Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
quarta-feira, 25 de março de 2009
Guiné 63/74 - P4076: Os nossos camaradas guineenses (4): Amadu Djaló, com marcas no corpo e na alma (Virgínio Briote)
terça-feira, 24 de março de 2009
Guiné 63/74 - P4075: O trauma da notícia da mobilização (2): No dia da minha inspecção, ali estava eu, em pelota... (Joaquim Mexia Alves)
Foto: © Joaquim Mexia Alves (2006). Direitos reservados
1. Mensagem do camarigo Joaquim Mexia Alves:
Assunto - O dia da minha inspecção
Meus caros camarigos Luis, Virgínio, Carlos e restantes Atabancados
Nem só de guerra e de tristezas vivem os antigos combatentes, por isso aqui vai uma história para rir, que se passou comigo no dia da minha inspecção.
Alguém se lembra da inspecção e de alguma coisa especial que tenha acontecido durante a dita cuja, para além de ser dia obrigatório de copos?
Pois no dia aprazado, lá compareci no DRM [- Distrito de Recrutamento e Mobilização Militar],em Leiria, que ficava naquela altura junto ao Convento de Santo Agostinho, em frente do antigo Liceu Rodrigues Lobo, (o tal das Éclogas), o que para o caso não interessa nada, mas sempre ficam a conhecer um pouco mais de Leiria.
À data o meu pai era o Governador Civil de Leiria, e como tal, figura bastante conhecida na cidade e no Distrito, obviamente. Isso não impediu, (nem o meu pai era pessoa de permitir excepções), que esta praça lá tivesse de se despir e permanecer em fila para as medições, pesagem e demais exigências de que agora não me lembro.
Passei então à fase de me encontrar todo nu, frente a uma mesa com três ou quatro indivíduos, à qual que presidia um Coronel que me lembrava de já ter visto na casa dos meus pais em Monte Real.
Então não é que o senhor decidiu fazer conversa de circunstância, perguntando pelo paizinho e pela mãezinha, como estavam todos, etc., etc., e eu ia tapando as partes conforme podia, sem saber muito bem o que fazer da minha vida.
Quando começava a entrar em desespero perante a situação, o senhor perguntou-me se eu me queixava de alguma coisa, ao que respondi a correr que não senhor, que era são como um “pero”, e que se não se importasse muito gostaria de me ir vestir e “pôr-me na alheta”.
Ainda esboçou um qualquer gesto de despedida, mas não teve tempo, porque eu apressadamente me baldei para fora da sala, sob os olhares trocistas do resto do pessoal que estava na mesa, e dos outros “mancebos” que assistiam ao acontecido.
Apenas valeu, porque foi motivo para beber mais umas “cervejolas” do que o habitual.
Aqui fica para a posteridade, um relato da minha inspecção, que se calhar os psiquiatras de hoje em dia, (não tenho nada contra os psiquiatras), diriam que me poderia ter traumatizado para a vida inteira....
Abraço camarigo do
Joaquim Mexia Alves
____________
Nota de L.G.:
(*) Vd. primeiro poste desta série > 24 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4072: O trauma da notícia da mobilização (1): A minha mobilização para a Guiné acagaçou-me (Magalhães Ribeiro)
Guiné 63/74 - P4074: O Nosso Livro de Visitas (58): Carlos Ventura, ex-combatente da Guiné da CCAV 3406/BCAV 3854 (Nova Lamego, 1972/74)
Prezado Luis Graça,
Despertado por um amigo ex-combatente em Angola, acedi ao teu blogue, que me surpreendeu pela positiva.
Lamento só hoje a ele ter acedido! Todavia, na vida "é sempre tempo"!
Fui militar miliciano na zona de Nova Lamego (Gabu Sara) entre 1972/74, na CCAV 3406/BCAV 3854. Com pena minha, apenas vi no blogue uma referência ao meu batalhão, referente a um convívio da CCS.
Facto é que, os ex-militares da CCAV 3406 (Cavleiros de Madina) se reúnem anualmente em convívio ininterrupto desde 1980.
Seria para mim um previlégio poder colaborar no teu blogue, através de textos e fotos que fizessem eco da minha unidade.
Todavia não sei como aceder, pelo que agradeço informação nesse.
Parabéns pela iniciativa
Um grande e caloroso Abraço
Carlos Ventura
Coimbra
2. Mensagem de CV com data de 23 de Março, com resposta a Carlos Ventura
Caro Carlos Ventura
Obrigado por teres contactado connosco.
Lamentas que não haja no nosso Blogue nada sobre a história da tua Unidade. A partir de hoje está nas tuas mãos dá-la a conhecer aos tertulianos e leitores do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné.
Para começar, deves enviar uma foto do teu tempo de militar e outra actual, tipo passe de preferência e em JPEG, que irão encimar os teus futuros trabalhos publicados.
Diz-nos qual foi o teu posto militar, tempo de comissão e tudo o que julgues útil para te conhecermos e à tua Unidade.
Podes mandar já uma história e fazê-la acompanhar de fotos devidamente legendadas.
Quando mandares fotos sem texto, fá-las acompanhar sempre de legendas, já que fotos mudas nem sempre dizem alguma coisa. Locais e datas dos acontecimentos são muito importantes.
Pode e deves ler o lado esquerdo da nossa página onde te podes informar dos objectivos do nosso trabalho e das regras elementares de convivência entre os tertulianos.
Toda a correspondência com trabalhos e fotos deve ser enviada para luisgracaecamaradasdaguine@gmail.com.
Por favor não utilizes este endereço para outro fim que não sejam assuntos relacionados com o Blogue.
Este meu endereço (carlos.vinhal@gmail.com) fica também ao teu dispor para assuntos relacionados com o Blogue.
Aguardando notícias tuas, deixo-te um abraço
Carlos Vinhal
Co-editor do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné
__________
Nota de CV
Vd. último poste da série de 5 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3986: O Nosso Livro de Visitas (57): Tony Grilo, Canadá: Artilheiro, apontador de obus 8,8 (Bissau, Cabedu, Cacine, Cameconde,1966/68)
Guiné 63/74 - P4073: Tabanca Grande (126): Tony Grilo, Artilheiro, Apontador de obús 8,8 (Guiné, 1966/68)
Amigo Graça e todos os camaradas da tabanca grande:
Cá estou a dar resposta ao teu e-mail, embora um pouco atrasado, mas não esquecido dos camaradas.
Agora vou dar resposta às tuas perguntas.
Sou natural do Alto Alentejo, duma terra chamada Barbacena a 15km de Elvas.
Vivi e cresci em Belém, Cascais, Cabo Espichel e por último na Rua Lopes Alto S. João - Lisboa.
Emigrei para o Canadá em 1972, onde tenho residido atá hoje.
A pouco e pouco tenho já contacto com alguns camaradas da 1427 e 1614.
Obrigado à TABANCA GRANDE.
Por hoje é tudo. Aí vão umas fotos, depois mando a história, pois estou indo através do meu diário, pois já são muitos anos, quero e tenho que ler. Tudo o que tenho escrito, dava para fazer um livro.
Um forte abraço para todos os camaradas.
Para ti um forte abraço.
Tony Grilo
2. Comentário de CV
Caro Tony Grilo
Muito obrigado pelo teu contacto.
Estás oficialmente apresentado à tertúlia, faltando apenas uma foto tua antiga.
Vê se nos arranjas uma foto das antigas onde estejas em grande plano para que possamos fazer uma foto tipo passe, como a que editei para a tua actual.
Quando nos enviares fotos, por favor manda sempre as respectivas legendas com a data, local e acontecimento para as podermos enquadrar nas histórias enviadas.
As que foram hoje publicadas vinham com pouca qualidade e sem acompanhamento das respectivas legendas.
Aguardamos próximas notícias tuas. Até lá recebe um abraço de boas-vindas da tertúlia.
Votos de boa saúde por essas lindas terras do Canadá.
Carlos Vinhal
__________
Nota de CV
(*) Vd. poste de 5 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3986: O Nosso Livro de Visitas (57): Tony Grilo, Canadá: Artilheiro, apontador de obus 8,8 (Bissau, Cabedu, Cacine, Cameconde,1966/68)
Vd. último poste da série de 9 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4003: Tabanca Grande (125): Júlio Pinto, ex-2.º Srgt Mil da CART 1769/BART 1926 (Angola, 1967/69)
Guiné 63/74 - P4072: O trauma da notícia da mobilização (1): A minha mobilização para a Guiné acagaçou-me (Magalhães Ribeiro)
Boa noite amigos tertulianos,
Acabo de inserir o seguinte comentário, que abaixo anexo, no post P4053(*) do José Silva, e gostava que quem quisesse comentar o fizesse à vontade para este meu mail, nomeadamente se se lembrarem do trauma do dia da mobilização, obrigados!
Já sei que alguns se embriagaram.
Um abraço amigo do MR
"Não sei o José Silva é associado da Associação Portuguesa de Veteranos de Guerra, cuja Delegação do Porto tem morada em Miragaia.
