sábado, 23 de janeiro de 2021

Guiné 61/74 - P21800: Os nossos enfermeiros (14): Na falta de médicos, optou-se pela secção sanitária a nível de companhia: um fur mil enf e três 1.ºs cabos aux enf (António J. Pereira da Costa / Paulo Santiago / António Carvalho / José Teixeira / Luís Graça)


Guiné >Zona leste > Região de Bafatá > Setor L1 > Bambadinca > CCAÇ 12 (1969/71) > 1969 (ao tempo do BCAÇ 2852, 1968/70) > Da esquerda para a direita, o 1º cabo aux enf Fernando [Andrade] Sousa (, vive na Trofa), o 1º cabo aux enf Carlos Alberto Rentes dos Santos ), é de Amarante, vive em França), o fur mil enf João Carreiro Martins (,vive em Lisboa) e o alf mil at cav José António G. Rodrigues (, já falecido, vivia em Lisboa; estava aqui de oficial de dia, era o cmdt do 4º Gr Comb).


Guiné >Zona leste > Região de Bafatá > Setor L1 > Bambadinca > CCAÇ 12 (1969/71) > 1969 
 (ao tempo do BCAÇ 2852, 1968/70)  > Três elementos dos serviços de saúde: ao centro, o fur mil enf João Carreiro Martins;  à sua esquerda,  o 1º cabo ex enf Fernando [Andrade]Sousa; e à sua direita o 1º cabo aux enf José Maria S. Faleiro (, morada actual desconhecida; foi dos primeiros a ser evacuado por doença intectocontagiosa, ainda em 1969).

Os três militares da CCAÇ 12 estão junto ao monumento erigido pela CCAÇ 1551 / BCAC 1888 (Bambadinca, mai - nov 1966; Fá Mandinga, nov 1966 - jan 1968): além de Bambadinca, teve pessoal destacado em Xitole, Saltinho, Mansambo; Missirá e Dulombi).


Fotos (e legendas): © Fernando Andrade Sousa (2016). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].

1. Comentários a vários postes sobre os serviços de saúde militares, e os nossos médicos e enfermeiros:


(i) António J.Pereira da Costa (*)


Louvemos o coronel médico Carlos Reis Alves, pela sua acção variada e pelo médico que foi ou ainda é. O conhecimento é algo que não nos podemos despir e que podemos aplicar sempre.

Pela recensão que foi apresentada podemos concluir que a sua acção dirá respeito a um TO [Angola] e num dado momento da Guerra [1970/71].

As alterações que se verificaram são consequência do "problema do pessoal" ou falta dele... Efectivamente seria lógico que em cada companhia existisse um médico. Efectivamente, teríamos uma unidade isolada - como era habitual - à qual estava ligada uma população que, às vezes atingia os milhares de pessoas.

Porém, o número de médicos não chegava e, assim rapidamente se resvalou para um médico por batalhão que era manifestamente insuficiente, devido à dispersão das unidades no terreno. E era o mínimo dos mínimos.

Assim, surge-nos o trabalho das Secções Sanitárias, sob o comando do furriel e com 3 cabos auxiliares de enfermagem (maqueiros), cujo trabalho foi heróico, quer pela insuficiência de meios, quer pela falta de conhecimentos, quer pelas variadíssimas situações que lhe poderiam surgir. Mas este será um tema para outro estudo.

Recordo que, no BArt 1896 e BCaç 2834, havia dois médicos, um em Cacine e outro em Buba.

Em Mansoa, havia também dois médicos no BCaç 4612, ambos em Mansoa. Um deles visitou a CArt 3567. Curiosamente era... ginecologista.


(ii) Paulo Santiago  (**)

No Saltinho, ao tempo da CCaçç 2701, havia Médico, o Dr Martins Faria, que era de Guimarães e faleceu precocemente há uns vinte anos. 

Na mesma altura,também havia médico no Xitole, o Dr Nunes de Matos.

No Saltinho, deixou de haver médico quando lá estava a Companhia da tragédia [ do Quirafo
, a CCAÇ 3490, Saltinho, 1972/74].

No Xitole [, CCAÇ 3492 /BART 3873, Xitole, 1972/74] continuou a haver Médico. O Dr Azevedo curou-me um otite.

Em Galomaro [, CCS / BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74], 
esteve o Dr Veloso, foi Director do IPO do Porto, e agora julgo ser Presidente da Liga. O Dr Pereira Coelho também esteve em Galomaro, mas tive pouco contacto com ele. 


(iii) António Carvalho [Carvalho de Mampatá] (**)

Caro amigo Teixeira e caros tabanqueiros

É (como costuma ser) interessante esta tua descrição pormenorizada da tua passagem por locais da Guiné, alguns deles comuns à minha permanência lá, pouco tempo depois.

