terça-feira, 25 de junho de 2024

Guiné 61/74 - P25682: In Memoriam (504): Aurélio Manuel Trindade, ten gen oriundo da arma de infantaria, ref (1933-2024): antigo comandante da 4ª CCAÇ / CCAÇ 6 (Bedanda, jul 65 / jul 67)



Foto da capa  do livro "Panteras à solta: No sul da Guiné uma companhia de tropas nativas defende a soberania de Portugal", de Manuel Andrezo, edição de autor, s/l, s/d [c. 2010 / 2020] , 445 pp. , il. [ Manuel Andrezo era o pseudónimo literário do ten gen ref Aurélio Manuel Trindade, ex-cap inf, 4ª CCAÇ / CCAÇ 6, Bedanda, jul 1965/ jul 67]

Na foto acima, da capa, o "capitão Cristo, sentado ao centro, na casa do Zé Saldanha [encarregado da Casa Ultramarina, em Bedanda, e onde se comia lindamente, graças aos dotes culinários da esposa, a balanta Inácia] . Por trás, em pé, os alferes Carvalho e Ribeiro e ainda o Zé Saldanha" (legenda, pág. 440).  O cap Cristo era nem mais nem menos do que o "alter ego" do cap Aurélio Manuel Trindade, o 10º (e último) comandante da 4ª CCAÇ, desde 1jan61, e o primeiro comandante (de dez!) , a partir de 1bril de 1967, da CCAÇ 6 (Bedana, 1967/74).





1. A morte do ten gen ref, oriundo da arma de infantaria, Aurélio Manuel Trindade, foi-me confirmada por dois dos seus amigos e camaradas, e membros da nossa Tabanca Grande, o cor art ref Morais da Silva e o cor inf ref Mário Arada Pinheiro.


Este oficial general nasceu a 11 de maio de 1933 , faleceu, aos 91 anos, a 12 de junho de 2024.

Temos cerca de duas dezenas de referências ao Aurélio Trindade, que foi comandante da 4ª CCAÇ  e depois CCAÇ 6 (Bedanda, 1965/67)...

Não o cheguei a conhecer pessoalmente, mas o Arada Pinheiro, que muito prezo (a esposa é da Lourinhã), emprestou-me o livro dele (autografado), escrito sobre pseudónimo (Manuel Andrezo), com as suas memórias de Bedanda e dos seus bravos da 4ª CCAÇ / CCAÇ 6, "Panteras à solta"...

Temos transcrito alguns excertos do livro, com a devida vénia, sob a forma de "notas de leituira"...

É mais do que justo fazer este "In Memoriam". Gostaria, inclusive, de lhe "dar honras de Tabanca Grande", a título póstumo (se não houver objeções da família, que não conheço, mas vou incumbir o cor Aradas Pinheiro para obter o OK do filho que lhe deu a triste notícia). 

A partilha das suas memórias de guerra é importante para todos os "bedandenses" (que passaram pela 4ª CCAÇ e depois CCAÇ 6), e para os demais camaradas da Guiné.

À família, camaradas de curso )da Escola do Exército) e amigos íntimos, o blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné manifesta os seus mais sinceros votos de condolências. E espera poder continuar a honrar a sua memória, através deste meio (virtual) de partilha de memórias dos antigos combatentes da Guimé.

2. Na realidade, o livro "Panteras à solta" é autobiográfica. Grande parte da narrativa, que segue um fio cronológico,  é constituída por episódios, entrecortados por muitos diálogos, sendo o principal protagonista o cap Cristo, "31 anos de idade, natural da Beira Alta, nascido e criado entre o duro granito da serra do Caramulo". É casado e pai de três filhos. Partiu no T/T Niassa, de Lisboa, em 30 de junho de 1965, com destino ao CTIG. 

Vai em rendição individual. Tem já duas comissões no Ultramar: Índia e Moçambique (donde acabara de regressar há 10 meses). (...) "Vai triste. (...) À sua frente o desconhecido. Sabe apenas que vai para a Guiné onde a guerra é dura. " (...) (pág. 7). 

Chega a Bissau a 5 de julho de 1965. E no dia seguinte, parte de imediato para Bedanda, de avioneta civil, com o cap Xáxa (a quem vai render), para tomar posse como novo comandante  da 4ª CCAÇ. 

O cap Xáxa  (Cap Inf António Feliciano Mota da Câmara Soares Tavares ?) fará as honras da sua apresentação aos militares e aos civis de Bedanda. E rapidamente a guerrilha do PAIGC (e a populaçao sob o seu controlo) vai passar a conhecê-lo e a temê-lo.

As primeiras impressões não foram favoráveis: "Os alferes não gostaram do novo capitão. Acharam-no com cara de poucos amigos. Nem se sequer se atreveram a praxá-lo, uma tradição muito cara à companhia" (...) (pág. 13).

De acordo com o portal UTW - Dos Veteranos a Guerra da Guiné, o cap inf Aurélio Manuel Trindade comandou, em Moçambique, a CCAÇ Esp 312, antes de ser mobilizado para o CTIG (Onde foi condcorada com a Cruz de Guerra de 2ª classe). Em Angola, e já como major de infantaria, seria o 2º comandante do BCAÇ 3856.

3. De um inquérito que o jornalista Adelino Gomes fez a "13 generais de Abril" (e publicado no "Público", em 2007), selecionámos as seguintes respostas dada pelo general Aurélio Trindade (nascido em 11 de maio de 1933, em Viseu; foi condecorado com 1985 com a Ordem da Liberdade):

(i) tinha 41 anos e era major de infantaria  à data do  25 de Abril de 1974, encontrando-se colocado na EPI, Mafra. 

(ii)  tinha feito 4 comissões de serviço no ultramar (Índia, Moçambique, Guiné, Angola);

(iii) resposta à pergunta sobre o seu apoio ao MFA: 

 "A maior parte de nós estávamos metidos no movimento desde longa data. Majores só estávamos dois, eu era um deles". No 25 de Abirl, a sua atividade operacional foi a de "comandante da unidade" (EPI)

(iv) sobre os protagonistas do 25 de Abril que acabaram por ser prejudicados nas suas carreiras, respondeu:

 "Todos os militares mesmo os que chegaram a generais como eu e o Jorge Silvério [também do Movimento, na EPI] pagam um preço por terem feito o 25de Abril. O preço, foi não me darem o comando de unidades. A mim, que na guerra tive uma companhia condecorada colectivamente por feitos em campanha (há no máximo uma dúzia, em centenas que lá andaram)."

(v) respondendo à pergunta do jornalista: "Quer indicar algum nome que gostava de ter visto no generalato (ou como almirante)?"... Resposta:

"Gertrudes da Silva. É o nº 1 do curso e ainda hoje lhe têm respeito. Pegou numa companhia do RI 14 na noite de 24 e veio por aí abaixo esses 300 quilómetros, até Lisboa, onde tinha uma missão a cumprir e cumpriu-a. Pagou a factura. Dizem que ele é gonçalvista? E os que estiveram ligados ao Mário Soares e ao Sá Carneiro? E à extrema-esquerda? Outro nome a quem não deram comando: Rui Rodrigues. Um homem que é capaz de arrancar com uma companhia e tomar o aeroporto, não pode comandar a Escola? Nos 300 que fizeram o 25 de Abril havias dos melhores oficiais do Exército. Por isso foram capazes de planear e executar aquela missão. O domínio da máquina militar pouco depois do 25 de Abril ficou nas mãos de militares que chamavam 'libertários' aos do 25 de Abril."

