A CCaç 726 não tem ainda a história escrita da unidade. O Alberto Pires (o Teco, como é mais conhecido entre nós) e o Carlos Guedes, com mais cinco camaradas estão a escrevê-la, com recurso às histórias dos Batalhões a que a Cª esteve adstrita e às memórias de mais de 400 fotos seleccionadas, tiradas entre Novembro de 1964 e Julho de 1966.
A história da CCaç 726 em datas
Mobilizada através do RI 16, Évora, a CCaç 726, comandada pelo Capitão Martins Cavaleiro (1), embarcou em Lisboa em 6 de Outubro.
Após o desembarque em Bissau, em 14 do mesmo mês, a CCaç 726 rendeu a CArt 676 no dispositivo e manobra do BCaç 600, enquanto, sob a orientação da CCaç 508, fazia a adaptação operacional na zona de Quinhamel, perto de Bissau. O primeiro GrComb a ser destacado para Guileje marchou em 28 de Outubro e o segundo em 17 Novembro.
Em 25 de Novembro de 1964 toda a CCaç 726 já estava no sector de Guileje (2), então criado, primeiro na dependência do BCaç 513, depois na do BCaç 600 e ainda na do BCaç 1861. Anteriormente Guileje esteve ocupado por um pelotão da CArt 495.
A CCaç 726, ao longo da permanência no sector, só ou em conjunto com outras subunidades, tomou parte em diversas operações, patrulhamentos e emboscadas no chamado corredor de Guileje. E por períodos variáveis, forneceu pelotões para temporariamente reforçarem as guarnições de Gadamael e Cacine.
Em 30 de Março de 1965, na sequência da Op Arpão, ocupou a povoação de Mejo, tendo lá deixado dois pelotões.
Em 27 de Janeiro de 1966, para reforçar a CCAÇ 1424, destacou dois pelotões para o Cachil, então na zona de acção do BCAÇ 1858.
Em 2 de Julho de 1966, por rotação com a CCAÇ 1424, passou a integrar o dispositivo do BCAÇ 1858, assumindo a responsabilidade do subsector de Cachil, mantendo ainda um pelotão em Mejo.
Em 16 de Julho foi substituída pela CCAV 1484 (Cap Cav Coutinho e Lima*), seguindo para Catió, onde se manteve até à chegada da CCAÇ 1587.
E em 6 de Agosto de 1966, seguiu para Bissau, a fim de embarcar de regresso à Metrópole.
As baixas da CCaç 726
Durante a comissão na Guiné, a CCAÇ 726 sofreu 10 mortos, dos quais 9 em combate.
Mais de metade da CCAÇ 726 sofreu ferimentos em combate, tendo alguns militares sido atingidos duas e três vezes ao longo da estadia em Guileje.
No total, existe o relato de terem sido evacuados para o HMP 14 elementos da Companhia, tendo cerca de 69 feridos, continuado ao serviço, depois de recuperados.
Mortos:
- Furr Mil António Gonçalves da Silva, em 29 Nov de 1964, por ferimentos em combate.
- 1º Sarg Joaquim Balsinhas, em 28 Fev 1965, por explosão de armadilha IN.
- 1º Cabo Amadeu Jaló, em 28 Maio de 1965, por doença, no HMP
- 1º Cabo Enf Manuel Moreira Marques, em 28 Jun de 1965, por ferimentos em combate.
- Sold Cond Armando Gonçalves da Fonseca, em 28 Ago de 1965, por ferimentos em combate.
- 1º Cabo Elísio Santos Filipe, em 28 Ago 1965, por ferimentos em combate.
- Sold Mil Mussa Bela Camará, em 28 Ago 1965, por ferimentos em combate.
- Sold Cond José Luís L. Pereira, em 29 Ago 1965, por ferimentos em combate.
- Sold Luciano Florêncio, em 7 Set 1965, por AP, em Cutia, ao serviço do GrCmds "Vampiros".
- 1º Cabo João Seborro, em 7 Nov 1965, por ferimentos em combate
As primeiras acções armadas da CCAÇ 726
A 1º acção em que a CCAÇ 726 participou foi uma emboscada que montou, para os lados de Balana, junto a uma cambança do rio. Apanharam armas e tantas munições (mais de 12.000) que se viram aflitos para trazerem todo o material para o aquartelamento.
Não demorou muito a terem a resposta. Um Gr Comb viria a cair, dias depois, numa emboscada. O IN, até essa data, estava habituado a utilizar o corredor sem ser incomodado, uma vez que os efectivos de Guileje, até então, não tinham passado de um pelotão.
Extractos de Perintreps e Sitreps com referências à CCAÇ 726
Novembro de 1964
República da Guiné-Conakry
O conjunto de notícias sobre a presença de grupos IN na Rep. Da Guiné, relacionadas com instrução e reabastecimento de material, levam a admitir o recorte de:
- Elementos do PAIGC regressados da URSS, onde receberam instrução;
- Um centro de instrução em Boké, onde, em Out. de 64, receberam instrução cerca de 300 elementos IN, que se admite pertencerem ao Exército Polpular (2 secções)
Sector E
- Registou-se o final da instrução das duas primeiras unidades do E. Popular, uma das quais se destina ao Quitafine (a outra irá para Boké), supondo-se que tenha sido já uma dessas unidades que actuou na região de Guileje.
