mail >
"Luís: O meu Endereço mudou porque passei para a Clix o mês passado. Julgava que tinhas recebido a mensagem que enviei a todos os meus correspondentes. Falhou... Mas não foi só a tua. Ando muito chocho com a falta dos cigarros e não tenho cabeça para nada. Mas hei-de conseguir!!! Um abraço do Zé Neto".
Zé Neto > 11/4/06 > Apelo do Pipo >
“Por agora é tudo, não esquecendo o meu agradecimento pelas muitas mensagens de força Zé, resiste ao cigarro que tu, Luis, desencadeaste na malta do blogue. Abraça-vos o velho Zé Neto”.
Zé Neto > 22/5/06 > Gandembel >
“Meu caro Luís: Não. Não desapareci. Apenas hibernei para vencer o tabágico vício. E estou a conseguir. Vou a caminho do quarto mês sem cigarro. Mas o assunto é a chegada do Idálio Reis ao blogue” (...).
_________
Notas de L.G.:
(1) Vd. posts de:
10 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXXXVII: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto) (1): Prelúdio(s)
13 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXLVII: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto) (2): Ordem de marcha
21 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDLXVII: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto) (3): Dauda, o Viegas
23 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDLXXIII: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto)(4): os azares dos sargentos
3 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXCVII: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto)(5): ecumenismo e festa do fanado
8 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DVII: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto)(6): dos Lordes e das bestas
11 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXXI: Memórias de Guileje (Zé Neto, 1967/68) (7): Francesinho e Cavaco, o belo e o monstro
14 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXXXIV: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto) (8): Gazela com chouriço à moda do Celestino
16 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXLIV: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto) (9): a Operação Bola de Fogo
25 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DLXXXV: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto) (Fim): o descanso em Buba
Guiné 63/74 - P1800: Álbum das Glórias (14): De Alferes (CCAÇ 1420, Fulacunda, 1965/67) a Capitão (CCAÇ 18, Quebo, 1970/72) (Rui Alexandrino Ferreira)
Guiné > Aldeia Formosa > CCAÇ 18 (1970/72) > 1971 > Os primeiros foguetões 122 capturados aos guerrilheiros do PAIGC. O Cap Mil Rui Ferreira, comandante da CCAÇ 18, é o elemento do meio, na fotografia.
Guiné > Fulacunda > CCAÇ 1420 (1965/67) 1966 > O Alf Mil Rui Ferreira "com um chapéu turra".
Guiné > Fulacunda > CCAÇ 1420 (1965/67) > 1967 > "Com o Eusébioa, a mascote da companhia".
Guiné > Aldeia Formosa (Quebo) > CCAÇ 18 (1970/72) > 1971 > "No meu quarto no Quebo com camuflado Cubano".
Fotos e legendas: © Rui Ferreira (2007). Direitos reservados.
O Rui Alexandrino Ferreira, que foi recentemente homenageado em Viseu, terra nde vive (1), nasceu em Angola (Lubango, 1943). Fez o COM em Mafra em 1964. Tem duas comissões na Guiné, primeiro como Alferes Miliciano (CCAÇ 1420, Fulacunda, 1965/67) e depois como Capitão Miliciano (CCAÇ 18, Aldeia Formosa, 1970/72). Fez ainda uma comissão em Angola, como capitão. Publicou em 2001 a sua primeira obra literária, Rumo a Fulacunda (2).
___________
Notas de L.G.:
(1) Vd. post de 30 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1797: Convívios (13): Viseu: Homenagem ao Rui Ferreira e apresentação do último livro do Cor Gertrurdes da Silva (Paulo Santiago)
(2) Vd. posts de ou sobre o Tenente-Coronel Rui Alexandrino Ferreira:
15 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1761: A floresta-galeria na escrita de Rui Ferreira
1 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1718: Lendo de um fôlego o livro do Rui Ferreira, Rumo a Fulacunda (Virgínio Briote)
14 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1661: Tertúlia: Notícias de Lafões, do Rui Ferreira, do Carlos Santos e da nossa gloriosa FAP (Victor Barata)
31 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1639: Estórias de Bissau (12): uma cidade militarizada (Rui Alexandrino Ferreira)
20 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1448: Os quatro comandantes da CCAÇ 2586 (A. Santos)
17 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1285: Bibliografia de uma guerra (14): Rumo a Fulacunda, um best seller, de Rui Alexandrino Ferreira (Luís Graça)
Guiné 63/74 - P1799: Pensamento do dia (11): A todos os homens e mulheres com coragem... (Manuel Bastos / António Duarte)
1. Mensagem do António Duarte (ex-Fur Mil da CCAÇ 12, Xime, 1973/74) (1) que, embora enviada há mais de um mês, não perde actualidade:
A todos os homens com coragem para lutar. A todos os homens com coragem para desertar. A todas as mulheres com coragem para perdoar a ambos.
(Copiado do blog do Manuel Bastos, combatente em Moçambique onde foi ferido muito gravemente em 1972, Cacimbo > Episódios da Guerra Colonial).