Em caso afirmativo aconselho-o a deslocar-se lá, e marcar consulta com o psicólogo que ali atende semanalmente ex-Combatentes com stress pós-traumático de guerra, a fim de entregar cópia do seu processo clínico, para que o seu problema seja levado a outras instâncias.
Também me parece que existe no Hospital Militar do Porto, possibilidade de marcação de consulta para ex-Combatentes com stress pós-traumático de guerra, onde o José deve apresentar o historial das suas doenças e perguntar o que deve fazer para o tratarem como deve ser.
Tem sido fácil desmascarar alguns oportunistas dos tais a que o J.S. se refere, desde logo por não possuírem passado clínico devidamente comprovado nos últimos 30/40 anos, pois quem sofre desta doença não pode ser desde ontem apenas.
Ao falar-se de doentes com stress, eu tenho a minha opinião pessoal perfeitamente formada e passo a contar-vos.
Eduardo Magalhães Ribeiro, Pira de Mansoa, arreando pela última vez a Bandeira de Portugal em Mansoa
2. Afinal onde se iniciava o tão doentio stress pós-traumático?
Era só quando o pessoal caía debaixo de fogo?
Tinha 21 anos (penso que hoje a maioria dos putos com 21 anos tem a mentalidade que nós tínhamos com 12/13 no nosso tempo), quando acabei a Especialidade em fins de 1973 segui para o RI16 em Évora.
Ali se foram juntando centenas de outros camaradas oriundos das mais diversas Unidades, com as mais diversas Especialidades.
Para quê todos nós sabemos. Serem mobilizados (carne para canhão como se dizia à boca cheia). Alguns para dar/receber mais alguma instrução.
Formar Batalhões. Guia de marcha: Ultramar (sendo os mais temidas mobilizações para Angola, Moçambique e Guiné).
E se uns eram mais fortes que outros e aparentavam serenidade nestes períodos, outros haviam que nem queriam ouvir nada, para não se sentirem mal. Quando saiu a mobilização do meu Batalhão houveram alguns que me pediram para eu ir ver se o nome deles constava da lista. Por medo ou superstição? Não lhes perguntei!
Mas a grande maioria consciente dos riscos que envolvia a guerra, entre eles malta já casada e com filhos como eu, devorava e espalhava as notícias que chegavam ao quartel, por cartas ou por telefonemas.
As notícias ÚNICAS que nos interessavam e OBCECAVAM, todos os dias, horas e momentos, eram as que nos chegavam das diversas frentes de guerra: - Anteontem morreram mais 2 em Moçambique, ontem morreram mais 3 em combate na Guiné e hoje morreu mais um na Angola. Este mês já morreram 60.
Doentio não é!
Então meus amigos permitam-me concluir, porque disso sou testemunha viva, que, desde logo, para muitos dos mobilizados, foi aí que se iniciou o stress-traumático, como é lógico, de intensidade pessoal variável. Era bem patente em alguns que algo não estava bem, quer através das conversas, quer através da mudança de atitudes e hábitos como a súbita procura de isolamento, a perda de comunicação e a busca de silêncio.
Outros exteriorizavam terríveis crises de ansiedade, por vezes denunciadas pelo choro e, ou, por lancinantes e dolorosas lamentações.
Outros ainda confessavam tímida e envergonhadamente que durante as tentativas para dormir, eram assolados por terríveis pesadelos.
Enfim, talvez por ser filho de tropa e ter visto o meu falecido pai ser mobilizado e preparar os tarecos umas 5 vezes (3 em Angola e 2 em Moçambique), não me custou por aí além.
Mas como não sou de ferro, é claro que a mobilização para a Guiné acagaçou-me, até que aconteceu o 25 de Abril. Mas não fugi e fui para Cumeré, Mansoa e Brá.
Tive sorte, mas cumpri a minha parte!
Para dizer a verdade, não há dia que não fale na Guiné e na guerra.
Se isto não é stress pós-traumático, é pelo menos um sintoma que me incomoda e incomoda os que me rodeiam, fartos de ouvirem falar desta tara!
Magalhães Ribeiro"
3. Comentário de CV
Por sugestão do nosso camarada Magalhães Ribeiro e até por sua iniciativa, porque nos mandou um artigo com as suas próprias impressões, inauguramos uma série destinada a um momento muito importante das nossas vidas de militares, aquele em que ficámos a conhecer o TO que nos estava destinado.
Quem quiser, pode desde já enviar trabalhos traduzindo aquilo que foi para si o momento em que soube que ia para a Guiné. Como encarou a situação, como deu conhecimento à família, como viveu esses tempos até ao embarque, etc.
Muito importante era a Especialidade e o Posto de cada um, situações estas que determinavam, e de que maneira, o modo como se via a situação.
Os nossos Cap Mil têm mais uma vez a hipótese de se fazerem ouvir, uma vez que foram dos homens mais sacrificados entre os milicianos, tendo sido literalmente arrebatados à família, já constituída, para irem, com um mínimo de preparação, assumirem a responsabilidade de conduzirem a vida de mais de centena e meia de vidas, durante bastante tempo, numa guerra que desconheciam, debaixo das mais adversas condições de terreno, clima, carência e muito mais.
Esperamos a colaboração de todos para que nos possamos ficar a conhecer um pouco melhor.
__________
Nota de CV
(*) Vd. poste de 19 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4053: Blogoterapia (98): José Silva, um camarada com muita falta de sorte
segunda-feira, 23 de março de 2009
Guiné 63/74 - P4071: Historiografia da presença portuguesa em África (18): Lembram-se deste(s) mapa(s) escolar(es) ? (Magalhães Ribeiro)
Mapa de Portugal Insular e Ultramarino, edição de 1939. (Em cim, três pormenores: os mapas de Moçambique, Angola e Guiné). Este material cartográfico equipava as salas de aula das nossas escolas primárias. Lembro-me que havia um destes, na Escola Conde de Ferreira, na minha terra, Lourinhã, onde recebi a instrução primária (1954/58). Como eu fazia anos em Janeiro, só pude matricular-me no ano lectivo de 1954/55...
Mas lembro-me do mapa e da lição do Livro de Leitura da 3ª Classe... E lembro-me do crucifixo, por detrás e por cima da cadeira da Profª Dona Helena, tendo do lado direito um enorme quadro preto e um não menos enorme estrado de madeira... Vigilantes e severos, entre o crucifixo, os retratos, a preto e branco, dos mais altos magistrados da Nação: Salazar e Carmona... E lembro-me ainda da menina dos cinco olhinhos e do temível ponteiro que caía, implacavel sobre a cabeça do pobre ignorante, que não sabia qual das cidades era a capital da Guiné: Bolama ? Bissau ?
Livro de Leitura da 3ª Classe > Portugal é grande (pp. 17-18)
(...) Se observarmos num mapa a situação de tudo o que é nosso, reconheceremos logo que Portugal tem possessões em quase todas as partes di mundo.
A língua portuguesa é falada em todas esses vastos territórios e também no Brasil, que, descoberto e colonizado por nós, se tornou nação independente no século XIX.
Ao vermos a enorme extensão do Império Português, admiramos o heroísmo com que os nossos antepassados, - sábios, marinheiros, soldados e missionários -, engrandeceram a Pátria. Por ela atrvessaram mares desconhecidos, sofreram as inclemências de climas insalubres e travaram lutas cruéis em paragens longínquas.
Aprendamos a lição do seu esforço para amar e servir, como eles, a nossa querida Pátria.
Lá aprendi , pelo menos, a localizar, no mapa da África negra, misteriosa e imensa, terra de leoões, de canibais e do Tarzan, o minúsculo território da Guiné (a par de outras "possessões ultramarinas", mais suculentas, como a Angola, em que as pedras se chamavam diamantes)...
Mas estava longe de imaginar, no ano lectivo de 1956/57, que doze anos depois, em meados de 1969, eu iria também seguir as peugadas dos meus ilustres antepassados, "atravessar mares desconhecidos, sofrer as inclemências de um clima insalubre e travar lutas cruéis em paragens longínquas" - a 5 mil quilómetros de casa...
Mais cruel, para mim, foi chegar a Contuboel, e porem-me a dar instrução militar a uns pobres fulas que não falavam a minha língua materna e que, por sua vez, nos chamavam tugas, quando se zangavam a sério connosco. Também não foi lá muito divertido mandarem-me, a seguir, para Bambadinca para fazer a guerra com estes tipos (nharros, rosnavam alguns de nós por entre dentes) que nem sequer sabiam onde ficava Lisboa, Coimbra ou Porto... No final, fiquei amigo deles e a temer pelo seu futuro... LG
Imagem: Cortesia do nosso camarada Magalhães Ribeiro (2009). Copyleft
Ficha Bibliográfica (visualização ISBD)
[533284] PORTUGAL INSULAR E ULTRAMARINO
Portugal insular e ultramarino [Material cartográfico]. - Escalas 1:165000 - 1:20000000. - Gaia : Lito. Lusitana, [1939]. - 1 mapa : color. ; 99,00x72,50 cm, em folha de 104,00x77,00 cm http://purl.pt/11441.
