sábado, 16 de dezembro de 2023

Guiné 61/74 - P24964: Em louvor das nossas LDG (Lanchas de Desembarque Grandes) Classes Alfange e Bombarda




Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Setor L1 (Bambadinca) >  Xime > c. 1969/70 >  LDG 105 NRP Bombarada  > Desembarque no porto fluvial do Xime de uma mais ou companhias de "piras", destinados ao Leste. Fotos do álbum do álbum do José Carlos Lopes, ex-fur mimanuense do conselho administrativo do comando do BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70).

Fotos (e legendas): © José Carlos Lopes(2012). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. As nossas LDG (Lanchas de Desembarque Grande) levaram-nos a muitos sítios. E em segurança. Inspiravam confiança. Levaram-nos ao Xime e a Bambadinca, na zona leste. Levaram-nos a Buba, na região de Quínara. Levaram-nos ao sul, a Cacine, nas região de Tombali, levaram-nos, no Norte, aos aquartelamentos ao longo do rio Cacheu... 

Muitas dezenas de milhares de homens tiveram o seu contacto com a guerra, na sua "viagem em LDG"... Contrariamente às lanchas mais pequenas, as LDP e as LDM, as LDG só mais raramente eram atacadas ou flageladas. Os guerrilheiros do PAIGC tinham medo do seu poder de fogo: 2 metralhadoras OERLIKON MK II 20 mm (1965), mais tarte, em 1973, substituídas por 2 peças BOFFORS, antiaéreas, de 40 mm, à semelhança da LDG 105 NRP Bombarda, mais moderna (1969).

Estranha-se, em todo o caso, que o PAIGC nunca tenha tentado, com uma certeira canhoada, meter uma LDG ao fundo...

Para além, deste armamento (que metia respeitinho, a quem estivesse emboscado na orla da mata ou do tarrafe,  a tripulação da LDG costumava levar um morteirete ou morteiro  60 mm com que batia zonas suspeitas (por exemplo, a margem sul do rio Geba, entre a foz do Rio Corubal e a Ponta Varela, quando vinha de Bissau para o Xime, ou no mato Cão, quando seguia até Bambadinca; estes eram os locais mais que prováveis, no rio Geba,  para o IN desencadear ataques ou flagelações às nossas embarcações, quer civis quer militares)...


LDG 101 NRP Alfange. Foto do Museu de Marinha, gentilmente disponibilizada pelo Manuel Lema Santos, engenheiro, nosso camarada, 1º ten RN, 1965/72, criador e editor do blogue Reserva Naval]


2. O ex-fuzileiro Miguel Cunha já aqui contou uma história divertida à pala do morteirete ou morteiro 60 mm que eles usavam na LDG 101 (*):

(...) "Fiz várias escoltas nas LDG e principalmente na Alfange, ao Xime e a Cacine. Era comandante o 1º tenente Malhão Pereira.

Tenho uma história passada a bordo da Alfange.

Nas anteparas da lancha, mais ou menos a meio, existia, de cada lado, um fundo de bidão com areia para servir de apoio ao prato do morteiro de 60 mm.

Julgo que as tropas [do Exército] que transportávamos, pensavam que os bidões com areia era para urinar. E alguns fizeram-no, de certeza. O pior foi quando o comandante mandou fazer umas morteiradas de protecção. Com o coice do prato do morteiro na areia, ficámos a cheirar a urina o dia todo!

Miguel Cunha, Fz 996/68, Cia 10 Fz, 1969/1971.  (---)



3. Mas pergunta-se:  para lá da tropa (fuzileiros, "infantes" e outros, como milícias, familiares de tropa africana, e seus animais domésticos), o que é que a LDG costumava levar mais, de Bissau até ao Xime  (ou, ao contrário, do Xime a Bissau)? Ou até mesmo de Bissau a Bambadinca, nessa época, que as LDG também chegavam ao  porto fluvial de Bambadinca, pelo menos até finais de 1968 (depois começaram a ficar só pelo Xime...

Há camaradas nossos que estiveram no leste que fizeram esta mesma viagem, mas que desembarcaram em Bambadinca, e não no Xime, tendo feito portanto o percurso, mais penoso, pelo Rio Geba Estreito, cheio de curvas e contracurvas (e entre elas, as do temível Mato Cão)....

Satisfazendo a curiosidade de alguns leitores, pode-se dizer que as LDG que navegavam no Geba,  levavam  tudo e mais alguma coisa... Tudo o que era preciso, à ida,  para um homem se instalar no "buraco" que lhe tido cabido em sorte... Como  não havia estradas para o leste (em 1969 apenas havia um troço alcatroado, Bambadinca-Bafatá,. e a estrada Mansoa-Bambadinca esta interdia), a grande via de comunicação com o leste era o Rio Geba...

