domingo, 17 de abril de 2022

Guiné 61/74 - P23175: Depois de Canchungo, Mansoa e Cufar, 1972/74: No Espelho do Mundo (António Graça de Abreu) - Parte XXXII: Paris, França, 1966 e 1994




Paris, 1994 (a primeira foto de cima; as restantes, s/d)



Paris, França, 1966 e 1994

por António Graça de Abreu (*)




[ (i) Docente universitário reformado,  escritor, sinólogo (especialista em língua, literatura e história da China); 

(ii) natural do Porto, vive em Cascais; 

(iii) autor de mais de 20 títulos, entre eles, "Diário da Guiné: Lama, Sangue e Água Pura" (Lisboa: Guerra & Paz Editores, 2007, 220 pp); 

(iv) ex-alf mil, CAOP1, Canchungo, Mansoa e Cufar, 1972/74; 

(v) é membro da nossa Tabanca Grande desde 2007, tem 308 referências no blogue;

(vi)  texto e fotos enviados em 15/4/2022 ]






Aquele que contempla as profundezas de Paris é tomado pela vertigem. 
Nada é mais fantástico. Nada é mais trágico. Nada é mais sublime.

Victor Hugo



Novembro de 1966. A lenta viagem, quase dois dias desde Lisboa, não no Sud-Express mas no barato, ronceiro, suado e menos bem frequentado -- a começar por mim --, comboio dos emigrantes. 

Tenho dezoito anos, parto para Paris, depois para as alemanhas. O desconforto nos tabiques gastos da carruagem, encostado aos companheiros de jornada, misturado com o meu povo pobre que rejeita mastigar a fome e, quase expulso da sua terra, parte para franças e araganças, em busca de francos e de marcos.

Chego a Paris, Austerlitz. A pequena mala de mão, o mapa da cidade, os pezinhos ao caminho, Rive Gauche, Quartier Latin, Rue Montarparnasse, Hotel du Ponant, 6º. Andar, quarto 29.

 O Urbano Tavares Rodrigues, meu professor, deu-me indicação do alojamento e carta de recomendação para o escritor e jornalista Jorge Reis.

Fixar-me-ei um dia nesta cidade? Talvez. Distante das guerras de África que grassam em Portugal. Com uma francesa linda a tomar conta de mim, a orientar-me os passos, a levar-me pela mão, a inundar-me de prazeres gauleses e universais.

Duas menos vinte da noite. Deitado na cama fofa do hotel, escrevo sobre os primeiros dias em Paris. Cidade bonita, menos luz e menos contos de fada do que havia imaginado. Uma semana a andar por aqui, por acolá, a passear, quilómetros e quilómetros a pé, meio inebriado pelos vapores da capital francesa, respirando a primeira radical mudança de vida. 

Do 2º. andar da Torre Eiffel eu olhava a Paris imensa e interrogava-me se não era tudo um grande sonho. Pisei os cais do Sena, desci os Campos Elísios, avancei pelo museu do Louvre, o espanto diante do sorriso misterioso da difusa Monalisa, perambulei pelas galerias de pintura com as magias de Vermeer, Giotto, Rafael, Rembrant, Ingres.

Nas décadas vindouras, retalhado pelo mundo, com menos surpresa, regressei mais quatro ou cinco vezes a Paris. Em 1994 com a mulher e os filhos pequeninos, para a Disneylândia e o mundo.

Em Notre Dame, ilha de la Cité, revenciar Deus, o apogeu dos vitrais, a pedra gótica flamejando por absides, abóbadas e coruchéus. Perto, na Sainte-Chapelle, outra vez a maravilha, os tons de azul do esplendor dos vitrais e a relíquia mais sagrada, a coroa de espinhos de Jesus Cristo recamada a ouro.

No museu de Orsay, outra vez o espanto diante de Renoir, Gaugin, Cézanne, Van Gogh, Matisse, Manet. No Museu Guimet, sete mil anos de História e arte chinesa, no museu Cernuschi, mais China clássica e antiga, nas livrarias do Quartier Latin, montanhas de livros raros sobre o mundo chinês.

Os pintores de ocasião em Montmartre, Place de Têtre, depois Pigalle, a vida louca das noites, cansado das caminhadas adormecer num hotelzinho, acenando para o can-can do Moulin Rouge. Champs Élysées, em busca do palacete 202 , residência aborrecida do Jacinto, de A Cidade e as Serras, a fantasia do nosso Eça. Aqui por perto, para os lados do Arco do Triunfo, decapitaram na guilhotina Luis XVI e Maria Antonieta.

Recordo palavras do norte-americano Ernest Hemingway: “Se temos a sorte de viver em Paris quando jovens, não importa onde se possa viver depois. Paris é uma festa.”

Pela festa, tudo vale a pena, a mão acariciando, ao de leve, as águas do Sena.

António Graça de Abreu
___________

Nota do editor:

(*) Último poste da série > 5 de abril de 2022 > Guiné 61/74 - P23143: Depois de Canchungo, Mansoa e Cufar, 1972/74: No Espelho do Mundo (António Graça de Abreu) - Parte XXXI: Itália, Florença, 2015

sábado, 16 de abril de 2022

Guiné 61/74 - P23174: Os nossos seres, saberes e lazeres (501): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (46): Trancoso é muito mais do que o seu núcleo histórico (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 17 de Janeiro de 2022

Queridos amigos,
É hora da despedida, deambula-se à volta das muralhas, espreitam-se portas e postigos, entra-se no núcleo histórico, revê-se património já conhecido, insatisfeito fico com a incursão, na verdade Trancoso merece visita mais cuidada e tem nos arrabaldes motivos para itinerância maior, basta pensar no Campo Militar da Batalha de Trancoso e Moreira de Rei. Só nos fica a consolação do que o que não se vê no inverno aguçar o apetite para vir no verão. Oxalá tal aconteça.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (46):
Trancoso é muito mais do que o seu núcleo histórico