Caro Luís,
Bem sei que ainda há pouco tempo houve discussão brava sobre o tema dos desertores (2) e a possibilidade de estes manifestarem a sua opinião no nosso espaço.
Como conheço o Manuel Bastos, de vez em quando visito o seu espaço e deparei com esta bonita frase, que eu subscrevo inteiramente. É da sua autoria e mostra uma tranquilidade e um perdão implícito, que vindo de um camarada nosso que quase perdeu a vida, me toca profundamente. Desta forma e se algum dia achares oportuno voltar de novo ao tema da aceitação de desertores na nossa caserna, regista que, e sem prejuízo de respeitar, perceber e aceitar opiniões diversas, se deveria permitir a participação dos outros que desertaram.
Quero também dizer que não dou esmola para o peditório de que desertaram por não concordarem com a guerra colonial. Diria que no limite, o que abre lugar a muitas poucas excepções, todos desertaram porque não quiseram arriscar a pele. Do outro lado ficam os que, como nós, combateram, o que não nos torna a todos concordantes com a bondade da guerra.
Um abraço
António Duarte
__________
Nota de L.G.:
(1) Vd. os seguintes posts, da autoria do António Duarte (ou com referências a ele):
5 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1565: A CCAÇ 12, o nosso 'neto' António Duarte e os nossos queridos 'nharros' (Abel Rodrigues)
28 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1553: A CCAÇ 12 no Poidão e na Ponta do Inglês, pela enésima vez (António Duarte)
20 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DLXVIII: Notícias da CART 3493 (Mansambo, 1972) e da CCAÇ 12 (Bambadinca e Xime, 1973/74) (António Duarte)
18 Fevereiro 2006 > Guiné 63/74 - DLXI: Um periquito da CCAÇ 12 (António Duarte / Sousa de Castro)
21 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1302: Blogoterapia (1): Palmas para o Amílcar Mendes, o Beja Santos e o Victor Tavares (António Duarte, CART 3493 e CCAÇ 12)
24 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P984: Ainda a tragédia de Quirafo: o 'morto' que afinal estava vivo (António Duarte)
17 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P966: O Mexia Alves que eu conheci em Bambadinca (António Duarte, CCAÇ 12, 1973)
11 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXLV: Ex-graduados da CCAÇ 12 também foram fuzilados (António Duarte)
(2) O ponto de partida foi o post de 3 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1560: Questões politicamente (in)correctas (25): O ex-fuzileiro naval António Pinto, meu camarada desertor (João Tunes)
Até há data publicaram-se mais de uma dúzia de posts sobre este tópico.
A todos os homens com coragem para lutar. A todos os homens com coragem para desertar. A todas as mulheres com coragem para perdoar a ambos.
(Copiado do blog do Manuel Bastos, combatente em Moçambique onde foi ferido muito gravemente em 1972, Cacimbo > Episódios da Guerra Colonial).
Caro Luís,
Bem sei que ainda há pouco tempo houve discussão brava sobre o tema dos desertores (2) e a possibilidade de estes manifestarem a sua opinião no nosso espaço.
Como conheço o Manuel Bastos, de vez em quando visito o seu espaço e deparei com esta bonita frase, que eu subscrevo inteiramente. É da sua autoria e mostra uma tranquilidade e um perdão implícito, que vindo de um camarada nosso que quase perdeu a vida, me toca profundamente. Desta forma e se algum dia achares oportuno voltar de novo ao tema da aceitação de desertores na nossa caserna, regista que, e sem prejuízo de respeitar, perceber e aceitar opiniões diversas, se deveria permitir a participação dos outros que desertaram.
Quero também dizer que não dou esmola para o peditório de que desertaram por não concordarem com a guerra colonial. Diria que no limite, o que abre lugar a muitas poucas excepções, todos desertaram porque não quiseram arriscar a pele. Do outro lado ficam os que, como nós, combateram, o que não nos torna a todos concordantes com a bondade da guerra.
Um abraço
António Duarte
__________
Nota de L.G.:
(1) Vd. os seguintes posts, da autoria do António Duarte (ou com referências a ele):
5 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1565: A CCAÇ 12, o nosso 'neto' António Duarte e os nossos queridos 'nharros' (Abel Rodrigues)
28 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1553: A CCAÇ 12 no Poidão e na Ponta do Inglês, pela enésima vez (António Duarte)
20 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DLXVIII: Notícias da CART 3493 (Mansambo, 1972) e da CCAÇ 12 (Bambadinca e Xime, 1973/74) (António Duarte)
18 Fevereiro 2006 > Guiné 63/74 - DLXI: Um periquito da CCAÇ 12 (António Duarte / Sousa de Castro)
21 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1302: Blogoterapia (1): Palmas para o Amílcar Mendes, o Beja Santos e o Victor Tavares (António Duarte, CART 3493 e CCAÇ 12)
24 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P984: Ainda a tragédia de Quirafo: o 'morto' que afinal estava vivo (António Duarte)
17 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P966: O Mexia Alves que eu conheci em Bambadinca (António Duarte, CCAÇ 12, 1973)
11 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXLV: Ex-graduados da CCAÇ 12 também foram fuzilados (António Duarte)
(2) O ponto de partida foi o post de 3 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1560: Questões politicamente (in)correctas (25): O ex-fuzileiro naval António Pinto, meu camarada desertor (João Tunes)
Até há data publicaram-se mais de uma dúzia de posts sobre este tópico.