No meu tempo, a minha companhia 
[, CART 6250/72, Mampatá,1972-74] tinha quatro Cabos Auxiliares de Enfermagem ( Celso, Gomes, Pinto e Azevedo), um por cada grupo de combate. Eram todos desenrascados e excelentes no mato.

Eu [, furriel enfermeiro,] estava mais na Enfermaria do Quartel, mas, algumas vezes, por doença ou férias de um 1º Cabo, ou ainda quando o Capitão saía, tinha também que alinhar no mato.

Nunca fiz qualquer diário, infelizmente, por isso não posso fazer descrições muito minuciosas de como aquilo funcionava. 

 Certo é que só havia um Alferes Médico na sede do Batalhão [BCAÇ 3852], em Aldeia Formosa, e esse era, segundo o que conheço, no período 72/74, o panorama geral naquele território.

O Médico terá visitado a nossa Companhia uma ou duas vezes , no decurso da comissão. O que sucedia com mais frequência era eu deslocar-me a Aldeia Formosa para receber instruções ou formação do Médico.

Na enfermaria do aquartelamento de Mampatá, havia dois turnos de trabalho, um destinado a pessoal civil e outro a pessoal militar. Claro que qualquer civil ou militar era atendido em qualquer um dos turnos e em qualquer hora se se tratasse de alguém que padecesse de algum ferimento ou doença grave que requeresse atendimento imediato. Os civis eram tratados com os melhores meios disponíveis, nada lhes sendo regateado. Estávamos, então, no tempo do Spínola. 

 
(iv) José Teixeira (**)

Bom amigo Carvalho: No tempo em que estive em Mampatá era o enfermeiro do Grupo de Combate aí sediado.

A Companhia [, CCAÇ 2381, 1968/70,]  estava sediada em Aldeia Formosa e tinha um Gr Comb em Mampatá e outro na Chamarra. Em Aldeia Formosa ficaram dois Gr Comb e um cabo auxiliar de enfermeiro.

Como o Furriel se estava nas tintas , era o desgraçado que alinhava em todas. Por exemplo: ia a Buba na coluna, regressava no dia seguinte com as viaturas carregadas e no outro dia a seguir partia para Gandembel.

Era duro, até porque as saídas de batimento da zona era feita a nível de Gr Comb e o desgraçado estava sempre a alinhar. Por esta razão eu sempre disse que fui um homem de sorte.

Eu montava o meu posto de socorros num sobrado de uma casa e atendia os meus camaradas e a população em geral. Foi um tempo bom para mim pelo que me pude dedicar à população, conhecer as pessoas os seus hábitos e valores, etc


(v) Luís Graça (***)

Em comentário à publicação do álbum de Fernando Andrade Sousa que foi 1º cabo aux enf, CCAÇ 12 (Contuboel e Bambadinca, entre maio de 1969 e março de 1971), e mora na Trofa
, escrevemos o seguinte:

É inacreditável como é que a CCAÇ 12, uma subunidade de intervenção ao serviço do BCAÇ 2852 e depois do BART 2917, só tinha dois enfermeiros operacionais para alinhar no mato, aliás, dois 1ºs cabos aux enf, o Fernando Sousa e o Carlos Alberto Rentes dos Santos.

E este último só por pouco tempo, já que foi trabalhar como carpinteiro (!) no reordenamento de Nhabijões!... 

O 1º cabo aux enf José Maria S. Faleiro foi cedo evacuado para a metrópole. por doença infetocontagiosa (creio que hepatite) e e só muito mais tarde foi substituído pelo 1º cabo aux enf Fernando B. Gonçalves [, de quem já nem me lembro].

Os médicos e os furrieis enfermeiros (como era o caso do nosso João Carreiro Martins, de resto já enfermeiro na vida civil ) não alinhavam no mato (!), sendo cada vez mais absorvidos pelas tarefas de prestação de cuidados de saúde às populações civis!...

Spínola parecia confiar apenas no HM 241, nos helicópteros da FAP e nas enfermeiras paraquedistas que vinham fazer as evacuações Ypsilon!... 

Mas é legítimo perguntar-se: quantos camaradas nossos não terão morrido por falta de primeiros socorros e reanimação no mato!... A vida ali contava-se ao segundo... E nenhuma graduado tinha aprendido na recruta e na especialidade a fazer um simples garrote para estancar um ferimento de bala numa perna ou num braço!... Muito menos administrar um soro... É que os enfermeiros também eram alvos a abater, no caso de uma emboscada no mato.,,

Nunca vi ninguém protestar por esta insólita situação. A política da "Guiné Melhor" levou Spínola a "canibalizar", literalmente,  o seu próprio exército: alguns dos nossos melhores operacionais eram afetados a missões civis, como os reordenamentos, os postes militares escolares e os serviços de saúde! Spínola tinha pressa em "roubar" as populações ao PAIGC... 