Homens e material iam e  vinham nas embarcações militares e civis...  Neste caso, a LDG - Lancha de Desembarque Grande foi posta ao serviço do exército, para transporte de tropas e material, muito mais vezes do que em operações anfíbias, com os fuzileiros...

Quando se amplia as nossos fotos com pessoal metido no fundo de um LDG,  dá para ver alguns pormenores insólitos... No bojo da LDG, na carga que é transportada, v
vê-se de tudo um pouco, numa "desordem" indescritível:
  • tubos de bazuca, 
  • espingardas G3,
  • cunhetes de munições.
  • jericãs,
  • camas, 
  • outras peças de mobíliário,
  • colchões.
  • fardos de mantas,
  • malas de viagem,
  • baus,
  • sacos,
  • caixotes 
  • viaturas (Unimog, Berliet, etc.)
  • máquinas da engenharia, 
  • e até... uma cabra!... 

Quem fez este "cruzeiro", como nós (**), lembra-se que pela manhã, aproveitando a maré, estava a embarcação a LGD 101)  de saída do porto de Bissau... O calor e a humidade já eram insuportáveis pelo que os "piras" começavam, logo à saída do cais, a "avacalhar o sistema", ou seja, a infringir a disciplina, o decoro e a segurança militares... No caso da foto acima, já não "piras!" que vão para o mato, mas "velhinhos" que vão para Bissau... Daí a descontração e alguma... bagunça!

Nas fotos a seguir veem-se militares em tronco nu; outros aproveitam para matar o tempo (e aliviar a alguma tensão), sentando-se numa improvisada mesa de jogo, a jogar às cartas (?) e a beber ums bejecas... (Ainda não se usava o termo "bejeca")...  Em todo o caso, estava-se longe da ideia de "cruzeiro turístico", Geba acima, Geba abaixo...








Guiné > Rio Geba >  Fevereiro de 1970 > Viagem Xime-Bissau >  LDG 101 NRP Alfange > Entre outras tropas levava o pessoal do Pel Rec Daimler 2046 (Bambadinca, 1968/70), que terminva a sua comissão no setor L (Bambadinca), e era comandado pelo alf mil cav Jaime Machado. Iriam regressar à metrópole em abril de 1970, no mesmo T/T Niassa em que tinha vindo.

Fotos (e legendas): © Jaime Machado (2015). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


4.  A Classe Alfange foi uma classe de lanchas de desembarque grande (LDG) o serviço da Marinha Portuguesa.

Os navios desta classe foram construídos nos Estaleiros Navais do Mondego (Figueira da Foz), com um projeto baseado na Classe LCT-4,  de origem britânica. 

Pelo seu deslocamento superior a 400 toneladas, os navios foram classificados, pela Marinha Portuguesa, como "lanchas de desembarque grandes (LDG)".

As lanchas destinavam-se a ser empregues na Guerra do Ultramar em missões de reabastecimento logístico, de transporte de tropas e em operações anfíbias, sobretudo em apoio dos Fuzileiros. Foram empregues nos teatros de operações de Angola e da Guiné Portuguesa.

Em 22 de novembro de 1970, a LDG 104 NRP Montante (classe Alfange) e a LDG 105 (classe Bombarda) fizeram parte da força naval portuguesa envolvida na Operação Mar Verde (invasão e Conacri), transportando tropas de desembarque  (comandos guineenses e opositores ao regime de Sékou Turé

As LDG foram batizados com designações de armas medievais (Ariete, Alfange, Cimitarra. Montante). 

Terminada a Guerra do Ultramar, os navios foram cedidos a Angola e à Guiné-Bissau. (...)

Unidades:


Nº de amura /  Nome  /  Comissão em Portugal / Observações
  • LDG 101 NRP Alfange 1965 - 1974 Cedida a Angola
  • LDG 102 NRP Ariete 1965 - 1975 Cedida a Angola
  • LDG 103 NRP Cimitarra 1965 - 1975 Cedida a Angola
  • LDG 104 NRP Montante 1965 - 1974 Cedida à Guiné-Bissau

Ficha técnica > Classe Alfange

Nome: Classe Alfange
Construtor(es): Estaleiros Navais do Mondego
Lançamento: 1965
Unidade inicial: NRP Alfange
Unidade final: NRP Cimitarra
Em serviço: 1965 - 197
Operadores: Portugal | Guiné-Bissau | Angola

Características gerais
Tipo: Lancha de desembarque
Deslocamento: 480 t
Comprimento: 57 m
Boca: 11,8 m
Calado: 1,2 m
Propulsão: 2 motores diesel 1 000 hp 2 veios
Velocidade: 10,3 nós
Sensores: Radar de navegação DECCA
Armamento: 2 peças de 20 mm (1965) | 2 peças de 40 mm (1973)
Tripulação/Equipagem: 20
Carga: 270 t

Fonte: Adaptado de Wikipedia > Classe Ariete 


Bissau > Cais da Marinha > Setembro de 1968 > LDG 101 NRP Alfange > Transporte de um Pel Art com destino a Piche, por via fluvial até  Bambadincas (rio Geba)


Bissau > Cais da Marinha > Setembro de 1968 > LDG 101 NRP Alfange > Peças de artilharia 11.4 ao lado de garrafões de vinho...