Guiné 63/74 - P1798: Região de Catió: Descendentes da família Pinho Brandão procuram-se (Gilda Pinho Brandão)
Guiné > Região de Tombali > Ilha do Como > 1964 > Croquis da Op Tridente (de 14 de Janeiro a 24 de Março de 1964) .... "A designada Ilha do Como é, na realidade, constituída por 3 ilhas: Caiar, Como e Catunco mas que formam na prática um todo, já que a separação entre elas é feita por canais relativamente estreitos e apenas na maré-cheia essa separação é notória". O Mário Dias, que participou na Operação Tridente, desenhou este croquis com base na carta da província da Guiné (1961). A vermelho, aparece assinalada a famosa Casa Brandão que esteve no centro da batalha da Ilha do Como, uma batalha mítica para o PAIGC e para a sua máquina de propaganda (LG).
Infogravura: © Mário Dias (2005). Direitos reservados.
1. Mensagem enviada por Gilda Bras:
Muito boa tarde,
Parabéns pela vossa página, pois ajudou-me a descobrir que a família que eu procuro há mais de 35 anos, foi importante para a formação da Guiné.
Não sei se alguém me pode ajudar, eu gostava de encontrar familiares do Afonso Pinho Brandão e Manuel Pinho Brandão, comerciantes importantes na Guiné na altura da Guerra (1).
Sou filha do Afonso Pinho Brandão, chamo-me Gilda Pinho Brandão. Se me puderem ajudar, podem fazê-lo para o meu e-mail.
Muito obrigada e continuem com o vosso bom trabalho.
Cumprimentos
Gilda Brás
2. Minha querida:
Dois dos nossos camaradas que estiveram na Ilha do Como e em Catió, têm apontamentos sobre a família Pinho Brandão. Pelo que presumo das suas palavras, o Afonso e o Manuel de Pinho Brandão seriam irmãos. É isso ? Será que estamos a falar da mesma família ? Julgo que sim.
Pode ser que que os nossos camaradas Mário Dias e Mendes Gomes possam acrescentar algo mais sobre estes importantes comerciantes e proprietários da Região de Tombali. Obrigado pela simpática apreciação que faz do nosso blogue. Apareça sempre. Saudações. Luís Graça & Camaradas da Guiné.
__________
Nota de L.G.
(1) Há várias referências no nosso blogue à Casa Brandão e à figura, já então lendária, do comerciante Manuel de Pinho Brandão, da Ilha do Como. Vd. posts sobre a batalha da Ilha do Como (1964):
17 de Novembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCXCV: A verdade sobre a Op Tridente (Ilha do Como, 1964) (Carlos Fortunato / Mário Dias)
15 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXX: Histórias do Como (Mário Dias)
15 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXXII: Op Tridente (Ilha do Como, 1964): Parte I (Mário Dias)
(...) "[A Ilha do Como] não tinha estradas. Apenas existia uma picada que ligava as instalações do comerciante de arroz, Manuel Pinho Brandão (na prática, o dono da ilha) a Cachil. A partir desta localidade o acesso ao continente (Catió) era feito de canoa ou por outra qualquer embarcação. A casa deste comerciante era, se não estou em erro, a única construída de cimento e coberta a telha" (...)
16 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXXV: Op Tridente (Ilha do Como, 1964): II Parte (Mário Dias)
(...) "A tabanca de Cauane, bem como as restantes, estava praticamente destruída assim como a casa do comerciante Brandão, ali bem próxima. Meses antes, já a aviação havia actuado na ilha bombardeando e destruindo todas as instalações que pudessem ser proveitosas ao IN. Recordo-me ainda de assistir no QG em Santa Luzia, onde ocasionalmente me encontrava, aos protestos do referido Brandão por lhe terem escavacado tudo quanto possuía no Como" (...).
(...) "Um dos pontos que pretendíamos dominar era a picada que, partindo das imediações da casa Brandão, seguia para Norte em direcção a Cassaca e Cachil. Tarefa difícil pois o inimigo tinha instaladas à entrada da mata metralhadoras no enfiamento da picada. No dia 23 o grupo de comandos reforçado com uma secção da CCAV 488 e uma secção de fuzileiros dirigiu-se ao local para tentar alcançar e destruir as metralhadoras. Escondidos na casa Brandão, fomos progredindo de um e outro lado do ourique. Porém, ao chegarmos junto ao rio que atravessa a bolanha tínhamos que subir para o ourique e passar por umas tábuas que faziam de ponte. Como era de esperar, as metralhadoras entraram em funcionamento. Zás. Tudo a saltar de novo para o desnível do ourique" (...).