- O documento contém os seguintes mapas: Mapa 1: "Açores" - Escala 1:2500000. - Mapa 2: "Possessões da Índia" - Escala 1:20000000. - Mapa 3: "Damão" - Escala 1:600000 . - Mapa 4: "Goa" - Escala 1:400000. - Mapa 5: "Madeira" - Escala 1:650000 . - Mapa 6: "Cabo Verde" - Escala 1:2400000 . - Mapa 7: "Diu" - Escala 1:185000. - Mapa 8: "Guiné" - Escala 1:340000. - Mapa 9: "S. Tomé e Priíncipe" - Escala 1:800000. - Mapa 10: "Macau" - Escala 1:165000. - Mapa 11: "Timor" - Escala 1:5000000. - Mapa 12: "Angola" - Escala 1:6000000. - Mapa 13: "Moçambique" - Escala 1:6000000
__________
Nota de L.G.:
(*) Vd. poste anterior desta série > 12 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3878: Historiografia da presença portuguesa (18): O sítio Memória de África ® (Afonso Sousa)
Guiné 63/74 - P4070: Agenda cultural (4): Exposição de pintura de Neves e Sousa na Livraria-Galeria Verney, Oeiras (Mário Beja Santos)
Luís,
Na Biblioteca Verney, em Oeiras, está exposta até 24 de Maio uma exposição de Neves e Sousa(*) onde aparece esta imagem que o pintor ofereceu a Manuel Barão da Cunha, e que está patente ao público. Solicitei autorização aos serviços para poder ser reproduzida no nosso blogue.
Infelizmente, são ainda muito poucos os artistas plásticos que falaram sobre a nossa guerra. Quando quiseres, podes inseri-la.
Um abraço do Mário
Imagem de Neves e Sousa, "Ferido em combate", do livro Tempo africano, de Manuel Barão da Cunha
2. Alguns dados bibliográficos de Neves e Sousa
Poeta e pintor português, Albano Silvino Gama de Carvalho das Neves e Sousa nasceu em 1921, em Matosinhos, e faleceu em 1995, em São Salvador da Baía, no Brasil.
Desde muito cedo foi viver para Angola e, depois de 1975, para o Brasil.
Cursou pintura na Escola Superior de Belas-Artes, no Porto, vindo a pintar temáticas africanas e temáticas locais angolanas. Visitou vários países como Cabo verde, Guiné, Moçambique e São Tomé e Príncipe.
Publicou livros de poesia, como Motivos Angolanos (1946), Mahamba. Poesias 1943-1949 (1949), Muênho (1968), entre outros, e está incluído em algumas antologias, tal como Antologia Poética Angolana (1963), Presença do Arquipélago de S. Tomé e Príncipe na Moderna Cultura Portuguesa (1968) e Angolana (1974).
Recebeu, em 1963, a Comenda da Ordem do Infante D. Henrique pelo Governo de Portugal, em 1970, a Honorary Mention - International Design Exhibition, em Rijeka (Jugoslávia), em 1974, em Nápoles, Itália, a medalha de ouro de Designers da Academia Ponzen e, em 1993, de novo pelo Governo português, a Comenda da Ordem de Mérito.
Algumas das obras picturais do "pintor angolano", como é conhecido, podem ser vistas em várias exposições e no Hospital Português da Bahía (Brasil).
Dados recolhidos na Infopédia, com a devida vénia. (CV)
3. Neste endereço do Youtube poderão apreciar algumas obras de Neves e Sousa:
http://www.youtube.com/watch?v=98FBJy7ieEo
(CV)
__________
Nota de CV
Vd. último poste da série de 8 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3997: Agenda cultural (3): O pintor Manuel Botelho no semanário "Sol". V. Briote
domingo, 22 de março de 2009
Guine 63/74 - P4069: Portugal, sociedade multicultural, a correr n Ponte 25 de Abril (Luís Graça)
Ponte 25 de Abril > 19ª Meia Maratona de Lisboa e Mini Maratona Vodafone > 22 de Março de 2009 > Uma festa popular, que reuniu mais de 35 mil, de todo o país, desde Baião a Estremoz, mas também do estrangeiro (Pode até mesmo dizer-se que o espanhol era a segunda língua mais falada, na travessia da Ponte). Partida da portagem da ponte, chegada frente ao mosteiro dos Jerónimos, em Belém...
Enquanto fazia horas, convivi com dois professores de música (o Lage e o Paulo Marinho) de um dos colégios da Casa Pia que animam um grupo de gaitas de foles e caixas, composto por alunos (externos) daquela instituição, onde há miúdos com diversas origens, filhos de pais caboverdeanos, guineenses, angolanos, brasileiros, portugueses... Fizeram toda a mini-maratona (c. 7,2 km) em marcha, a tocar, transmitindo uma alegria contagiante... e a lembrar que Portugal é uma sociedade multicultural (Quem disse que nós, ex-combatentes da guerra colonial, fomos os coveiros do Império ? Por que não também os parteiros de uma nova sociedade, aberta, plural, solidária ?)...
É uma ternura e uma alegria ver um puto, português, de origem caboverdeana, a tocar gaita de foles, um instrumento muito ligado à cultura popular de Trás-os-Montes e Alto Minho, mas que também faz parte do meu imaginário de infância, associado às festas dos camponeses e aos círios na minha Estremadura natal...
Gostei de os conhecer e de conviver duas horas com eles... Este vídeo é uma homenagem a este grupo de gaiteiros e de caixas, casapianos... Deixem-me acrescentar que o Paulo Marinho, um dos históricos do festival Andanças (a que eu me habituei a levar os meus filhos, desde o início) (*) é um dos elementos que integra o conhecido Grupo Gaiteiros de Lisboa, criado em 1991 e que já gravou 5 discos. O penúltimo tem por título Macaréu (Aduf Edições, 2002). Absolutamento obrigatório conhecer, ouvir, comprar.
Segundo percebi, os referidos professores e alunos da Cada Pia estavam ali a tíulo pessoal, não-institucional, embora a sua presença tivesse o apoio da Associação dos Trabalhadores da Casa Pia de Lisboa (recém criada) e da própria administração da CPL.
E, a propósito, não é de mais enaltecer a missão histórica da Casa Pia de Lisboa, a que preside hoje a minha amiga Dra. Joaquina Madeira: "A CPL cumpre a tradição nos objectivos que prossegue há mais de dois séculos: acolher, cuidar, proteger e inserir socialmente as crianças e jovens que experimentam situações de especial desfavor ou vulnerabilidade social, nas suas vidas".
Vídeo (''55): Luís Graça (2009). Copyleft
____________
Nota de L.G.:
(*) O festival Andanças realiza-se anualmente desde 1996. É uma ideia desenvolvida pela PédeXumbo - Associação para a Promoção de Música e Dança. O próximo Andanças 2009 vai decorrer de 3 a 9 de Agosto de 2009, como sempre em Carvalhais, S. Pedro do Sul. Aberto a todas as gerações: netos, filhos e avós... E também a ex-combatentes da guerra colonial. Os meus filhos têm as melhores recordações deste festival que é único...
Guiné 63/74 - P4068: Recordando a tragédia do Quirafo, ocorrida no dia 17 de Abril de 1972 (Luís Dias)
Caro Luís
O camarada Paulo Santiago(*) veio lembrar uma das piores emboscadas que ocorreram na Guiné, em que estiveram envolvidos elementos da CCAÇ 3490, pertencente ao meu Batalhão – o BCAÇ 3872 (Galomaro). Foi um dia terrível, um desastre em que morreram 9 militares, 1 sargento milícia e 2 elementos da população ao nosso serviço, havendo ainda a lamentar diversos feridos e a captura do soldado António Baptista(**) pelos guerrilheiros.
As causas para o sucedido poderiam ser melhor explicadas pelo ex – Capitão Mil Dário Lourenço, se quisesse vir ao nosso blogue elucidar-nos sobre os detalhes que determinaram o avanço da coluna naquela maldita segunda-feira, dia 17 de Abril de 1972, dado que o Comandante da Operação foi morto em combate na emboscada que se sucedeu.
Não tendo essa possibilidade, resta-nos falar do que passou a constar no nosso batalhão.
A CCAÇ 3491/BCAÇ 3872 recebeu ordens para reabrir a picada Dulombi - Jifim, que se encontrava em mau estado de conservação, porque deixara de ser utilizada, após o rebentamento de uma mina anti-carro que causou mortos na Companhia que fomos render – a CCAÇ 2700 – e, em Abril de 1972, iniciou essa tarefa, empenhando diariamente um Grupo de Combate na protecção dos trabalhos, em que estavam envolvidos elementos civis contratados para esse fim.
Também a CCAÇ 3490/BCAÇ3872 (Saltinho) recebeu ordens, na mesma altura, para reabrir a estrada Quirafo – Rio Cantoro.
