Camaradas
Recebi hoje um mail de um camarada da Companhia de Cavalaria 8351, Os Tigres do Cumbijã, que faz parte da Tabanca e cujo nome é João Melo e me fez reavivar sentimentos tão contraditórios como o sentimento da revolta perante a obrigação do cumprimento do serviço militar, e o sentimento da ternura com que os camaradas da minha Companhia, e porventura de tantas outras, partilham nos encontros que vamos promovendo anualmente.
Muito brevemente irei aderir à Tabanca, pois tive a honra de comandar a Companhia de Cavalaria 8351, como Capitão Miliciano, Miliciano obviamente, pois aqueles locais por onde fomos obrigados a deambular destinavam-se aos não profissionais, e ao aderir, vou tentar preencher algumas imprecisões que, por exemplo, ainda hoje li acerca do Cumbijã e de Nhacobá e relembrar alguns dos meus queridos camaradas que morreram em combate, bem como os que ultimamente vão desaparecendo a uma velocidade vertiginosa, ceifados pela doença e pelo suicídio… Será o durante e o após…
Hoje limito-me ao antes e porquê ao antes? Ao consultar a lista dos camaradas da Tabanca da Guiné deparei com o nome Mário Beja Santos! Curioso, como o mundo é pequeno… O Senhor Beja Santos foi meu comandante de pelotão em Mafra, onde assentei praça em Janeiro de 1971. É verdade, também ao recordar esta fase muito difícil da minha vida poderei afirmar peremptoriamente que tive a honra de ter sido comandado, ou melhor ensinado, pelo Dr. Beja Santos, suponho que na altura estudante universitário, quase finalista de um curso de Letras. Eu, estava então na faculdade de Economia da Universidade do Porto, onde terminei a licenciatura em 1975, após ter interrompido os estudos durante quarenta e cinco meses para cumprimento do serviço militar obrigatório, pois passei à disponibilidade em finais de 1974.
Mais do que a instrução que o então Alferes Miliciano Beja Santos ministrava, recordo com particular entusiasmo conversas que com ele mantive durante os intervalos da instrução debicando aqui e acolá e muito cautelosamente a situação política que então vivíamos, ouvindo os seus conselhos de quem tinha vindo da guerra da Guiné e a sua preocupação, ao passar pelos instruendos que sentados no chão ao frio gelado de uma das abas do convento com uma prancheta apoiada nos joelhos, tentavam resolver os testes que lhe permitiam ou não ir a fim de semana… "Oh Mamadu, não é a c) é a d)"… Devo-lhe alguns fins de semana, dr. Beja Santos…
Julgo saber que foi ele que me indicou para frequentar o curso de capitães, tendo após o meu regresso dos quatro meses de estágio em Angola, procurado o dr. Beja Santos sem que tivesse chegado à fala com ele, pois entretanto havia abandonado Mafra. Vi-o várias vezes na televisão, congratulei-me com as obras que publicou, mas as vicissitudes da vida sempre me impediram de chegar à fala com ele. 37 anos e alguns meses depois… quem havia de dizer, escrevo esta mensagem para, quem sabe, um dia me dê o prazer de comigo almoçar.
Vasco Augusto Rodrigues da Gama
Buarcos
P.S. Dr. Luís Graça: Não consigo enviar a mensagem com conhecimento ao dr. Beja Santos. Poderá fazer-me o favor de a reencaminhar? Obrigado.
2. Comentário de CV:
Caro Vasco da Gama
Cabe-me a mim os pelouros do Nosso Livro de Visitas e da Tabanca Grande, pelo que estou eu a responder-te.
Para já, muito obrigado pelo teu contacto. Já reenviei esta tua mensagem ao nosso camarada Mário Beja Santos, que como sabes tem hoje mais um dia grande, pois vai ser apresentado o seu segundo livro, dedicado à sua Comissão de serviço na Guiné, Diário da Guiné, 1969-1970, O Tigre Vadio, continuação cronológica do anterior Diário da Guiné, 1968-1969, Na Terra dos Soncó.
Como já deves ter reparado, o tratamento por tu na nossa Tabanca Grande é normalmente usado, pois entre camaradas que sentiram e viveram as dificuldades de uma guerra que não queriam, não há distinções entre antigos postos militares e posições sociais. Há sim uma imensa amizade, respeito e um espírito de solidariedade que nos permite discutir sem ofender, pois as diferenças de opinião são salutares. Não discutimos opções políticas e religiosas, assim como a situação política da actual Guiné-Bissau, a quem cabe resolver os seus problemas sem ingerência exterior.
Quando puderes e quiseres, envia as tuas fotos da praxe, a antiga, do tempo de tropa, e a actual para nos conhecermos no primeiro contacto visual. Estas fotos servirão também para acompanhar os teus trabalhos publicados no nosso Blogue.
Esperamos, como é lógico, a tua colaboração com as tuas prosas ou versos e as tuas fotos. Conta-nos como foi a tua experiência enquanto capitão miliciano, a História da tua Unidade, dos teus homens, entre outras coisas que nos queiras contar.
Deixo-te, em nome dos editores e da tertúlia, um abraço.
O camarada
Carlos Vinhal
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 10 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3433: O Nosso Livro de Visitas (41): Afonso Costa, ex-1.º Cabo de Trms, Amura, 1970/72, procura camaradas do Centro de Comunicações
1 comentário:
POIS TIVE O PRAZER DE TER SIDO COMANDADO POR VASCO GAMA EM ESTREMOZ (EU PERTENCIA Á 8351).ENTRETANTO FUI MOBILIZADO PARA A GUINÉ FAZENDO PARTE DA 8350 (PIRATAS DE GUILEJE). JÁ LÁ E EM CUMBIJÃ TIVE O PRIVILEGIO DE JOGAR VOLEI CO O CAP V GAMA ,POIS EU ESTAVA EM COLIBUIA.
J CARVALHO
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