Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
quarta-feira, 6 de outubro de 2010
Guiné 63/74 - P7090: Blogoterapia (159): Paradoxo e uma Orquídea (Torcato Mendonça)
Como é possível, um militar e graduado, operacional, praticante da “arte” da guerra e paradoxalmente detestá-la, não acreditar nela, ir quase ao desespero por nela continuar? Que transformação sofreu?
Ou, hoje, tantos anos depois, questionar-se do porquê de aqui escrever, recordar, engolir em seco ou em amargo de boca depois de ler certos textos e comentários?
Que o leva, a ele e a outros. O sentirem o camarada, o amigo, a solidariedade de forma tão intensa, de forma ou de tal forma que, de quando em vez sinta a “espinha da posta de pescada” – na frase feliz de um excelente camarada, melhor de um duplo camarada, que eu concordo e, por isso mesmo lha roubo – e retira-a, a dita espinha claro, não em protesto mas em sorriso?
Malhas que o Império tece ou, camarada, amigo é algo indefinível ou só se tenta definir em palavras ditas e bem ditas mas, isso sim, principalmente ou sempre, se praticam na convivência salutar de um quotidiano que outrora foi risco de vida, união forte e hoje, agora, é recordação de amizade e convivência a divergir para, convenhamos, quase sempre, a convergir mais forte, mais una, mais tudo o que só certos homens (homens e mulheres) têm o privilégio de sentir. Mesmo no conhecimento só através da Net, da conversa ao telefone, do fugaz encontro de um almoço, de um abraço breve mas caloroso – no encontro, para minoria semanal e para a maioria anual.
Pode efectivamente ter havido a tal metamorfose, a tal “lavagem ao cérebro” – forte o conceito – a que o treino, e bem, obrigou.
A tal união, a tal força, a amizade e camaradagem é, mais reforçada ainda, para os que entraram em combate ou estiveram em zonas de guerra, ou mais ainda se viveram perigos juntos.
Talvez tudo isto e um “ramo de rosas”. Não. Nem rosas, nem cravos devido a hipotética analogia bacoca. Digamos então… orquídeas.
Por isso Paro, Escuto e Olho.
Não.
Paro, Leio e Penso.
Concordo, discordo, gosto, não gosto e faço compasso de espera. Esqueço de pronto tolos e petulantes e vou caminhando, agora, na rota do voo outonal das aves. Porque não ao correr de uma agradável dose de loucura.
E,
Talvez, porque não, ofereça então uma orquídea a alguém.
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Em tempo:
- A guerra é, como tudo na vida, como uma moeda tem o verso e o reverso. Uns estão num lado e outros no outro. Uns são amigos, camaradas e outros, que o são igualmente, tornam-se ambos, em troca de verso e reverso, em inimigos. No mais brutal e desumano comportamento do ser humano tentam, uns e outros eliminarem-se.
Simples e primário. Pode eventualmente haver excesso, não de zelo mas de deformação. São excepções. Lastimável é certo.
Mas o normal acontece. Guerra é guerra e o inimigo é abatido. Por quem? Que interessa isso. Acontece. Camarada não transportes esse farto como um mal. Deixa e vai esquecendo pois não há qualquer imoralidade. No acto, nesse que te preocupa, eventualmente quantas vidas de camaradas salvaste?
TM
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Notas de CV:
(*) Vd. poste de 4 de Setembro de 2010 > Guiné 63/74 - P6929: Parabéns a você (147): Torcato Mendonça, 66 anos, uma referência do nosso blogue, um português pré-esforçado, um orgulhoso ex-combatente (Luís Graça)
Vd. último poste da série de 21 de Setembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7021: Blogoterapia (158): A Nossa Pátria (Juvenal Amado)
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1 comentário:
olá amigo Torcato!
Estive a ler o seu paradoxo.
Quantas dúvidas nos assaltam?
Quantos porquês!
Apenas uma pergunta se sente real:
(Desse teu acto, quantas vidas de camaradas salvas-te?)
Incrível saber e sentir que essa é a realidade!
Obrigada amigo, nunca tinha pensado nisso.
A quem ofereceria as orquídeas?
Um abraço da Felismina
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