A Operação Estrada Junta iniciou-se, ao que presumo, em 10 de Abril de 1972. Diariamente foram cumpridas as tarefas, com mais ou menos dificuldade, embora sem quaisquer problemas operacionais até ao dia 18 de Abril. De facto, na zona em que rebentou uma mina anti-carro que matou elementos da CCAÇ 2700 e no meio da picada, foi detectada e levantada uma mina anti-pessoal PMD-6, pelo 2.º GComb (por mim comandado).
A mina fora colocada naquela parte da picada (ao meio) em que o capim cresce melhor, dificultando a hipótese de ser detectada. Na realidade, caso fossemos em patrulha pelo local, poderíamos estar a lamentar uma desgraça. Eu próprio estive com um pé muito perto dela, porque estava a ouvir os elementos das milícias a explicarem o que sucedera naquele local aos camaradas da 27$00. Só que prossegui e um dos elementos civis que vinha a efectuar a capinagem da estrada, logo atrás, bateu com a ponta da catana na madeira da mina, sendo então esta detectada e levantada com os habituais cuidados para estas situações.
A emboscada do Quirafo dera-se na véspera e estávamos todos consternados pela morte de tantos camaradas da CCAÇ 3490 e eu muito especialmente porque me dava muito bem com o Alf Mil Op Esp Armandino Ribeiro (um dos mortos naquele combate), porque quer em Abrantes, quer no IAO na Guiné, tínhamos treinado acções em emboscadas e reacção às mesmas, com os nossos Grupos. Logo a seguir foi dada ordem para pararmos com os trabalhos, ao que parece por iniciativa do próprio Comandante-Chefe, ficando a reparação da estrada por terminar, embora tivesse sido muito pouco utilizada posteriormente (unicamente em uma ou duas Operações em que foram envolvidas forças dos pára-quedistas e em que houve necessidade de os colocar e recolher nas zonas mais perto do Rio Corubal).
Mas este relato prende-se, essencialmente, para referir um facto. No nosso caso, iniciaram-se os trabalhos de arranjo da estrada e quando chegámos ao fim-de-semana, as ordens foram de non-stop, ou seja mantivemo-nos sempre a trabalhar (Sábado e Domingo) o que parecia já ser uma tradição, porque também na nossa primeira Operação, após a saída dos velhinhos, na qual tivemos o primeiro contacto com o inimigo, se iniciara a mesma num fim-de-semana.
Infelizmente, no caso do Quirafo, de má memória, a CCAÇ 3490, parou os trabalhos na 6.ª Feira, para os reiniciar na 2.ª Feira fatídica de 17 de Abril, dando a possibilidade do IN organizar a emboscada, com recurso, inclusive, a um canhão sem recuo, tendo o fim-de-semana todo para escolher o local e estabelecer o plano de fogos para a zona de morte.
E aqui alguma coisa nos escapa, o porquê desta decisão? As circunstâncias que levaram o Comando a ordenar o avanço da coluna de trabalhos se, segundo alguns dizem, sabiam que alguém vira o IN nas imediações e estavam alertados para este facto. Sei que o Armandino era uma pessoa generosa, disciplinada, imbuída do espírito do cumprimento dos deveres militares – um Ranger - e que talvez nessa sua vontade de efectuar o serviço que estava previamente determinado, não tenha feito a correcta avaliação da situação, ou não tenha achado credível a informação obtida e o seu avanço com o seu GCOMB reforçado para o Quirafo, tenha sido feito sem as cautelas que, face às informações aparentemente disponíveis, se impunham, nomeadamente um avanço apeado, em vez de motorizado e ainda uma melhor distribuição do seu pessoal, talvez difcultasse aquele tipo de emboscada. Quem sabe... o que teria sido melhor?
A emboscada ainda poderia ter feito mais mortos, pois as viaturas não chegaram a cair totalmente na denominada zona de morte, dado que o condutor da primeira viatura avistou um elemento IN e lançou a viatura para a berma da estrada e a outra conseguiu retroceder e fugir da zona.
Este desastre deu-nos algumas lições, nomeadamente a sair com viaturas com os taipais erguidos, como acontecia na segurança que se fazia na estrada Piche-Buruntuma, em que o 3.º GComb da nossa Companhia quando ali esteve de apoio ao Batalhão daquela área, chamou a atenção para que as viaturas tivessem, como já era habitual em outros locais, os taipais retirados e os bancos colocados ao meio.
O nosso Batalhão chegara à Guiné em 24 de Dezembro de 1971 e aos seus locais de destino um mês depois do IAO no Cumeré. Em Abril de 1972 (em apenas 3 meses), depois da emboscada no Quirafo, o Batalhão sofrera 4 mortos em Cancolim (1 numa mina a/c e 3 numa flagelação ao aquartelamento da CCAÇ 3489) e 9 na emboscada do Saltinho (CCAÇ3490), tendo a CCAÇ 3491, tido a sorte de não ter sofridos baixas no contacto/emboscada sofrido em 11 de Março, na área de intervenção do Dulombi, ao seja 13 mortos em tão pouco tempo de Guiné.
No fim da comissão, já em Bissau, o Comando do Batalhão foi alertado por um soldado da CCAÇ 3489 (Cancolim), que fora feito prisioneiro do PAIGC e que conseguira evadir-se, que lhes referiu que o soldado António Baptista, dado como morto em combate na emboscada do Quirafo, estava vivo e era prisioneiro do PAIGC.
Nesta altura, apenas uma prece por todos aqueles que tombaram no Quirafo. Paz às suas almas.
Luís Dias
Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Saltinho > Picada de Quirafo > Fevereiro de 2005 > Restos da GMC da CCAÇ 3490 (Saltinho, 1972/74), do BCAÇ 3872 (Galomaro, 1972/74) que transportava um grupo de combate reforçado, comandado pelo Alf Mil Armandino, e que sofreu uma das mais terríveis emboscadas de que houve memória na guerra da Guiné (1963/74).
Quinta do Paul, Ortigosa, Monte Real, Leiria > 17 de Maio de 2008 > III Encontro Nacional da Nossa Tertúlia > Um convidado especial, que veio de Matosinhos, trazido pelo Álvaro Basto: o nosso tertuliano António Batista da Silva, a quem chamamos, com ternura, o morto-vivo do Quirafo.
__________
Nota de CV:
(*) Vd. poste de 18 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4046: Ainda a atroz dúvida da Cidália, 37 anos depois: O meu marido morreu mesmo na emboscada do Quirafo ? (Paulo Santiago)
(**) Sobre o caso António Batista vd. postes de:
26 de Maio de 2008 > Guiné 63/74 - P2885: O Nosso III Encontro Nacional, Monte Real, 17 de Maio de 2008 (9): António Batista, ex-prisioneiro de guerra
25 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2680: O caso do nosso camarada António Batista (Carlos Vinhal / Álvaro Basto / Paulo Santiago e Pereira da Costa)
1 de Fevereiro de 2008 Guiné 63/74 - P2497: O dossiê António da Silva Batista: um caso de indignidade humana (Torcato Mendonça)
31 de Janeiro de 2008 Guiné 63/74 - P2494: Sr. Ministro da Defesa, parece que não há Simplex que valha ao António da Silva Batista! (Paulo Santiago)
8 de Janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2422: Quem terá sido o Camarada que ficou na campa do António Baptista? (Prisioneiros de Guerra) (Virgínio Briote)
25 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2381: Diana Andringa, com o teu apoio, podemos ajudar o António Batista, o morto-vivo do Quirafo (Álvaro Basto)
21 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2371: O Sold António Baptista não constava das listas de PG (Prisioneiros de Guerra) (Virgínio Briote)
28 de Setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2140: Tabanca Grande (35): Notícias do Tony Tavares (CCAÇ 2701) e do António Batista (CCAÇ 3490) (Ayala Botto)
9 de Agosto de 2007 > Guiné 63/74 - P2040: No almoço da tertúlia de Matosinhos com o António Batista, o nosso morto-vivo do Quirafo (Paulo Santiago)
30 de Julho de 2007 >Guiné 63/74 - P2011: Vamos ajudar o António Batista, ex-Soldado da CCAÇ 3490/BCAÇ 3872 (Júlio César / Paulo Santiago / Álvaro Basto / Carlos Vinhal)
26 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1999: Vamos arranjar uma caderneta militar nova para o António Batista (Rui Ferreira / Paulo Santiago)
24 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1991: O Simplex, o Kafka e o Batista ou a Estória do Vivo que a Burocracia Quer como Morto (João Tunes)
24 de Jullho de 2007 > Guiné 63/74 - P1990: Carta aberta ao Cor Ayala Botto: O caso Batista: O que fazer para salvar a sua honra militar ? (Paulo Santiago)
23 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1986: António da Silva Batista, o morto-vivo do Quirafo: um processo kafkiano que envergonha o Exército Português (Luís Graça)
22 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1985: Prisioneiro do PAIGC: António da Silva Batista, ex-Sold At Inf, CCAÇ 3490 / BCAÇ 3872 (2) (Álvaro Basto / João e Paulo Santiago)
22 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1983: Prisioneiro do PAIGC: António da Silva Batista, ex-Sold At Inf, CCAÇ 3490 / BCAÇ 3872 (1) (Álvaro Basto / João e Paulo Santiago)
21 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1980: Blogoterapia (26): Os nossos fantasmas, os nossos Quirafos (Virgínio Briote / Torcato Mendonça/Luís Graça)
17 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1959: Em busca de... (2): António da Silva Batista, de Crestins-Maia, o morto-vivo do Quirafo (Álvaro Basto / Paulo Santiago)
Notas de L.G.:
Sobre a tragédia do Quirafo, vd. postes de:
21 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1980: Blogoterapia (26): Os nossos fantasmas, os nossos Quirafos (Virgínio Briote / Torcato Mendonça/Luís Graça)
17 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1962: Blogoterapia (25): Os Quirafos do nosso Passado (Torcato Mendonça / Virgínio Briote)
12 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1947: O Coronel Paulo Malu, ex-comandante do PAIGC, fala-nos da terrível emboscada do Quirafo (Pepito / Paulo Santiago)
15 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1077: A tragédia do Quirafo (Parte V): eles comem tudo! (Paulo Santiago)
28 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P1000: A tragédia do Quirafo (Parte IV): Spínola no Saltinho (Paulo Santiago)
26 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P990: A tragédia do Quirafo (parte III): a fatídica segunda-feira, 17 de Abril de 1972 (Paulo Santiago)
25 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P986: A tragédia do Quirafo (Parte II): a ida premonitória à foz do Rio Cantoro (Paulo Santiago)
23 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P980: A tragédia do Quirafo (Parte I): o capitão-proveta Lourenço (Paulo Santiago)
Guiné 63/74 - P4067: Os nossos camaradas guineenses (3): Amadu Djaló, Fula de Bafatá, comando da 1ª CCA, preso, exilado... (Virgínio Briote)
Como é do vosso conhecimento, tenho entre mãos as Memórias do Amadu Djaló.