17 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXXX: Op Tridente (Ilha do Como, 1964): III Parte (Mário Dias)
(...) "Passagem e pequena paragem na tabanca de Cauane, troca de informações com o comandante da CCAV 488, dono da casa, e iniciámos a penetração na mata à 1 hora do dia 21, partindo da casa Brandão. Reacção do IN?...nenhuma. Progredimos até Cassaca que foi alcançada às 02H30. Feita uma batida cuidadosa à região, encontraram-se a Norte algumas casas de mato quase destruídas e há muito abandonadas" (...).
15 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDLI: Falsificação da história: a batalha da Ilha do Como (Mário Dias)
Há também uma referência a um outro (?) Brandão, de Ganjola, região de Catió, e que é aqui soberbamente evocado pelo nosso camarada Mendes Gomes:
22 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1455: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (7): O Sr. Brandão, de Ganjolá, aliás, de Arouca, e a Sra. Sexta-Feira
(...) "Sete e Meio era o nome dado à casa que albergava os alferes da companhia de intervenção e mais alguns dos felizardos, residentes com o comando do batalhão (...).
"Era a casa do enfermeiro de antes da guerra. Como aconteceu a tantos outros, foi obrigado a cedê-la, de aquartelamento, aos militares.
"Uma pequena moradia, em cimento armado e tijolo, como as que se encontravam em qualquer parte da metrópole, ali, era um palacete de luxo, aos olhos dos indígenas das rudes tabancas de palha. Uma sala comum, quatro quartos e uma casa de banho, dava a sensação de estadia romanesca, para um aventureiro que viesse fazer uma caçada nas cerradas matas tropicais, ali ao pé.
"Era-nos fácil imaginar, com sadia cobiça, a deliciosa época da vida colonial, de antes da guerra, para os felizardos, a quem a sorte, em boa hora, escorraçara, com a pena de desterro, por feitos heterodoxos à moral reinante das gentes da metrópole.
"Era o caso do Sr. Brandão, de Ganjola, a quinze km de Catió, um injustiçado lavrador das terras de Arouca. Ali vivia há dezenas de anos, por assassínio, cometido numa das romarias da Senhora da Mó. No meio dos folguedos e romarias, por vezes, acertavam-se contas atrasadas, duma qualquer hora de desavença, mesmo no fim da missa domingueira.
"O Sr. Brandão, agora, era um velhote, rodeado de filhos e netos que foi gerando, ao sabor das madrugadas de batuque e da liberdade de escolha, sem custos, entre as mais viçosas bajudas da tabanca…
"Uma negra, velha, mas de rosto e olhar, ainda iluminados por olhos meigos, como a sua voz, doce, era a predilecta, de sempre. Seu nome, Sexta-Feira. Soava bem aos ouvidos dos falares balantas, fulas ou mandingas. Era ela quem lhe tratava das tarefas caseiras. Dedicada. Sem nada cobrar, para além do breve e malicioso sorriso do velho Brandão, quando lhe despontava o desejo do seu corpo, negro, sem idade. Podia despontar a qualquer hora. Sexta-Feira ali estava, sempre dócil e submissa.
"Uma loja farta de tudo o que chegava na carreira regular das barcaças de Bissau. Os lindos panos de cor garrida e os gordos cordões reluzentes, de fantasia, com que as negras tanto gostavam de se enfeitar.
"O vinho tinto da metrópole era o regalo dos ociosos negros, de rostos engelhados e curtidos pelo álcool, pela tarde fora, a par da cachaça de coco.O saboroso bacalhau, curado nas míticas secas da Figueira da Foz e Aveiro, tão apreciado e toda a sorte de ferragens eram tudo o que aguçava o desejo daquelas gentes, para a troca do arroz, milho, mandioca, galinhas e demais produtos que, em cortejo lento e constante, pelas picadas entre as frondosas matas, traziam em açafates, à cabeça.O preço era feito, à medida da vontade gulosa do velho, matreiro e bem afortunado, Brandão.
"Dizia-se que tinha metade das terras de Arouca… não fosse o diabo tecê-las. Ali, vivia, pacatamente, como se não houvesse guerra, numa típica mansão colonial, de um piso sobreelevado, com um varandim a toda a volta, com as dependências necessárias à farta panóplia de utensílios, alfaias e mercadoria.
"Ficava mesmo ao pé [do rio], rico de peixe, onde, infalivelmente, chegavam, em cada dia, as marés vivas capazes de lhe movimentar, de graça, os prodigiosos moinhos com que moía os cereais abundantes.
"Conhecia toda a gente, naquelas paragens, incluindo os turras, a quem pagava, com simpatia, os devidos tributos de guerra…quando não era o fornecimento das informações sobre os últimos planos de operações que, por artes obscuras, ali chegavam aos ouvidos bem afilados.
