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sábado, 29 de março de 2025

Guiné 61/74 - P26627: Os nossos seres, saberes e lazeres (675): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (198): Bruscamente, no Natal passado, uma viagem relâmpago a Ponta Delgada – 2 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 17 de Dezembro de 2024:

Queridos amigos,
Ir a São Miguel é como chegar à segunda casa, o deslumbramento nunca cansa, é verdade que há uma dor por todos aqueles que aqui me deram tanta estima e que já partiram. Estava ali no jardim de Antero de Quental, depois de ter deixado na Biblioteca Municipal os livros autografados e que me foram oferecidos por Armando Cortes Rodrigues, a derradeira figura do Orpheu, olhei para a casa onde visitava o meu professor de Cultura Portuguesa, António Machado Pires, foi uma melancolia, outras já tinham acontecido, como a perda do médico oftalmologista Botelho de Melo, que me tratou em Bissau de uns olhos chamuscados por uma mina anticarro. Para quem deixou a vida profissional há uma dúzia de anos, foi também um raro prazer conversar com gente de uma associação de consumidores que ajudei a fundar, falámos do passado, andámos pelo presente e visionámos o que parece vir a ser o futuro, as associações de consumidores carecem de posturas novas neste admirável novo mundo que orbita no digital, na cultura da urgência e na modernidade líquida, cabe-lhes conjugar esforços perante as ameaças ambientais e uma solidariedade que contrarie este primado do individualismo, o grande Cavalo de Tróia da equidade e do Estado social. E fica-me a vontade de regressar depressa.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (198):
Bruscamente, no Natal passado, uma viagem relâmpago a Ponta Delgada – 2

Mário Beja Santos

Recapitulando, aterrei em Ponta Delgada ao principio da tarde, o secretário-geral da ACRA – Associação dos Consumidores da Região dos Açores telefonara-me dias antes lembrando-me das minhas obrigações enquanto um dos impulsionadores, ia para 35 anos, desta organização que privilegia os interesses dos consumidores açorianos, é uma promotora de causas de interesse público, acrescento que, tirando a DECO, é a associação de consumidores que resta da década de 1980, em tempos de pré-adesão à CEE e depois houvera cerca de dúzia e meia de associações, desapareceram praticamente todas ou não chegam ao grande público. Não podia dizer que não, a ACRA lutara denodadamente, anos a fio, para a criação de um centro de arbitragem de conflitos de consumo da região, este entrou em pleno funcionamento, é uma vitória de estalo, mas que traz problemas de foco, agora as reclamações dos conflitos de consumo são tratados nesse centro de arbitragem, o CIMARA, a ACRA precisa urgentemente de encontrar novos azimutes ou reforçar parcerias neste mundo de ameaças ambientais onde o consumo pesa, onde o paradigma digital suscita preocupações, tal como as tecnologias que decorrem e irão decorrer da inteligência artificial, a informação e educação do consumidor carecem de redobrados cuidados. Tive a tarde por minha conta, percorri uma cidade que conheço relativamente bem, aqui vivi de outubro de 1967 a março de 1968, fiz amizades inquebrantáveis, há saudades sem conto, memórias vivas e pesar por aqueles que já partiram e a quem devo profunda gratidão. Comecei o novo dia na cidade da Lagoa, houve larga conversa no auditório camarário, é um ritual que não descuro, almoçar filetes de abrótea ou peixe porco. E depois de regalado, pedi ao anfitrião que me levasse ao outro lado da cidade, extasia-me esta enseada e o contraponto da pedra vulcânica com a terra verde.

Igreja de Nossa Senhora do Rosário
Cidade da Lagoa, vista da Igreja de Nossa Senhora do Rosário
Enquanto aqui fiz tropa esta bela igreja barroca, que pertenceu aos Jesuítas, chamada Igreja do Colégio, esteve sempre fechada, muito depois reabriu e tem um interior faustoso, compatível com o esplendor desta fachada, aqui me detenho e recordo que em frente vivia um senhor chamado Leonardo que saía de caleche, ou talvez uma tipoia, bem indumentado, de botina e chapéu de coco, era um gosto ver aquela marca do passado a meter-se no meio do trânsito. Aqui ao lado da Igreja do Colégio é a Biblioteca Municipal Antero de Quental, aqui venho depositar presentes, um deles foi uma oferta do Dr. Armando Cortes Rodrigues que me convidara para jantar em casa, na Rua do Frias, recebeu-me parecia um gaúcho, recordou-me os seus tempos de Lisboa, inevitavelmente Fernando Pessoa veio à baila, os livros com dedicatória dele ficam nesta biblioteca.
Não há nada de espetacular nesta fotografia, sei muito bem, estamos no Largo 2 de Março, era precisamente naquela esquina que parava uma viatura militar que transportava para os Arrifes os milicianos, oficiais e sargentos, que iam dar recruta. Não havia viaturas, mas o transporte era completamente desconfortável, o camião aos saltos, nós de pé agarrados a uns puxadores manhosos, aos encontrões uns aos outros, a viatura aos saltos e a parar bruscamente quando passavam as vacas. Foi assim, voltei facilmente a 55 anos atrás.
Também no Largo 2 de Março esta casa apalaçada era uma ruína, em franco abandono, dá gosto vê-la aprumada, transformada em alojamento local, passava por aqui todos os dias, lá ao fundo virava à esquerda para me ir encontrar com gente amiga no café Gil ou na Tabacaria Açoriana.
O café Gil agora é um restaurante de sushi, a livraria Gil fechou, é loja expectante, sobrevive a Tabacaria Açoreana, com bastantes alterações, mantém à entrada uma zona de cafetaria, em espaço intermédio temos os jornais, revistas e a lotaria e depois a zona de livraria, ainda um tanto parecida com o que foi. Tem agora este aspeto de tertúlia, antes de entrar ainda procurei o Melo Bento no seu escritório, disseram que talvez estivesse na Açoreana, não estava, talvez a tertúlia comece mais tarde. Olhei melancolicamente para o escaparate onde se vendia o República ou o Diário de Lisboa.
O meu quarto ficava aqui, Rua de Lisboa, n.º 31, 1.º andar, janela sem varanda, quarto com direito a banhos e tratamento de roupa, vinha do quartel, desfardava-me, e partia à civil com um livro debaixo do braço. Nunca esqueci o dia em que sobraçava um calhamaço de cerca de 700 páginas, uma biografia de Kennedy feita por Theodore Sorensen, Editorial Aster, 1967, eis senão quando sou abordado na Tabacaria Açoreana por alguém que me pediu para ler o livro no fim de semana, marcámos ponto de encontro, o dito senhor nunca mais apareceu… O que posso dizer é que a casa levou obras, no meu tempo era uma simples alvenaria branca, uma porta muito simples e nada de gelosias como estas.
É incrível como passei tantas vezes por aqui a caminho do Largo de São Francisco, ou em sentido inverso, para ir para o meu quarto, e nunca me detive para conversar com o Roberto Ivens, natural aqui da terra, que andou com o Brito Capello naquelas expedições africanas, nos tempos em que procurávamos consolidar o Terceiro Império, é um busto bonito, a peanha é elegante, um dever de memória bem assumido.
Houve grandes benfeitorias, naqueles anos 1960 o coliseu estava um tanto escalavrado, é hoje uma casa de concertos, no meu tempo era sobretudo cinema, aqui trouxe um pelotão para vermos o filme Lord Jim, realizado por Richard Brooks, com um elenco de primeiríssima água, descobri que um bom número dos meus recrutas jamais tinha entrado num cinema, foi uma noite de grande felicidade, o comandante do batalhão autorizou que viéssemos todos de viatura, a partir dos Arrifes, finda a sessão, a minha malta regressou à caserna.
Venho despedir-me deste saudoso Antero, nunca foi poeta do meu culto, mas jamais esquecerei a sua conferência no Casino Lisbonense intitulada Causas da decadência dos povos peninsulares, não entendo como todos aqueles que se debruçam sobre a história do pensamento português omitem sempre esta reflexão anteriana.
E também venho despedir-me do Largo da Matriz, um pouco mais à frente há um café que subsiste com o nome Nacional, eu era comensal, comia todos os dias pão, azeitonas, sopa, uma travessa com peixe ou carne e uma sobremesa. Sempre muito bem servido. O empregado caiu na asneira de dizer que era irmão de um recruta meu, adverti-o que no dia em que ele me tratasse mal havia consequências sérias para o irmão, ele terá ficado inquieto, chegava ao desplante de me dizer “Hoje peça a carne, o peixe não está muito bom.” E também neste Largo da Matriz estava o consultório do Botelho de Melo, amigo para sempre, tratou-me carinhosamente a vista depois de um trágico acidente com uma mina anticarro.
Por uso e costume, nunca me apresento em imagem nestas deambulações. Abro exceção porque foi um momento de rara felicidade, reencontrei o jornalista Sidónio Bettencourt, ele era estagiário aí pelos anos 1980 nos estúdios da Emissora Nacional, onde eu gravava programas, nem todos eram em direto. Coube ao Sidónio fazer uma gravação de um desses programas, no final disse-lhe que ele devia ficar na Emissora pelo seu alto profissionalismo. Agradeceu o meu comentário, mas disse-me prontamente que o seu lugar era aqui. Entrevistou-me longamente, não esqueceu aquele encontro de há largas décadas, alguém que acompanhara a emissão nos estúdios disse-me logo que tínhamos que ficar na fotografia. Dei-lhe um abraço e parti para o aeroporto, a visita meteórica chegara ao fim.
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Nota do editor