Mário Beja Santos

Convém advertir o leitor que o programa das Aldeias Históricas de Portugal fala de Trancoso com o seu núcleo dentro das muralhas, releva esse belo espaço chamado o Campo da Feira (foi ali que se fez a apresentação do livro que aqui me trouxe, um belo espaço conventual recuperado, ali perto faz-se a feira, surpreendeu-me ver no chão uma quantidade impressionante de pilhas abandonadas a envenenar os solos, que negligência ambiental tão violenta); destaca também o campo militar da batalha de Trancoso, tem a ver com os acontecimentos de 29 de maio de 1395, castelhanos rechaçados, há o riquíssimo património de Moreira de Rei e as paisagens envolventes de Trancoso. Itinerância para outro dia, ou mais dias. Vamos completar o festim, temos pela frente a Casa do Bandarra, é um espaço que recorda alguém de nome Gonçalo Anes, o sapateiro, talvez visionário e talvez profeta, de quem pouco se sabe e muito se especula, deixou premonições e trovas onde alude à vinda do Messias, ao sebastianismo e ao Quinto Império, daí a sua importância na cultura portuguesa. Esta casa abriu portas recentemente, em 2017. E segundo a brochura oferecida ao visitante, “pretende ser um espaço capaz de transmitir ao visitante alguns dados biográficos relevantes, caracterizado por Fernando Pessoa como sendo não português, mas Portugal. Neste Centro Interpretativo será possível encontrar várias aplicações multimédia e surpresas, uma curta-metragem sobre a vida e a obra de Bandarra e, ainda, um documentário acerca das reminiscências antropológicas e sociais recolhidas a partir da sabedoria popular”. Visita-se com imenso agrado.
Bem perto da casa do Bandarra dei com algumas inscrições atribuídas a judeus convertidos, os cristãos-novos, principais vítimas da Inquisição, estão ali bem perto do Centro de Interpretação Isaac Cardoso, para quem gosta de estudar o judaísmo em Portugal tem aqui provavelmente uma esclarecedora viagem guiada de um mundo de sofrimento e esperança, de crença inabalável gravada nas pedras, mesmo com o risco de ser assado nas fogueiras.
Pormenor do Centro Interpretativo Isaac Cardoso, projeto do atelier de Gonçalo Byrne
Estas muralhas de Trancoso dão muito que falar. Já se fez referência aos sucessivos restauros e aditamentos, as últimas e bastantes importantes benfeitorias concluíram-se em 1940, há fotografias da época que mostram os casebres que entram os séculos XVIII e XIX se tinham construído, foram então demolidas e há também notícia que em 1933 se tinham colocado a meias na fortaleza. Porque castelo e muralhas são o prato substância do centro histórico, com 15 torres e cubelos, 4 portas e 3 postigos. Ao longo do tempo fizeram-se uns retalhos nas muralhas, que é o que se procura aqui mostrar, hoje seria impensável, não parariam as manifestações, ninguém aceitaria esfaquear aquelas que são talvez as mais impressionantes muralhas de castelo em Portugal.
Outro pormenor da muralha, destaca a sua monumentalidade
O Boeirinho é um postigo aberto nas muralhas, perto das Portas do Prado, tem cerca de 1,5 m de altura. Como as portas da vila fechavam ao anoitecer, este postigo servia para os retardatários. Em 1916, a autarquia pretendeu prolongar a rua do Boeirinho, rasgando a muralha naquele sítio, e pediu autorização ao Ministério da Guerra. O povo não aceitou, o escritor Antero de Figueiredo veio em defesa do curioso e pequeno postigo, enfatizou que esta porta era um documento único na defesa da vila. Enfim, a ideia de o taparem não foi por diante. Há também o Olhinho do Sol e outras portas, são aberturas nas muralhas exteriores de forma a proporcionarem o acesso dos moradores aos terrenos agrícolas.
Outra perspetiva do Boeirinho
Esta é a fachada do chamado Palácio Ducal, trata-se de um palacete que pertenceu, por casamento à Duquesa de Pozen, filha do herdeiro do trono da Polónia. Sobre a varanda central ostenta o bração da família, cujo titular mais importante foi o fidalgo D. António da Costa Coutinho Lopes Tavares e Ornelas. Prevê-se para breve a construção do Museu de Trancoso neste espaço.
É pena, está na hora de partir, vou amesendar-me em Rio de Mel, daqui seguirei para a região da Lourinhã, despeço-me com mágoa, bem gostaria de ter ido a necrópole de Moreira de Rei, ver com mais cuidado as Portas do Prado e da Traição e tanta coisa mais. Fica-me a quase segurança de qualquer dia regresso e que Trancoso me dará o seu xi coração. Sem reservas, até à próxima.

(continua)

____________

Nota do editor

Último poste da série de 9 DE ABRIL DE 2022 > Guiné 61/74 - P23155: Os nossos seres, saberes e lazeres (500): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (45): Trancoso castelo e muralhas, uma manhã de neblina, a presença judaica (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P23173: Humor de caserna (49): Mensagem, de 13/3/1971, enviado pelo Cap Art Gaspar, cmdt da CART 3330, à Manutenção Militar, c/c ACAP, Com-Chefe, CAOP1 e BCAÇ 2928: "Maior respeito boa vontade Vexa. Verifico todo peixe estragado, ovos com pintos, etc. Ir buscar estes implica risco vida. Ou monto aviário ou entre acordo. Pronto colaborar todo sacrifício. Estou com o pessoal destruído moralmente. Julgo compreendeu." (Ernestino Caniço)

 


88/C/71

Maior respeito boa vontade Vexa. Verifico todo peixe estragado,  ovos com pintos, etc. Ir buscar estes implica risco vida. Ou monto aviário ou entre acordo. Pronto colaborar todo sacrifício. Estou com o pessoal destruído moralmente. Julgo compreendeu. Cap Gaspar


Foto (e legenda): © Ernestino Caniço (2022). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. M
ensagem do nosso camarada Ernestino Caniço:

 (i) ex-Alf Mil Cav, cmdt do Pel Rec Daimler 2208, Mansabá e Mansoa; Rep ACAP - Repartição de Assuntos Civis e Ação Psicológica, Bissau, fev 1970/dez 1971;

(ii) hoje médico, aos  77 anos teima em continuar ao serviço dos outros,  de acordo com o seu juramento hipocrático; 

(iii) vive em Tomar, estando reformado do SNS ]


Data: 15 abril 2022 17:25  

Assunto - Major Gaspar

Caros amigos:

Votos de ótima Páscoa.

Face ao citado humor do Major Gaspar (*), ocorreu-me enviar-vos um excerto de uma mensagem dirigida pelo então  Cap Gaspar à Manutenção Militar, em 13mar1971, enquanto Cmdt da CART 3330.

A referida mensagem foi enviada com conhecimento à ACAP (Assuntos Civis e Acção Psicológica), COMCHEFE, CAOP1 e BCAÇ 2928.

Sendo um fragmento de um documento original, aquilatareis vós do seu interesse.

Um abraço,

Ernestino Caniço

________

sexta-feira, 15 de abril de 2022

Guiné 61/74 - P23172: Em busca de... (317): Camaradas de armas de João Carvalheiro, falecido há cerca de 2 anos no Porto e que pertenceu à 3.ª CCAÇ/BCAÇ 4512/72 (Cuntima, 1973/74). Procura a sua sobrinha, Sílvia Zayas Serra

1. Através do Formulário de Contacto do Blogguer, recebemos em 12 de Abril de 2022 esta mensagem de Sílvia Zayas Serra, uma nossa leitora, sobrinha do nosso camarada João Carvalheiro, recentemente falecido:

Boa tarde:
Sou artista e sobrinha do João Carvalheiro que faleceu no Porto há dois anos. Ele era furriel de minas e armadilhas. Na minha memória estão as histórias que o meu tio contava sobre Guiné, e Maria Turra, gostava de falar com alguém que o tenha conhecido ou estado com ele em algum momento lá na Guiné. Esteve na tropa, penso que de 72 a 74 mais ou menos.

No meu doutoramento e algumas das peças artisticas e filmes, trabalho com memória, também por perceber como segunda geração o imaginário que formaram estas experiéncias e sobretudo por um desejo muito emocional de perceber.

Agradecia alguém com quem falar. Muito obrigada pelo blogue e a recuperação de documentos!
Sou nascida em Espanha e por isso o meu português às vezes pode parecer esquisito...