"Aquele sítio era estratégico e crucial. Por isso, um pelotão reforçado com uma metralhadora pesada, destacado de Catió, disputava-lhe os largos aposentos, como guarda avançada e tampão às possíveis arremetidas que os turras poderiam desfechar sobre Catió" (...).
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Nota de L.G.
(1) Há várias referências no nosso blogue à Casa Brandão e à figura, já então lendária, do comerciante Manuel de Pinho Brandão, da Ilha do Como. Vd. posts sobre a batalha da Ilha do Como (1964):
17 de Novembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCXCV: A verdade sobre a Op Tridente (Ilha do Como, 1964) (Carlos Fortunato / Mário Dias)
15 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXX: Histórias do Como (Mário Dias)
15 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXXII: Op Tridente (Ilha do Como, 1964): Parte I (Mário Dias)
(...) "[A Ilha do Como] não tinha estradas. Apenas existia uma picada que ligava as instalações do comerciante de arroz, Manuel Pinho Brandão (na prática, o dono da ilha) a Cachil. A partir desta localidade o acesso ao continente (Catió) era feito de canoa ou por outra qualquer embarcação. A casa deste comerciante era, se não estou em erro, a única construída de cimento e coberta a telha" (...)
16 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXXV: Op Tridente (Ilha do Como, 1964): II Parte (Mário Dias)
(...) "A tabanca de Cauane, bem como as restantes, estava praticamente destruída assim como a casa do comerciante Brandão, ali bem próxima. Meses antes, já a aviação havia actuado na ilha bombardeando e destruindo todas as instalações que pudessem ser proveitosas ao IN. Recordo-me ainda de assistir no QG em Santa Luzia, onde ocasionalmente me encontrava, aos protestos do referido Brandão por lhe terem escavacado tudo quanto possuía no Como" (...).
(...) "Um dos pontos que pretendíamos dominar era a picada que, partindo das imediações da casa Brandão, seguia para Norte em direcção a Cassaca e Cachil. Tarefa difícil pois o inimigo tinha instaladas à entrada da mata metralhadoras no enfiamento da picada. No dia 23 o grupo de comandos reforçado com uma secção da CCAV 488 e uma secção de fuzileiros dirigiu-se ao local para tentar alcançar e destruir as metralhadoras. Escondidos na casa Brandão, fomos progredindo de um e outro lado do ourique. Porém, ao chegarmos junto ao rio que atravessa a bolanha tínhamos que subir para o ourique e passar por umas tábuas que faziam de ponte. Como era de esperar, as metralhadoras entraram em funcionamento. Zás. Tudo a saltar de novo para o desnível do ourique" (...).
17 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXXX: Op Tridente (Ilha do Como, 1964): III Parte (Mário Dias)
(...) "Passagem e pequena paragem na tabanca de Cauane, troca de informações com o comandante da CCAV 488, dono da casa, e iniciámos a penetração na mata à 1 hora do dia 21, partindo da casa Brandão. Reacção do IN?...nenhuma. Progredimos até Cassaca que foi alcançada às 02H30. Feita uma batida cuidadosa à região, encontraram-se a Norte algumas casas de mato quase destruídas e há muito abandonadas" (...).
15 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDLI: Falsificação da história: a batalha da Ilha do Como (Mário Dias)
Há também uma referência a um outro (?) Brandão, de Ganjola, região de Catió, e que é aqui soberbamente evocado pelo nosso camarada Mendes Gomes:
22 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1455: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (7): O Sr. Brandão, de Ganjolá, aliás, de Arouca, e a Sra. Sexta-Feira
(...) "Sete e Meio era o nome dado à casa que albergava os alferes da companhia de intervenção e mais alguns dos felizardos, residentes com o comando do batalhão (...).
"Era a casa do enfermeiro de antes da guerra. Como aconteceu a tantos outros, foi obrigado a cedê-la, de aquartelamento, aos militares.
"Uma pequena moradia, em cimento armado e tijolo, como as que se encontravam em qualquer parte da metrópole, ali, era um palacete de luxo, aos olhos dos indígenas das rudes tabancas de palha. Uma sala comum, quatro quartos e uma casa de banho, dava a sensação de estadia romanesca, para um aventureiro que viesse fazer uma caçada nas cerradas matas tropicais, ali ao pé.
"Era-nos fácil imaginar, com sadia cobiça, a deliciosa época da vida colonial, de antes da guerra, para os felizardos, a quem a sorte, em boa hora, escorraçara, com a pena de desterro, por feitos heterodoxos à moral reinante das gentes da metrópole.
"Era o caso do Sr. Brandão, de Ganjola, a quinze km de Catió, um injustiçado lavrador das terras de Arouca. Ali vivia há dezenas de anos, por assassínio, cometido numa das romarias da Senhora da Mó. No meio dos folguedos e romarias, por vezes, acertavam-se contas atrasadas, duma qualquer hora de desavença, mesmo no fim da missa domingueira.