Último post da série de 22 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26605: Os nossos seres, saberes e lazeres (674): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (197): Bruscamente, no Natal passado, uma viagem relâmpago a Ponta Delgada – 1 (Mário Beja Santos)

sexta-feira, 28 de março de 2025

Guiné 61/74 - P26626: Notas de leitura (1784): Philip J. Havik, um devotado historiador da Guiné: Na Terra do Novo Deus: O general Henrique Dias de Carvalho na Guiné (1898-1899) (5) – 1 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 22 de Março de 2025:

Queridos amigos,
Há alguns anos, aqui escrevi, não escondendo o meu embevecimento, quanto me surpreenderam estes apontamentos inéditos de um general que finda uma carreira prestigiosa em Angola aceitara a sugestão de um nobre italiano para organizar com Vítor Cordon a Companhia de Comércio e Exploração da Guiné. É escusado dourar a pílula, no fim do século, e finalmente com as fronteiras da colónia definidas, estando em Mafra o processo de ocupação da Angola e Moçambique, discutia-se nos meios políticos intelectuais o que fazer das pequenas colónias, ainda por cima numa época de exaustão do erário público. Regressaram as propostas de criar companhias majestáticas, o velho general pôs-se a caminho e foi conhecer a Guiné. Deixou apontamentos, não são tão apurados como os que escreveu sobre a Lunda, é profundamente crítico no estado em que se encontrava a colónia, tece considerações de uma assombrosa modernidade, estava-se então a desflorestar o território porque parecia que se encaminhava perigosamente a agricultura para a monocultura da mancarra. Custa-me a entender o silêncio dos estudiosos acerca destes apontamentos e do olhar profundo do seu autor.

Um abraço do
Mário



Philip J. Havik, um devotado historiador da Guiné:
Na Terra do Novo Deus:
O general Henrique Dias de Carvalho na Guiné (1898-1899) (5) – 1


Mário Beja Santos

O investigador vai debruçar-se numa obra intitulada Apontamentos Inéditos, doados pela família do general Henrique Dias de Carvalho e que a Agência Geral das Colónias publicou em 1944. Numa época em que houve a tentação de regressar às companhias majestáticas para a colónia da Guiné, este conceituado general cujo nome está historicamente associado ao que fez na Lunda (Angola), foi convidado em 1898 pelo Marquês de Liveri a organizar com Vítor Cordon a Companhia de Comércio e Exploração da Guiné. Desligou-se do projeto depois de dois anos de estadia na Guiné, recusou-se a aceitar que houvesse uma administração belga para a dita companhia. Como escreve Philip Havik, “Apesar de não ter a abrangência dos seus escritos sobre Angola, estes apontamentos revelam uma notável capacidade de observação de um militar bastante experimentado no reconhecimento do interior africano, ao tempo ainda pouco atravessado por viajantes Ocidentais.”

