sábado, 9 de fevereiro de 2019

Guiné 61/74 - P19484: Os nossos seres, saberes e lazeres (307): Viagem à Holanda acima das águas (11) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 22 de Outubro de 2018:

Queridos amigos,
Conheci este museu vai para 40 anos, nunca me saiu da recordação, é uma arquitetura Arte Déco de primeiríssima água, aqui se albergam obras essenciais de uma corrente artística que foi das mais empolgantes da arte mundial, por todo o século XX, De Stijl, rompeu com os cânones de uma arquitetura separada das artes plásticas ou do design de interiores ou das artes do mobiliário.
Com esta nova corrente, tudo se conjuga. Movimento que deixou escola, e sentimo-lo bem quando vemos obras de mobiliário concebidas por génios da arquitetura como Siza Vieira ou Souto Moura.
Era um dos mais desejados passeios nesta viagem pela Holanda. E o anseio foi satisfeito, com uma tal intensidade que apetece regressar já, a esse admirável mundo novo de uma inovação que percorreu todo o século XX.

Um abraço do
Mário


Viagem à Holanda acima das águas (11)

Beja Santos

É a despedida de Amesterdão, e o viandante guarda outra nota de humor de Bill Bryson, aquele que é considerado o autor de livros de viagens mais lido em todo o mundo, tem a ver com os holandeses e Amesterdão, diz que eles são parecidos com os ingleses no modo como estacionam os carros, no modo como colocam os contentores de lixo na rua e no modo como encostam as bicicletas contra a árvore ou o corrimão mais próximo. “Em Amesterdão limitam-se a abandonar os carros juntos do canal, muitas vezes à beira de caírem à água”. É uma cidade que tem uma grande história de tolerância, que prima pela arte de viver, o escritor português Rentes de Carvalho viveu em Amesterdão quatro anos e deixou relatos de profunda simpatia pela cidade, elogiando o poder de por ela vagabundear por ser calorosa e hospitalar. “Ao contrário de muitas outras metrópoles, Amesterdão parece ter conservado este sentimento de intimidade e segurança que são próprios das pequenas aglomerações. Talvez porque as ruas não são monumentais, talvez por causa dos seus canais sinuosos, talvez também por causa da sucessão incessante da água e da terra. Seja como for, a cidade tem qualquer coisa de atractivo, mesmo no coração do inverno, podemos ver os interiores das casas”. É essa a imagem que o viandante pretende guardar, talvez com aquela nesga de amargura de ter visto pouco, seria desejável permanecer mais tempo. Fica para a próxima, e sem mais comentários.



Um grande filósofo, Spinoza, com descendência portuguesa. Levou uma vida atribulada. Foi racionalista, o seu génio andou a par de Descartes e Leibniz. Fez imensas críticas ao texto bíblico, mesmo na cidade da tolerância, suscitou azedumes e repúdios. Tem nome consagrado na filosofia ocidental.



É a última fotografia de Amesterdão, a poucos metros do Rijks apanha-se o autocarro para Alphen. Amanhã é o dia para receber companhia do artista plástico do século XX que o viandante mais estima, Piet Mondrian, por isso se vai viajar até Haia.


Há uma forte razão sentimental para esta peregrinação, impossível descurá-la. Preparava-se o viandante para fazer programas televisivos, isto em 1978, e pediu à RTP para ir a Haia, à sede da Organização Internacional das Associações de Consumidores, buscar material. Assim aconteceu, viajou sábado de Lisboa até aqui, ao tempo era uma boa modalidade de fazer um brevíssimo roteiro turístico. E começou por aqui, domingo bem cedo, no Gemeentemuseum, a arquitetura é excecional, data de 1935, é um assombroso monumento da Arte Déco holandesa, a luz natural jorra por inúmeras janelas, não há escadas como aquelas, na elegância das linhas, o que atraiu o viandante foi Piet Mondrian, que continua a ser o patrono da casa, mas a coleção permanente é magnífica, aqui se encontram génios como Egon Schiele, Claude Monet ou Francis Bacon, tem cerâmica e moda do melhor, estava escrito: um dia inesquecível, como aconteceu.




Falar de Mondrian e deste portentoso edifício remete-nos para um dos mais importantes movimentos artísticos que emergiram no século XX: De Stijl, que incluía nomes como Piet Mondrian, Bart van der Leck, Gerrit Rietveld e Theo van Doesburg, juntaram-se à volta da publicação De Stijl, tinham o conceito de arte total, era uma abordagem de associação e aproximação de diferentes elementos como a arquitetura, as artes plásticas, o design e o mobiliário, introduziram uma rotura com o passado, embora estes artistas soubessem da existência do pensamento de um arquiteto de nome H. P. Berlage que já no fim do século XIX aspirava à conjugação de disciplinas para gerar uma nova dinâmica no modo de habitar e de viver. O resultado foi uma explosão artística que só viria a ser posta em causa quando os exércitos alemães irromperam nos Países Baixos, em abril de 1940.





Não falemos agora deste prodigioso De Stijl nem de Mondrian e companheiros, fica para a próxima, saboreie-se as artes decorativas, pormenores belíssimos de outras eras, encham-se os pulmões, De Stijl é uma manifestação em estado puro da pintura, a cor, a linha, a forma, tudo vai aparecer depurado mas confortável, o academismo e o classicismo iriam entrar em banho-maria. Virá mais tarde a contestação com os realismos totalitários e depois o neorrealismo, por um lado, e o abstracionismo e o não-figurativismo, por outra via. Mas isso é outra história.

(Continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 2 de fevereiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19464: Os nossos seres, saberes e lazeres (306): Viagem à Holanda acima das águas (10) (Mário Beja Santos)

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