domingo, 7 de janeiro de 2024

Guiné 61/74 - P25043: Capas da Ilustração Portuguesa - Parte VIII: mais um flagrante do fotógrafo Joshua Benoliel, no embarque do CEP para França: a cena tocante de um camarada que escreve, em cima do joelho, um bilhete-postal de despedida, para a família de um outro camarada






Legenda: "Expedicionários portugueses: escrevendo a um camarada uma carta para a família". ("Cliché": Benoliel)


Capa da "Ilustração Portuguesa", II Série, nº 575, Lisboa, 26 de fevereiro de 1917. (Edição semanal do jornal "O Século"; editor lit.: José Joubert Chaves; nº avulso: 10 centavos.)

Observações: O jornal diário, republicano, "O Século", custava 1 centavo (uma centésima parte do escudo, a nova moeda que valia mil réis da antiga). Com o início da I Grande Guerra, e a escalada dos preços, há uma crise do papel que vem afetar  brutalmente a toda a imprensa (nacional e estrangeira). O quilo de papel que, emPortugal,  custava 8 centavos, disparava rapidamente para os 50.

 "O Século" passará a custar 2 centavos (20$00 réis,  um vintém), a partir de 1 de fevereiro de 1918.  Era, a par do "Diário de Notícias", o jornal de referência dos lisboetas.  A imprensa escrita tem o seu "boom" nesta época, que antecede a rádio (anos 20) e a televisão (anos 50). Apesar da censura imposta pela entrada de Portugal no conflito (a declaração de guerra da Alemanha contra Portugal data de 9 de março de 1916), é apenas pelos jornais que as famílias têm notícias do  que se passa nos teatros de operações (na Europa e em África). Dado o seu custo, e a deficiência da cobertura da rede, o telefone era proibitivo.

Em 26 de fevereiro de 1917, a "Ilustração Portuguesa" custava (o número avulso) 10 centavos, não sendo portanto para todas as bolsas, estava apenas ao alcance da classes média, média alta e alta. (A edição de 4/2/1918 já custava 12 centavos e no final dos anos de 1918 e 1919, 15 centavos, passando a 20 centavos, no final de 1920.  Na época (1917, o salário médio entre os rurais era de 60 centavos,diários, um pouco mais alto entre o operariado fabril. A inflação, por seu turno, torna- se "milionária":  a valores atuais, o coeficiente de desvalorização moeda era superior a mil por cento: mais de 3 mil (para 1916), de 2,4 mil (para 1917) e de 1,7 mil (para 1918).


1. O fotojornalista  Joshua Benoliel (1873-1932) é o autor deste "flagrante": antes da partida para França, no cais de embarque, em Alcàntara, dois militares do CEP estão anichados a um canto, junto a uma carroça, retirados do resto da tropa: vistos de perfil, um deles (lado esquerdo) escreve, em cima do joelho, uma carta  ou um postal que outro camarada (à direita) lhe dita , e terá por certo como destinário a sua família, algures na terra...

É uma cena tocante, pela solicitude, pela camaradagem, pela entreajuda, pelo momento único de separação, saudade, angústia e incerteza, que representava para aqueles rapazes a partida para a guerra.  

Na  cobertura jornalística  que fez da partida do  CEP (Corpo Expedicionário Portuguès) para França, entre janeiro e outubro de 1917, o Joshua Benoliel privilegiou estes cenas mais intimistas da separação e da despedida.

De acordo com o censo de 1911, em 5,960 milhões de habitantes, 75,1% eram analfabetos,  (68,4% dos homens e 81,2% das mulheres), com maior predominância nas zonas rurais.

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Nota do editor:

Último poste da série > 4 de janeiro de 2024 > Guiné 61/74 - P25033: Capas da Ilustração Portuguesa - Parte VII: outra foto fabulosa, intimista, do Joshua Benoliel, na partida do CEP para França: uma jovem mulher despede-se do marido (ou do pai ?), com a mãe ao lado, de xaile; olha-o, olhos nos olhos, e com a sua mão direita afaga o pescoço do militar, que era do RI 14 (Viseu)

1 comentário:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Não se consegue perceber bem se o militar está a escrever com caneta ou com lápis...A caneta, o papel e a tinta (em tinteiro) eram três bens preciosos do nossos camaradas do CEP. Náo havia ainda a esferográfica que democratizou a escrita... (Só se irá divulgar nos anos 50). A caneta de tinta permanente era um luxo (se é que já tinha sido descoberta)... E, tal como nós, os nossos camaradas do CEP (aqueles que tiveram a felicidade de andar na escola) aprenderam a escrever com giz, lápis de carvão e depois com caneta aparo, de ponta metálica, que se molhava no tinteiro (e o segredo era não "não morrar a escrita", isto é, o papel).