Não menos importante é o que o investigador escreve antes da apresentação da obra. A Guiné, na altura em que Dias de Carvalho lá permanece dois anos, não era uma colónia stritu sensu, dado que as autoridades portuguesas não controlavam a maior parte do território que foi atribuído a Portugal, em conformidade com a Convenção Luso-Francesa de 12 de maio de 1886. Era a presença limitada a alguns Presídios e Praças, caso de Bissau, Cacheu, Farim, Buba, Bolama e ainda de forma incipiente, Bafatá. Também na sequência da Conferência de Berlim, despertara um fervor nacionalista, nasciam sonhos de um “Novo Brasil”, desta feita no continente africano. Nos meios políticos intelectuais havia quem acha-se que as “colónias de pequena extensão” eram prejudiciais, salvo quando o seu solo encerrava “riquezas naturais”, o que não era o caso da Guiné. Havik elenca um conjunto de relatos que expunham a debilidade da presença portuguesa, as suas causas e propondo soluções. Portugal não ignorava os apetites dos colonizadores franceses, e convém não esquecer que a Grã-Bretanha se esforçara por deter Bolama, dava-lhe jeito, com a Serra Leoa ali ao lado. E havia hostilidade de chefaturas e senhores da guerra contra as praças. Nos seus apontamentos, Dias de Carvalho entra diretamente no debate, opõe-se à ideia de que a Guiné só podia servir como feitoria comercial ou feitoria-presídio. A resposta sustentável passaria pelo desenvolvimento da agricultura mediante as chamadas pontas, explorações agrícolas e comerciais, regra geral situadas à beira-rio, em ricos solos aluviais, neste tempo falava-se no amendoim, arroz e milho, virá depois o coconote e as matérias-primas das saboarias e só muito mais tarde o caju.

Como se processavam estes negócios? Havik responde:
“O negócio era feito com base em empréstimos, em espécie, de artigos europeus (como aguardente, armas de fogo, pólvora, barras de ferro, tecidos, etc.) emprestados pelas casas de comércio franceses para ser vir como base da troca com as culturas de renda, e principalmente mancarra ou amendoim, mas também coconote ou noz de palmeira. A exportação das culturas estava sujeita a vários condicionantes e riscos, por ex. climáticos, as técnicas de cultivo, a mão-de-obra nativa, o papel dos intermediários, a intervenção das autoridades africanas, e os conflitos na região que se intensificaram ao longo do século XIX. Estes, e a baixa das cotações no mercado internacional contribuíram decisivamente para interromper a expansão da cultura de amendoim nos meados dos anos 80, quando sofreu uma queda abrupta. Até este ponto, o cultivo de amendoim que se espalhou a partir da Gâmbia para o Senegal e a Guiné nos anos 30 do século XIX, tinha atraído um crescente número de ponteiros, na sua maioria de origem cabo-verdiana, emigrando das ilhas por causa das secas e fomes, empregando trabalhadores nativos que migraram sazonalmente para as áreas de produção. Estes últimos estavam, em princípio, obrigados a vender a sua produção ao proprietário das explorações que fixava os preços, criando neste modo práticas abusivas denunciadas por vários governadores e funcionários coloniais, que se queixavam da falta de desenvolvimento dos recursos da então província.”

Comprovadamente, Dias de Carvalho tinha estudado a história recente da região, vê-se que conhecia os problemas relacionados com as propriedades do Rio Grande de Buba, e quanto aos métodos agrícolas é crítico pela desarborização causada pelo corte de lenha para fogos e para a cultura da mancarra. Opina a favor da diversificação das culturas e o arroteamento das terras, é desfavorável à cultura da mancarra e sim a culturas mais demoradas. Outra observação de Havik a reter a propósito destes apontamentos:
“A sua abordagem é notável pela noção da modernização, pela defesa de uma política baseada em conceitos científicos e a sua aplicação no domínio do aproveitamento dos recursos naturais.”
E, mais adiante:
“A sua longa exposição sobre as várias espécies, do algodão ao tabaco, da borracha às palmeiras, e passando pelo arroz e a mandioca, demonstra a atenção dada à potencialidade de culturas. Além de referências a culturas de subsistência e principalmente cultivadas para consumo interno como o arroz, a mandioca e o milho, destacam-se aquelas viradas para renda e da exportação, como o algodão, a borracha, o cacau, o café, a cana-de-açúcar, o caju, a cola, a mancarra, a noz e azeite da palmeira e o tabaco.”

Dias de Carvalho tece uma crítica profunda à falta de bases sólidas para a propriedade agrícola, lamenta que as empresas que lá operavam limitavam-se a atividades de caráter exclusivamente comerciais. Voltemos a Havik:
“Ao referir-se ao comércio, o autor critica a tributação feita através dos direitos de importação e exportação, e as sucessivas alterações das pautas alfandegárias. O seu pleito pelo livre comércio, que o leva a apoiar algumas revindicações do comércio português e estrangeiro na Guiné, sublinhou os efeitos prejudiciais de certas tarifas (por ex. sobre a importação de tabaco e álcool), e os problemas que causou para a permuta em géneros com os nativos.”

Deixemos para o apontamento seguinte a apreciação que Havik faz do olhar antropológico, etnológico e etnográfico de Dias de Carvalho, é verdade que são meros apontamentos e que faltou vida ao seu autor para corporizar e substantivar o que aqui aparece resumido e por vezes escrito com caráter de urgência, são, contudo, registos que comprovam a sua argúcia e nos dão o conhecimento da Guiné, na passagem para o século XX.

A primeira central elétrica de Bissau em 1940 – ao lado do campo Lino Correia
Palmeira em Bolama
Bolama, 1900

(continua)
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Notas do editor:

Vd. post de 21 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26603: Notas de leitura (1782): Philip J. Havik, um devotado historiador da Guiné: Negros e brancos na Guiné Portuguesa (1915-1935) (4) – 3 (Mário Beja Santos)

Último post da série de 24 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26611: Notas de leitura (1783): "Futuros Criativos"; edição da Associação para a Cooperação Entre os Povos, Fundação Portugal-África e Instituto Camões, 2019 (1) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P26625: Álbum fotográfico de João Moreira (ex-Fur Mil Cav da CCAV 2721 - Olossato e Nhacra, 1970/72) (21)

Foto 164 > Abril de 1971 > Olossato > João Moreira > Viatura carregada para mais uma coluna
Foto 165 > Abril de 1971 >  Olossato > João Moreira junto ao bananal da companhia
Foto 166 > Abril de 1971 > Olossato > João Moreira > 1 ano de Comissão
Foto 167 > Abril de 1971 > Olossato > João Moreira
Foto 168 > Abril de 1971 > Olossato > João Moreira junto à igreja e ao Memorial da companhia que fomos render
Foto 169 > Abril de 1971 > Olossato > João Moreira junto junto à "igreja"
Foto 170 > Abril de 1971 > Olossato > João Moreira
Foto 1971 > Abril de 1971 > Olossato > João Moreira > Ponte do rio Olossato, na "estrada" para Farim

(continua)
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Nota do editor

Último post da série de 20 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26600: Álbum fotográfico de João Moreira (ex-Fur Mil Cav da CCAV 2721 - Olossato e Nhacra, 1970/72) (20)

Guiné 61/74 - P26624: Humor de caserna (108): dicas da "medicina do viajante"...(Do blogue "Africanidades", do nossso amigo e histórico da Tabanca Grande, Jorge Rosmaninho Neto, desaparecido do nosso radar)



Jorge Rosmaninho Neto, andarilho africanista...agora desaparecido do nosso radar. Era (é) um dos 111 da Tabanca Grande.