- Referida a existência de metralhadoras pesadas AA de 3 canos e viaturas blindadas na posse do IN.
- Observados vestígios de passagem de numerosos grupos, em ambos os sentidos, na área Gadamael-Guileje-Gandembel e caminhos recentemente abertos na área de Contabane.
- Observados 3 sobrevoos de helicóptero em Sangonhã, sempre na direcção E-W.
Dois ataques a Guileje no mesmo dia
Na madrugada de 29 de Novembro de 1964, a CCaç 726 levantou-se mais cedo. Acordou com fogo nutrido de armas automáticas e granadas de morteiro e de RPG. Durou até ao nascer do dia o ataque ao aquartelamento.
Depois do ataque, houve que evacuar os feridos mais graves. Guileje assistiu pela primeira vez a um movimento de helis e Dorniers, que, a partir daí, passaria a ser banal.
Dos relatórios dos ataques:
29 Nov 64 – grupo estimado em cerca de 200 IN atacou a tabanca e o quartel de Guileje, durante cerca de duas horas, com LGF, Mort 60 e 80, MP, Esp, P e GM, provocando incêndio e destruição de instalações militares e civis e causando 2 M e 11 F às NT e 4 M e 20 F à população.
Cerca das 4h00 um grupo estimado em cerca de 200 elementos atacou Guileje usando toda a gama de armas, em especial morteiros, lança-granadas-foguete, metralhadoras pesadas e espingardas automáticas. A intensidade do ataque era brutal e o uso de granadas incendiárias deu origem à destruição por incêndio da maioria das instalações militares e casas da população.
Por se tratar de um acontecimento notável e extraordinário refere-se aqui que no dia 29 de Novembro de 1964 foi Guileje atacada pela primeira unidade do chamado 'Exército Popular' IN, dotado de armamento poderoso, incluindo(…).
Todas as casas da tabanca foram incendiadas e destruídas.
Do Sitrep nº 89 P 300103 de 29 Nov 64 da CCAÇ 726
- Povoação deprimida perdas haveres (.) Boa reacção imediata aparecer pessoal comandante BC513 e oficial reabastecimentos e FAP evacuação feridos (.) Bom moral geral com desejo vingar ataque (.)
- FOX 963 transportar reabastecimentos chegaram em boa ordem (.) Chegar reforço PARAS (.) Trabalhos em melhorar defesa (.) CmdtCCaç726 ferido evacuado (.) Médico presente anima população (.)
- De Bissau arroz e farinha povoação que recebeu oferta sensibilizada (.)
- Oficial TMS encontra-se neste (.) Veio engenheiro águas e obras (.)
Nesse mesmo dia esteve em Guileje o Comandante do Batalhão a fim de tomar contacto com os estragos causados e necessidades imediatas das tropas e da população. Estabelecida uma ponte aérea de socorro em géneros, munições e roupas. Nem um só dos seus habitantes pediu para sair dali ou se deslocou por sua iniciativa para outras localidades. Mais decididos do que nunca, mostraram-se firmes na defesa da sua terra e no desejo de vingar os seus mortos.
Durante o dia fizeram-se as evacuações e foi reforçada a guarnição com um Pelotão de Pára-quedistas.
Foi tanto o movimento que até o próprio IN se convenceu que uma boa parte da CCAÇ 726 tinha abandonado Guileje.
À noite, assinalaram com vários very-lights o 2º ataque.
Os militares da CCAÇ 726, abrigados em toscos abrigos (ainda não tinha havido tempo para os construir) viram e ouviram guerrilheiros, de pé, junto à fiada do arame farpado, a incentivar a população a juntar-se-lhes. Recortados pela intensa luz, foram alvo do fogo dos militares abrigados.
Povoação e quartel de Guileje com iluminação exterior a petromaxes. Reconstituição e montagem, a partir da foto original, de J. Guedes. Com a devida vénia.
O aquartelamento foi defendido pelo 2º e 3º pelotões da CCAÇ 726 e por um pelotão da CART 495, com um efectivo total de 76 militares. Dias antes, um GrComb da CCAÇ 726 tinha sofrido 1 morto e 14 feridos numa emboscada.
A cozinha, o refeitório, a GMC e a armação de uma das tendas, na manhã a seguir ao 1º ataque.
Foto de António Pires (Teco).
A - 1º Sargento Balsinhas (morto por AP, em 28 Fev 65)
B - Furr Mil Enf. Manuel Rodrigues
C- 2º Sarg José Bebiano
D - Furr Mil Transm Carlos Cruz
E - militares da CArt 495
O 2º ataque no mesmo dia
Do Sitrep nº 93 de 30 Nov 64 da CCAÇ 726
1. 291900 a 301900 (.)
2. IN atacou esta das 2215 às 2325 (.) Utilizou Mort, Bazuca, MP, Esp aut, P, GM (.) Causou 3 feridos nativos sem gravidade (.)