"O Sr. Brandão, agora, era um velhote, rodeado de filhos e netos que foi gerando, ao sabor das madrugadas de batuque e da liberdade de escolha, sem custos, entre as mais viçosas bajudas da tabanca…
"Uma negra, velha, mas de rosto e olhar, ainda iluminados por olhos meigos, como a sua voz, doce, era a predilecta, de sempre. Seu nome, Sexta-Feira. Soava bem aos ouvidos dos falares balantas, fulas ou mandingas. Era ela quem lhe tratava das tarefas caseiras. Dedicada. Sem nada cobrar, para além do breve e malicioso sorriso do velho Brandão, quando lhe despontava o desejo do seu corpo, negro, sem idade. Podia despontar a qualquer hora. Sexta-Feira ali estava, sempre dócil e submissa.
"Uma loja farta de tudo o que chegava na carreira regular das barcaças de Bissau. Os lindos panos de cor garrida e os gordos cordões reluzentes, de fantasia, com que as negras tanto gostavam de se enfeitar.
"O vinho tinto da metrópole era o regalo dos ociosos negros, de rostos engelhados e curtidos pelo álcool, pela tarde fora, a par da cachaça de coco.O saboroso bacalhau, curado nas míticas secas da Figueira da Foz e Aveiro, tão apreciado e toda a sorte de ferragens eram tudo o que aguçava o desejo daquelas gentes, para a troca do arroz, milho, mandioca, galinhas e demais produtos que, em cortejo lento e constante, pelas picadas entre as frondosas matas, traziam em açafates, à cabeça.O preço era feito, à medida da vontade gulosa do velho, matreiro e bem afortunado, Brandão.
"Dizia-se que tinha metade das terras de Arouca… não fosse o diabo tecê-las. Ali, vivia, pacatamente, como se não houvesse guerra, numa típica mansão colonial, de um piso sobreelevado, com um varandim a toda a volta, com as dependências necessárias à farta panóplia de utensílios, alfaias e mercadoria.
"Ficava mesmo ao pé [do rio], rico de peixe, onde, infalivelmente, chegavam, em cada dia, as marés vivas capazes de lhe movimentar, de graça, os prodigiosos moinhos com que moía os cereais abundantes.
"Conhecia toda a gente, naquelas paragens, incluindo os turras, a quem pagava, com simpatia, os devidos tributos de guerra…quando não era o fornecimento das informações sobre os últimos planos de operações que, por artes obscuras, ali chegavam aos ouvidos bem afilados.
"Aquele sítio era estratégico e crucial. Por isso, um pelotão reforçado com uma metralhadora pesada, destacado de Catió, disputava-lhe os largos aposentos, como guarda avançada e tampão às possíveis arremetidas que os turras poderiam desfechar sobre Catió" (...).
Guiné 63/74 - P1797: Bibliografia (7): Homenagem ao Rui Ferreira e apresentação do último livro do Gertrurdes da Silva (Paulo Santiago)
Capa do livro do Cor Gerturdes da Silva, Quatro Estações em Abril, editado em 2007 pela Palimage.
1. Mensagem do Paulo Santiago, com data de 27 de Maio de 2007
Hoje, também estavas convidado, fui a Viseu onde o Rui, mais uma vez, reuniu alguns dos seus camaradas da CCAÇ 1420 (que esteve em Fulacunda, entre outros locais), da CCAÇ 18, a qual formou e comandou e ainda ainda militares de outras Companhias que ele comandou após o 25 de Abril.
Estavam também, era o meu caso, ex-militares amigos do Ruizinho. Cheguei atrasado ao RIV [Regimento de Infantaria de Viseu], onde começava o encontro, com uma Missa pelos militares já falecidos. Encaminharam-me para o auditório do Instituto Politécnico, fica frente ao RIV, onde decorria um Colóquio, estando no uso da palavra, quando entrei, o Cor Gertrudes da Silva, que falou segundo me apercebi - incovenientes de chegar atrasado - da problemática da Guerra Colonial, aparecimento do Movimento dos Capitães, desembocando no 25 de Abril. Tudo muito bem exposto, outra coisa não seria de esperar de um Capitão de Abril com uma licenciatura em História tirada nos inícios dos anos 80.
Falou de seguida um ex-militar, Dr. José Moreira, que fez a Guerra na [CCAÇ] 1420. Notável exposição. Falou outro, também ex-comandado do Rui, que já não fez a Guerra, entrou para o COM em 76. O Comandante do RIV também proferiu algumas palavras, antes de nos encaminharmos para aquele Regimento, onde houve um almoço volante bem servido e bem acompanhado com vinhos da adega cooperativa de Silgueiros.
Às 15,30 voltámos ao auditório do Politécnico, onde se ia proceder à apresentação do último livro do Cor Gertrudes da Silva intitulado Quatro Estações em Abril, último da trilogia iniciada com Deus, Pátria e... A Vida, a que se seguiu A Pátria ou A Vida... (à presentação deste último também assisti, em Viseu, no mesmo local, convidado pelo Rui, feita de forma brilhante pelo
Major-General Pezarat Correia, oficial de operações em Aldeia Formosa, quando o Cap
Rui Alexandrino comandava a CCAÇ 18).