(vi) Sobre o antigos combatentes, Aurélio Triandade, fez questão de manifestar ao jornalista "a sua indignação pela forma como têm sido tratado":

(...) Como “oficial, ex-combatente e homem do 25 de Abril”...  Todos os governos têm dito que querem defender os ex-combatentes, “mas não fazem o essencial”, limitando-se a dar-lhes “uma esmola, e a esmola desonra o Estado português”.  (...)  “Os ex-combatentes nunca pediram ao estado uma pensão. O que pediram foi tratamento igual [em relação à contagem do tempo de serviço, quer militares quer os jovens do serviço militar obrigatório que foram para a actividade privada]. Dá-se 150 euros - trinta contos por ano - a um ex-combatente? É uma miséria. É indigno. Ou davam qualquer coisa decente ou não davam nada. Vem agora este governo dizer que só dá aos que precisam. Mas o ex-combatente não precisa de esmolas. Se querem dá-la,  façam-no pela Segurança Social, por exemplo. Por ser combatente, não”. (...)

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Nota do editor:

Último poste da série > 26 de maio de 2024 > Guiné 61/74 - P25564: In Memoriam (503): Lino Bicari (1935-2024) foi a sepultar ontem, no Alvito, Alentejo... "Senti a partida deste bom amigo, que encontrei na Guiné, e desejo-lhe o descanso eterno" (Arsénio Puim, ex-alf grad capelão, BART 2917, Bambadinca, mai 70/mai71)

Guiné 61/74 - P25681: 20º aniversário do nosso blogue (16): Alguns dos melhores postes de sempre (XI): na noite de 22 de junho de 1968, há 56 anos, Contabane transformou-se no inferno - Parte I: a versão de Manuel Traquina (ex-fur mil mec auto, CCAÇ 2382, Buba, 1968/70)




Guiné > Região de Tombali > Contabane > CCAÇ 2382 (1968/70) > Malta da CCAÇ 2382 instalada nma monumental bagabaga (candidato ao concurso O Melhor Bagabaga da Guiné...), nas proximidades de Contabane, uma tabanca e destacamento destruídos na sequência do ataque, de três horas, levado a cabo pelo PAIGC em 22 de junho de 1968.

Contabane foi então abandonado pelas NT e pela população. Mais tarde será feito um reordenamento, mesmo frente ao Saltinho. Por lá passou o nosso camarada Paulo Santiago, quando foi comandante Pel Caç Nat 53 (1970/72). A povoação hoje chama-se Sinchã Sambel.

Foto (e legenda): © Manuel Traquina (2008). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar): Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]





Guião da CCAÇ 2382 (Buba, 1968/70), "Por picadas nunca estradas, por estradas nunca picadas"... Um trocadilho bem achado..., ó Zé do Olho Vivo!




1. O Manuel Batista Traquina,
  "ribatejano, escritor e fadista", com vivências ang0lanas, ex-fur mil mec auto, da CCAÇ 2382, Buba, 1968/70) vive em Abrantes, onde nasceu em 1945.  [foto de 2008 à equerda].   

Podia ter sido apanhado à unha. Ou até ter sido morto. Teve sorte: esteve lá nesse pavoroso ataque a Contabane, em 22 de junho de 1968, e relatou-nos o essencial do que viu e viveu, no seu livro "Os Tempos de Guerra: de Abrantes à Guiné"   (Abrantes, editora Palha de Abrantes, 2009. ISBN 978-972-98796-6-1,228 pp.). A CECA (Comissão para o Estudo das Companhas de África) não faz qualquer referência a este ataque, que reduziu a cinzas Contabane que era até então um importante tampão fula (eixo Contabane - Aldeia Formosa), contra a fúria do PAIGC na região do Forreá.

Beja Santos
e Hermínio Marques

Este episódio de guerra foi recentemente evocado aqui pelo Beja Santos que, no passado dia 17, foi abordado pelo Hermínio Marques, antigo sold cond da CCAÇ 2382, o qual lhe contou como perdeu tod0s os seus haveres há 56 anos, em Contabane.

Ambos estava de passagem pela ilha de Santa Maria. O Hermínio Marques, que vive na América, casado com uma açoriana, reconheceu, no Hotel, o Beja Santos, sendo visita assídua do nosso blogue! (*).


Vamos convidar o Hermínio, que já nos escreveu, a juntar-se a esta tertúlia que é a Tabanca Grande, e onde já cá estão alguns bravos da CCAÇ 2382, a companhia do Zé do Olho Vivo, como o Manuel Traquina, o Carlos Nery, o José Manuel Cancela, o Alberto Ferreira, 
o padeiro, também conhecido por "Geada").



O Ataque a Contabane (**)

por Manuel Traquina

Era o dia 22 de Junho daquele ano de 1968, a Companhia estava na Guiné havia pouco mais de um mês e, ao ser deslocada para a região de Aldeia Formosa, (Quebo) dois pelotões fixaram-se em Mampatá, os restantes bem como o Comando foram deslocados para a aldeia de Contabane. 

Ali parecia respirar-se a paz, a população era numerosa e bastante acolhedora, e como habitual faziam-se alguns patrulhamentos na região, que ficava a poucos quilómetros da fronteira com a Guiné-Conákri.

Naquela aldeia os militares acomodavam-se nas próprias moranças cedidas pelo chefe da Tabanca. À volta da aldeia tinham sido abertos no terreno algumas valas e abrigos, além de duas fiadas de arame farpado. 

Tudo parecia correr dentro da normalidade, naquela tarde eu próprio com mais quatro militares saímos no Unimog a buscar água do poço que se localizava a curta distância.

Porém, já próximo do anoitecer, um dos elementos nativos que connosco efetuavam um patrulhamento, pisou um engenho explosivo, que lhe deixou um pé seriamente afectado. Este foi o primeiro sinal de que toda aquela paz não era real, o grupo recolheu à aldeia/aquartelamento, era a hora de jantar e na improvisada enfermaria o furriel enfermeiro Chambel com grande dificuldade, tentava encontrar uma veia onde pudesse administrar algum soro ao militar milícia, que com um pé decepado tinha perdido muito sangue.

Entretanto o sargento João Boiça, apercebendo-se da situação, corria de uma ponta à outra da aldeia, não parava de alertar todos para que de imediato se deslocassem para os abrigos, talvez ao tomar esta medida tenha evitado algumas mortes.

Tinha anoitecido e, de repente,  algumas explosões deram inicio a um ataque que se ia prolongar por cerca de três horas, as balas incendiarias atravessavam a palha que servia de cobertura à morança onde o ferido começava a receber o soro. Disse ao Chambel e ao Coelho que tínhamos que sair daqui imediatamente com o ferido, porém ele, já mais endurecido pela guerra, reunindo as suas débeis forças arrastou-se até á porta e, no escuro,  sem que nos apercebesse-mos desapareceu rastejando, só na manhã seguinte o voltámos a ver, quando da chegada do helicóptero que o evacuou bem como a outros feridos.

Foram cerca de três horas de bombardeamentos em que a aldeia reduzida a cinzas mais parecia um inferno. Mo final foi uma forte trovoada que, transformou a cinza em lama, onde quase não havia onde nos abrigar. 

Não tenho dúvidas de que nós,  os militares,  que naquela tarde fomos à água, pasámos muito perto do local onde o inimigo preparava o ataque e só não fomos feitos prisioneiros porque o objetivo era o ataque. 