Cumprimentos
Silvia Zayas Serra


********************

2. Mensagem de 13 de Abril, do nosso Blogue enviado à Silvía:

Cara Sílvia
Muito obrigado pelo seu contacto.
Com os elementos que nos mandou vai ser muito difícil obter notícias de seu tio.
Não consegue saber em que companhia foi ele integrado para a Guiné? Data de ida e regresso? Locais onde esteve?

Ficamos a aguardar mais elementos.

Cumprimentos
Ao dispor
Carlos Vinhal


********************

3. Mensagem da Sílvia com data de 14 de Abril:

Caro Carlos:
Muito obrigada pela resposta.
Tenho estado toda a manhã a rever as cassettes onde há anos o filmei a falar, para ver se encontro mais dados.
Escrevo aqui o que consegui pesquisar:
Pelos vistos esteve de 72 a setembro de 74 na tropa, foi para a zona de Farim.
Como lhe dizia era furriel de minas e armadilhas.
Assentou praça no quartel das Caldas da Rainha.
Foi para Guiné em dezembro de 72 ou 73 (na data ele contradiz-se). Depois de chegar e do treino operacional em Bissau, foi para um quartel no sector de Farim, em Contima.
Farim era a sede do Batalhão. Tinham uma enfermaria com furriel enfermeiro e dois cabos enfermeiros, onde vinham individuos do Senegal buscar medicamentos.
Fala do Corredor de Lamel como se fosse perto.
Tinham um motorista ao que chamavam Cabito.
Depois viveu no Porto e trabalhou no sector audiovisual do ICBAS (instituto de Ciencias Biomédicas Abel Salazar)

Oxalá isto sirva, mando cumprimentos e muito boa Páscoa para si.
Silvia


********************

4. Mensagem no mesmo dia enviada à nossa amiga Sílvia:

Boa tarde Sílvia
A partir dos novos elementos que me mandou, presumo que o meu camarada João Carvalheiro terá ido para a Guiné em 6 de Dezembeo de 1972, integrado na 3.ª Companhia do Batalhão de Caçadores 4512/72.
A 3.ª Companhia esteve colocada em Cuntima entre 8 de Fevereiro de 1973 e 24 de Agosto de 1974. Cuntima era muito próximo de Farim onde estava instalada a CCS do Batalhão e parte da 1.ª Companhia.
O Batalhão regressou a Portugal em três vôos dos Transportes Aéreos Militares nos dias 28; 29 e 30 de Agosto.

Dá-se uma coincidência um bocado desoladora. Um Batalhão é composto por CCS; 1.ª; 2.ª e 3.ª Companhias. Temos no Blogue malta da CCS; 1.ª e 2.ª Companhias. Da 3.ª, a que pertenceu o tio, ninguém.

Vou publicar as nossas mensagens para ver se alguém do BCAÇ 4512/72 o conheceu ou se lembra dele. Isto partindo princípio que o que eu pesquisei está correcto. Se tivesse por aí uma foto dele do tempo da Guiné seria uma boa ajuda.
Outra coisa. Temos um camarada da Guiné, ex-Alferes Miliciano Médico, o Prof. Amaral Bernardo, que foi professor no ICBAS. Ter-se-ão cruzado no Instituto? Não são contemporâneos na Guiné.

Continuo por aqui.
Vou enviar noutra mensagem uns anexos com o emblema do Batalhão e a digitalização da Identificação e síntese da Actividade Operacional do Batalhão.

Boa Páscoa para a Sílvia e demais familiares.
Carlos


********************

5. Mensagem da nossa "sobrinha" Sílvia também de 14 de Abril:

Carlos:
Muito obrigada por todo o esforço e trabalho de pesquisa, está a ser muito amável e muito útil! Obrigada também pelo anexo!
Passo a anexar umas fotos. Espero que haja sorte e encontremos algum colega dessa altura!
Penso que de certeza que o Professor Amaral Bernardo e ele se conheceram.

Por enquanto mais nada, muitíssimo obrigada novamente e continuação de Boa Páscoa
Silvia


João Carvalheiro, ex-Furriel Miliciano Atirador de Infantaria e Minas e Armadilhas
3.ª CCAÇ/BCAÇ 4512/72, Cutima, 1973/74

Digitalização das páginas referentes ao BCAÇ 4512/72 - Fichas das Unidades - Guiné
Com a devida vénia ao Estado-Maior do Exército - Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974)

********************

6. Nota do editor CV:

Apela-se aos camaradas da tertúlia e leitores em geral, do BCAÇ 4512/72, que embora não sendo da 3.ª CCAÇ, e se lembrem do Fur Mil João Carvalheiro, nos enviem os elementos possíveis para satisfazer o propósito da nossa "sobrinha" Sílvia em conhecer camaradas do seu tio.

____________

Nota do editor

Último poste da série de 28 DE JANEIRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P22947: Em busca de... (316): Furriel Silva que em 1973 deu escolinha aos meninos de Chugué. Procura-o o cidadão guinnense, radicado em Itália, Vasco Na Nena que lhe quer prestar o seu reconhecimento. Ponto da situação (Carlos Silva, Cor Tir na Reforma)

Guiné 61/74 - P23171: Notas de leitura (1437): "Os Forjanenses e a Guerra Colonial", organização de Luís G. Coutinho de Almeida e Carlos M. Gomes de Sá; edição da Junta de Freguesia de Forjães, 2018 (2) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 9 de Julho de 2019:

Queridos amigos,
A saga destes forjanenses merece a nossa atenção. Não é a primeira vez que uma Junta de Freguesia estende a mão aos antigos combatentes. No caso vertente, o Coronel Coutinho de Almeida contou com um credenciado publicista, Carlos Gomes de Sá, e lançaram-se nesta empreitada na recolha dos testemunhos, o resultado é um sucesso, vem sempre ao de cima o sentido da identidade local, onde quer que o militar chegue pergunta se há gente de Esposende ou Viana, por exemplo. São testemunhos comedidos, nada de jactâncias, vaidadezinhas ou azedumes que ficaram para o resto da vida. Todos deploram ao que a Guiné chegou e à inutilidade daquela guerra. E é profundamente comovente ver estes velhos combatentes nalguns casos abraçados às mulheres e até às suas mães. Uma edição exemplar que todas as autarquias deviam conhecer.

Um abraço do
Mário



Memórias insuperáveis, a historiografia as saiba escutar (2)

Beja Santos

É um belíssimo, inolvidável, trabalho de recolha junto de antigos combatentes ligados à freguesia de Forjães (concelho de Esposende), a organização pertence a Luís G. Coutinho de Almeida e Carlos M. Gomes de Sá, a edição é da Junta de Freguesia de Forjães, 2018. Não conheço nada de tão tocante, tal é o vigor do testemunho entre os vínculos locais e, em inúmeros casos, uma saudade guineense que não secou. Como é evidente, os testemunhos recolhidos são amplos, estes forjanenses e suas famílias falam da Índia, da guerra de África mas também de São Tomé e Príncipe, Timor e outras paragens. O que aqui se regista, obviamente, circunscreve-se à Guiné, mas desde já se adverte o leitor que se sentirá gratificado com a leitura de todos estes testemunhos, esta memória é aparentemente regional, não haja ilusões, mas estamos lá todos nós.

