segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Guiné 63/74 - P12075: Recortes de imprensa (67): a situação, em Portugal, dos nossos camaradas guineenses (Deutsche Welle Africa)


Recorte da página da DW - Deutsche Welle, a emissora alemã que emite em português para a África


1. Peça do jornalista João Carlos, correspondente em Portugal da DW África, disponível hoje na página oficial daquela estação de rádio, e já anunciada em poste anterior, P12065, de  21 do corrente. O ficheiro áudio (5' 55'') pode ser ouvido aqui, na íntegra.

Tomamos a liberdade de, com a devida vénia, reproduzir alguns excertos da peça:

(...) A propósito do quadragésimo aniversário da independência da Guiné-Bissau, que se assinala dia 24 de setembro, a DW África foi conhecer a história de alguns antigos combatentes guineenses que vivem em Portugal. Um deles é Racido Bari. Vive sozinho em Queluz-Belas, nos arredores de Lisboa. Foi soldado, telegrafista de Infantaria "na área das comunicações militares. Esta era a minha especialidade. Vim para aqui em 1989".

Veio de Bissau com o objetivo de reunir os documentos necessários e requerer ao Ministério do Exército a constituição de um processo sumário por ter sido ferido em combate. Mas a resposta dada pela instituição portuguesa foi que "não podiamos ter a documentação, como bilhete de identidade. Teriamos que ficar aqui 6 anos, como cidadãos estrangeiros", conta Racido Bari.

Já Julde Jakuité, outro dos feridos de guerra, mora com a mulher no concelho do Seixal, na outra margem do rio Tejo. "Sou furriel graduado no Exército Português e na altura, no tempo da guerra, diziam que o furriel recebe um ordenado compatível com o dos brancos". Jaquité faz parte da Associação dos Antigos Combatentes da Guiné-Bissau em Portugal. Como ele, há colegas seus que vivem também em situações difíceis. Conta que "muita gente está a morrer. Alguns estão com problemas de trombose por causa dos nervos". Outros sofrem "de traumas de guerra". Jaquité afirma que "é a dificuldade que faz isso".


(...) Mas, passados estes anos todos, os direitos de muitos dos soldados ou milícias recrutados localmente foram ignorados. Desprezados até, como nos diz Luís Graça, furriel do exército português na companhia africana, entre 1969 e 1971 [Foto à esquerda, com dois dos miliatres da CCAÇ 12, do 4º Gr Comb, 2ª secção, José Carlos Suleimane Baldé e Umaru Baldé, Setor L1, Bambadinca, Finte, 1969. Foto de L.G.].

 A falta de reconhecimento dos direitos dos militares guineenses é para Luís Graça " uma coisa que me doi a mim enquanto português e antigo combatente e amigo dos guineenses". Para ele "esse problema não foi resolvido e portanto, há muitas situações dramáticas lá e cá. Lá ainda pior..."


(...) Lamentam os militares guineenses que o Governo português não cumpriu o Acordo de Argel de 1974. O acordo diz que Portugal pagará as pensões de sangue, de invalidez e de reforma a quaisquer cidadãos da República da Guiné-Bissau por motivos de serviços prestados às Forças Armadas Portuguesas. Devido às alterações da lei ao longo dos anos, há casos de ex-militares portugueses, angolanos, moçambicanos e guineenses que não são considerados deficientes das Forças Armadas, consoante o grau de invalidez, refere Jakuité. "Alguns até não conseguem resolver os problemas da junta médica," porque apesar do hospital militar ter dado a confirmação na altura que essa pessoa esteve internada, o governo exige testemunhas.

Mas Jakuité questiona o motivo do governo as exigir, "quando a maioria dos comandantes já morreu, os sargentos, os alferes morreram", então "como é que esta pessoa vai resolver o problema dele?" E por este condicionamento, o antigo combatente afirma que "há algumas pessoas que ficam ali 4, 5, 6 anos à espera que a pensão seja paga".

 (...) Há companheiros há vários anos à espera que o Governo Português lhes atribua uma pensão de invalidez. Alguns recebem na ordem dos 400 euros mensais. É o caso de Racido Bari. "Eu vivo aqui com dificuldades enormes, porque eu pago a renda sozinho, só para mim, 150 euros. Mas o que posso fazer? Não tenho outra alternativa".

Jakuité vive com 530 euros e tem o seu processo arquivado na Procuradoria Geral da República. Considera que tem havido um tratamento de injustiça comparado com colegas portugueses. Conta que "hoje um posto de furriel ganha à volta de 1000 euros, e a mim, nem me pagam o posto que eu tinha. Estou mesmo revoltado com isso".

(...) Depois dos sacrifícios consentidos nos anos dramáticos de guerra, exigem ser tratados com dignidade. Luís Graça refere que não se pode generalizar o problema, mas reafirma que ainda existem cidadãos guineenses que lutam para serem reconhecidos os seus direitos. "O problema mais dramático, até por razões culturais, é o problema de integração dos guineenses, que foram antigos soldados portugueses e nunca houve uma política orientada para os ajudar, para os integrar, para haver um reconhecimento dos seus direitos" como "os direitos de reforma". Afirma que houve alguns que o conseguiram como "Marcelino da Mata, é um exemplo de um homem guineense, militar que acabou por ser integrado, e hoje é coronel do Exército Português." Contudo, Luís Graça sublinha que "o caso do Marcelino da Mata é uma excepção, não é a regra." 

(...) Entretanto, a DW África apurou, perante o impasse na solução destes casos, que um grupo de antigos combatentes guineenses está a preparar condições para interpor uma ação judicial contra o Estado português junto de instâncias internacionais, entre as quais o Tribunal de Haia.
(Itálico, negrito e realce a amarelo, nossos, LG).
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Nota do editor:

Último poste da série > 20 de junho de 2013 > Guiné 63/74 - P11735: Recortes de imprensa (66): Osvaldo Lopes da Silva, então comandante do PAIGC, e um dos principais responsáveis pela Op Amílcar Cabral, sustenta, na mesa-redonda, em Coimbra, no passado dia 23/5/2013, a versão do cerco total ao quartel de Guileje e afirma que as forças sitiantes dispunham de um dispositivo (do qual teria sido utilizado menos de 10%), com condições para actuar durante um mês (AngopPress)

1 comentário:

Anónimo disse...

Joao CARLOS
24 set 2013 09:08 (

Caro Luís Graça,

A DW apresenta nesta 3ª feira um especial sobre a Guiné-Bissau. Levantamos o problema mas falta a resposta das autoridades portuguesas, que aguardamos para um próximo apontamento.

Um próximo apontamento porque ainda há outras pessoas a ouvir, entre as quais da Associação dos Deficientes das Forças Armadas Portuguesas.

Muito obrigado pela colaboração.

Link:

http://www.dw.de/24-de-setembro-de-2013-manh%C3%A3/a-17108779