A apresentação do livro de hoje foi feita, dizem-me, com grande sapiência e clareza (estava um pouco estourado e passei pelas brasas) pela Prof Dr Margarida Sofia, da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra.
O Cor Gertrudes da Silva (1) terminou agradecendo a presença dos presentes, com uma palavra especial para o Ruizinho, afirmando que, possivelmente sem o seu apoio, esta trilogia nunca teria aparecido.
Também outro momento, marcante, foi quando tirou um envelope do bolso, endereçado à sua esposa com um remetente de uma Gervásia Romão, moradora em Algés, vindo dentro deste envelope um outro, mais pequeno fechado, em que vinha escrito Cap Gertrudes da Silva, trazendo uma carta, com a data de 5 de Maio de 1974, que (cito de cabeça) alterava uma data/hora já programada, falava da adesão da Companhia de Comandos de Lamego, inquirindo também sobre a adesão do Regimento da Guarda que seria necessário para bloquear a fronteira em Vilar Formoso e informando que a nova data/hora seria marcada por estafeta. Assinava a carta: Otelo... Isto é história!
Viseu > 2001 > O Rui Alexandrino Ferreira, hoje coronel de infantaria na reforma, faz a apresentação do seu livro de memórias Rumo a Fulacunda, editado pela Palimage(2)
Foto: © Rui Ferreira (2007). Direitos reservados.
Deste terceiro livro, não posso dizer nada, ainda não o comecei a ler, os outros dois anteriores, são ficção, mas ficção vivida pelo autor na dureza do mato em Angola e na Guiné, havendo uma certa continuação do primeiro para o segundo e, nas palavras do Editor, existirá.a também um fio condutor entre o segundo e este último.
Aconselho a ler, são livros que nos dizem muito. Passe a publicidade, a editora é a Palimage (1), a mesma que editou Rumo a Fulacunda, do Rui Alexandrino Ferreira (2).
Mesmo para quem passou pelas brasas, a mensagem já vai longa.
Paulo Santiago
PS 1- O Cor Gertrudes da Silva escreve alguns textos na Avenida da Liberdade, página da Associação 25 de Abril, editada pelo Pedro Lauret.
PS2 - O coronel Gertrudes da Silva no dia 25 de Abril de 1974, prestando serviço no RI 14 de Viseu, comandou uma força de mais de 500 homens que se dirigiu do Norte sobre a capital. Ficou conhecido por Agrupamento Norte.
Pormenores em http://www.25abril.org/index.php?content=1&hora=1&unidade=10&tema=
(Mensagem de Pedro Lauret).
____________
Notas de L.G.:
(1) Nota curricular fornecida pela editora:
Gertrudes da Silva, de seu nome completo Diamantino Gertrudes da Silva, nasceu em Alvite, concelho de Moimenta da Beira, a 20 de Fevereiro de 1943.
Em 1963 ingressou na Academia Militar, seguindo depois a carreira de Oficial do Exército, na Arma de Infantaria, até ao posto de coronel, encontrando-se agora na situação de reforma.
No tempo próprio cumpriu duas comissões por imposição na Guerra Colonial – a 1.ª em Angola e a 2.ª na Guiné [, CCAÇ 2781, Bissum, 1970/72). À margem das suas ocupações profissionais militares, em 1980 concluiu a Licenciatura em História na Universidade de Coimbra.
Para além de outras condecorações, foi agraciado com a Grã-Cruz da Ordem da Liberdade pela sua participação no Movimento do 25 de Abril de 1974.
Publicações:
Deus, Pátria e... a Vida
A Pátria ou A Vida
Quatro Estações em ABRIL
As imagens aqui utilizadas estão disponíveis no sítio da editora Palimage. São por nós utilizadas, com a devida vénia.
(2) Vd. post de 17 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1285: Bibliografia de uma guerra (14): Rumo a Fulacunda, um best seller, de Rui Alexandrino Ferreira (Luís Graça)
Guiné 63/74 - P1796: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (5): A(s) alegria(s) do(s) reencontro(s)
Guiné > Subsector de Galomaro > Dulombi > CCAÇ 2700 (1970/72) > Mortos da companhia > Memorial executado pelo Furriel Timóteo > Vítimas mortais: António Jacinto da Conceição Carrasqueira (10/8/70, mina a/c); António Guimarães (18/2/71 / mina a/c); José Augusto Dias de Sousa (18/2/71; mina a/c); José Guedes Monteiro (1/10/71; combate); Rogério António Soares (1/10/71; combate); Luís Vasco Fernandes (5/10/71; mina a/c); Adriano Francisco (8/3/72, doença).
Fotos: Fernando Barata (2007). Direitos reservados.
V (e última) parte do resumo da história da CCAÇ 2700 (Dulombi, Maio de 1970/ Abril de 72), unidade que pertenceu ao BCAÇ 2912, e foi render a CCAÇ 2405 do BCAÇ 2852 (1968/70). O autor do texto é o ex-Alf Mil Fernando Barata, da CCAÇ 2700 (1).