1. José Rosmaninho Neto: "jornalista, independentista, alentejano" (sic),   viajante, professor (ocasional ?) na Guiné-Bissau, autor do blogue "Africanidades"... Um dos históricos do nosso blogue. Tem 20 referências. Com perfil no Blogger desde 2003... Nunca soubemos ao certo o seu poiso... Creio que era de  Évora. Em 2021 vivia na Suiça. Se calhar continua por lá.  Como muitos dos nossos "emigras"...

 Em suma, deixou de estar no nosso radar, desde finais de 2007... De qualquer modo, um homem não poder ser andarilho toda a vida... Para onde quer ele esteja, aqui vai o nosso "alfabravo".

Até finais de 2007 ainda trocámos algumas mensagens e publicámos algumas das suas fotos da Guiné-Bissau. Ofereceu-se inclusive para nos ajudar a organizar uma possível viagem àquele país onde, na altura, era cooperante (professor, se não erramos).

Sempre tivemos muito apreço pelo seu blogue Africanidades (vd. aqui no Arquivo.pt) de que se publicaram cerca de 300 postes, entre setembro de 2006 e maio de 2009.  Depois passou a ter uma página no Facebook mas perdemos o seu rasto.

Para "matar saudades", aqui vai com a devida vénia um texto do nosso amigo (que nunca fez tropa, pelo que ele nos contava nem teria idade para isso)... Um pequeno texto bem humorado sobre a "medicina do viajante"...


por Jorge Rosmaninho Neto


Tenho um desaguisado antigo com um certo tipo de médicos que trabalham no Instituto de Medicina Tropical, em Lisboa. Já aqui o assumi, depois de certo amigo, pela primeira vez em África, ter sido aconselhado a viajar para estes trópicos....

  • de gola alta (ridículo!);
  • botas por cima das calças (estúpido!) 
  • e camisola grossa, de noite, para se proteger dos mosquitos (idiota!).

Há lá pelo Instituto muita gente competente, avisada de África, conhecedora da realidade. Mas há também muita maçariquice, por parte de um certo tipo de gente que (arrisco a dizer) nunca foi nem sequer à Trafaria, ali em frente, do outro lado do Tejo.

Uns amigos que por aqui passaram na última semana, confessaram-me que a médica que os (des)aconselhou, no Instituto, lhes perguntou a certa altura onde ficariam instalados. Perante a resposta (“ficaremos em casa de amigos”), a doutorazeca disse:

- Então têm que ter mais cuidado ainda, porque essas pessoas que vivem em África têm a mania que nada lhes faz mal.

Néscios comentários como este provocam dois tipos de reacções:

  • uma, menos grave: um sorriso, por parte de quem aqui habita, pois de facto África não é papão de boca larga à espera da melhor oportunidade para comer tenros ocidentais!;
  • outra, mais grave: constrange quem viaja, obrigando as pessoas a adoptarem atitudes e comportamentos que afectam as suas férias (há quem traga água de Portugal e só beba dessa, desconfiada da água engarrafada que aqui se vende).

Na falta de camas em hospitais psiquiátricos para estes médicos, sugiro que sejam enviados para África. Desta forma poderiam: por um lado conhecer na prática a realidade local; por outro dar consultas de “medicina ocidental” aos que cá moram (os tais que “têm a mania que nada lhes faz mal”), antes de estes efectuarem viagens para a Europa.

Os verdadeiros perigos para a saúde dos viajantes estão lá, no primeiro mundo. Em primeiro lugar no plástico que se come e bebe. Depois, nas opiniões de médicos como estes.

Postado por Jorge Rosmaninho às 01:13 

(Seleção, revisão / fixação d e texto: LG)

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Nota do editor:

Ultimo poste da série > 21 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26604: Humor de caserna (107): "Teixeira Pinto colonizou a Guiné sem arcas frigoríficas", disse o Intendente em Bissau... Ao que o capitão, no mato, retorquiu: "Solicito envio urgente do Teixeira Pinto" (Aníbal José da Silva, ex-fur mil SAM, Vagomestre, CCAV 2383, Nova Sintra e Tite, 1969/70)

quinta-feira, 27 de março de 2025

Guiné 61/74 - P26623: No céu não há disto: Comes & bebes: sugestões dos 'vagomestres' da Tabanca Grande (47): Um prato duriense, que se comia na Quaresma, "sável frito com açorda de ovas" (e que vai bem com o "Nita", da Quinta de Candoz, um DOC verde, branco, colheita selecionada, 2023, diz a "Chef" Alice)




Alfragide > 23 de março de 2025 > Um prato duriense, "sável frito com açorda de ovos", que vai bem com o "Nita", branco, verde, da Quinta de Candoz, colheita selecionada (2023)... A sugestão é da "Chef" Alice...

Foto (e legenda): © Luís Graça (2025). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

1. Caros leitores: dou conta que desde maio do ano passado que não têm aparecido no blogue as tradicionais sugestões gastronómicas dos nossos vagomestres (*)...

 E, a propósito, por onde é que eles andam ? Há tempos pusemos um anúncio: "Vagomestres, precisam-se!"... Só apareceu um, o Aníbal José da Silva (**)...

Mas todos os dias a malta  tem de comer, mal ou bem... Nas nossas "messes" e "ranchos"... Cada vez pior, diz o povo...E ele há coisas que vão desaparecendo das nossas mesas: caça, peixe, marisco, vitela, queijo e requeijão de Serpa... Quem é que lhe chega ? 

O vagomestre, com a pandemia de Covid-19, habituou-se aos enlatados: atum com grão de bico, cavalas em óleo de girassol,  sardinha em óleo picante com pickles, etc. E aos congelados... 

Mas, feitas as contas ao quilo, até o raio das conservas de peixe estão pela hora da morte... E até os petiscos dos pobres passaram para o cardápio dos ricos, do bacalhau ao polvo, do berbigão à sapateira, do sável à lampreia...

 Será que ainda se fazem as "iscas com elas" ?  E ainda há quem faça "tomates de carneiro com ovos mexidos" ?...

O que desapareceu, do nosso tempo, foram também as tascas, com serradura no chão e pipos de tinto carrascão na parede, mesas de tampo de mármore e mochos de madeira em vez de cadeiras de plástico...