Apesar do grande aparato e grande potencial de fogo, sofremos apenas três feridos,  dois dos quais de maior gravidade. Porém, quase todo o património da companhia ali ficou reduzido a cinza, os rádios, os géneros alimentícios, o equipamento de enfermagem, tudo ali ficou carbonizado, grande parte dos militares ficaram apenas com a roupa que tinham vestida. 

Na manhã seguinte um helicóptero evacuou os feridos, alguns militares apressaram-se a escrever um ou outro aerograma meio queimado e enlameado que foi entregue ao piloto do helicóptero, era a parte psicológica a funcionar, pretendiam partilhar aquele momento de desânimo com alguém do coração.

Contabane foi totalmente evacuada de população e militares, saímos dali moralmente destroçados, alguns apenas de calções, sapatilhas e a sua G3, mas vivos para suportar muitos outros ataques e emboscadas durante os vinte e dois meses que se seguiram. 

Já no termo da comissão viemos encontrar na cidade de Bissau o milícia que, ao pisar a armadilha,  foi amputado de um pé, e que naquela cidade tentava sobrevier como engraxador de sapatos.

Neste agora passado dia 22 de junho de 2008, ao completarem-se quarenta anos sobre este ataque, quero homenagear os dois camaradas mortos,  não neste ataque, mas noutros que se seguiram, furriel Ramiro de Sousa Duarte e o soldado Elidio Fidalgo Rodrigues, pertencentes a esta Companhia.

 Quero também saudar todos os militares da CCAÇ 2382, estou convencido que todos os que viveram este acontecimento o recordam e jamais esquecerão aquelas horas difíceis ali vividas. (***)

Manuel Batista Traquina
Ex-Fur Mil, CCAÇ 2382 (Buba, 1968/70)


Guiné > Região de Tombali > Carta de Contabane (1959 > Escala 1/50 mil > Posição relativa de Contabane, a sul de Saltinho e do rio Corubal, a caminho da fronteira... A nordeste, Quirafo, também de trágica memória para as NT (abril de 1972).

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2024)


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Notas do editor:

(*) Vd. poste de  22 de junho de 2024 > Guiné 61/74 - P25674: (De) Caras (209): Hermínio Marques, ex-Soldado Condutor da CCAÇ 2382: "Vou contar-lhe como perdi as minhas coisas em Contabane" (Mário Beja Santos)



Vd.poste anterior: 4 de maio de 2024 > Guiné 61/74 - P25476: 20.º aniversário do nosso blogue (14): Alguns dos melhores postes de sempre (X): O fatídico dia 12 de outubro de 1970: a emboscada de Infandre, Zona Oeste, Setor 04 (Mansoa) (Afonso Sousa, ex-fur mil trms, CART 2412, 1968/70)

segunda-feira, 24 de junho de 2024

Guiné 61/74 - P25680: Notas de leitura (1703): O Ministro do Ultramar na Guiné, março de 1970, Horácio Caio fala na vitória (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 18 de Janeiro de 2023:

Queridos amigos,
Mais uma surpresa, uma bibliotecária dedicada deixou-me em cima da mesa de trabalho na Sociedade de Geografia de Lisboa uma revista que desconhecia totalmente, e de que não encontro referências no google, a Cartaz, pelo título palpita-me tratar-se de uma publicação do SNI, revista mensal de cultura, informação e turismo. O conteúdo tem a ver com a visita de Silva Cunha à Guiné, em março de 1970, nada que não esteja já registado. A novidade é a colaboração de Horácio Caio, não se sabe ao certo se também viajou na comitiva ministerial, já escreveu sobre a Guiné e o último livro de reportagem claramente em defesa do Ultramar é da sua lavra, já caminhamos para o 25 de Abril. Foi o primeiro repórter de guerra, terá ido pelo menos três vezes à Guiné, e podemos juntar o seu nome a Amândio César, José Manuel Pintasilgo, Dutra Faria e Avelino Rodrigues (este entrevistou Spínola, que numa dessas peças publicadas no Diário de Lisboa teve uma tirada bombástica, revela-se favorável à autodeterminação). Enfim, tratemos estes documentos como reportagens pró-regime (não será o caso das de Avelino Rodrigues), Horácio Caio era jornalista da Época (jornal do regime que sucedeu ao Diário da Manhã).

Um abraço do
Mário



O Ministro do Ultramar na Guiné, março de 1970, Horácio Caio fala na vitória

Mário Beja Santos

Já conhecia dois livros de Horácio Caio alusivos a duas viagens que fizera à Guiné. Caio tornou-se no primeiro repórter de guerra e foi autor de um bestseller Angola Os Dias do Desespero. Foi com surpresa que pude compulsar uma revista intitulada Cartaz, revista mensal de cultura, informação e turismo, ano VI, número especial março 1970, a visita de Joaquim da Silva Cunha percorreu durante dias localidades da zona Leste (chegou a aterrar em Madina do Boé), esteve no Norte, em Mansabá, no chão manjaco, foi ao Sul a Catió, Cabedu, Cacine, etc. Agradável descoberta na Biblioteca da Sociedade de Geografia de Lisboa, desconhecia inteiramente este relato e creio que esta revista estava ligada ao SNI. No seguimento do relato da viagem aparece um texto de Horácio Caio, é bem provável que ele havia viajado como ministro e intitula-o os caminhos para a vitória, quatro pequenas histórias que ele interliga. Aqui fica o seu resumo.

Na primeira, refere um episódio passado em Bissalanca, que assim começa:
“Às cinco horas nasce o dia. O céu pardo da madrugada fica subitamente brilhante de purpura, passa aos poucos para o turquesa e o laranja e esborrata-se em vários matizes de azul. Então, a grande bola de fogo surge majestosa no seu bom-dia de esperança. A estrada alcatroada até Bissalanca, nastro esticado no ocre da terra, avisa de súbitos rumores metálicos os bairros sociais e as tabancas. São cinco quilómetros de asfalto bordado de casuarinas e poilões onde belos pássaros gorjeiam as sinfonias da manhã.” Faz uma apreciação do que encontra no bar, anda por ali alguém a fazer limpezas enquanto a enfermeira paraquedista e os pilotos do helicóptero ouvem música do tempo. O senhor da limpeza trava conversa com o repórter, agora estava tudo muito melhor, no passado não havia helicópteros nem piquetes, agora tudo se processa com rapidez para transportar os feridos. “Tudo está muito melhor desde que veio este general.”

A segunda estória prende-se com a audácia de um capitão miliciano que se fartou de ouvir os obuses por cima do seu quartel, perdeu a paciência com aqueles guerrilheiros que matavam, roubavam, destruíam, incendiavam e raptavam gente, preparou uma operação em que levou alguns homens para observar a posição onde estavam os guerrilheiros e a população forçada a viver com eles. Feita a referência, preparou um grupo para um golpe de mão, dividiu o contingente em três grupos de homens e pelas quatro da manhã emboscou-se ali perto. Ao nascer do dia, abriu fogo, os guerrilheiros ainda resistiram, e depois fugiram, o capitão queria apanhar gente, a população não acompanhou os guerrilheiros, homens, mulheres e crianças desceram o outeiro, silenciosos, à frente dos soldados. Atrás, o fumo do incêndio subia grosso e negro, traziam setenta e seis vacas que o inimigo roubara à população dos arredores.

A terceira estória intitula-se Eu dei a minha palavra, tem a ver com um homem que se vem entregar à tropa, é interrogado, tem resposta pronta: “A Guiné é a terra onde eu nasci. Esta é a minha terra, é aqui que eu quero ficar. Venho entregar-me à tropa.” E explica que há outros que também se querem entregar, mas têm medo, estão numa tabanca no Senegal, têm medo de ser mortos, compromete-se a ir buscá-los se o deixarem. Volta quarenta dias depois, numa luminosa manhã de dezembro, avisa que os fugitivos do PAIGC estão do outro lado da fronteira, será quatrocentos desalojados que querem viver à sombra da bandeira portuguesa.