Temos agora o soldado Carlos Alberto Maciel Martins Gomes, fez a sua comissão na Guiné entre 1968 e 1970. Os vínculos locais afloram imediatamente, acaba de chegar a Bissau e logo se estabelece uma identificação com a terra de onde vem, aparece um soldado que lhe diz: “Ó Meira, também estás por aqui? Era o Sr. Manuel Neiva, o homem da Marta da Porcena. Era marinheiro. Nós seguíamos para cima, para Bambadinca. Também vi o Armindo da Gena”. Seguiram para Contuboel e Sare Bacar, confessa que os meses iniciais foram muito difíceis, refere o desastre da jangada no Cheche, no início de fevereiro de 1969. É comedido nas suas considerações, de como viveu e se adaptou. Adorava jogar futebol, apelidavam-no por “Pedro Gomes”, o defesa lateral direito do Sporting. Ajudava na horta. Regressou e procurou arranjar trabalho em França. Inserção difícil, teve pesadelos, sonhava que ainda estava na guerra.

Carlos Alberto Brochado de Almeida foi furriel miliciano entre 1967 e 1969, ficou adstrito à CART 1661, cujo primeiro-comandante foi o arquiteto Luís Vassalo Rosa. Desembarcou e foi colocado em Porto Gole, onde se encontrava o Pelotão de Caçadores Nativos N.º 54, a que pertencia. “Embora integrado numa Companhia de Artilharia, o meu grupo era um Pelotão de Soldados Nativos comandados por um Alferes teoricamente auxiliado por três Furriéis. O Pelotão de Soldados Nativos era um grupo heterogéneo formado por Balantas, Fulas, Futa-Fulas, Mandingas e Papéis. Cristãos eram alguns dos Papéis oriundos da ilha de Bissau. Apesar da sua heterogeneidade, o pelotão era um grupo coeso onde não havia fronteiras de relacionamento entre brancos e nativos. O segredo desta boa relação alicerçou-se, basicamente, no nosso respeito pela cultura de cada etnia e no tratamento de igualdade que havia entre todos os membros”. Não esquece uma flagelação ao quartel numa noite de abril de 1968, 45 minutos de fogo infernal. Ao fim de 18 meses, o furriel Almeida foi transferido para o Quartel-General, trabalho de secretaria. “Foi ali, durante seis meses, que vi a outra face da guerra: a dos papéis, a das cunhas, a das contrapartidas, mas também a das noites dormidas sem a arma à cabeceira da cama”.

O soldado José Boucinha da Cruz, condutor auto, esteve na Guiné entre 1970 e 1972, colocado na CCS do Batalhão de Bissorã e temos mais uma história de vínculos locais: “Fora, fazíamos segurança às colunas que traziam os géneros de Mansoa, onde os íamos esperar. Cada vez que lá ia perguntava sempre se havia por lá militares de Esposende, Barcelos ou Viana. Foi assim que encontrei o Carlos do Rogério, que me apresentou o Guilherme Pimentel e que viria a casar com a sua prima Lúcia Torres. Noutra ocasião em Bissau, encontrei o Couto dos Santos, que estava na Marinha e que andava a estudar. Encontrei também o Baltazar Costa, que estava de férias em Bissau. Por lá também me cruzei com o falecido Ascânio, de Antas (que foi guarda-redes do Forjães) e com o filho do moleiro da Azenha do Grilo, de S. Paio”. Não sendo operacional, escasseava-lhe o tempo livre, tinha de fazer a limpeza do Depósito de Géneros. É tocante o final do seu depoimento: “Quando cheguei a casa, o meu pai não estava. Tinha ido a Barroselas com o Zé Matos para me ir esperar. Estava só a minha mãe e que alegria que ela sentiu quando entrei em casa. Quando o meu pai chegou, mandou deitar uns foguetes. Eu estava à mesa a comer e, quando começaram a rebentar, mandei-me para debaixo da mesa, ainda com a ideia dos ataques. Casei em 9 de Dezembro e dali a uma semana fui com a minha mulher a Santa Maria Adelaide oferecer o vestido de casamento, como promessa de eu ter voltado vivo da guerra. Em termos de camaradagem, vimos lá momentos muito bons. Vou sempre aos encontros anuais do meu batalhão 2927. E, de há seis anos para cá, em Forjães, eu e o Albino do Firmino organizamos, anualmente, o encontro dos combatentes da Guiné. Há uma missa cantada, uma romagem ao cemitério para depor um ramo de flores pelos que já faleceram. E nunca nos esquecemos de ir a Aldreu, deixar também um ramo de flores na campa do António Amorim Torres, que faleceu na Guiné”.

José Carlos Ribeiro da Fonseca faz a sua comissão de 1970 a 1972, é furriel miliciano, vagomestre, pertenceu à Companhia de Caçadores Nativos 15. De Bissau segue para Bolama, para o Centro de Instrução Militar, logo se pôs à procura de alguém de Esposende ou Viana. Encontrou o Fernando Macedo (Ferreiro), bem como o seu chefe, um natural de Carvoeiro, seu colega na escola em Viana. Foi integrado na Companhia Balanta. Em 3 de março de 1970, partem para Mansoa, ficam junto do BCAÇ 2885. Numa coluna, em Safim, encontrou-se com o Jorge Gomes. Construiu um bom relacionamento com o Capitão Mário Tomé. Em 27 de março tem o seu batismo de fogo, um ataque a Mansoa com misseis terra-terra. No fim de maio chega-lhe a notícia do nascimento da filha. Vê chegar a Mansoa o Joaquim Luís e o Ascânio, seu amigo de S. Paio de Antas. Vêm de férias e no regresso apercebe-se do endurecimento da luta, o alcatroamento de Mansabá a Farim foi trabalhoso. Assiste à rendição do Batalhão 2885 pelo Batalhão 3832. Refere o ataque de 9 de junho de 1971 a Bissau e os muitos confrontos em patrulhamentos dentro da zona de ação. Regressou a 28 de janeiro de 1972, diz não ter experimentado perturbações de ordem psíquica ou física, o que gostou foi o frio do inverno. “Mas o meu tempo após o regresso foi muito difícil no âmbito familiar, porque a minha filha, já com vinte meses, não me conhecia de lado algum, fugia a qualquer contato comigo e, embora a mãe tudo fizesse para explicar quem eu era, só reconhecia o avô materno com quem conviveu desde o nascimento”.


O Coronel Luís Gonzaga Coutinho de Almeida entre o autarca da Murtosa e um elemento da GNR
Mário Leitão, escritor limiano, que se associou a este empreendimento
____________

Nota do editor

Último poste da série de 11 DE ABRIL DE 2022 > Guiné 61/74 - P23159: Notas de leitura (1436): "Os Forjanenses e a Guerra Colonial", organização de Luís G. Coutinho de Almeida e Carlos M. Gomes de Sá; edição da Junta de Freguesia de Forjães, 2018 (1) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P23170: Humor de caserna (48): o major art José Joaquim Vilares Gaspar, o "Gasparinho", visto por Salgueiro Maia: loucura ou contestação do sistema?

