terça-feira, 18 de setembro de 2018

Guiné 61/74 - P19024: Os nossos capelães (10): O "romance do Padre Puim", por Carlos Rebelo (1948-2009), ex-fur mil sapador, CCS/BART 2917 (Bambadinca, 1970/72)


Guiné > Região de Bafatá > Bmbadinca > CCS/ BART 2917 (1970/72) >  c. 1970/71 > Arsénio Puim (açoriano, da Ilha de São Jorge, ex-alf mil capelão;  foi expulso do Batalhão e do CTIG em Maio de 1971, apenas com um ano de comissão; no final da década de 1970 deixou o sacerdócio, formou-se em enfermagem, casou-se, teve 2 filhos; vive na Ilha de São Miguel; está reformado; é membro da nossa Tabanca Grande; tem cerca de 40 referências no nosso blogue.

Outros casos como o do alf mil capelão Puim  foi: (i) o do Mário de Oliveira (BCAÇ 1912,  Mansoa, 1967/68); e, eventualmente, (ii) o do Carlos Manuel Valente Borges de Pinho  (BCAÇ 4513, Aldeia Formosa, 1973/74)... Também nenhum destes dois completou a comissão, que era normalmente de 21/22 meses. (O Carlos Manuel Valente Borges de Pinho nem sequer chegou a conhecer Aldeia Formosa, tendo partido de Bolama para a metrópole. Desconhecemos os motivos. Os seus camaradas de batalhão dizem-me que deixou o sacerdócio.)

Foto: © Gualberto Magno Passos Marques (2009). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


Guiné > Bissau > c. 1970 > Da esquerda para a direita 3 furriéis milicianos da CCS / BART 2917 (Bambadinca, 1970/72) , José Adelino Santos, Benjamim Durães e Carlos Rebelo (1948-2009).


Setúbal > Convívio do pessoal da CCS/BART  2917 (Bambadinca, 1970/72) > 2008 > Da esquerda para a direita: Carlos Rebelo, Luís Moreira e David Guimarães no último convívio em que esteve presente o Carlos Rebelo (1948-2009).


Viana do Castelo > Convívio do pessoal da CCS do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72) > 16 de maio de 2009 > Da esquerda para a direita, o Benjamim Durães (ex-fur mil do Pel Rec Inf);  o Arsénio Puim (ex-alf mil capelão) e o Jorge Cabral (ex-alf mil art, Pel Caç Nat 63, Fá Mandinga e Missirá, 1969). O Arsénio Puim veio propositadamente dos Açores, para esta 3ª edição do convívio, mas já não pôde abraçar o seu amigo e camarada Carlos Rebelo, acabado de falecer uns dias antes. (*)

Fotos (e legendas): © Benjamim Durães (2009).Todos os  direitos reservados. [Edição e legendagem comnplementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


ROMANCE DO PADRE PUIM
OU UM EPISÓDIO DA GUERRA COLONIAL (***)

por Carlos Rebelo

(Para o Padre Puim,
onde quer que se encontre, tantos anos depois)


Foi mais ou menos assim
que se passou com Puim,
padre daquela fornada
do Vaticano Segundo
e capelão militar:
criticou a hierarquia
por usar e abusar
dos prisioneiros de guerra,
velhos, mulheres e crianças,
que a tropa em suas andanças
trazia ao aquartelamento.

Padre Puim predicava
contra o facto e apontava
certos atos desumanos
que o exército praticava.

Isto caiu muito mal
no goto de um general
que pôs a PIDE em ação:
Puim foi notificado
e, digamos, convidado
a calar-se, ou então...

... Então foi o que aconteceu:
padre Puim foi detido
e de imediato trazido
desde o mato à capital
para falar com o tal,
no seu quartel general.

Reafirmou o que disse
e até disse inda mais:
que não gostava da guerra
e pouco de generais.
E disse querer saber
qual a razão de ter sido
demitido.

Aqui o tal general
escusou-se a dizer tal,
mas perante a insistência
e o tom de veemência
dos protestos de Puim,
retorqui-lhe assim:
 - Digamos que o senhor foi
considerado  indesejável
ao CTIG (*)

Padre Puim perguntou:
- Sim ? Mas..., porquê ?
Ao que o general repetiu
o que antes já dissera,
e assim, 
uma, outra e outra vez.

Ficou à espera Puim
da explicação que não vinha,
até que disse o que disse:
 - Se eu sou indesejável ao CTIG,
O CTIG é indesejável para mim.
Boa tarde!

Virou as costas, saiu,
nunca mais ninguém o viu
a falar com generais
e outros assim que tais.

Eu, que fui seu amigo,
sei dos cuidados e dores,
quando entrou no avião
de regresso aos Açores,
donde era natural,
 e então um simples padre,
antes de ser capelão
no exército de Portugal.

(1) Comando Territorial Independente da Guiné

[Revisão / fixação de texto para esta edição no blogue: L.G.] (****)


Carlos [Augusto Travassos] Rebelo

(i) ex-fur mil sapador, CCS/BART 2917 (Bambadinca, 1970/72);

(ii) faleceu em 6 de Maio de 2009, em Gueifães, Maia, onde morava (**);

(iii) escreveu este "romance" em 2007 e entregou-o ao seu camarada e amigo Benjamim Durães para ser lido no 1º Encontro-Convívio da CCS/BART 2917 que se realizou em Setúbal;

(iv) o texto foi publicados no Jornal dos Serviços Sociais da CGD - Caixa Geral de Depósitos, e reproduzido posteriormente no nosso blogue (***).