E a última estória, Dá muito trabalho para morrer, um paraninfo à bravura militar, até mete linguagem de caserna, anda um grupo de combate à procura de turras, há tiroteio, o nosso herói perde-se do grupo, apanhou um tiro no ombro, aconteceu-lhe quando andava na caça ao homem. Novamente vem à baila o nosso general, não é a primeira vez que Horácio Caio enaltece o comandante-chefe que aparece imprevistamente nos lugares de risco, houvera uma emboscada, não quis tiros, queria saber para onde ia aquele grupo de cinquenta turras, então avistou-se um depósito de material.

“Caçámos quarenta e oito, vivos, e um montão de pistolas metralhadoras e espingardas, que eram as deles e outras que estavam escondidas. Outros fugiram, mas o que vigiava em cima da árvore estava morto, no chão, ainda por cima caiu de cabeça para baixo, tinha o pescoço partido; ele foi apanhado como um rato dentro da ratoeira. Ele podia ter caído só com o medo do barulho do tiro. E caiu daquela altura, já se vê, um tipo parte logo o pescoço, é uma chatice. Também já vi alguns morrerem só porque têm medo e quando vão a fugir e têm que atravessar um rio afogam-se porque o medo tira as forças todas a um turra.
Não querem combater e, por isso, fogem à nossa frente cheios de medo e não se entregam porque depois os chefes que vivem para lá das fronteiras mandam matá-los. É isso o que dizem todos quando se convencem de que nós os protegemos e ficam a trabalhar connosco e depois veem que é assim mesmo e são felizes ao pé da tropa.”


A história vitoriosa tem que envolver o general claro está, ele andava perdido, deu um tiro no turra que se está a esvair em sangue, virá um helicóptero bendito. Foram lá metidos, quando chegaram ao destino tinha à espera o general que lhe deu um abraço. “Eh pá, a gente sente uma coisa cá por dentro.”

Creio tratar-se da segunda viagem de Horácio Caio, e como o documento comprova ele acreditava a todo o transe que estava a escrever para mostrar aos incréus ou aos indiferentes por onde passavam os caminhos para a vitória, como ele escreveu histórias muito breves e de pouca importância para quem vive longe da guerra.

Joaquim da Silva Cunha, Ministro do Ultramar, distribuindo presentes às autoridades gentílicas durante a sua visita de março de 1970
O Ministro cumprimentando a população após a inauguração do aeroporto do Gabu, no seu quinto dia de viagem à Guiné, março de 1970
Horácio Caio (1928-2008)

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Nota do editor

Último post da série de 21 DE JUNHO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25668: Notas de leitura (1702): Factos passados na Costa da Guiné em meados do século XIX (e referidos no Boletim Official do Governo Geral de Cabo Verde, anos 1860 a 1864) (8) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P25679: As nossas geografias emocionais (25): Quase todos partimos, até 1972, num navio de transporte de tropas, a partir do Gare Marítima da Rocha Conde Óbidos, e não da Gare Marítma de Alcantara...



Lisboa > 22 de Março de 2009 > Cais e Gare Marítima de Alcântara, vistas da Ponte 25 de Abril... > Não, não foi o nosso cais de partida... A nossa "porta de saída" para África foi o Cais da Rocha do Conde Óbidos, que fica mais para leste, a 1600 metros de distância...  Às vezes confundimos os dois cais e as duas gares (que são do mesmo arquiteto, o Pardal Monteiro).  

O Cais de Alcântara também era usado, mais pontualmente, para as partidas  e as chegadas de tropas,  mas era o cais da Rocha do Conde de Óbidos que estava destinado a esse fim.  Aliás, eram onde atracavam os navios da CCN (Companhia Colonial de Navegação), enquanto o de Alcântara era o terminal da CNN (Companhia Nacional de Navegação) e a SG (Sociedade Geral). 

Pelo outro lado, não passávamos sequer pelas gares....pelo que nunca pudemos admirar os painéis do Almada Negreiros, obras-primas da pintura portuguesa do séc. XX.

Foto (e legenda): © Luís Graça (2024). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

 


Lisboa > Gare Marítima da Rocha do Conde de Óbidos > Da autoria do arquiteto Pardal Monteiro, foi inaugurada em 1948... Foi daqui que partimos, muitos de nós,  para a Guiné... Nos últimos anos da guerra (a partir de meados de 1972), o transporte já se fazia por via aérea, através dos TAM - Transportes Aéreos Militares. (LG)

Foto do domínio público. Cortesia de Wikipedia.



1. O porto de Lisboa tem dois cais e duas  gares marítimas, a de Alcântara, a poente, e a da Rocha Conde de Óbidos,  a nascente. Ambas servidas por linha férrea... Mas muitos camaradas, sobretudo os de fora de Lisboa, confundem as gares...

Recorde-se a aqui, resumidamente, a história da sua construção:

(i) A modernização do porto de Lisboa é relativamente recente. as primeiras grandes obras remontam ao ano de 1887, no reinado de D. Luís. 

Até 1907 não havia cais acostável (!) para os navios de passageiros, de maior tonelagem. Ficavam ao largo do Tejo, fazendo-se o transbordo de passageiros e bagagens, "à moda antiga"...

Datam dos finais da monarquia, os trabalhos de dragagem, na margem norte do rio, a oeste do cais de Alcântara. 

(ii) Em 1918 começaram a poder atracar no porto de Lisboa os transatlânticos de maior arqueação bruta. 

(iii) A atracação de navios de passageiros passou a ser obrigatória em 1927.

(iv) O cais de Alcântara  e o molhe oeste (poente) do cais de Santos ficaram reservados para as companhias de navegação estrangeiras. 

(v) Os navios nacionais, com destino às ilhas adjacentes e às colónias de  África, partiam do cais da Fundição, Terreiro do Trigo (junto a Santa Apolónia) e molhe leste (nascente) do cais de Santos.

(vi) É no âmbito do “plano de melhoramentos do porto de Lisboa: margem norte do Rio Tejo”, da iniciativa do Estado Novo, que vão ser construídas as gares marítimas de Alcântara e da Rocha do Conde de Óbidos; era então ministro das Obras Públicas e Comunicações, o eng Duarte Pacheco (1901-1943).

(vii) O projeto destas gares marítimas com 2 pisos, é do arquiteto Pardal Monteiro (1895-1957), um dos grandes arquitetos estadonovistas cua obra marcou a cidade de Lisboa, entre as décadas de 1920 e 1950, com edifícios icónicos como a Estação do Cais do Sodré, o Instituto Superior Técnico, a Igreja de N. Sra. de Fátima, o 
Hotel Ritz, etc.

(viii) A gare marítima de Alcântara será inaugurada ainda em plena II Guerra Mundial (a 7 de julho de 1943), quando afluíam a Lisboa dezenas de milhares de refugiados de um continente devastado pela tragédia da deriva totalitária e da guerra.

(ix) Por sua vez, a gare marítima Rocha de Conde de Óbidos (chamava-se assim em virtude do cais estar próximo do palácio do Conde de Óbidos, hoje edifício da Cruz Vermelha, ao lado do Museu Nacional de Arte Antiga, ou Museu das Janelas Verdes) só foi inaugurada em 1948; é 
 aqui se localizava o estaleiro naval que, em 1936, seria  concessionado a um empresa do grupo CUF, a primeira do país a construir navios com casco de aço.