São quatro maços A4, de um lado e doutro, escritos pela mão dele, em letra grande. Do mal o menos. Sempre seguido, nada de vírgulas nem pontos, tudo de rajada. A escrita é de um negro, com muito pouca instrução escolar, como a maioria que conviveu connosco. Mas escrita de dentro de uma Alma grande, com sabedoria, com o senso e a inteligência, que muitas vezes presenciámos naqueles nossos companheiros de armas.
Ver o Amadu a descrever as peripécias em que se envolveu, está a ser muito mais que um descobrimento. Não me vêm as lágrimas aos olhos, mas em cada linha do que escreve é como se eu tivesse estado lá também. E em duas ou três, estive. Nas outras, felizmente para mim, ainda bem que não.
Estou a ver toda a vida dele na cidade natal, Bafatá, a conviver com o Pai, a Mãe, alguns Irmãos, o Avô e amigos mais chegados...A ir e a regressar, acompanhando um primo, feito djila como ele, ao Senegal.
A hesitar na incorporação, a tentar adiar, enquanto abria uma banca para negociar, no Mercado de Bafatá. Não pôde evitar. Fugir não fazia parte da sua maneira de ser, nem lhe cabia na cabeça deixar os Pais e a Família, para trás. Ainda faltavam uns anos para começar a guerra, mas já havia cheiro a pólvora no ar.
Depois da recruta em Bolama, as deambulações, como condutor por Cacine, Bedanda, Catió, Cufar, Farim, entre 62 e 64. Já havia minas, emboscadas, abatizes. Mas ainda era possível ir de Farim a Susana, em coluna, em viagens intermináveis.
Farto de o porem à frente, como 'rebenta minas', não só por medo, mas por uma atitude, que achou prepotente, de um alferes, sobrinho (?) do Governador Schulz, pediu a transferência para a 4ª Rep, do QG, em Bissau.
Foi-lhe concedida. No parque das viaturas da CCS do QG teve a sorte e o contentamento de encontrar o seu amigo, o Tomás Camará, que estava no Gr Cmds do então alferes Saraiva.
Comandos? Que é isso de 'comandos de Saraiva'?
Não precisou de muitas respostas, para uns tempos depois, estar em Madina do Boé com o grupo. Para participar e de que maneira num acontecimento que o marcou para sempre: a mina em Madina, que matou toda a gente, menos um, que vinha na 2º e última viatura.
Um grupo de 20 homens, repartido em duas viaturas, de um momento para o outro, estava reduzido a metade. Não podiam ir todos buscar socorro a Madina, a 30 kms de distância. Alguém tinha que ficar ali, a amparar os feridos, a ficar com os mortos.
Uma das equipas dos "Fantasmas", antes de Madina do Boé. Sold. ??, Carreira (único sobrevivente), Furr Artur, Sold Artur e Sold Godinho.
Uma tarde que pareceu um ano, junto à estrada para Madina, a assistir ao morre este, agora aquele, atè à noite, quando chegou o socorro.
Depois, foram ao Como. Outra odisseia. O 'grupo de Saraiva' despedia-se numa operação, a que puseram o nome de 'Ciao'. Tudo correu bem a princípio. Depois, já na retirada, o alferes Saraiva não quis sair de lá sem trazer a MP, que alguns afirmavam ter sido usada contra eles. Obrigou-os a voltar a um acampamento em chamas. Dos dez que se 'ofereceram' para voltarem ao acampamento, um morreu, com a comissão terminada há que tempos, e todos os outros ficaram feridos.
GrCmds "Fantasmas", no regresso de uma op. no Sul. Amadu Djaló está sentado, de quico na cabeça, ao lado do Tomás Camará, seu grande amigo. Vê-se também o João Parreira, na fila superior, de óculos escuros.
E, logo dois ou três dias depois, foram para o Oio e a história quase se repetiu. Porque a guerra é assim, é feita assim, de repetições, 'os que morreram já não morrem outra vez, morrem outros, os feridos é que podem ter mais sorte, podem voltar a ser feridos outra vez'.
Depois, o 'grupo de Saraiva' acabou e o Amadu achou que já era tempo de ter um pouco de paz. Afinal era um condutor encartado e era mais antigo que muitos. E como condutor ganhava mais 150 escudos que nos comados de Brá e, na altura, 150 escs. dava para comprar muito arroz.
Até que apareceu lá na 4ª Rep, um alferes, o Luís Rainha, do grupo 'Centuriões', que tinha substituído o 'grupo de Saraiva', com uma autorização da 1ª Rep para o levar, outra vez, para os comandos de Brá.
Foi. E logo, dois ou três dias depois, entrou numa nomadização, prevista para durar 48 horas, na zona de Faquina Mandinga, Sitató, na fronteira com o Senegal. Uma nomadização feita num golpe de mão. Entraram por um acampamento, sem ele e os companheiros, em que se incluíu este escriba, terem sido convidados.
O 1º heli-assalto na Guiné foi em Jabadá Beafada, em 06 Mar66. O Amadu, com mais 15 homens do grupo do Rainha também foi, a reforçar o meu grupo.
E, outra vez em Maio, tal como no ano anterior com o 'grupo de Saraiva', nova teimosia, desta vez do Rainha. Ao mesmo acampamento, no Como, para vingar as baixas que o 'grupo de Saraiva' tinha tido no ano anterior. Trouxeram armas e a pistola linda, de coronha nacarada, do Pansau Na Ina e o chapéu chinês dele, também.
Depois a CCmds do CTIG acabou. E sempre que a unidade acabava, ou alguma coisa não lhe agradava, o Amadu pedia transferência. Para a 4ª Rep, a sua eterna casa-mãe.
Tempos depois, estava em Bafatá, quando chegou uma ordem de Spínola para todos os cmds guineenses se concentrarem em Bissau, para fazerem provas e novo curso para a constituição da 1ª CCmds Africanos.
Depois de muito esforço nos treinos, começaram as operações com o capitão João Bacar Djaló, comandante da 1ª CCmds Africanos. A morte do capitão em Jufa (?) abanou-os a todos, não foi só ao Amadu. Estavam em Brá, quando chegou a má notícia. Correram logo para o Hospital Militar, a confirmarem se era verdade. Encontraram-se à entrada do HM 241 com o General Spinola. Depois, seguiram-no pelo corredor até a uma sala, onde estava depositado o corpo do João Bacar. O General levantou o lençol que cobria o capitão e eles espalharam-se pelos corredores a chorarem.
Seguiu-se a formação do BCmds com o capitão Almeida Bruno...seguiu-se Fá Mandinga, Bambadinca...