3. NT reagiram bem, capturadas 2 Esp aut e vário material (.) Causou baixas avaliar poças de sangue e restos humanos.
Às 22h15 o mesmo grupo IN voltou a atacar, talvez entusiasmado com o relativo êxito que obtivera na madrugada anterior. Foram no entanto surpreendidos com a reacção das NT tendo sido postos em fuga cerca das 23h25.
Abandonou 1 Esp aut e 1 Carabina semi-aut e muito outro material havendo a destacar 1aparelho de pontaria de morteiro 60. Pelas poças de sangue, sinais de arrastamento de corpos e despojos humanos abandonados, o IN deveria ter sofrido pesadas baixas. Notícias posteriores referem que i IN sofreu 30 (?) mortos.
Amílcar Cabral em Guileje
Dezembro de 1964
República da Guiné
- Reportada a presença de Amílcar Cabral até aos primeiros dias de Dez de 64, na área fronteiriça, entre Sansalé e Simbeli, admitindo-se que a sua presença estivesse ligada às actuações do E. Popular contra Guileje e Gadamael.
- Verificou-se que a R. da Guiné incrementou o auxílio que vem prestando ao PAIGC dando-lhe facilidades de utilização dos seus aquartelamentos e de viaturas, quer para ministrar instrução, quer para efectuar reabastecimentos e transportar pessoal.
Já está reportado o apoio dado pelos aquartelamentos de Koundara (a norte) e o de Boké (a sul) no aspecto de concentração, instrução e transporte de elementos IN e ainda no aspecto de ligações rádio com o secretariado do PAIGC em Conakry.
Sector E
- Observados sobrevoos de helicóptero, de Sangonhá, na direcção W, e sobre o rio Cacine.
- O IN, sempre que pretende fazer entradas maciças de material pelo corredor de Guileje, destrói previamente os pontões na estrada, antes e depois daquela região, para o isolar.
As defesas de Guileje após os ataques
Guileje depois dos ataques. Abrigos com MP e com AA (c), espaldões do LGF (d) e do Mort 81 (e), resguardados com tapumes e trincheiras de protecção (b) e duas fiadas de arame farpado (a). Fora deste o aquartelamento estava armadilhado.
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Nota do co-editor vb:
Publicam-se aqui extractos da história de uma das Companhias que mais baixas sofreu na Guiné. A história escrita da CCÁÇ 726 está ainda em construção. Agradecemos ao Teco e ao Carlos Guedes o privilégio que nos quiseram dar, de sermos os primeiros a ler a história da CCAÇ 726.
(1) A CCAÇ 726 teve ainda como Comandantes o Cap Inf Arménio Teodósio e o Cap Art Nuno Rubim.
(2) Vd. ainda posts de:
Guiné 63/74 - P2358: A CCAÇ 726, a primeira unidade a ocupar Guileje: em memória do Alf Mil Comando António Vilaça (Virgínio Briote)
Guiné 63/74 - P1173: A fortificação de Guileje (Nuno Rubim, Teco e Guedes, CCAÇ 726)
Guiné 63/74 - P864: Unidades aquarteladas em Guileje até 1973 (Nuno Rubim / Pepito)
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Nota de vb:
(*) O Cmdt da CCav 1484 era o Cap. Cav Rui Pessoa de Amorim e não, como está indicado acima, o Cap Coutinho e Lima). Corrigido pela mensagem do nosso Camarada Benito Neves, a quem agradecemos a informação correcta e as informações adicionais que nos enviou:
Meu caro Virginio,
Não por vício mas por mero prazer, sou um frequentador quase permanente da nossa caserna virtual. E digo quase permanente porque é a primeira coisa que faço quando me levanto e também a última do dia, antes de me deitar. Foi o que agora aconteceu e li as andanças da C. Caç. 726. Porém, no 8º parágrafo da história da C. Caç. 726, é referido que " /Em 16 de Julho foi substituída pela C. Cav. 1484 (Cap. Cav. Coutinho e Lima), seguindo para Catió onde se manteve até à chegada da C. Caç. 1587.". /
Ora bem, há aqui uma correcção a fazer no que se refere ao comandante da C.Cav. 1484 que foi sempre o Cap. Cav. Rui Manuel Soares Pessoa de Amorim. Desde a constituição da C. Cav. 1484 no RC 7, até à sua desmobilização na mesma Unidade. O Cap. Cav. Pessoa de Amorim apenas não esteve no comando da Companhia nos períodos das suas férias.
Eu estive nesta rendição no Cachil e o Cap. Pessoa de Amorim também lá esteve. Desconheço em absoluto quem terá sido o Cap. Cav. Coutinho e Lima. A rendição no Cachil da C. Cav. 1484 pela C. Caç. 1587, foi feita por fases, G. Comb. a G. Comb., iniciada em 07/07/66.
Que me seja perdoada a intervenção, mas o rigor não me deixou ficar indiferente.
(...)
Benito Neves, Fur. Mil. Cav. CCav. 1484