Para muito de nós, antigos combatentes, o cais da Rocha de Conde de Óbidos foi o local de embarque para a guerra colonial... 

Vínhamos, geralmente de noite, de comboio, das unidades de mobilização (muitos vinham diretamente do Campo Militar de Santa Margarida). Nunca passávamos pela gare.  

Só mais tarde eu vim a conhecer os salões Almada Negreiros e admirar os seus painéis, hoje famosos ...

Já aqui confessei, em tempos,  que gosto mais dos painéis da Gare Marítima da Rocha do Conde de Óbidos, pela sua modernidade e ousadia (temática e estética) (*). 

Todos os cais de partida (mais do que os de chegada) fazem parte das nossas geografias emocionais (**).


(**) Último poste da série > 2 de abril de 2024 > Guiné 61/74 - P25327: As nossoas geografias emocionais (24): Nhamate, no sector Oeste 1, Bissorã, em 1970, ao tempo da CCAÇ 13, "Leões Negros"

Guiné 61/74 - P25678: (In)citações (267): Compensações às colónias (Juvenal Amado, ex-1.º Cabo CAR)

1. Mensagem do nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), com data de 22 de Junho de 2024:

Meus caros camaradas e amigos,
Começo por agradecer os votos pelo meu aniversário, embora nós tenhamos muitos anos de prática, sabe sempre bem sentir o aconchego dos amigos.
Assim envio uma reflexão sobre estes tempos mais menos conturbados, que povoam os nossos dias.

Um abraço
Juvenal Amado



COMPENSACÕES ÀS COLÓNIAS

E de repente, o senhor Presidente da Republica sai-se desta forma ligeira sobre o assunto, tal como comentou o decote da senhora no Canadá numa das suas visitas de Estado.

Foi saudado com um enorme coro de críticas mais menos violentas, onde pontua muita gente de direita saudosista e, muitos veteranos ressentidos não sei bem do quê.

Portugal foi ao seu tempo “descobridor” que, não pediu licença para ocupar vastas regiões das quais não tirou mais proventos, porque não teve nunca força para ocupação total dos territórios reclamados para si no contexto das nações colonizadoras. Mesmo assim de Angola, Moçambique e Brasil, as riquezas o comércio de escravos os seus lucros escorreram para a capital do reino em quantidades consideráveis, não fosse a avareza da nobreza e clero, teriam feito de Portugal uma nação próspera, com resultados que teriam chegado aos dias de hoje.

Ao contrário sabemos das enormes dívidas que foram contraídas no sistema financeiro internacional por reis e por fim pela república até aos dias de hoje.

Perdido que foi o Brasil ficamos com duas colonias muito cobiçadas que pela sua riqueza serviriam de penhor no sistema financeiro internacional.

Mas lá diz o ditado que não há bem que sempre dure, nem mal que nunca acabe e, 500 anos em que se mantiveram esses territórios num imobilismo confrangedor para onde era preciso carta de chamada, fomos acordados na nossa precoce juventude muitos de nós na escola primária, para uma realidade dura, que foi o eclodir de violência armada com intuito de nos expulsar de lá. Durante 13 anos de guerra fez-se pela modernização o que não se tinha feito até então. O rastilho estava aceso e já não havia forma de o apagar. O direito à autodeterminação consagrado na carta das Nações Unidas foi exigido, aliás sendo Portugal o ultimo a enfrentar o problema, que ao contrário de alguns ex-colonizadores, não manteve poder através do neocolonialismo onde as potências outrora dominantes exerceram a sua vontade sobre os novos países atrás de golpes de estado, ou guerras civis incessantes. Homens da sua confiança possibilitaram em troca de umas de migalhas a uma clique governativa que vendeu assim o futuro do seu povo.

Mas voltando ao tema levantado por Sua Ex.ª, o problema não é só português. A Bélgica, a França, a Inglaterra, a Holanda, a Espanha e até a Alemanha ocuparam, dominaram e extorquiram de riquezas vastos territórios do nosso globo.
Sufocaram com sangue revoltas, segregaram, escravizaram as populações indígenas fisicamente e nas suas crenças, impondo religião dominante no Ocidente.

A Bélgica é acusada de genocídio de mais 10.000 de congoleses, mas os outros, também impuseram a sua vontade com massacres mais ao menos documentados.

Durante as duas Grande Guerras os colonizadores utilizaram milhões de súbditos coloniais nas suas guerras na Europa e na Ásia. O resultado era de prever findo que foram os conflitos, logo estes se apressaram a pedir a independência, facto que acabou nas guerras de libertação. Os que lutaram contra a nova ordem Mundial da Alemanha e Japão imperiais transformaram-se em opressores dos povos sob a sua tutela. Voltaram as tropas expedicionárias o ódio das posições oficiais e da propaganda do regime, voltaram-se irmãos contra irmãos.

Esta nossa Europa dos “bons costumes” tem que reconhecer que é rica à custa de muita miséria do terceiro Mundo.

A aceitação desses novos países provocou rios de sangue refugiados e deslocados. Quando digo que não sei bem de quê de que os veteranos se ressentem é pelo simples facto, que nós fomos também fomos carne para canhão e deixamos a nossa juventude nas matas e bolanhas, quando não deixamos lá a pele.

Para além do direito a estarmos orgulhosos por termos vestido a farda, não somos heróis, somos vítimas e é preciso interiorizar esse sentimento.

E assim chegamos ao cerne da questão. Será que não se deve algo aos povos que estiveram sob nossa administração cinco séculos?

Está claro que não pode haver sentido literal na devolução de alguma coisa material, uma vez que nem juros podiam pagar, mas há formas de compensação que passa pela cooperação, por apoio na saúde, na educação, tecnologia, verdadeira amizade e tudo tratado sem sobranceria nem paternalismo que sobra por cá, quando se fala dos novos países de expressão portuguesa. Distanciarmo-nos de discursos de ódio e xenofónicos é pois um imperativo.

São países muitos jovens e necessitam quase tudo, pese as enormes riquezas de que são detentores, também precisam de tempo e respeito, para assim encontrarem um caminho melhor para os seus povos.

Um abraço
21/06/2024
Juvenal Sacadura Amado

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Nota do editor

Último post da série de 31 DE MAIO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25590: (In)citações (266): Vamos identificar as Unidades com as Divisas, lemas e designações mais curiosas e divertidas (Augusto Silva Santos, ex-Fur Mil Inf)

domingo, 23 de junho de 2024

Guiné 61/74 - P25677: Elementos para a história dos Pel Caç Nat 52, 54 e 63 que, ao tempo da BART 2917 (Bambadinca, jun 70 / mar 72), estavam destacados no Sector L1 - Parte II

 

Guiné > Região de Bafatá  > Sector L1 > Bambadinca > Mato Cão > O ten cor Polidoro Monteiro, último comandante do BART 2917, o alf médico Vilar e o alf mil Paulo Santiago, cmdt do Pel Caç Nat 53 (Saltinho) e depois instrutor de milícias (no CIM de Bambadinca)  com um crocodilo juvenil  do rio Geba... 

Foto tirada em novembro ou dezembro de 1971 no Mato Cão, após ocupação da zona com vista à construção de um destacamento, encarregue de proteger a navegação no Geba Estreito e impedir as infiltrações na guerrilha no reordenamento de Nhabijões, um enorme conjunto de tabancas de população balanta e mandinga tradicionalmente "sob duplo controlo".

Foto (e legenda): © Paulo Santiago (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar; Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].




Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá  > Sector L1 (Bambadinca) > Destacamento do Mato Cão > Pel Caç Nat 52 > 1973 > O alf mil Joaquim Mexia Alves, posando com um babuíno (macaco-cão) mais o Braima Candé (em primeiro plano), tendo na segunda fila, de pé, o seu impedido, o Mamadu, ladeado pelo Manga Turé. 

Foto (e legenda): © Joaquim Mexia Alves  (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar; Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) > Mato Cão >  Pel Caç Nat 52 (1973 /74) >   Vista do Rio Geba e bolanha de Nhabijões, a partir do "planalto" do Mato Cão.  Foto do último cmdt do Pelotão, alf mil  Luís Mourato Oliveira.

Foto (e legenda): © Luís Mourato Oliveira (2016). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar; Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1. Em 1 de julho de 1971, ao tempo do BART 2917 (Bambadinca, junho 1970/maio 1972), era a seguinte dispositivo das NT no Sector L1 (Zona Leste), no que diz respeito aos Pel Caç Nat 52, 54 e 63

  • Pel Caç Nat 52 >  Fá Mandinga;
  • Pel Caç Nat 54 > Bambadinca;
  • Pel Caç Nat 63 > Missirá (reforçado por 1 Pel Mil 202 / CMil 1) e a seguir Mato Cão

Maio 71

Op Triângulo Vermelho - 4 e 5mai71

Na região de Enxalé-Cuor, sector L1, foi feito um patrulhamento por forças de 3 GComb/CArt 2715 (Xime), CCaç 12 (Bambadinca), CCP 123 (Bissalanca) e 1 Pel Caç 54 (Bambadinca). 

O lN flagelou as NT, causando 2 mortos e 9 feridos e sofrendo 4 mortos.

Destruídas 12 tabancas, 20 moranças e meios de vida. Capturado 1 elemento armado com esp "Mauser" e documentos diversos.

Agosto 71

28ago71

- Um grupo IN estimado em cerca de 10 elementos flagelou com LROCK, RPG-2 e ARMAUTLIG, de Mato Cão, o barco “Manuel Barbosa” causando 8 feridos graves, e 9 feridos ligeiros.

- Pelas 14,50 horas uma Secção do Pel Caç Nat 52 iniciou a progressão em meio auto com destino a Finete onde se juntaria uma Secção do Pel Mil  201.

- Às 15,10 horas, em [BAMBADINCA 4C2-84], a viatura Unimog 411 de matrícula “ME-18-93” accionou uma mina A/P reforçada, com a roda da frente do lado direito, ficando completamente destruída e provocando ferimentos na quase totalidade dos elementos das NT que nela seguiam, nomeadamente no 2º cabo atirador Nhaga Maque do Pel Caç Nat  52 que veio mais tarde a falecer em Bambadinca como consequência dos ferimentos recebidos.

- Após o accionamento da mina o sold cond Manuel Castro Ribeiro Silva   da CCS/BART 2917 mas destacado no Pel Caç Nat 52, assumiu o Comando da Secção, instalando os seus companheiros e montando um dispositivo de segurança à viatura com os elementos mais válidos após o que se deslocou a Bambadinca, transportando aos ombros um dos feridos, a fim de avisar as NT sedeadas neste aquartelamento.

- Imediatamente se deslocou de Bambadinca uma Secção da CCAÇ 12 (acompanhada de um enfermeiro e macas) que se encarregou do transporte dos feridos de Finete, para onde as milícias desta tabanca, que imediatamente acorreram ao local do acionamento da mina os tinham já transportado, para Bambadinca.

- Num reconhecimento feito posteriormente não foi detectada a colocação de mais qualquer engenho explosivo, tendo-se no entanto detectado em [BAMBADINCA 4C7-74], vestígios de instalação em emboscada de um Grupo IN estimado em cerca de 10 elementos, o que vem confirmar declarações de milícias em Finete que dizem ter ouvido alguns tiros.

Novembro  71

2-7nov71

Op Tareco Vilão I

(Desenrolar da acção)

- No dia 2 de novembro pelas 8,30 horas os 2 Gr Comb da CCAÇ 12 (Bambadinca) deslocaram-se em meios auto de Bambadinca  para o Porto (fluvial) de Bambadinca de onde em meios fluviais [barco sintex], prosseguiram para Mato Cão, onde chegaram cerca das 21,00 horas.

- Substituíram então, no local, os Gr Comb  da CCAÇ 12 empenhados na Op Tudo Vale , montando uma rede de emboscadas nos trilhos de acesso mais provável do IN ao Destacamento de Mato Cão, garantindo a segurança com a colaboração do Pel Caç Nat  63, do pessoal que procede à instalação daquele Destacamento.

- No dia 3 pelas 13,30 horas, um Grupo IN estimado em cerca de 40 elementos flagelou com RPG-2 e Arm Aut Lig de [BAMBADINCA 1H97-61], apoiados por RPG-7 e Mort 82, o estacionamento de Mato Cão,  causando 2 feridos graves e 8 ligeiros.

- As NT reagiram imediatamente obrigando o IN a retirar, com baixas prováveis.

- Feito reconhecimento à área de instalação IN,  detectaram-se vestígios de IN ter aproximado e retirado na direcção de Chicri, tendo-se encontrado vários vestígios de sangue.

- No dia 6 pelas 16,55 horas, um Grupo IN não estimado flagelou da direcção de Chicri o estacionamento de Mato Cão e as forças de segurança ao mesmo, durante 5 minutos com Mort 82 e LRock.

- As NT reagiram prontamente pelo fogo de Mort 81 obrigando o IN a retirar.

- Posteriormente o 20º Pel Art (Xime) bateu os trilhos prováveis de retirada.

- Não foi feita uma conveniente batida imediata por, após os tiros de artilharia, ter anoitecido sendo a visibilidade muito fraca.

- No dia 7 pelas 6,45 horas quando o Pel Caç Nat 63 explorava o contacto havido ao anoitecer do dia 6 reconhecendo a mata a Norte de arame farpado detectaram a cerca de 600 metros do mesmo, numeroso Grupo IN estimado em 50 elementos que ali se encontrava emboscado.

- As NT imediatamente abriram fogo, tendo o IN,  ao sentir-se descoberto, reagido com RPG-2, RPG-7, Mort 60 e Arm Aut Lig  ao mesmo tempo que um outro Grupo IN localizado mais para Norte e a uns 500 metros do primeiro, começou a flagelar o estacionamento de Mato Cão  com Mort  82 e RPG-7.

- As NT imediatamente exploraram o contacto manobrando pelo fogo e movimento obrigando o IN a retirar.

- Apesar da pronta e enérgica reacção do Pel Caç Nat  63,  o IN conseguiu ao fim de cerca de um minuto quebrar o contacto em virtude do Pelotão ter esgotado as munições de MorT 60 e dilagrama que transportava consigo, cujo consumo foi maior do que seria de prever num contacto deste tipo em virtude do LGFog. 8,9 cm não ter funcionado.

- Remuniciado, o Pel Caç Nat 63 prosseguiu na batida tendo encontrado abandonado no terreno um morto, armado de pistola CESKA ZBROJOVKA m/1927, de origem checa, identificado por documentos que possuía como sendo Mário Campos, e uma granada de RPG-7.

- Foram ainda detectados vestígios e vistos elementos IN arrastando mais cinco corpos de elementos feridos ou mortos pelas NT.

- Entretanto, primeiro, os Mort 81 do Destacamento e posteriormente o 20º Pel Art /BAC 7  (10,5 cm) (Xime) batiam os itinerários previsíveis de retirada tendo o Pel Caç Nat  63 verificado que alguns dos impactos de artilharia se situavam sobre o trilho seguido pelo IN e nas suas imediações encontrava-se muito sangue.