Mas estamos numa época boa para certos "petiscos" como as favas suadas, as casulas com butelo ou o sável frito com acorda de ovas... Foi o que a nossa "chef" Alice fez para celebrar os dois mesinhos da segunda neta, a Rosinha (nascida a 23 de janeiro)... Dizem os comensaios que foi comer e chorar por mais (o sável foi generoso, tinha dois quilos e meio e trazia as ovas...). 

Era um "prato" que se comia à mesa dos pobres, na Quaresma, por várias razões que se podem enumerar pelos dedos:

  • era a altura do sável (e da lampreia) subir o rio Douro para desovar (ainda não havia barragens); 
  • os pobres não compravam a bu(r)la ao senhor abade;
  • os "rendeiros" não podiam comer carne mas precisavam de proteína para trabalhar os socalcos do seu "senhor e amo";
  • o sável vendia-se de porta em porta, uma fiada enorme de peixe enfiado num longo varapau às costas do pescador de rio; 
  • tinha muitas espinhas, era preciso engenho, arte e paciência para o saber cortar fininho e fritá-lo em azeite...

Ele há coisas que não há no céu... E que não têm preço. E que, por isso, não passam pelo estreito dos bilionários... E uma delas é, para além do "cebolinho do talho",  seguramente a açorda de ovas com sável frito, com um toque muito especial do alho e do coentro (que era do Sul, dos ganhões, e que por isso não ia à mesa do rei)... 

Tudo à moda da "Chef" Alice, segundo uma receita antiga da família da Quinta de Candoz, que ainda é do tempo do extinto concelho de Bem Viver e das pesqueiras do rio Douro que tinham foral do senhor Dom Manuel , o Venturoso.

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Notas do editor LG:

(*) Último poste da série > 13 de maio de 2024 > Guiné 61/74 - P25517: No céu não há disto... Comes & bebes: sugestões dos 'vagomestres' da Tabanca Grande (46): Viva o po(l)vo... da Lourinhã!

(**) Vd. poste de 18 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26595: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (3): A Alimentação

Guiné 61/74 - P26622: Ser solidário (280): O que se passa com o caudal de água da Fonte Frondosa / Sanjuna, de Empada ? (Henk Eggens / Vincent Kuyvenhoven / Luís Graça / José Teixeira / Inês Allen / Arménio Estorninho)





Foto nº 1 e 1A > Guiné-Bissau > Região de Quínara > Empada > 1983 > Fotografia da Fonte Frondosa com a esposa Anke (holandesa) no meio das lavadeiras.


Foto nº 2 > Guiné-Bissau > Região de Quínara > Empada > s/d > A nascente da Fonte Frondosa (cuja construção data de 1946, ao tempo do governador Sarmento Rodrigues)



Vídeo (00:22) > s/d > A "sanjuna" entupida




Foto nº 3 > Guiné-Bissau > Região de Quínara > Empada > s/d > A Fonte Frondosa / Sanjuna, na língua local. Imagem do sítio da ONGD Sanjuna.nl


Sobre a ONGD Sanjuna.nl ver também o vídeo  Sanjuna in 100 sec (01' 40'') (em neerlandês)
 

Fotos, vídeo (e legendagem):  © Vincent Kuyvenhoven  (2025). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




1. Do nosso amigo, Henk Eggens, holandês (ou neerlandês) (que vive em Portugal, em Santa Comba Dão, tendo trabalhado como médico, cooperante, na Guiné-Bissau, em Fulacunda e em Bissau, de 1980 a 1984) recebemos a seguinte mensagem, com data de 21 do corrente:


Olá, Luís,Tudo bem contigo?

Estou na minha terra natal, curtindo filhas, netinh@s e amigos.

(...) Tenho um pedido para publicar no blogue, pedir informação aos tabanqueiros sobre a Fonte Frondosa,  no Empada, sul da Guiné.

O tabanqueiro José Teixeira escreveu uma história cómica  (*) sobre os soldados, atormentados pelos "hormónios"  
[o português é tramado. ó Henk, querias dizer... "hormonas"] da juventude, observando as bajudas a tomar banho naquela fonte.

Provavelmente (era) a visão dos soldados naquela época.

Minha pergunta é a seguinte:

Meu amigo e colega Vincent Kuyvenhoven trabalhou como médico na Guiné, baseado em Empada (1983-1986). Gostou (junto com a esposa Anke) da experiência e o ambiente. Decidiram apoiar a população de Empada, até agora. Criaram uma fundação chamada Sanjuna.

Sanjuna é o nome local da Fonte Frondosa.

Um breve resumo em português dos principais pontos do relatório anual de 2023 da Fundação Sanjuna:

Introdução
- 2023 foi o nono ano completo da fundação desde a sua criação em abril de 2014
- O coordenador Vincent Kuyvenhoven fez duas visitas a Empada para acompanhar projetos

Atividades Apoiadas
- Foco principal em educação, água potável, saúde e desporto
- Financiaram bolsas de estudo, construção de escolas, formação de professores
- Construíram tanques de água em várias aldeias
- Apoiaram cuidados de saúde comunitários e formação de agentes de saúde
- Contribuíram para torneios de futebol locais

Finanças
- Receitas totais: €36.100
- Despesas totais: €29.200

Vincent e Anke costumam visitar Empada pelo menos uma vez por ano.


Azulejo da Fonte Frondosa, cuja construção
é de 1946, do tempo do governador 
Sarmento Rodrigues




A pergunta deles é sobre a bacia de água atrás do quadro de azulejos e torneira.

Vincent me escreveu o seguinte:

"A fonte está a degradar-se um pouco em 2 aspectos: poluição da bacia de água (cuja função não me é clara) e drenagem dificultada, que veio à tona na época das chuvas."

Veja o clipe em anexo que mostra a situação atual na época da chuva.

Será que alguém dos tabanqueiros que viveram na Empada podem esclarecer a função  
desta bacia? 

Os homens grandes e mindjeres grandes lá não podiam esclarecer a função da mesma.

Agradeço se achas oportuno publicar esta pergunta no blogue. (...)

Um AB desde Holanda,
Henk

2. Resposta do editor LG, na volta do correio:

Que bom, Henk, a nossa terra é sempre a melhor do mundo... Boa estadia. O tempo por aqui não está grande coisa, chegou ontem a primavera...

Vamos ajudar os teus amigos...Vou-te pôr em contacto com dois tabanqueiros nossos, que têm uma forte ligação a Empada, a Inês Allen (filha de um antigo combatente, já falecido) e o José Teixeira ( e coordenador da ONGD Tabanca de Matosinhos, já lá voltou â Guiné-Bissau meia dúzia de vezes, foi enfermeiro durante a guerra)...