_________________


7 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

É a primeira aceção da palavra "romance"...


romance | s. m. | adj. 2 g.

ro·man·ce
substantivo masculino
1. Narração histórica em versos simples. [...]


"romance", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013, https://dicionario.priberam.org/romance [consultado em 18-09-2018].

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Vejo que o nosso Arsénio Puim continua vivo, ativo e saudável... É diretor diocesano da Pastoral da Cultura, na sua terra... Ver aqui uma entrevista que deu, em 12 de março de 2016.

Entrevista do Jornal “A Crença” ao Director Diocesano da Pastoral da Cultura

https://padrericardotavares.wordpress.com/2016/03/12/pastoral-cultura-crenca/

Anónimo disse...

Grande homem o camarada Arsénio Puim, bater o pé a um General, não é qualquer um.
Que esteja a viver a sua felicidade, sem ter de obedecer cegamente a ordens de quem não tem a mínima noção de ética e humanidade.
Os meus desejos de longa vida e saúde.
Virgilio Teixeira

Anónimo disse...

E Parabéns pelos excelentes versos dedicados ao seu camarada e amigo, pelo falecido Carlos Rebelo.
Virgilio Teixeira

José Teixeira disse...

O Carlos Manuel Valente Borges de Pinho era e é felizmente meu amigo pessoal, ao ponto de ser por convite o celebrante do meu casamento.
Foi coadjutor da paróquia de Cedofeita no Porto, transitando depois para S. João de Ovar. Por razões afetivas abandonou o sacerdócio uns meses depois de ter chegado à Guiné. Veio de regresso e foi para Mafra tirar o curso de Oficial por imposição militar e foi colocado em Infantaria 6 no Porto para formar Batalhão e partir para a guerra. Entretanto deu-se o 25 de Abril e ficou por cá.
Estava marcado e vigiado pela PIDE desde Cedofeita. Sei que foi chamado pelo comandante de Batalhão e por este lhe foi dito mais ou menos isto: A PIDE ordenou-me que o Capelão fosse vigiado porque era um tipo perigoso, mais lhe disse: eu não vou criar problemas, faça a sua vidinha, mas se me complicar a vida fodo-o.
Chegou a estar em Aldeia Formosa. Foi por ele, no seu regresso que soube que o Alferes de 2ª linha e meu amigo, o Aliu Baldé chefe de Tabanca de Mampatá tinha falecido por doença e que a grande àrvore que havia no centro de Mampatá tinha sido abatida para alargar a estrada para Iroel/Colibuia/ Nhacobá.
Cursou direito e foi trabalhar para a Soares da Costa, de onde já se deve ter reformado.
José Teixeira

Tabanca Grande Luís Graça disse...

O que fizeram ao Puim, os seus comandantes, os do BART 2917, o AC e o BB, foi de uma grande pulhice humana...Afinal, o que ele fez foi em perfeito alinhamento com as orientações da política spinolista "Por uma Guiné Melhor"!...

O Puim, enquanto português, homem, cidadão, capelão e oficial do Exército Português, insurgiu-se, protestou ou chamou a atenção para a situação desumana, degradante, em que viviam, muma espécie de galinheiro, em Bambadinca, velhos, mulheres e crianças que foram "recuperados" de uma tabanca no mato, sob controlo do PAIGC (que "eles" chamavam, pomposamente, "áreas libertadas", na famigerada áera do Poindon / Ponta do Inglês onde demos e levámos muita porrada ao longo da guerra...)!

Porra, não eram "TURRAS"!... Era população civil, desarmada, andrajosa, miserável, esfomeada, apavorada... As crianças tinham nascido no mato e entravam em pânico ao ouvir o roncar de uma GMC...no quartel.

Muito provavelmente estes "pobres diabos" foram trazidos pela minha CCAL 12 em abril de 1971... Eu tinha acabado de chegar à metrópole, há coisa de um mês e tal...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

O "romance" escrito pelo Carlos Rebelo não pode ser lido "à letra"... O Rebelo nunca mais viu o seu camarada e amigo Puim... Daí a dedicatória: "Para o Padre Puim, onde quer que se encontre, tantos anos depois"...

Quando o Puim veio à metrópole, em 2009, ao 3º convívio do pessoal da CCS/BART 2917, já foi demasiado tarde... O Rebelo tinha acabado de morrer...

O Rebelo imaginou esta cena, o Puim, vítima mas corajoso, enfrentando o seu juiz, o general, prepopente mas farco, e saindo porta fora com a dignidade e a superioridade dos que têm a razão moral...

Mas nimnguém pode garantir, a não ser o próprio Puim, que as coisas se tenham passado assim... Nem sei sequer se o Puim esteve com o Spínola. É de todo improvável...Sei, pelas conversas que tive com ele, em Lisboa, na casa dos filhos, que houve, isso, sim, uma discussão azeda, amargurada, entre ele e o capelão-chefe, lá no "Vaticano", em Bissau...

Não estou a defender o Spínola, mas se ele tivesse chegado a saber a história como devia ser (, a história dos dedsgraçados dos prisioneiros civis, em Bambadinca, abril ou maio de 1971) quem teria levado uma "porrada" era o comando do BART 2917, o AC e o BB...