- Neste contacto as NT sofreram 3 feridos graves e 9 (um civil) ligeiros sendo um ferido grave e 3 ligeiros proveniente do contacto directo com o IN e os restantes como consequência da flagelação ao estacionamento.

- No dia 7 pelas 14,30 horas, os 2 Gr Comb  da CCAÇ 12,  após serem substituídos no local pelas NT empenhadas na Op Tareco Vilão II II, iniciaram progressão em meios fluviais [Barco Girassol] para Bambadinca, permanecendo o Pel Caç Nat  63 e uma Secção do Pel Mil  202 em Mato Cão, onde chegaram cerca das 16,00 horas

Fonte: História do BART 2917, de 15nov1969 a 27mar1972, mimeog, 182 pp. (Cópia, em formo digital, gentilmente cedida por Benjamim Durães)



Guiné > Região de Bafatá > Carta de Bambadinca (1955) > Escala de 1/50 mil > Detalhes: posição relativa de Bambadinca, Nhabijões, Mato Cão, Missirá, Sancorlá e Salá. O PAIGC só mandava (alguma coisa), a partir de Salá... tendo "barracas", mas a noroeste, na zona de Madina / Belel). Já no OIo havia a "base central" de Sara Sarauol... O destacamento, mais a norte de Bambadinca, no setor L1. era Missirá, guarnecido por um Pel Caç Nat (52 ou 63, em diferentes períodos) e um pelotão de milícias... Vários camaradas nossos, membros da Tabanca Grande, andaram por outros sítios, "pouco recomendáveis"... A Madina/ Belel (que já não vem neste excerto do mapa) ia-se uma vez por ano, na época seca...para dar e levar porrada.

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2018)


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Guiné 61/74 - P25676: Contos do ser e não ser: Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 / BCAÇ 1887 (23): "Os grelos"

Adão Pinho Cruz
Ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547
Autor do livro "Contos do Ser e Não Ser"


Os grelos

Eu seguia rua abaixo, pelo lado esquerdo da Sá da Bandeira. À minha frente, ia um casal, ela de meiaidade, gordinha, ele mais velho, hemiplégico, de bengala na mão esquerda, arrastando a perna direita, pendendo sempre para a direita, trajetória que a mulher ia corrigindo com um pequeno toque na mão dele. Se assim não fosse, as sequelas do seu AVC, à semelhança de um GPS, obrigavam-no a tombar para fora do passeio.

Lá mais ao fundo, frente ao Pingo Doce, o homem, como se uma mola o puxasse sempre para aquele lado, faz, com toda a facilidade, um rodopio de noventa graus para a direita, ficando em linha reta com a porta do supermercado. A mulher olha para a direita e para a esquerda (look right and look left, à londrina) e atravessa a rua, tendo o cuidado de pegar na mão do marido, pois, de outra forma, com a sua pendência para a direita, ele iria desembocar dez ou vinte metros acima.

Já dentro do Pingo Doce, resolvi seguir os passos daquele par amoroso, ao mesmo tempo que ia dando uma olhadela às prateleiras que me interessavam. A dada altura, verifiquei que o homem parou, olhando insistentemente para o sítio onde estavam as carnes de porco. A mulher puxou-o, mas ele resistiu. Apoiou-se na prateleira, encostou a bengala e com a mão esquerda pegou numa embalagem contendo uma orelha de porco.

Imediatamente a mulher gordinha o dissuadiu dizendo-lhe:
- Nem penses, vou-te comprar uns grelinhos que vi ali e que têm um aspeto do carago!
- Que se fodam os grelos, respondeu ele de forma bem entendível, apesar da fala meio entaramelada.

Só tive tempo de dar meia-volta e tapar a boca com a mão, a fim de abafar uma explosiva gargalhada, que eu não saberia explicar aos circundantes.

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Nota do editor

Último post da série de 16 DE JUNHO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25646: Contos do ser e não ser: Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 / BCAÇ 1887 (22): "Engenharia e tatuagem"

Guiné 61/74 - P25675: Fotos à procura de.. uma legenda (181): Nos navios de transporte de tropas ,em que fizemos o "cruzeiro das nossas vidas", havia sessões de cinema, ao ar livre, no convés...

 


T/T Quanza > BCaç 617 >  A caminho da Guiné > c. 8-15 janeiro de 1964 > Tela para projeção de filmes  ao ar livre...




T/T Quanza > BCaç 617 > A caminho de Guiné > 9 de janeiro de 1964 > Exercício de salvamento a bordo


Fotos (e legendas): © João Sacôto (2019). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. As fotos do  João Sacôto (ex-alf mil da CCAÇ 617 / BCAÇ 619, Catió, Ilha do Como e Cachil, 1964/66; piloto e  comandante da TAP, reformado) não mentem: no T/T Quanza, onde viajou para a Guiné, havia uma tela, pendurada no mastro principal (o da ré), no convés, onde era pressuposto projetar-se filmes... 

Não sabemos quais, nem quantos, nem a que horas... (se é que chegou a haver alguma sessão dessas durante a viagem). Mas só podia ser à noite...Como as noites eram frias e ventosas, em alto mar, é de imaginar que as sessões de cinema ao ar livre não deviam ser muito concorridas... 

Alguém se lembra ainda destes "cruzeiros das nossas vidas" ? Nos outros navios de transporte de tropas (Niassa, Uíge, Ana Mafalda, Carvalho Araújo, etc.) também havia sessões de cinema à noite, no convés ?  E serviam-se mantas e pipocas ?

Camaradas, a caixa de comentários é vossa...

PS1 - Parece que a Companhia Nacional de Navegação foi inovadora, terá ido a primeira a instalar telas  gigantes no convés para sessões de cinema ao ar livre, nas carreiras de África, logo em finais dos anos 40... E nomeadamente no navio Angola.

Diz a Wikipedia, sobre a Companhia Nacional de Navegação (CNN):

(...) A CNN deteve a maior frota do país, com nove unidades: o "N/T Príncipe Perfeito" (1961), que se constituía no seu navio-almirante, os gémeos "N/T Angola" (1948) e "N/T Moçambique" (1949), o "N/T Niassa" (1955), os irmãos "N/T Índia" (1951) e "N/T Timor" (1951), o "N/T Quanza" (1929),os gémeos "N/T Lúrio" (1950) e o "N/T Zambézia" (1949).

Nestes navios se fez a maior parte do transporte dos contingentes militares, material, funcionários do Estado e portugueses que iam para os antigos territórios portugueses em África Ocidental. (....) Alguns deles faziam ainda as carreiras de África Oriental e do Extremo Oriente.(...)


PS2 - Temos mais de 60 referências com o descritor "O cruzeiro das nossas vidas"... Não nos lembramos de ler, nesses postes, alusão a sessões de cinema ao ar livre... Mas alguns navios, como era o caso do Quanza, em 1964, já estava equipado...