Ver aqui a página do Facebbok da Inês Allen.

Sobre Empada temos 185 referências no nosso blogue:

https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/search/label/Empada

A carta de Empada (1961) (Escala 1/50 mil) está disponível aqui:

https://arquivo.pt/wayback/20170222021858/http://www.ensp.unl.pt/luis.graca/guine_guerracolonial51_mapa_Empada.html

Diz-me se posso reencaminhar para a Inês e o Zé o teu mail... Conhecem a gente atual da tabanca de Empada... Aqui fica o pedido dos teus amigos (já visitei o "site" da Sanjuna, tenho que traduzir para inglês...)

Boa saúde, bom descanso... Luís

3. Comentário do editor LG:

Henk, com a tua devida autorização aqui tens a nossa troca de mensagens no blogue, com enfoque nos problemas da Fonte Frondosa /Sajuna, de Empada. 

Já falei com o Zé Teixeira, que ficou radiante com a hipótese de poder ser útil ao teu amigo Vincent, o mesmo é dizer, à população de Empada. Ele, tal como a Inês Allen, mantem fortes laços afetivos com Empada, que se traduzem também em ajuda material. Ele e ela vão gostar de poder falar contigo. Seguem os endereços de email dos dois.

Falei com a Inês, que é uma linda menina, e com um grande coração, tal como o falecido pai, Xico Allen (1950-2022). Esteve em maio de 2024, em Empada, na inauguração do campo de futebol que tem o nome do pai. Já então o problema da "Sajuna" fora-lhe abordado pela população, que a adora. Conta lá voltar para o ano...

Quanto ao Zé Teixeira, disse-me que já em 2015, quando passou por lá, a fonte estava com menos água...Ele acha que a diminuição do caudal tem a ver com as alterações climáticas... E, infelizmente, esse problema não é exclusivo de Empada...A água doce na Guiné - Bissau é um bem escasso. Temos essa dolorosa experiência, que nos vem do tempo da guerra, nomeadamente no tempo seco. A água era salobra e ferrosa. Bebiamos água engarrafada (Vichy e Perrier) com uísque... Até o gelo era horrível...

No nosso tempo, há 50/60 anos, chovia muito mais. O Zé é de 1968/70, um ano mais velho do que eu...Ambos conhecemos a guerra "pura e dura", ele na região do Forreá (Buba, Empada, Quebo, Mampatá...).


Região de Quinara > Empada > 1969 > "Eu, tomando banho à fula, na Fonte Frondosa, principal zona de banhos e de lavadouro". Foto do álbum do Arménio Estorninho, ex-1º cabo mec auto, CCAÇ 2381, Ingoré, Aldeia Formosa, Buba e Empada, 1968/70).

Foto (e legenda): © Arménio Estorninho (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

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(**) Último poste da série > 13 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26580: Ser solidário (279): Ajude sem gastar nada! Consigne 1% do seu IRS à Afectos com Letras - ONGD


Guiné 61/74 - P26621: Timor-Leste: passado e presente (31): demografia da primeira metade do séc. XX


 
Timor > c. 1936/40 > Álbum Fontoura, foto nº 17099 > Bacau ou "Vila Salazar > O governador maj inf Álvaro Fontoura  (set 1936 - mai 1940) é conhecido pela sua "ação civilizadora e colonizadora", a par do "culto da personalidade de Salazar".

Álbum Fontoura : Fotos do Arquivo de História Social > Álbum Fontoura. Imagem do domínio público.


1. Às voltas com a historiografia da presença portuguesa em Timor-Leste (*), recolhemos alguns dados sobre a demografia da primeira metade do séc. XX.


Em 1940, por exemplo, o território teria 463 996 habitantes (245 338 homens, e 218 658 mulheres) assim distribuidos: 

  • Brancos >  359
  • Mistos >  689
  • Negros, indianos e amarelos > 2844
  • Indígenas negros e malaios  > 460 104
Total= 1 463 996

As categorias de classificação usadas eram as da época...O conceito de "raça" (humana) hoje foi posto de parte.

Os "brancos" eram os funcionários,  civis e militares (metropolitanos, indianos, macaenses e africanos).

Em 1927 havia 80 deportados que se integraram na vida da ilha, exercendo os mais diversos ofícios. 

Em 1931 havia a distinção entre deportados "sociais" e "politicos". Os primeiros eram "criminosos de delito comum", os segundos eram responsáveis de ações violentas contra a República e, depois do 28 de maio de 1927, contra a "ditadura militar" Parte destes deportados  eram acusados de pertencer a controversa  "Legião Vermelha" (1919-1925).

A política do governador Teófilo Duarte, por volta de 1928, foi os do "integrar" na comunidade local.

Entre os deportados "sociais" havia também um pequeno grupo de chineses de Macau.

Em 1927 um levantamento demográfico apontava para 431 604 o número total de  habitantes, dos quais 389 eram "brancos". 

Em 1930, os "brancos" seriam apenas 368 num total de 472 221 habitantes  (249 257 homens e 222 963 mulheres). 

Convira referir que estes dados não são seguros. Há mudanças nas categorias de classificação comparações.   Em 1911 os timorenses eram considerados "mestiços". A população, em 1911, seria a seguinte:

  • Brancos > 230
  • Pretos >  297
  • Mestiços > 376 380
  • Amarelos > 806
  • Asiáticos > 102
Total = 377 815


Em 1920 os "timorenses" já eram "malaios": 392 518. Os  "brancos" não passavam dos 250. Total= 394 518.

Há uma quebra demográfica nos anos 30. Razões apontadas:
  • Surto de gripe (1932);
  • Grandes temporais (1938);
  • Outros factores  (incluindo deficiente recolha de dados) (Figueiredo, 2003, pág. 555).

Nesta época ficou sem efeito a tentativa de fixar pelo menos 500 famílias, de origem metropolitano (com "direito a médico, professor e missionário", mais isenções fiscais durante 10 anos).

Durante a República não havia, em teoria, na lei, trabalho forçado... Na prática, as coisas eram em diferentes.

 E destacar, entre os governadores desta época, além do ten Teófilo Duarte (1898-1958) (no período de set 1926 a dez 1928) , o major inf Álvaro Fontoura (1891-1075), no período de set1937 a mai 1940.

Fonte: Fernando Figueiredo, "Timor (1910-1955), in: "História dos Portugueses no Extremo Oriente", 4º volume: Macau e Timor no Período Republicano", dir. A. H. de Oliveira Marques, Lisboa: Fundação Oriente, 2003, pp. 521-575.