1. Trancrição de um excerto do poste P3262 (*), da autoria do nosso saudoso amigo, Leopoldo Amado (1960-2021), historiador guineense,  vítima da pandemia de Covid-19:


(...) O exemplo mais sonante de loucura, traço muito comum à literatura de guerra colonial, é-nos dado por Salgueiro Maia, ao referir-se à caricata figura do major Gaspar, cuja irreverência abeirava-se da loucura, aliás, motivo pelo qual acabou ser hospitalizado:

(...) o major Gaspar vai comandar o CAOP 2 em Mansabá, onde, dando boa conta do recado, é solicitado para se deslocar a Bissau, à reunião semanal do Com-Chefe, onde deveria ser salientado o seu compor­tamento. Só que a coluna que, vinda de Farim, o devia transportar a Bissau nunca mais chegava. 

Farto de esperar, avança para Mansoa só com o condutor, percorrendo um itinerário onde eram frequentes as emboscadas, pois passava ao lado do Morés. À sua chegada a Mansoa, umas centenas de elementos da população agitam-se, pe­gando nas suas mercadorias com vista a ocupar lugar na coluna. Aí, o major Gaspar acha conveniente mandar parar o jipe. A população acerca-se e ele explica: 

«Meu povo, permaneçam mansos, porque a coluna ainda não vem aí, só vem o Gaspar.» 

Continua só em direcção a Bissau. Começa por visitar os seus amigos páras à entrada da cidade, depois o seu amigo director do Hospital Militar, os seus amigos comandos, etc. 

Entra em Bissau feliz e, desejando dar saída à sua alegria, descobre que o único sítio da Guiné onde havia uma peanha para um polícia dirigir o trânsito tinha um PSP guineense, que o major Gaspar considerou estar a fazer mal o seu trabalho. 

Fez parar o jipe ao lado da peanha e fez sair o polícia do sítio e, de pistola-metralhadora ao pescoço, o major Gaspar foi dirigir o trânsito. Lá, como noutros sítios, os condutores, apesar de na maioria serem militares, não eram obe­dientes, e assim o nosso amigo fartou-se de desobediências. Tanto, que atirou uma rajada por cima de uma camioneta da engenharia militar que não lhe obedeceu. 

Continuou em funções, mas surge mais uma camioneta, do Depósito de Adidos, que também não lhe obedece, e aí vai o resto do carregador. 

O Palácio do Governo, onde se encontrava o general Spínola, distava uns 400 m em linha recta, pelo que os disparos eram nítidos e originaram que a polícia do Exército fosse chamada ao local.

Postas perante a realidade, as entidades competentes determi­naram a baixa à neuropsiquiatria do major Gaspar. Mas alguns, suficientemente conhecedores da maneira de ser do «doente», con­seguiram autorização para o director do Hospital Militar conven­cer o major a descansar uns dias no Hospital, onde os amigos o visitaram com assiduidade, criando talvez o único período de ver­dadeiro descanso e convívio que este homem teve ao longo de vários anos de guerra e de guerras com o sistema. 

As histórias do major Gaspar foram para muitos combatentes o escape natural nas vicissitudes da vida em campanha; quem o conheceu guarda dele a imagem do lutador pela dignidade e pela justiça, a certeza de que a sua luta foi imortal (...) ”[19] )**)

[ Seleção / Revisão e fixação de texto / Negritos / Realce a amarelo, para  efeitos de publicação deste poste no blogue: LG]
________

Nota do Leopoldo Amado:

[19] Maia, Salgueiro, O Acaso, In Capitão de Abril – Memórias da guerra do Ultramar e do 25 de Abril, Editorial Notícias, pp. 56 e 57.
___________

Notas do editor:


Guiné 61/74 - P23169: Parabéns a você (2055): António Pimentel, ex-Alf Mil Rec Inf da CCS/BCAÇ 2851 (Mansabá e Galomaro, 1968/70)

____________

Nota do editor

Último poste da série de 11 DE ABRIL DE 2022 > Guiné 61/74 - P23157: Parabéns a você (2054): Jorge Picado, ex-Cap Mil Inf, CMDT da CCAÇ 2589/BCAÇ 2885 (Mansoa, 1970/71); CMDT da CART 2732 (Mansabá, 1971) ; CAOP 1 (Teixeira Pinto, 1971/72)

quinta-feira, 14 de abril de 2022

Guiné 61/74 - P23168: Agenda cultural (807): Seminário Internacional de História Militar - "As Forças Armadas e a Guerra Colonial (1961-1974): Adaptações, Evoluções e Impactos", a levar a efeito no próximo dia 4 de Maio de 2022 na Amadora

SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE HISTÓRIA MILITAR DA ACADEMIA MILITAR

“AS FORÇAS ARMADAS E A GUERRA COLONIAL (1961-1974): ADAPTAÇÕES, EVOLUÇÕES E IMPACTOS”

Portugal, Amadora, 04 de Maio de 2022


A Academia Militar organiza e desenvolve o Seminário “As Forças Armadas e a Guerra Colonial (1961-1974): Adaptações, Evoluções e Impactos”, em maio de 2022, com o objetivo principal de promover a divulgação científica deste tema central da História de Portugal mais recente.

O Seminário pretende reunir investigadores, académicos, estudantes e outros interessados nesta área da História de Portugal, de forma a proporcionar uma oportunidade para a divulgação de estudos e o debate de ideias no domínio da História da Guerra Colonial.

O evento será organizado no âmbito de uma parceria que reúne as sinergias da Academia Militar e do ISCTE-IUL, tal como tem vindo a ser feito no âmbito do Doutoramento em História Defesa e Estudos de Segurança, com o envolvimento da Comissão Portuguesa de História Militar.

____________

Nota do editor

Último poste da série de 3 DE ABRIL DE 2022 > Guiné 61/74 - P23136: Agenda cultural (806): Salgueiro Maia - O Implicado, filme de Sérgio Graciano (Portugal, 2021, 1h 55m), a estrear nos cinemas no próximo dia 14

Guiné 61/74 - P23167: Humor de caserna (47): O Gasparinho, que eu... não conheci no BAC 1 / GA 7 (Domingos Robalo, ex-fur mil art, BAC 1 / GAC 7 / GA 7, Bissau, 1969/71; ex-comandante do 22º Pel Art, Fulacunda, 1969/70)

1. Comentário publicado na nossa página do Facebook, Tabanca Grande Luía Graça, pelo nosso camarada Domingos Robalo, com data de 11 de abril de 2022, 21h18;

Domingos Robalo, ex-fur mil art, BAC 1 / GAC 7 / GA 7, Bissau, 1969/71; foi comandante do 22º Pel Art, em Fulacunda (1969/70); nasceu em Castelo Branco, trabalhou na Lisnave, vive em Almada; tem 26 eferências no nosso blogue. 

[ Foto atual, à esquerda, Tabanca da Linha, Algés, 2019; foto de Manuel Resende].



Olá amigos, camaradas. 

Li os relatos do blogue (*) e algo não bate certo em termos de datas em relação ao major Gaspar. Irei confirmar, pois sou desse tempo na BAC1/GA7. 

Em março de 1969, estava eu colocado no RALIS, tendo como 2° Comandante o Coronel Ferreira da Silva. Já na altura não era militar de quem se gostasse. 

Em maio de 69 embarco para a Guiné, sendo mobilizado em rendição individual,  colocado ns BAC1, então comandada pelo capitão Moura S. 

Em novembro de 69 venho de férias e em Almada conversei casualmente com um anterior camarada do RALIS, que me informou da mobilização do Coronel Ferreira da Silva para comandar a BAC1, em vias de passar a GAC7, o que viria acontecer pouco tempo depois.