Eram ops atrás de ops. Uma vez foram a Morés, sob o comando do capitão Zacarias Saiegh e sofreram uma terrivel derrota, talvez a maior de todas que os cmds tiveram em toda a guerra na Guiné, com um saldo 'completamente' negativo, de 5 mortos e um nº de feridos, que ninguém se lembrou de contar. Uma azelhice, fruto de fanfarronice que só não acabou pior porque o Almeida Bruno foi para lá com 'lobos maus' e com quase toda a esquadrulha dos ALL para os tirar de lá de qualquer maneira e, talvez também, porque o IN já estava saciado.
E outra e mais outra ida a Morés, as três idas a Coboiana (com um pormenor, passado ao radio, com o Cor Rafael Durão, que seria delicioso, se não tivesse acabado, quase como nos cajueiros, em Morés, com a 1ª CCmds Africanos sem oficiais, todos atingidos e a cª entregue ao Sargento mais antigo, o Amadu Djaló).
Chegou a informação que o Amílcar Cabral estava com jornalistas, de visita à zona libertada de Madina. Pegaram neles e largaram-nos na zona, três dias, sem nada para comer e com água a ferver nos cantis. No regresso, desmaiaram quatro soldados, que saíram em macas dos aviões. Depois foi Gandembel...
Estavam em 'estranhos' preparativos no mar e na ilha de Soga e ficaram muito surpreendidos qiuando lhes disseram para quê. Houve recusas e hesitações que só terminaram depois das intervenções do Comandante Calvão e, principalmente, com a visita e o curto discurso do próprio Spínola.
A mudança das fardas e das armas, a partida para uma Conacri, em fim de semana, e o episódio do regresso a Bissau, após uns longos 15 dias, que nunca mais acabavam, com eles em Soga, sem saberem o que fazer, e aparentemente, também sem alguns superiores saberem como deveriam proceder com eles.
E Kumbamory, com o capitão Carlos Matos Gomes, ops atrás de ops.
E depois, porque a 'guerra é feita de muitos depois, não é?', o 25 de Abril, que alterou tudo.
A entrega das armas, a vida civil sem amigos, as prisões dos camaradas, os fuzilamentos, o caso dos 90 e tal mortos, em Farim, abafados nos antigos paióis da tropa portuguesa, a prisão dele e a escapadela numa hora que só costuma acontecer uma vez na vida de um homem, graças a um acto digno e cavalheiresco de um comandante do PAIGC.
A Bissau do Luís Cabral, em 1975, era uma cidade triste, com recolheres obrigatórios, denúncias, falta de arroz, falta de tudo, menos de 'milho para burro', que um país amigo lhes enviara num navio.
O golpe do Nino foi o renascer de uma esperança. Depois, a desilusão e a vinda para Portugal.
Uma obra que me empolga. Totalmente absorvido nesta história. Estou a fazer este trabalho, quase a tempo inteiro. A passar para o PC, a correr, todos estes caracteres.
Depois, respeitando o estilo dele, africano, doutra forma perde muito interesse, passo à redacção do texto, talvez eliminando um ou outro capítulo (depende dele) e adicionando outro/s com factos que, ele, ou quer deliberadamente omitir ou resolveu abreviar, como o caso de Conacri.
E, finalmente espero, a redacção 'definitiva', para entregar à Associação de Comandos, para publicação.
Estou a chegar ao fim da 1ª fase. Estou cansado. Mas é uma obra que me está a dar muito gosto fazer. Vou continuar o trabalho do Amadu Bailo Djaló. Sei que estes maços de folhas já andaram por várias mãos, que se cansaram e desistiram. Vou acabá-lo, conforme me foi pedido.
E vou continuar a seguir dia a dia o nosso blogue, com muitos motivos de interesse e satisfeito por termos gente nova e cheia de talento.
Espero e agradeço que me compreendam.
Um abraço grande para ti, para o Carlos e para todos os Camaradas.
vb
_________
1. Vd. poste de 16 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3903: A Compª de Cmds do CTIG, 1965/66. Artigo do General Garcia Leandro na Revista Mama Sume. V. Briote
2. Amadu Bailo Djaló nasceu em Bafatá, em 1940. Aos 14 anos, o irmão mais velho levou-o para Boké, para casa de um tio. A mãe era natural de Boké e o pai de Fulamori, também da República da Guiné-Conackry.
Um ano depois, com a morte do tio, regressou a Bafatá. Aos 16 anos conheceu Bissau e um ano depois Bolama. Desde muito jovem deu sinais de querer ganhar dinheiro e de ser independente. Começou por organizar bailes e festas, juntamente com um primo, para a juventude de Bafatá, a quem cobrava as entradas. As meninas de então chamavam ao Amadu 'Mari Velo'.
Enquanto não foi incorporado, foi trabalhando na construção civil, primeiro no Gabu, como capataz e pouco mais tarde em Bafatá. Estávamos em 1958.~
Depois da recruta em Bolama, seguiu-se o CICA/BAC, em Bissau, depois Bedanda na 4ª CCaç, a 1ª CCaç em Farim, regressou à CCS/QG, depois os Comandos de 1964 a 1966, a CCS/QG outra vez, Bafatá no BCav conhecido pelo 'sete de espadas', a 1ªCCmds Africanos, o BCmds, a CCaç 21, com base em Bambadinca, o 25 de Abril...Nos princípios de Janeiro de 1959, regressou a Bafatá. Como sabia ler e escrever, puseram-no a tomar notas, na campanha da mancarra. Aos 20 anos quis dar um salto, tornar-se verdadeiramente independente. Conseguiu abrir uma banca para negociar no Mercado de Bafatá.
Guiné 63/74 - P4066: Humor de caserna (9): Quando os alentejanos de Jumbembem viram cair-lhes os tomates... a seus pés (Artur Conceição)
Foto: © Artur Conceição (2009). Direitos reservados.
1. Mensagem do Artur Conceição, ex-Sold Trms Inf e Cond Auto, CART 730, Bissorã, Farim e Jumbembém (1965/67):
Caro Luís Graça, Carlos Vinhal e Virgínio Briote
Para dar continuidade à linha dos dois últimos postes, 4064 e 4065 achei que era ocasião de mandar este texto, que já estava escrito faz algum tempo.
Tive o cuidado de seguir as recomendações do Luís Graças que desde já agradeço.
“Fruto do tomateiro é tomate, e não se escreve no plural”
Deixo ao vosso critério o interesse que possa ter.
Um abraço
Artur António da Conceição
Damaia - Amadora
2.Humor de caserna (*) > Frescos em Jumbembem!... Só tomate e alface
por Artur Conceição
Em Outubro do ano passado, estive em Benfica a cumprimentar alguns camaradas, e também para assistir à apresentação do livro do António Graça Abreu.
Como sempre acontece nestas ocasiões fala-se de muita coisa relacionada com a guerra.
Os mais atentos, e que fazem a leitura de todos os postes, já perceberam que durante os 13 anos de guerra na Guiné houve avanços e talvez recuos como é normal.
A dada altura falou-se da logística e do poderio aéreo de ambas as partes, o que como é evidente gerou debate de opiniões, como seria de esperar, e ainda bem que assim é.
Para mim, combatente entre 1965 e 1967, deixou-me um pouco admirado ouvir falar em distribuição de frescos (couves, pepinos, tomates e outros), por helicópteros e avionetas, a partir de Bissalanca para os aquartelamentos espalhados pelo resto do território.
Não tenho qualquer razão para duvidar desta afirmação, mas parece-me que primeiro é necessário que a acção seja colocada no tempo.
Durante o tempo que estive em Jumbembem, apenas tenho ideia de duas idas de helicópteros para evacuar dois mortos, e uma terceira para evacuar uma doente da população. A avioneta passava uma vez por semana para largar lá do alto os sacos do correio, e nada mais caía do céu, a não ser umas valentes chuvadas no seu tempo. Morteiradas… Graças a Deus, nunca caíram.
Chegaram em determinada altura umas galinhas vindas de Farim, mas em coluna, e que por serem poucas foram parar à messe de Oficiais e à messe de Sargentos. Em má hora o fizeram, porque para agravar a situação aconteceu na ausência do Comandante da Companhia, isto porque os praças fizeram “serenata” junto a essas messes com aquela canção do Conjunto António Mafra: “oh senhora Marquinhas, cuidado com as galinhas porque o meu galo é solteiro"...
Sem pretender meter foice em seara alheia, penso que o solo da Guiné é muito bom para a produção de muitos produtos agrícolas que designamos por frescos. Em relação a alface e tomate, posso afirmar que é um sucesso, porque aqui falo por experiência própria.
Muitos produtos agrícolas não existiam na Guiné porque não eram cultivados, e não eram cultivados talvez por uma questão cultural. Os hábitos alimentares da população não incluem este tipo de produtos.
Ao fundo das moranças de Jumbembem, entre a tabanca e a ribeira existia uma faixa de terreno onde havia um poço que tinha instalada uma bomba de balanço para tirar água onde nos abastecíamos para todas as necessidades antes da abertura do furo. A partir da altura em que foi aberto o furo, esta bomba deixou de ter a mesma utilidade e servia apenas para rega e algumas, poucas, lavagens, pois o furo debitava quanta água fosse necessária para a CART 730 e para a população.