2. Depois da II Guerra Mundial, depois da invasão e ocupação japonesas do território,entre fevereiro de 1942 e setembro de 1945, em que terão morrido 40 mil a 70 mil timorenses (por todas as causas),  a população terá regredido para os 416,7 mil (em 1951).  

Segundo o censo de 2010, a população do novo país da CPLP ultrapassava já então o milhão de habitantes.

A maioria da população é de origem malaio-polinésia e papua, havendo minorias de chineses, árabes e europeus.Mais de 90% diz-se católica.

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Nota do editor LG:

Guiné 61/74 - P26620: Parabéns a você (2360): Armando Pires, ex-Fur Mil Enf.º da CCS/BCAÇ 2861 (Bula e Bissorã, 1969/70); Carlos Vinhal, ex-Fur Mil At Art - MA da CART 2732 (Mansabá, 1970/72) e Eduardo Magalhães Ribeiro, ex-Fur Mil Op Esp da CCS/BCAÇ 4612/72 (Mansoa, 1974)



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Nota do editor

Último post da série de 25 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26612: Parabéns a você (2359): Rui Silva, ex-2.º Sargento Mil da CCAÇ 816 (Bissorã, Olossato e Mansoa, 1965/67)

quarta-feira, 26 de março de 2025

Guiné 61/74 - P26619: Historiografia da presença portuguesa em África (474): A Província da Guiné Portuguesa - Boletim Official do Governo da Província da Guiné Portuguesa, 1908; 1909 e 1910 (28) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 7 de Novembro de 2024:

Queridos amigos,
Não se encontra resposta para a publicação de louvores e relatórios de operações que decorreram na margem direita do Geba e em Bissau nos primeiros meses de 1908 em Boletins tão posteriores. Constituem, aliás, a única nota em que se desvelam operações militares, de nós já conhecidas. Voltaremos à modorra do costume, excecionam-se acontecimentos como o aniversário do rei D. Manuel II, a morte de Eduardo VII, para a qual houve luto nacional e a proclamação do 5 de outubro, aqui se reproduzem as imagens.

Um abraço do
Mário



A Província da Guiné Portuguesa
Boletim Official do Governo da Província da Guiné Portuguesa, 1908, 1909 e 1910 (28)


Mário Beja Santos

O ano de 1908 é uma lufada de ar fresco, ficamos com uma grande dívida de gratidão ao governador Oliveira Muzanty, até agora o Boletim Official é um mero arrastar de menções administrativas, e subitamente ficamos a saber que há tensões, gente insubmissa, operações militares, enviam-se telegramas para Lisboa a anunciar acontecimentos, de um modo geral bem-sucedidos. É o caso do telegrama enviado no Boletim Official n.º 46, de 21 de novembro de 1908, fala de um castigo dado aos Balantas, culpados de roubos, em 17 de novembro, pela madrugada, a tropa atacou de surpresa Cunhi Cumba, incendiaram-na, bem como a Chumbel, os rebeldes tiveram 37 mortos, entre eles o chefe da tabanca, apresaram-se armas, no dia seguinte prosseguiram-se as operações, queimaram-se Blassi, Assagre e Nhafo, os rebeldes tiveram 73 mortos, eram baluartes Balantas, foi montado posto militar em Cunhi Cumba. Felicita-se o comandante da campanha, tem-se agora posse efetiva da margem norte do Geba.

No Boletim Official n.º 48, de 5 de dezembro, publica-se telegrama expedito para o ministro da Marinha, os Balantas restituíram uma lancha, gente em Goli como não restituiu armamento destruiu-se a povoação, fizeram-se prisioneiros e apanhou-se gado; os auxiliares atacaram Malafo apoiados pela canhoneira Lurio, os Balantas retiraram-se para o mato depois de grande resistência, Malafo e Goli ficaram ocupados por forças auxiliares. Quem dirigiu estas operações fora o capitão de artilharia Viriato Gomes da Fonseca.

Ainda no mesmo Boletim vêm publicados vários telegramas, dois assinados pelo governador em que se fala de uma coluna que tomara Ganturé, no Cuor, iniciando perseguição, noutro telegrama refere-se uma batida em toda a região do Cuor, o inimigo tivera enormes perdas materiais e de vidas, o rei D. Manuel agradece, os telegramas que se sucedem têm a ver com as citações do ministro e o secretário-geral, na ausência do governador escreve em portaria que em consequência das operações é por este Governo, declarado livre para a navegação e aberto ao comércio o porto de Bambadinca, ficando porém ainda proibido o atracar à margem direita do Geba em toda a região do Cuor, com exceção do porto de Sambel Nhantá. Ora a portaria datada de abril de 1908, matéria anterior à data da publicação do Boletim Official.

Estamos agora a 26 de dezembro, Boletim Official n.º 51, mais telegramas enviados ao ministro, comunica-se que os régulos de Sama, Irondim e Gussará vieram pedir perdão, pagaram multa e imposto de palhota, toda a região do Cuor está completamente batida e ocupada; noutro telegrama fala-se de combates que duraram mais de três horas em que se tomou Intim e Bandim.

Temos finalmente o suplemento n.º 4 ao Boletim Official n.º 12, com data de 20 de março de 1909, o governador da coluna, o capitão Ilídio Nazaré publica o relatório, por determinação do governador, a data é de 28 de abril de 1908. Batera-se o régulo Infali Soncó, havia agora que louvar os oficiais e as praças que tinham feito parte da coluna de combate. Há textos de louvor bastante interessantes, aqui se registam:
“Companhia de Marinha comandada pelo 1.º tenente Luís Bernardo da Silveira Estrela, pela tenacidade e disciplina que sempre mostrou durante esta fase da campanha e mais particularmente o segundo e terceiro pelotões ambos sob a direção do subchefe do Estado-maior D. José Serpa Pimental, o primeiro comandando pelo 2.º tenente José Francisco Monteiro porque, tendo sido mandado procurar dois soldados que se dizia terem ficado à retaguarda, o fez com a máxima energia e prontidão, logo a seguir ao combate de Ganturé, apesar da excessiva fadiga em que se encontravam as tropas; o segundo sob o comando do 2.º tenente Frederico da Silva Pinheiro Chagas, pela maneira como prestou socorro à escolta do comboio e se porto no ataque de flanco que recebeu por parte do inimigo.”;
“3.ª secção da Companhia de Infantaria 13 sob o comando do capitão comandante da mesma Companhia, Jorge Prestello de Pestana Veloso Camacho, pela maneira como sustentou o fogo e pôs em debandada o inimigo no ataque que este fez à fonte de Ganturé na tarde de 6 de abril e para o que muito contribuiu a presença de espírito, sangue-frio e coragem do mesmo capitão”;
“Bateria de Artilharia sob o comando do capitão Viriato Gomes da Fonseca, pela rapidez como sempre embarcou e desembarcou o gado e material, e fez as marchas apesar das dificuldades do terreno, e ainda pela rapidez como sempre meteu em combate; e em especial a 1.ª peça dirigida pelo tenente da mesma bateria, Nunes da Ponte, que, pela justeza e precisão do tiro, muito contribuiu para pôr o inimigo em fuga no ataque à fonte de Ganturé”;
“Companhia de Atiradores sob o comando do capitão José Carlos Botelho Moniz e corpo de auxiliares sob o comando do capitão José Xavier Teixeira de Barros e tenente José Proença Fortes, pela maneira como se houveram na tomada de Madina no dia 8, o que em especial lhe havia incumbido”.