 Quando regressei de férias e me apresentei na unidade eu e o "novo comandante" já eramos conhecidos por termos tido alguns arrufos no RALIS. 

"Ó filho" era um termo muito do agrado deste militar. Um dia, o Sargento Canário do QP e encarregado das obras da unidade, já falecido, teve um caso com o " Ó filho" e foi de imediato recambiado para o mato. Disse o Coronel:  "Então Canário, as obras andam ou não andam? Resposta do Seiras,  sargento; "Meu comandante, como quer que as obras andem se não têm pernas ?". 

O Comandante não gostou do à vontade do "pobre Canário", que já teria mais de 50 anos de idade, eu era um puto com 21 anos. 

Ao tempo do capitão Moura S. era eu que participava na regulação de tiro em todos os PELART do TO juntamente com o capitão Viriato O. alternando com o capitão Fradique. O coronel, comandante da unidade resolveu ir fazer uma regulação de tiro a um PELART. Deu os elementos ao chefe de secção, furriel Monj.... fez-se a pontaria, tudo pronto?! Fogo...!!!

Granada pelo ar..., vai cair numa palhota amiga, vários feridos... Aqui deu- se a bronca. De quem foi a culpa? Dos dados mal calculados, mal introduzidos na BF ou deficiente comunicação? 

Levantou-se um auto que andou enrolado muito tempo até que chegaram mesmo a propor ao furriel que assumisse culpa e poder embarcar e passar à peluda. Só que este não aceitou porque entendeu não ter de assumir uma culpa que não sentia ter. 

Entretanto, o Coronel tinha dado baixa e regressou à Metrópole. Em maio de 71 sou desmobilizado e regresso com mais um louvor, desta feita dado pelo 2° Comandante, recém chegado de Piche, o major Mexia, já falecido. 

O major Gaspar será figura posterior à minha desmobilização. Do coronel, nunca mais ouvi referência, a não ser agora no blogue.

Os oficiais do QP, à data de maio de 71 eram ; major Mexia, capitães Viriato, Fradique, Pereira S, Evaristo e Lourenço, estes últimos da A.A. [Artilharia Anti-Aérea].

Mais estórias haveria, mas a prosa já vai longa. 

Abraço. Saudações artilheiras. Domingos Robalo.

__________

Nota do editor:

(*) Último poste da série > 11 de abril de 2022 > Guiné 61/74 - P23158: Humor de caserna (46): Histórias pícaras: O Gasparinho - Parte III (António J. Pereira da Costa / Luís Faria / José Afonso / José Borrego): (vi) Picagem automática: as rajadas de G3 em vez da pica; (vii) Mensagem-relâmpago: Quem viu passar as minhas chapas de zinco, levadas pelo tornado? (viii) Informo Vexa que Sexa passou na mecha

Guiné 61/74 - P23166: (Ex)citações (406): Mudo-me, de vez, depois da Páscoa, para Key-West, Florida, EUA: foi um privilégio poder contactar, através do nosso blogue, camaradas que não conhecia, alguns dos quais se tornaram amigos (José Belo, régulo vitalício da Tabanca da Lapónia)


José Belo, jurista, o nosso luso-sueco, cidadão do mundo, membro da Tabanca Grande, repartia, até agora. a sua vida entre a Lapónia (sueca), Estocolmo e os EUA (Key West, Florida; (ii) foi nomeado por nós régulo (vitalício) da Tabanca da Lapónia, agora jubilado; (iii) na outra vida, foi alf mil inf, CCAÇ 2391, "Os Maiorais", Ingoré, Buba, Aldeia Formosa, Mampatá e Empada, 1968/70); (iv) é cap inf ref do exército português; (v) durante anos alimentou, no nosso blogue, a série "Da Suécia com Saudade"; (vi) tem cerca de 220 referências no nosso blogue.


1. Mensagem do Joseph Belo:

Data - quarta, 13/04/2022, 23:31   
Assunto - O último pombo-correio... congelado

Este é o último pombo-correio desde o extremo do extremo Norte da Escandinávia.

Depois da Páscoa,  a mudança para o outro lado do Atlântico é definitiva, passando o meu “centro operacional “ a ser a minha casa de Key West onde estarei à disposição de Amigos e Camaradas.

Mantenho o meu apartamento em Estocolmo para visitas “turísticas” à Suécia.

Foi um privilégio ter tido a oportunidade de, através do teu blogue, ter tido a oportunidade de contactar com Camaradas da Guiné. Alguns dos quais, não os conhecendo a
nteriormente, se tornaram Amigos.

Um grande abraço com votos, para Ti e Família, de uma Feliz Páscoa. 
J. Brelo


2. Comentário do editor LG:

Publico a tua mensagem, por entender que não é pessoal, nem sequer uma despedida. É apenas um Olá, Mudas-te para Key West, onde já tinhas casa, mas agora a título definitivo: afinal, é nos EUA que tens a tua família, filhos e netos, e os negócios da família. Fico com a ideia que a Lapónia fica agora ainda mais longe, mas tu serás sempre, até ao fim dos teus e nossos dias, o nosso mítico régulo da mítica Tabanca da Lapónia. E passas a ter o raro privilégio de acumular o cargo: também já tinhas sido investido do alto cargo de régulo da Tabanca de Key West, Florida. (Não indico a morada nem a localização GPS por causa dos mísseis balísticos que andam para aí meio perdidos ou desnorteados, nunca sabendo nós quando é que algum nos pode cair no prato da sopa.)

Permite-me só fazer uma correção: o blogue que te aproximou dos camaradas da Guiné, e onde fizeste amigos, não é meu, é teu, é nosso... E continuará a ser nosso, enquanto todos nós quisermos. Haja saúde e paz e algum patacão para pagar o aluguer... e alimentar o "bicho".

Daqui da Tabanca de Candoz, desejo-te o melhor para a tua "nova vida". E espero poder continuar a contar com a tua colaboração. Em vez de pombos-correios congelados, vais-nos mandar agora uns inofensivos aligatores... Boa viagem até Kew West.  E nunca percas a ponta do fio de Ariadne que começaste a tecer em terras lusas... Um alfabraço. Doce Páscoa para ti e os teus. Luís
__________

Nota do editor:

Guiné 61/74 – P23165: Memórias de Gabú (José Saúde) (97): Gabu, região com história que me fora particularmente familiar na guerrilha da Guiné (José Saúde)

1. O nosso Camarada José Saúde, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523 (Nova Lamego, Gabu) - 1973/74, enviou-nos a seguinte mensagem.

As minhas memórias de Gabu

Gabu, região com história que me fora particularmente familiar na guerrilha da Guiné 

Somos antigos combatentes numa Guiné onde as histórias, e as suas hilariantes estórias onde a camaradagem entre o pessoal proliferava, se conservarão armazenadas em “esqueletos” que, por ironia de um destino nos vai por ora contemplando como seres viventes ao cimo deste planeta chamado Terra, permanecerão hirtos em memórias que jamais se apagarão no limbo do esquecimento da nossa existência.