Foi neste bocado de terreno que alguns de nós, os mais dedicados à natureza, plantámos alface e tomate que depois usávamos na alimentação, suprindo assim a falta dos tais frescos que não vinham de lado nenhum.
A produção de alface era de tal ordem que em menos de um mês, depois de sair do alfobre, estava pronta a comer; isto é, quando se arrancava uma para comer, era colocado logo outra naquele local. Quando se chegava ao fim do terreno, era voltar ao princípio e repetir o mesmo processo.
Quanto aos tomateiros, a produção era mais morosa mas havia belos exemplares e de excelente qualidade.
O meu contacto com a agricultura tinha terminado por volta dos 11 anos, mas entre andar a martirizar os peixes, metidos num bidão, para fazer campeonatos de pesca, ou andar a cultivar alface e tomate, eu preferia a segunda alternativa.
Ao lado da “horta das transmissões” havia a horta dos camaradas Alentejanos que, com muito mais experiência iam dando umas dicas e fornecendo sementes, que eles próprios pediam da Metrópole. Algumas dicas eram aceites, mas outras não, e ainda bem!!!
Um certo dia, os camaradas Alentejanos, compartes da horta, receberam da metrópole a seu pedido sulfato de cobre e cal para fazer uma calda bordalesa para tratar os tomateiros. Perguntaram-me se eu queria, mas eu argumentei que os tomateiros não tinham qualquer doença. Venceu a tradição e os tomateiros dos Alentejanos levaram mesmo com a calda bordalesa em cima.
O pior estava para acontecer, porque os tomateiros, todos “capadinhos” e carregadinhos dos mais bonitos exemplares, ficaram completamente queimados como se por eles tivesse passado um incêndio.
Os Alentejanos quando viram o resultado, caíram-lhes.. os tomates aos pés e confesso que não era para menos!
Tinham uma seara de luxo e ficaram sem nada. Os meus safaram-se de boa.
_________
Nota de L.G.:
(*) Vd. poste anterior desta série > 21 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4064: Humor de caserna (8): O Silva cagou-se (António Matos)
Sobre a temática hortofrutícola, vd. também o poste de 21 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4065: As Nossas Queridas Enfermeiras Pára-Quedistas (7): Os tomates do Capelão da BA 12, Bissalanca... e outras frutas (Miguel Pessoa)
sábado, 21 de março de 2009
Guiné 63/74 - P4065: As Nossas Queridas Enfermeiras Pára-Quedistas (7): Os tomates do Capelão da BA 12, Bissalanca... e outras frutas (Miguel Pessoa)
Foto: © Miguel Pessoa (2009). Direitos reservados
1. Mensagem do Miguel Pessoa (ex-Ten Pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74, hoje Cor Pilav Ref)
Luís:
Para entrar na "fila de espera", envio-te este texto ligeirinho que, na minha óptica, embora não sendo escrito por nenhuma delas, me foi contado por uma das intervenientes, pelo que penso que talvez possas incluí-lo na série "As Nossas Queridas Enfermeiras Pára-quedistas". Não gastes tudo de uma vez, que senão acabam-se-me as memórias...
(...) Embora eu goste de escolher os títulos dos meus textos, deixo ao teu critério a escolha do título para este trabalho, por recear que possa ser mal aceite aquele que eu escolhi. Embora eu tenha logo referido que este era um texto ligeirinho, um pouco 'revisteiro'....
Abraço. Miguel
2. As Nossas Queridas Enfermeiras Pára-Quedistas (*) >
OS TOMATES DO CAPELÃO... E OUTRAS FRUTAS
por Miguel Pessoa
No meu tempo na Guiné, os tomates do capelão da BA12 eram muito cobiçados, muito por culpa das nossas enfermeiras pára-quedistas que, sempre que podiam, faziam uma colheita na horta que o padre A... mantinha junto à igreja da Base.
Era generalizada a opinião, entre quem deles se servia, de que os tomates do nosso capelão, embora pequenos, eram sumarentos e saborosos e enriqueciam qualquer salada. E sabe-se o gosto que o pessoal tinha por tudo o que lhe lembrasse a metrópole. E era vê-los a "deitar abaixo" uma saladinha feita com tomates fresquinhos, acabadinhos de apanhar...
É claro que o padre A... calculava perfeitamente quem eram os malandros (neste caso as malandras...) que lhe andavam a "derreter" a fruta, mas pactuava simpaticamente com a situação, dado ser por uma boa causa.
Mas não se ficava pelos tomates a razia que as enfermeiras pára-quedistas faziam na fruta da base. Para além da fruta que iam comprando ao responsável pela horta da Base, lá iam marchando de vez em quando uns limões, uma papaia, que o pessoal a alimentar era muito e de bom apetite.
Nem o cajueiro do Comandante escapava (do Comandante é um modo de dizer, que estava junto ao comando da Base), sendo que, um dia, havendo uma escada à mão, duas enfermeiras (de que não vou referir os nomes...) resolveram atacar o dito cujo. Estavam elas neste preparo, penduradas nos ramos altos, quando passa o Comandante da Base, com o seu séquito.
O facto é que o Comandante não reconheceu "as intrusas", pois se viam apenas as calças do camuflado, pelo que invectivou energicamente as duas "delinquentes", julgando que eram soldados da Polícia Aérea; e as duas no topo da árvore também não reconheceram a voz do Comandante, pelo que reagiram verbalmente em termos que não vou reproduzir aqui...
Tendo as partes procedido à identificação mútua, o incidente acabou por ficar sanado, pese embora o Comandante tenha prosseguido a sua viagem resmungado contra a lata daquele pessoal, sublinhado por um sorriso complacente dos militares que o acompanhavam.
Miguel Pessoa
3. Comentário de L.G.:
Miguel: Como tu me disseste ao telefone, e muito bem, de vez em quando temos que mudar de folhetim, de teleponto ou de registo, que isto de "sangue, suor e lágrimas" (sic) também chateia, cansa e até pode matar (o blogue, a nossa paciência, a pachorra dos nossos leitores ou seguidores)... E, nesse caso, nada como o humor de caserna, coisa que é muito própria, específica, única, como a própria expressão indica, dos militares da tropa...
O humor (talvez mais do que a sorte) é que protege os audazes... Que me perdoem os nossos camaradas dos comandos, se lhes estou a glosar a divisa Audaces fortuna juvat [A sorte protege os audazes].
O humor (temperado q.b., com uísque e água de Perrier) era, na Guiné, o nosso talismã, a nossa mezinha, o nosso amuleto mágico, contra as balas de amigos e inimigos, contra a costureirinha, contra a Kalash, contra o RPG, contra o Strela, contra o tédio, contra o desânimo, contra o medo, contra a desesperança dos dias, contra as abelhas, contra os mosquitos, contra o cozinheiro, contra o vagomestre, contra o sargento, contra o RDM, contra o capitão, contra o comandante, contra o Com-Chefe, contra Deus e o Diabo...
Temos, na Tabanca Grande, alguns seguidores deste deus menor do Olimpo. Convenhamos que o género não é fácil, é preciso talento para não cair na grosseria, na boçalidade, na alarvice, registos com que muitas vezes, mas injustamente, se confunde o humor de caserna... com a linguagem do carroceiro... ou de alguns instrutores que tivemos na recruta!... ("O instruendo não mexe nem que lhe passe um c... pela boca!).
Grande cultivador do género (humor de caserna) é o nosso Jorge Cabral a quem nunca, por nunca, ouvi dizer um palavrão, tanto lá como cá. Em contrapartida, eu que era um menino de coro passei a falar pior do que o carroceiro e o meu instrutor da tropa...
Tudo isto para te dizer que os tomates do quintal do capelão, surripiados pelas nossas queridas enfermeiras pára-quedistas, é uma história de cinco estrelas, que merece figurar numa próxima antologia do nosso humor bloguístico... Obrigado, a ti e à tua fonte... presumivelmente transmontana.
PS 1 - Convenhamos que há um humor de género... Isto é, o sentido de humor de homens e mulheres pode diferir... Não rimos da mesma maneira, nem pelos mesmos motivos... Não rimos das mesmas anedotas. De homens e mulheres militares, não sei, que eu na tropa só convivi com machos... De qualquer modo, acho que elas usam mais a inteligência emocional...
PS 2 - Quem se lembraria dos tomates do capelão ? Esta história, se lhe quiserem pôr alguma brejeirice, malícia ou picante - mas com elevação e elegância... - só podia nascer da cabecinha das nossas meninas, que, como sabem, eram originalmente enfermeiras civis, tendo entrado para a Força Aérea como militares graduadas (nem me perguntem qual é a diferença)... Por outro lado, para ter tomates e outros hortícolas, o nosso capelão sabia da poda, era de origem rural ou camponesa... Saber trabalhar uma horta não é para todos/as...
PS3 - Já quanto aos machos, a história pode ter outra leitura, a que é completamente alheio o autor que, pelas provas já dadas, é incapaz de, em condições normais, de dizer uma palavrão.