É uma série bastante grande, o capitão Ilídio Nazaré também lavra louvor à sua ação, fica-se com a impressão que não há oficial nem sargento que não mereçam distinção, aparecem também louvados dois primeiros cabos da Companhia de Equipagens, dois primeiros cabos e um soldado da Companhia de Subsistência.

Vão também louvores para a forma como se houve a coluna comandada por Ilídio Nazaré perante as operações na ilha de Bissau, sustentando uma série de rudes combates contra um inimigo aguerrido derrotando-o sempre com o melhor êxito e infligindo-lhe baixas e perdas materiais.

Fica o mistério da publicação tão tardia destes louvores das campanhas do Cuor e de Bissau, que decorreram nos primeiros meses de 1908.

Anúncio da proclamação da República
Anúncio da morte do rei Eduardo VII do Reino Unido, maio de 1910
Celebração do aniversário do rei D. Manuel II, novembro de 1909
Abril de 1908, o rei agradece a notícia sobre a campanha no Cuor
"Pescadora Papel" retirada do Boletim Cultural da Guiné Portuguesa, 1971
Mercado de Bissau, 1910
(continua)
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Notas do editor:

Post anterior de 19 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26598: Historiografia da presença portuguesa em África (470): A Província da Guiné Portuguesa - Boletim Official do Governo da Província da Guiné Portuguesa, 1908 (27) (Mário Beja Santos)

Último post da série de 20 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26601: Historiografia da presença portuguesa em África (471): Bissau ao tempo de Leopoldina Ferreira ("Nha Bijagó") (1871-1959) (António Estácio, 1947-2022)

Guiné 61/74 - P26618: Nunca Tantos Deveram Tanto a Tão Poucas (8): Grande coragem, sangue frio, inteligência emocional, autocontrolo, empatia, serenidade, a da Rosa Exposto!..


As enfermeiras paraquedistas, da esquerda para a direita, Maria Rosa Exposto  (*) e Maria La Salette. Imagem obtida a partir de foto de grupo, da autoria de Fernando Miranda (trabalhou no Hospital da Força Aérea e tem o melhor álbum fotográfico sobre as enfermeiras paraquedistas). O Fernando Miranda é membro da União Portuguesa dos Paraquedistas (grupo público no Facebook, entretanto suspenso desde 16/1/2023). 


Edição do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2025), com a devida vénia..


 
1. Os riscos que corriam as nossas enfermeiras paraquedistas não eram poucos nem pequenos.  Riscos para a sua saúde e segurança no palco de guerra... Riscos físicos e psicológicos (e, em menor grau, químicos e biológicos, já que lidavam com sangue, derivados do sangue e produtos de primeiros socorros usados a bordo)...  Riscos não só por andarem de avião, de serem atingidas pelo fogo do IN ou de sofrerem um acidente em terra ou no ar, como sobretudo devido à  exposição a situações de grande stress, durante as evacuações de doentes e de feridos graves,  tendo que saber lidar com a vida e a morte, a dor e o sofrimento, a violência e o descontrolo emocional dos evacuados,  etc.

Este relato da Maria Exposto, transmontana de Bragança, ex-alf grad enf pqdt, do 4º Curso (1964), é bem revelador das situações mais insólitas e imprevistas que podiam ocorrer... Era preciso muita coragem, sangue frio, inteligência emocional, autocontrolo, empatia, serenidade ...

 Grande mulher e grande profissional, a Rosa Exposto,  que soube salvar uma vida ou mais do que uma... na situação a seguir descrita.

Este caso devia fazer parte da "casoteca" das nossas escolas que formam profissionais que têm de lidar com distúrbios emocionais, crises e outros conflitos podendo pôr a risco a vida do próprio e de terceiros: polícias, militares, bombeiros, médicos, enfermeiros, psicólogos, etc.

A situação descrita (um distúrbio emocional, ou "transtorno de ansiedade",   frequente e muitas vezes associado ao álcool nos quartéis do mato)  podia ter redundado em tragédia como aconteceu noutros sítios. É pena não podermos identificar o local e a subunidade. 

A Rosa  diz-nos apenas que foi "algures na Guiné",  e o quartel  (talvez provavelmente um destacamento) era tão pequeno que nem tinha um pista de aterragem para uma avioneta, nem talvez sequer um heliporto. (**)

No fim "tudo acabou em bem", mas ela confessa, com toda a humildade, que sentiu muito medo e suores frios quando se apercebeu do que estava em jogo... Um homem perturbado e com uma arma na mão é sempre imprevisível...



Fonte: Excerto de "IX. Os riscos que corríamos". In: "Nós, enfermeiras paraquedistas", 2ª ed., org. Rosa Serra, prefácio do Prof. Adriano Moreira (Porto: Fronteira do Caos, 2014), pp.  302-302 (com a devida vénia).

(Seleção, digitalização, edição da foto, título do poste: LG)


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Notas do editor:

(*) Vd. postes de:

25 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26614: Desaparecido do nosso radar (3): Maria Rosa Exposto, ex-alf grad enfermeira paraquedista, do 4º curso (1964)... Tudo indica que tenha ficado, como enfermeira civil, na FAP.

15 de janeiro de 2025 > Guiné 61/74 - P26392: Nunca Tantos Deveram Tanto a Tão Poucas (2): O que é feito de ti, Maria Rosa Exposto ?... "Nunca vos esqueci nem esquecerei", escreveu ela em depoimento para o livro "Nós, Enfermeiras Paraquedistas", 2ª ed., 2014, pág. 403)

(**) Último poste série > 13 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26578: Nunca tantos Deveram Tanto a Tão Poucas (7): Cristina Silva, ten grad enf pqdt, a única das 46 que foi ferida em combate