Louvores
José Augusto Dias de Sousa (título póstumo)
Alfredo Lopes Ribeiro
Teodoro da Cruz Abreu
Francisco Teixeira Pinto
Arnaldo Seabra da Costa
Carlos Medeiros Barbosa
João dos Santos Henriques Veras
Luís Manuel Telha
Carlos Alberto Maurício Gomes (pelo Cmdt Batalhão)
Manuel Maria Cardoso Maricato
Ricardo Pereira Lemos
Manuel Pedrosa Costa
Alberto Jorge Seixas Pereira
José Maria Prata
José Rocha Carvalho
José Joaquim Queirós Fernandes
Vítor Manuel Rodrigues
Carlos Teixeira Santos
Fernando Costa Ramos
Alfredo Azevedo
Manuel Fernando C. Almeida
Vítor António Gonçalves
Augusto Pereira Rosa
José Silva dos Santos
Albino Almeida da Piedade
Bernardino Rodrigues Pereira
Luís Santos Silva
José Augusto de Sousa
Miguel Carvalho Teixeira
Manuel Fernando R. Brito
Domingos Magalhães Lemos
António Vasco Lopes Alves
Ramiro de Jesus Oliveira
Posfácio
Terminada esta dura campanha da nossa vida (1), igualmente dura e não menos importante fase haveríamos agora que enfrentar.
Para alguns era o retomar dos estudos então interrompidos, para outros o retomar duma profissão deixada a meio possivelmente na altura que se começava a potenciar o que o mestre havia ensinado, para outros, o iniciar de uma caminhada, pintalgada agora, aqui e além por outras minas e armadilhas.
Era o tempo para saborear avidamente junto dos familiares, amigos e conhecidos momentos mágicos de confraternização, de comemoração e até de alguma cumplicidade com os colegas mais chegados.
Foi também tempo para alguns tentarem a sua sorte noutras paragens, principalmente França e Alemanha, países que desde a década de 60 se tinham aberto à imigração.
Os anos foram passando e não imaginam a tristeza que eu ia sentindo, sempre que ao folhear quer A Bola quer o Jornal de Notícias, ia tomando conhecimento de mais um almoço/convívio da companhia x ou do batalhão y, sempre na expectativa que mais dia menos dia lá apareceria publicitado o almoço da 2700.
E não é que (quem espera sempre alcança) por meados de Maio de 1991, me aparece na caixa do correio uma convocatória para o 1.º almoço da Companhia.
Graças a dois Homens que – nunca será de mais realçar – foram os obreiros deste “saboroso mecanismo socializante” e que dão pelo nome de José Marinho e Fernando Ramos, como todos sabem. Sei que posteriormente têm sido ajudados por alguns camaradas (recordo-me do Quintas, do Ferreira, do Cunha, do Silva Soares), mas perdoem-me, sem eles o milagre não teria acontecido.
A 20 de Julho de 1991, apesar das dificuldades em divulgar o evento, pelo desconhecimento da morada de bastante camaradas, lá estava o Campo da Feira, em Barcelos, emoldurado com aproximadamente 60 ex-elementos da Companhia, a maior parte acompanhada pela respectiva cara-metade e alguns mesmo com os herdeiros.
Foram momentos inolvidáveis aqueles que se sentiram e que se prolongaram no restaurante, agora com o estômago já reconfortado, mas sinceramente isso foi o acessório.
A partir daqui e de forma ininterrupta todos os anos nos temos encontrado nos mais diversos locais.
Pelo seu significado não quero deixar de realçar o 7.º Encontro que se realizou no Regimento de Infantaria de Abrantes, quartel onde a nossa Companhia foi formada, tendo sido descerrada uma placa alusiva ao acontecimento e celebrada missa pelo capelão da Unidade. No ano seguinte foi escolhido o Regimento de Infantaria de Vila Real, pela razão de ter sido aqui que a maior parte das praças que formavam a Companhia ter feito a sua recruta.
É digno de registo, tanto em Abrantes como Vila Real, a forma exemplar como fomos recebidos pelas respectivas chefias.
Esperamos que estes convívios mantenham a sua periodicidade. Não tenho dúvida que enquanto, pelo menos o Marinho e Ramos forem vivos, eles realizar-se-ão (2).
___________
Notas de L.G.:
(1) Vd. posts anteriores:
22 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1541: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (1): Introdução: a 'nossa Guiné'
26 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1550: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (2): A nossa gente
15 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1595: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (3): minas, tornados, emboscadas, flagelações e acção... psicossocial
11 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1651: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (4): Historietas
(2) O próximo encontro, o 16º, será a 10 de Junho de 2007, em Braga: vd. post de 30 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1795: Convívios (12): 16.º Encontro da CCAÇ 2700 / BCAÇ 2912 (Dulombi, 1970/72), Braga, 10 de Junho de 2007 (Fernando Barata)
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