Rio Geba (Estreito)  > Bambadinca > Setembro de 1968 > LDG 101 NRP Alfange no porto fluvial de Bambadinca, com um Pel Art com destino a Piche (que depois seguiu, em coluna motorizada, Bambadinca - Bafatá- Nova Lamego - Piche)

Fotos (e legendas): © João José Alves Martins (2012). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca)  > Xime > 1969 > LDG 105 NRP Bombarda no cais fluvial do Xime

Fotos (e legenda): © Humberto Reis (2005). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


4. Em 1969, entraram  ao serviço da Marinha as LDG Classe Bombarda, mais comprida e deslocando mais tonelagem.

Nome: Classe Bombarda
Operador: Portugal
Unidade inicial: NRP Bombarda (1969)
Unidade final: NRP Bacamarte (1985)
Lançamento: 1969
Em serviço: 1969 - 2014

Características gerais

Tipo: Lancha de desembarque
Deslocamento: 652 tonelada
Comprimento: 56 metro
Boca: 11,8 m
Calado: 1,9 m
Propulsão: motores diesel de 910 hp 2 veios
Velocidade: 10 nós
Armamento:  2 peças de 40 mm (LDG 201 e LDG 203) | 2 peças de 20 mm (LDG 202)
Tripulação: 20
Passageiros : 1 batalhão de fuzileiros navais
Carga.  9 carros de combate ou 10 camiões de 6 t


Guiné > Região de Quínara > Buba > 1ª C/BCAÇ 4513/72 (Bula, 1973/74) > 4 de setembro de 1974 > A LDG 105 NRP Bombarda abicada em Buba

Foto (e legenda): © António Alves da Cruz (2023). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

4 comentários:

Valdemar Silva disse...

No dia 7-3-1969 a minha CART 2479, fut. CART 11 "Os Lacraus", saiu de Bissau numa LDG até ao Xime, seguiu e pernoitou em Bambadinca, no outro dia passou por Bafatá e finalmente chegou a Contuboel no dia 8-3-1969.
Por incrível que pareça não me lembro de nada, excepto na chegada ao Xime ver no cais a rapaziada da tropa que mais parecia, ficção, de férias na praia. Depois toda a CART, as suas viaturas com as bagagens particulares, material e todo o pessoal a pé saiu do Xime com a milícia a fazer a segurança e aparecer vestígios da guerra com invólucros pelo chão da estrada de terra vermelha.

Incrível, não me lembro de mais nada a não ser ter visto uns ninhos de andorinhas numa ponte.

Saúde da boa
Valdemar Queiroz

Eduardo Estrela disse...

Pois eu fui no início de junho de 1969 para Bolama numa LDG ( não me lembro qual dela ) ) e em 3 de novembro também de 1969, voltei a usufruir duma viagem a bordo destas lanchas, de Bolama para Farim com escala em Bissau, onde deixámos a malta da CCaç 13. Descemos o Geba, entrámos no Cacheu e aportámos depois a Farim.
Também não me recordo do nome desta última LDG
Recordo isso sim, que a mesma nos dava alguma sensação de segurança por força da envergadura das peças de artilharia que possuíam.
Abraço fraterno
Eduardo Estrela

Anónimo disse...

A LDG101 foi o trenó que trouxe a minha companhia, a CCaç3327/BII17, do Enxudé, zona de Tite, para Bissau. Era o adeus ao mato e a primeira etapa no regresso a casa. Era então o dia 24 de Dezembro de 1972.
Abraço transatlântico.
José Câmara

Joaquim Luis Fernandes disse...

Nunca embarquei numa LDG e o que delas sei é o que se vai publicando nas RS, nomeadamente neste Blogue.

Até fico com a impressão que passei pela Guiné sem saber o que era a guerra, pese embora, no ano de 1973, ter andado com a "canhota" nas mãos, em zonas de contacto eminente, nas escoltas de T.Pinto ao Cacheu e a João Landim, ou nos patrulhamentos de reconhecimento ofensivo, nas matas da região de Churo, nas barbas da mítica Caboiana.
E até participei num patrulhamento à mata do Balenguerez, com aproximação por via fluvial, a partir de Bassarel, nos Sintex, pelo rio Costa e um dos seus braços. E não foi com os fuzileiros. Éramos "tropa macaca" dos "velhinhos" do 4 pelotão da CCAÇ3461, autodenominado "os americanos".

Sem saber o que era a guerra, mesmo assim, tive o meu quinhão de sofrimento, que bastou.