Com a melhor das intenções, acabou por desfalcar as companhias que andavam na "porrada"... Enfim, não sabemos  o que se passava com as tropas especiais,que tinham outro estatuto e poder reivindicativo... Seria interessante saber como estavam organizados os serviços de saúde nos destacamentos de fuzileiros especiais, nas companhias de comandos, no BCP 12...

Mais: a CCAÇ 12 é obrigada a participar directamente no "projecto de recuperação psicológica e promoção social da população dos Nhabijões", ao tempo do BCAÇ 2852 (e depois do BART 2917), fornecendo uma equipa de reordenamentos e autodefesa, constituída pelos operacionais:

  • alf mil António Carlão (cmdt do 2º Gr Comb, já falecido);
  • fur mil at inf Joaquim M. A. Fernandes (cmdt da 1ª seção do 4º Gr Comb);
  • 1º cabo at inf Virgílio Encarnação (cmdt da 3ª seção do 4º Gr Comb);
  • sold arv at int Alfa Baldé.

Foram tirar o respectivo estágio a Bissau, de 6 a 12 de Outubro de 1969, estava  a CCAÇ 12 há três meses em Bambadinca, à ordens do BCAÇ 2852...

Foram ainda requisitados à CCAÇ 12 dois carpinteiros, um  1º cab at inf (cujo nome ainda consegui saber) e próprio 1º cabo aux enf Carlos Albertos Rentes dos Santos.

A CCÇ 12 tinham 24 operacionais (graduados e 1ºs cabos atiradores),
metropolitanos, e uma centena de praças do recrutamento local, distribuídos por 4 grupos de combate, sem contar com os especialistas, metropolitanos (condutores auto, transmissões, enfermagem, etc., ao todo uns 35/40). 

Os 4 elementos operacionais brancos que são retirados à companhia, representavam... um 1/6 do total!

Na prática, e durante muitos meses, o pobre do 1º cabo aux enf Fernando Andrade Sousa era o único a "alinhar no mato", dos 4 elementos iniciais da equipa de saúde!... (A CCAÇ 12 não tinha, de resto, soldados maqueiros; é possível que, por vezes, tenha alinhado o pessoal sanitário da CCS em operações a nível de batalhão).

E o Fernando também tinha, além disso, de integrar as equipas de "ação psicossocioal" (!), por exemplo, as visitas às tabancas, vacinação, etc.... E mais: ia todos os dias para o poste de saúde quando estava em Bambadinca!... E ainda foi destacado, dois ou três meses, no princípio de 1970, para o Xime da CART 2520, que estava sem enfermeiro!...

Em conclusão foram homens como o Fernando Anadrade Sousa, "marca c...",, como se diz no Norte, que seguraram as pontas desta "p... de guerra"!... (Julgo que levou, no fim, um louvor, averbado na caderneta militar, como seria, de resto, da mais elementar justiça!... Era o mínimo que  o capitão lhe podia dar!).
____________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 19 de janeiro de 2021 > Guiné 61/74 - P21781: Nota de leitura (1335): Os serviços de saúde militar e a guerra colonial - Parte I (Luís Graça)

3 comentários:

António J. P. Costa disse...

Olá Camaradas

O Dr. Reis Alves fala(?) de ambulâncias - uma por companhia - o que, pelo menos e a partir de 1967/8 na Guiné não era verdade e não creio que tivesse utilidade. Alguém se lembra de haver ambulâncias nas unidade operacionais?
As primeiras unidades foram também dotadas de atrelados sanitários que, curiosamente iam dotados de material perecível. Posso afirmar que o meu cunhado, médico mobilizado para Cabinda, ainda em 1961, tinha um na sua companhia e deitou fora embalagens de penicilina que não podiam ser utilizadas por estarem claramente fora de prazo.
Recordo-me de os ver, prontos para embarque no Dep. Mat. Sanitário, em S. Domingos de Benfica.
No Xime e em Mansabá não havia nenhum, mas em Cacine (1968) não posso afirmar. Estes atrelados seriam algo que podia permitir montar, à chegada a qualquer local, uma enfermaria de campanha rudimentar, mas acho inconcebível que levassem material para consumo.
É falta de previsão, mas admito-a como inexperiência. No fundo, o Exército não tinha prática "destas coisas da guerra", não sabia o que ia encontrar em África e aquela foi uma solução adoptada, com a melhor das intenções.

Um Ab.
António J. P. Costa

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Não, nunca vi ambulâncias nem atrelados sanitários... no mato.

José Teixeira disse...

Creio que foi em Empada que vi um atrelado, onde havia apenas equipamento cirúrgico , mas já tão desfalcado de equipamento que creio, acabou por ser abatido à lista do equipamento da Unidade na sequência de um ataque.
J. Teixeira