PS4 - É que, caros camaradas da Guiné, não podemos esquecer que, na nossa língua, o vocábulo tomate tem, no plural, uma conotação, um significado vernáculo; não se trata só dos frutos do tomateiro, como também dos testículos... que até são, no sul do país, um petisco muito apreciado, uma especialidade gastronómica (túbaros ou tomates de carneiro, por exemplo)...
PS5 - Como dizem os lexicógrafos, tomates (no plural) é um tabuísmo ("palavra, locução ou acepção tabus, consideradas chulas, grosseiras ou ofensivas de maioria na maioria dos contextos")... Ou em termos mais simples, são os nossos palavrões... que por pudor só escrevemos, em público, por iniciais seguidas de três pontinhos (f... da p..., por exemplo).
PS6 - Não é (não foi) preciso pôr uma bolinha ao canto superior do poste, como fazem os senhores e as senhoras da nossa televisão (pública)... Mas se fosse preciso fazer um aviso ao público, poderia rezar assim: Avisa-se o respeitável público que nos lê (e vê) que a palavra "tomates do capelão" só quer dizer isso mesmo, os frutos do tomateiro que existe (ou existia) no quintal ou jardim do capelão...
PS7 - Espero que o Miguel, o capelão, as senhoras enfermeiras pára-quedistas e os demais camaradas que passaram pela BA 12, em Bissalanaca, me perdoem o excesso de explicações e o consequente abuso...do tempo de antena do editor. Mas se quiserem comentar a história (o texto e o contexto), façam favor, que o autor gosta e os editores apreciam...
PS8 - Já não era sem tempo: temos finalmente a nossa Força Aérea, no nosso blogue, a voar alto, valorosa e garbosa, por cima das nossas tropas, quer eu dizer, das nossas cabeças... Era bom que agora também aparecessem, com mais assiduidade, os furtivos fuzos e marinheiros... Para compor o ramalhete das NT...
_______________
Nota de L.G.:
(*) Vd. postes da série As Nossas Queridas Enfermeiras Pára-Quedistas:
20 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3914: As nossas queridas enfermeiras pára-quedistas (1): Uma brincadeira (machista...) em terra dos Lassas (Mário Fitas)
24 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3931: As nossas queridas enfermeiras pára-quedistas (2): Elementos para a sua história (1961-1974) (Cor Manuel A. Bernardo)
28 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3952: As Nossas Queridas Enfermeiras Pára-quedistas (3): No fim do mundo (Giselda Pessoa)
7 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3994: As Nossas Queridas Enfermeiras Pára-quedistas (4): Uma civil, e transmontana de Sabrosa, na tropa (Giselda Pessoa)
8 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3999: As Nossas Queridas Enfermeiras Pára-quedistas (5): Justamente recordadas no Dia Internacional da Mulher
14 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4029: As Nossas Queridas Enfermeiras Pára-Quedistas (6): O anjo da guarda do Zé de Guidaje (Giselda Pessoa)
Guiné 63/74 - P4064: Humor de caserna (8): O Silva cagou-se (António Matos)
Caro Luís Graça,
se achares graça à estória, pois que faça parte do acervo deste nosso blog.
Um abraço,
António
O Silva cagou-se...
Como se torna saboroso recordar estórias daquele tempo...
Como é gratificante podermos contar na primeira pessoa uma aventura ou retrato da vida dum militar compulsivamente transformado em combatente pela integridade física que queria preservar por achar cedo morrer por causa alheia...
Como é ridiculamente transtornante pensarmos que uma linha muito ténue separou a alegria e o ímpeto da vida, do estoiro duma bala no crâneo...
Como é infantil o facto de um traque deixado sair ao sabor dum momento de extremo stress podia ter ocasionado uma tragédia de contornos difíceis de contabilizar...
Como é difícil imaginar a mágoa que hoje podia assoberbar as mentes de pais extremosos que recordavam filhos caídos numa guerra...
A estória que vos venho relatar tem a ver com uma passada nos Açores aquando da formação da Companhia 2790, num exercício preparatório da realidade ultramarina, mas que teve a versão real mais tarde, em plena Guiné, aquando duma Operação ao Choquemone.
Estávamos nos Arrifes, em 1970.
Fazíamos uma progressão em direcção a um determinado objectivo que pretendíamos tomar.
Deslocávamo-nos em formação de um Grupo de Combate.
O treino consistia numa deslocação silenciosa tendo em vista a tomada dum objectivo sem que o inimigo, por perto, nos localizasse.
O terreno era pródigo em material estaladiço sob a pressão dos pés em andamento pelo que as instruções iam no sentido de não se fazerem ouvir as consequências dos constantes crache-crache que iam acontecendo.
A conclusão seria confrontar os soldados com um cenário de guerra onde a referenciação das nossas tropas podia transformar-se numa carnificina.
Tudo corria bem.
Os soldados interiorizavam o exercício...
A páginas tantas, um soldado protagonizava uma cena de descontrolo gástrico que se evidenciou numa hilariante e ruidosa situação provocada por um flato intestinal - o Silva cagou-se!
É por demais desnecessário recordar a cena que, do ponto de vista pedagógico, serviu de emenda a quantos a temeram.
No silêncio da noite e perante a ânsia de chegarmos a local seguro após uma Operação no TO da Guiné, éramos confrontados com o insólito duma descarga de gás intestinal em estado de grande tensão por parte dum soldado, que teve como efeito a perca de qualquer concentração defensiva para se transformar na mais estridente das gargalhadas colectivas jamais ouvidas...
O Silva cagou-se e, a partir daí, foi cognominado de Silva Cagão!
Tudo acabou em bem uma vez que ou o inimigo não se encontrava por ali ou, atacado por idêntico estado de euforia, não teria tido capacidade de reacção.
Nunca mais o Silva se livrou do apelido.
Justiça seja feita. O Silva, verdadeiro sósia do John Wayne, viria mais tarde a ser um dos grandes heróis desconhecidos da guerra do ultramar ao afrontar, de peito feito às balas, um conjunto de malfeitores maltrapilhos que emboscaram o Pelotão, mas que viram nesse Homem e na sua coragem a impossibilidade de darem o grito do Ipiranga sem que levassem para casa a marca da sua pontaria e sangue frio.
Como açoreano e eventualmente imigrado nas terras do tio Sam, jamais o localizei.
Lamento.
António Matos
__________
Nota de CV:
Vd. último poste da série de 5 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3567: Humor de caserna (7): O Pastilhas e a bajuda (Gabriel Gonçalves, CCAÇ 12, Contuboel e Bambadinca, 1969/71)
Guiné 63/74 - P4063: Em busca de... (67): Celestino Júlio Coelho Monteiro, ex-combatente na Guiné nos anos de 1969/70 (João Bénard Garcia)
Boa noite Luís,
Estive a pesquisar o seu blogue à procura de um ex-combatente na Guiné e não consegui encontrá-lo. Creio que me poderá ajudar embora me faltem alguns dados para o localizar.
Chamo-me João Bénard Garcia e sou jornalista do 24horas.
Falei há umas semanas com o senhor Celestino Júlio Coelho Monteiro, que tem agora 66 anos (teria na altura 26/27 anos) e que me disse ter estado na Guiné entre 1969 e 1970 e que saiu de lá quando chegou o Marechal Spínola. Ele não me disse em que companhia combateu, apenas que esteve no interior da Guiné onde, usando palavras suas, “a guerra era do piorio”.
Desde a altura em que falei com ele nunca mais consegui que me voltasse a atender o telefone. Tenho necessidade urgente em contactá-lo ou falar com camaradas da companhia que se reunam em convívios.
Decidi recorrer a si depois de ter dado voltas e mais voltas na internet e depois de ter contactado a Liga dos Combatentes e a Associação de Veteranos de Guerra. Devo ter tido azar mas ninguém atendeu o telefone.
Se acha que me pode ajudar, por favor envie-me um e-mail com os seus contactos que responderei de volta.
Despeço-me, agradecendo desde já a atenção,
Cumprimentos,
João Bénard Garcia
213306411
914991383
joao.a.garcia@24horas.com.pt
jobegarcia@gmail.com
2. Hoje mesmo foi enviado este mail à Tertúlia pedindo ajuda para encontar este nosso camarada:
Camaradas e Amigos Tertulianos
Contactou-nos João Bénard Garcia, Jornalista do Jornal 24 Horas, pedindo ajuda para encontrar um camarada nosso de nome Celestino Júlio Coelho Monteiro, que deve ter estado na Guiné nos anos de 1969/70.
Peço a todos e especialmente aos suspeitos do costume uma pista para encontrar este nosso camarada.
Um abraço e votos de bom fim de semana.
Carlos Vinhal
__________
Nota de CV
Vd. último poste da série de 12 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3877: Em busca de... (66): Sérgio Nuno procura camaradas de seu pai, da CCAÇ 1686/BCAÇ 1912, Guiné 1967/69