Somos, também, pequeníssimos sopros de vento que se diluem facilmente na infinidade de um horizonte, onde a perceção de confronto com o além parece, por enquanto, distante. Todavia, somos, no fundo, pessoas com uma mente privilegiada para recordar, com saudade, camaradas que o evoluir dos tempos ousou separar, algo que, em meu entender, naturalmente se aceita.

A imagem que exponho dos “piriquitos” na “5ª Avenida de Nova Lamego”, assim como o texto seguinte, são conteúdos que fazem parte do meu livro “Um Ranger na Guerra Colonial 1973/1974 Memórias de Gabu”, lançado a público pelas Edições Colibri.

Piriquitos desbravavam o ambiente da “avenida”. Da esquerda para a direita: o Cardoso, Operações Especiais/Ranger, eu, José Saúde, Operações Especiais/Ranger, o Santos, Minas e Armadilhas, Freitas e o Rui, Operações Especiais/Ranger.

Antiga Nova Lamego

Denominada como Nova Lamego, sobretudo ao longo da guerra colonial, Gabu é uma região cujas fronteiras confinam a Norte com o Senegal, a Leste e a Sul com as regiões de Tombali e a Oeste com Bafatá.

Recorrendo a dados históricos contemplados na Wikipédia, enciclopédia livre, Gabu foi a capital do Império Kaabu, um reino Mandinga que existiu entre os anos de 1537 e 1867 e que se chamava Senegâmbia. Antes, tinha sido uma província do Império Mali. No século XIX a etnia fula impôs a sua supremacia na região e colocou ponto final no domínio de Kaabu.

Gabu é, igualmente, a pátria do chão fula (79,6%), existindo ainda a etnia mandiga (14,2%) que se espalha por toda a zona, mas numa menor escala. Foi-me dado a oportunidade em conhecer alguns dos princípios éticos de uma população que prima pela honra de uma herança que assumem como um indeclinável direito.

No plano territorial Gabu possui uma área de 9.150 kms2 e tinha no ano de 2004 uma população que se estimava em 178.318 almas, sendo, por isso, considerada uma das maiores, senão a maior, das regiões do país.

Introduzo como credível uma nota de rodapé que após a independência do país Gabu recuperou o seu nome tradicional existindo, atualmente, um pequeno núcleo urbano de inspiração colonial.

Detentora de clima tropical, quente e húmido, a região de Gabu é composta por uma população em que a doutrina praticada aponta como alvo principal a religião muçulmana (77,1%).

As temperaturas rondam normalmente os 30/33 graus durante o dia e os 18/23 à noite. As estações anuais definem-se como as das chuvas que vai de maio a novembro e a de seca de dezembro a abril. Dezembro e janeiro são considerados os mais frescos. Por outro lado, a economia assenta no comércio, agricultura e pecuária.

Os usos e costumes das gentes de Gabu derrapam para primórdios éticos onde é visível uma hierarquia humana que não abdica do erário transmitido de gerações para gerações.

Redijo este tema sobre um “estágio” obrigatório nessa zona e na qual me foi proporcionado observar algo mais ao longo da minha comissão em solo guineense, embora encurtada devido à Revolução de Abril de 1974, uma vez que fui um dos cerca de 45 mil militares dos três ramos das Forças Armadas – Exército, Força Aérea e Marinha – quando por lá prestava serviço. Conheci, portanto, a guerra e a paz e um pouco das vivências tradicionais das suas gentes.

Aliás, num trivial conhecimento com os nativos que muito me estimulou, pessoas simples que viviam no interior de um adensado mato e entre as duas frentes da guerra, usufrui da possibilidade em conhecer alguns dos seus expeditos hábitos, assim como as memórias que nós combatentes incessantemente recordaremos.

Um abraço, camaradas 

José Saúde

Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523

Mini-guião de colecção particular: © Carlos Coutinho (2011). Direitos reservados.

___________

Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em:

9 DE SETEMBRO DE 2020 > Guiné 61/74 – P21341: Memórias de Gabú (José Saúde) (96): A fé na guerra (José Saúde)

quarta-feira, 13 de abril de 2022

Guiné 61/74 - P23164: Historiografia da presença portuguesa em África (312): Fundos da gaveta: leituras espúrias sobre a História Antiga da Guiné Portuguesa (3) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 7 de Abril de 2021:

Queridos amigos,
São mesmo leituras espúrias, com grande elasticidade para o termo antiguidade, desta feita conclui-se esta curta incursão com o relatório que Orlando Ribeiro preparou para a Junta de Investigações Coloniais quanto à sua missão em 1947, ele sonhava voltar, pensava mesmo numa permanência de 4 meses, não aconteceu, felizmente que há este rico documento e em 2011 Philip Havik e Suzanne Daveau publicaram o caderno de campo da missão da Guiné, um dos mais belos textos científicos de caráter social que pude ler, não foi por acaso que Orlando Ribeiro além de ter sido a figura proeminente da Geografia em Portugal no século XX foi um eminente humanista, muito se esforçou, depois do 25 de abril, para que se consolidassem os estudos africanos numa base de aproveitamento do muito valor acrescentado em posse das instituições científicas nacionais, deploravelmente não veio a acontecer, para prejuízo da nossa cooperação nos países africanos de língua portuguesa.

Um abraço do
Mário



Fundos da gaveta: leituras espúrias sobre a História Antiga da Guiné Portuguesa (3)

Mário Beja Santos

Aquele que terá sido o maior geógrafo português do século XX, Orlando Ribeiro, visitou Guiné em 1947, há alguns anos aqui se fez referência ao seu importantíssimo caderno de apontamentos elaborado no terreno, Orlando Ribeiro: Guiné 1947, organizado por Philip Havik e Suzanne Daveau, Edições Húmus, 2011.

Em 1950, os anais da Junta de Investigações Coloniais davam à estampa a notícia sumária da sua missão científica, Orlando Ribeiro começa por abordar a missão em que esteve envolvido com outro eminente cientista, o Prof. Carríngton da Costa, este a chefiar a missão de Geologia, havia o plano de percorrer toda a colónia, só que, entretanto, Orlando Ribeiro adoeceu, chegou tardiamente. E escreve:
“Que vantagens trouxe a coordenação duas missões? Economia, por certo, e a possibilidade de discutir in loco muitas observações. Mas a Guiné é muito uniforme na terra e variada na gente. Desejava agrupar aquele emaranhado dos povos em conjuntos definidos pelos modos de vida, formas de habitação e povoamento, economia, etc. Para isso tinha de fazer um reconhecimento vasto e, tanto quanto possível, completo. As minhas observações são muito desequilibradas: a permanência mais larga que tive em chão de Fulas e Mandingas permitiu-me reunir sobre estes povos muitos elementos. Estudei também algumas tabancas de Papéis, Balantas, Manjacos e Brames. Em todas fiz inquéritos sumários, que às vezes ocuparam mais do que uma manhã ou que uma tarde de trabalho. Um acampamento com vários brancos, se por um lado torna a vida mais agradável, empata muito também. Creio que, para missões de pouca duração, o material muito completo traz menos vantagens do que inconvenientes. Uma cama portátil e o indispensável para cozinhar, um ou dois criados e, numa palhota ou na casa de um posto, o abrigo para a noite, dão maior mobilidade e fazem perder menos tempo”.

E explica o seu trabalho de campo: “A época era má, visto que as culturas se fazem quase só durante o tempo das chuvas. Vi ainda lavrar algumas bolanhas e recolhi uma coleção de instrumentos gentílicos usados no amanho da terra”. Faz agradecimentos à hospitalidade recebida, em particular a guineenses: “Não posso esquecer os amáveis informadores indígenas, que se prestavam, com uma compreensão que nem sempre se encontra na gente do povo da Metrópole, a mostrar-nos as suas casas e a descrever-nos os usos e costumes locais. Recordo em especial os veneráveis anciãos de Djabicunda, a cuja mesquita fui algumas vezes, que me receberem sempre com inexcedível cortesia e me fizeram dizer pelo intérprete quanto tinham gostado de falar comigo das coisas do tempo antigo”.

Deplora a carência de elementos cartográficos: “Qualquer trabalho de Geografia carece de base cartográfica. A colónia possui apenas um mapa de reconhecimento na escala de 1:500.000, cheio de imperfeições, lacunas e erros”. Deixa a sua esperança que o trabalho da missão Geoidrográfica venha a suprir tão grave lacuna. Revela satisfação com os avanços da investigação: “Tive a surpresa e o prazer de verificar que os estudo etnográficos, indispensável subsídio de Geografia humana, com que têm larga margem de afinidade, se encontravam na Guiné em pleno florescimento, animados pelo entusiástico apoio do Governador e a competência e dedicação do Tenente Teixeira da Mota”. Seguidamente dá conta dos objetivos do trabalho, lavrando que não dá por terminada a sua missão e deseja que lhe seja facultada uma nova permanência de 3 a 4 meses na Guiné. Faz o reconhecimento geral e apresenta as grandes unidades geográficas, do seguinte modo:
“1) Litoral – Ilhas adjacentes e uma costa rasa, rias e bolanhas – vegetação exuberante, mangal e floresta-galeria ao longo dos rios. Agricultura intensa, palmares, culturas alagadas, e pesca.
2) Região de transição (mata do Oio) – Relevo um pouco mais movido, mata densa, população esparsa. Uma grande reserva natural.
3) Planalto do interior (Bafatá – Gabu) – Dois ciclos geomorfológicos, planalto de erosão com rios encaixados, de largo leito maior entre margens escarpadas. Savana. População mista de Mandingas (fixos) e Fulas (móveis). Agricultura e pastoreio.
4) Boé (Bowal dos geógrafos franceses) – Não limitado pelo Cocoli (o outro nome do rio Corubal), como o mapa e o uso podem fazer crer; atravessa o rio. Colinas e planaltos desnudados. Região muito pobre, solo mau, agricultura rudimentar, gado raro, dizimados pelas glossinas”
.

Descreve minuciosamente a morfologia dos solos e daí transita para as questões do povoamento, economia e modos de vida indígenas, escreve parágrafos de elevado recorte literário e que mostram a sua inusitada capacidade de análise, falando dos Fulas, Mandingas, Balantas, Manjacos e Papéis, sobretudo. E expõe sem tibiezas os grandes problemas da colonização guineense:
“A Guiné não é uma colónia de povoamento. Sejam quais forem os atrativos que o desenvolvimento recente da capital e outras vilas proporcionem aos europeus, sem embargo da exceção de velhos colonos que gozaram sempre de saúde e robustez, o clima é pouco propício aos brancos. A própria lei que regula a utilização de licença graciosa para os funcionários públicos inclui a Guiné entre os lugares menos favorecidos. O paludismo graça com intensidade, principalmente na época das chuvas, as formosíssimas ilhas de Pecixe e Jata são grandes focos de doença do sono, espalhada mais ou menos por toda a colónia, assim como a lepra, a disenteria amibiana, a ancilostomíase, etc.
(…)
Salvo durante umas breves horas da manhã ou à tarde, está vedado aos brancos o trabalho agrícola e a longa exposição ao sol. Onde principalmente se vê quanto esta terra é imprópria para o europeu é no aspeto, pálido enfezado, que crianças normalmente robustas adquirem ao fim de pouco tempo de permanência. Daqui o especial caráter da colonização da Guiné. O branco vem para se demorar uns anos, que os azares da vida podem alongar, mas nunca com o espírito fixar-se; a família fica muitas vezes longe. Lentamente, o homem isolado, roído pela melancolia, abandona-se à sedução das belezas locais e, às vezes, uma prole matizada acaba por fixá-lo ao solo hostil. Apenas entre crioulos cabo-verdianos, em especial das ilhas de Barlavento, se encontram agricultores, que exploram a cana-de-açúcar para obter água-ardente. À parte algumas granjas do Estado, e uma ou outra horta à roda da casa de algum colono mais progressivo, as pontas lançadas pelo mato destinam-se quase apenas à cultura da cana. A restante agricultura é praticada por indígenas. O branco é, portanto, na Guiné, comerciante ou funcionário. O objetivo fundamental é demorar-se pouco enriquecendo depressa”
.

E comenta assim a economia guineense: “A economia da Guiné assenta numa base restrita; as fontes de receita essenciais são o imposto indígena e os impostos alfandegários, que incidem gravosamente sobre artefactos ou produtos de consumo corrente e indispensável, prejudicando deste modo o desenvolvimento da região. Outra grande fonte de receita é o comércio de oleaginosas, sendo a mancarra quase o único produto que os indígenas cultivam para vender. Assim, à parte a que se destina satisfazer as necessidades alimentares, é a monocultura, com todos os seus riscos, que fornece o essencial da exportação. Não há indústrias; são raras as plantações; o comércio, numa crise possível de oleaginosas, soçobrará sem remédio. A economia da colónia, primitiva e rudimentar, assenta numa base cuja fragilidade é evidente”.

Tanto quanto nos é dado perceber, Orlando Ribeiro jamais deu continuidade à missão que ambicionara fazer na Guiné. Esteve em Bissau no mês de dezembro, na Conferência Internacional do Africanistas Ocidentais, 1947, onde fez uma conferência e apresentou duas comunicações. Manifesta o seu desenho de prosseguir o estudo na Guiné. Não aconteceu.

E aqui se põe termo a um escasso número de textos que intitulei Fundos da Gaveta, papéis que me foram aparecendo enquanto trabalhava no meu projeto Guiné, Bilhete de Identidade, sempre a sonhar encontrar uma raridade, um documento fundamental para a História da Guiné, digamos que tive sorte em encontrar este relatório de Orlando Ribeiro, cronologicamente coincidente com o termo da investigação a que me afoitei, já que considero que é na governação de Sarmento Rodrigues que fica esclarecida a identidade da Guiné depois da presença portuguesa, a despeito das verdades como punhos que o geógrafo Orlando Ribeiro aqui deixa exaradas.


Carregamento de amendoim no porto do Pidjiquiti, fotografia de Orlando Ribeiro, 1947
Orlando Ribeiro na Guiné, com o seu guia
Bissau. 1947. Tabancas Brames com o seu cercado de pau alto, fotografia de Orlando Ribeiro
____________

Nota do editor

Último poste da série de 6 DE ABRIL DE 2022 > Guiné 61/74 - P23146: Historiografia da presença portuguesa em África (311): Fundos da gaveta: leituras espúrias sobre a História Antiga da Guiné Portuguesa (2) (Mário Beja Santos)