PS3 - Sobre o N/M Quanza ver aqui...
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Nota do editor:

Último poste da série > 23 de maio de 2024 > Guiné 61/74 - P25555: Fotos à procura de... uma legenda (180): não sendo a G3, que espingarda automática empunham estes dois militares do BCP 21, no Leste de Angola, c. 1970/72 ?

sábado, 22 de junho de 2024

Guiné 61/74 - P25674: (De) Caras (209): Hermínio Marques, ex-Soldado Condutor da CCAÇ 2382: "Vou contar-lhe como perdi as minhas coisas em Contabane" (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 21 de Junho de 2024:

Queridos amigos,
Pelo adiante vos contarei a alegria que tive em encontrar um soldado a quem dei recruta na ilha de S. Miguel, de outubro a dezembro de 1967, uma amizade indefetível, não nos víamos há umas boas décadas, o prazenteiro andou-me a mostrar as belezas da ilha de Sta. Maria, ele é do Santo Espírito, este encontro foi primeiro milagre; o segundo ocorreu no dia seguinte, alguém que me questiona à hora do pequeno-almoço, o mais importante de tudo é que ele nos acompanha lá onde vive, entre Nova Iorque e Boston, fiquei a conhecer a família, a quem fui apresentado, espontaneamente decidimos tirar uma fotografia, tão eloquente quanto a nossa Tabanca é Grande. E ouvi com pormenores o que se passou em Contabane, em 22 de junho de 1968.

Um abraço do
Mário



Vou contar-lhe como perdi as minhas coisas em Contabane

Mário Beja Santos

Hora do pequeno-almoço, 17 de junho de 2024, Hotel Colombo, Vila do Porto. Mordiscando com apetite uns ovos mexidos com bacon, antevendo as delícias panorâmicas que me serão proporcionadas durante um passeio a uma boa parte da ilha de Sta. Maria, eis que se aproxima da mesa alguém que pede desculpa pela interrupção, não leve a mal, o senhor lembra-me alguém que escreve num blogue que eu frequento regularmente lá na América, estou aqui de visita porque a minha mulher nasceu e viveu aqui bem perto, trouxemos a família para conhecer a terra natal da mãe da avó, é que eu estive na guerra da Guiné e o senhor lembra-me alguém, não se ofenda se não for essa pessoa.

Então levanto-me, confirmo que ele está certo, é o soldado condutor Hermínio Marques, escrevo à pressa CCAÇ 2382, andarilharam por Bula, Buba, Aldeia Formosa, Contabane, Mampatá e Chamarra, mas ele quer falar-me de Contabane, uma flagelação que durou três horas, ficou tudo reduzido a um caco, perdeu os seus haveres, sobrou uma mala de cartão toda empapada, cada um dos que lá estavam ficou com o que tinha vestido. Contagiou-me a alegria deste homem cuja existência, como compreenderão, ignorava completamente, para amenizar o ambiente falei-lhe de um telefonema que há muitos anos recebi do João Crisóstomo, ele tinha adquirido no aeroporto um dos volumes do meu Diário da Guiné, estava profundamente emocionado, prometi que nos iriamos conhecer quando viesse a Portugal.

O Hermínio leva-me junto da família, sinto-me como tivesse chegado da Lua, falo-lhes da Guiné e do que vivemos, a mulher do Hermínio vai-me respondendo, o resto da família parece ignorar a língua portuguesa. Estamos todos num embaraço, o Hermínio insiste que eu tenho de saber o que viveram em Contabane, a mulher leva-me a um corredor e mostra-me uma casa lá no alto, era a casa dos avós, e é nisto que Hermínio insiste, vamos tirar uma fotografia, peço licença para a divulgar no blogue, então porque não? Prometemos voltar à fala, ao fundo da sala alguém põe um dedo em cima de um relógio, e eu não quero partir para a Praia Formosa, Farol da Maia e Baía de S. Lourenço sem o estômago aconchegado. Novo abraço, fico a saber que o Hermínio vive entre Nova Iorque e Boston, nasceu na região de Viseu, só me faltou perguntar-lhe se também vai levar a família ou já a levou à sua terra natal.
Vila do Porto, Santa Maria, Açores, 17 de Junho de 2024 - Mário Beja Santos e Hermínio Martins

Vou passar a manhã dividido entre este encontro e o espetáculo de uma ilha desconhecida, aonde quero voltar, eu tenho a impressão que já lera um texto do Manuel Traquina[1], nosso confrade, sobre a destruição de Contabane, no meio da conversa o Hermínio falava-me nos Palhaços, na irreverência que o Capitão Carlos Nery caprichara para uso do estandarte, é facto que é uma completa desobediência aos preceitos castrenses, é quase uma diversão.[2]


E pronto, que o Hermínio e os seus gozem de muita saúde e que ele nos acompanhe lá dos EUA, da minha parte, e até poder, deste lado do oceano endosso-lhe notícias do que vou fazendo, com lembranças da Guiné.

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Notas do editor

[1] - Vd. post de 19 DE AGOSTO DE 2008 > Guiné 63/74 - P3141: Venturas e Desventuras do Zé do Olho Vivo (Manuel Traquina) (2): O ataque de 22 de Junho de 1968 a Contabane

[2] - Vd. post de 8 DE JUNHO DE 2010 > Guiné 63/74 - P6561: Histórias de Carlos Nery, ex-Cap Mil da CCAÇ 2382 (3): Fui o criador do emblema da Companhia, e gosto

Último post da série de 29 DE MAIO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25575: (De) Caras (208): António Baldé, ex-1º cabo , CIM Bolama (1966/69), Pel Caç Nat 56 (São João, 1969/70), e CART 11 (Paunca, 1970/71): "Eu tinha um sonho: ser apicultor no Cantanhez"...

Guiné 61/74 - P25673: Humor de caserna (69): O visionário "alfero Cabral", de saudosa memória (1944-2021), que, durante o seu "regulado" (Fá Mandinga e Missirá, 1969/71), ainda quis formar o Pelotão de Caçadoras NATIVAS 63...








Lisboa > Belém >  Monumento aos Combatentes do Ultramar > 10 de junho de 2016 > O nosso "alfero Cabral, de saudosa memória (1944-2021), na Marinha, Força Aérea, Exército e Milícia... Fotos do Mário Fitas (ex-fur mil inf op esp, CCAÇ 763, "Os Lassas", Cufar, 1965/67).


Fotos (e legenda): © Mário Fitas (2016). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementat: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




Guiné > Região Leste > Região de Bafatá > Secytor L1 (Bambadinca )> Fá Mandinga > Pel Caç Nat 63 > O "alfero Cabral", sempre benditas entre as mulheres, aqui entre  as suas queridas bajudas mandingas... Visionário, durante o seu "regulado" ainda formar o Pelotão de Caçadores NATIVAS 63...

Foto: © Jorge Cabral (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Na altura, escrevi em comentário ao poste P16191, entretanto readaptado (o "alfero" deixou-nos, inconsolados, em finais de 2021) (*): 

Meu caro "alfero Cabral":

Não te vi, porque fugiste mal o sol começou a apertar mais. Eu fui tarde e só fui espreitar... Mas folgo em saber que os teus problemas de saúde "vão indo e vindo", ou seja. que estás melhor. Como diz o povo, a doença vem a cavalo e vai a pé...

Fizeste bem vir também espreitar a "romaria" do 10 de junho...É um local de encontro obrigatório para os "último soldados do império"... É um local "sagrado" e "simbólico", aquele... onde cada um vai (e vem) com sentimentos às vezes contraditórios...

O nosso Mário Fitas, o "lassa", registou para a posteridade as "mantenhas" que partiste com os 3 ramos das novas Forças Armadas do Portugal Democrático, representadas por 3 gentis militares, do sexo feminino... Não te estou a imaginar, na próxima encarnação, na Marinha, muito menos na Força Aérea. És demasiado terráqueo para te alistares nestas duas armas, "elitistas".,..

A ti, que és um entendido em questões do género, e sempre foste bendito as mulheres, aqui na terra, não te estou a ver, de novo fardado, a não ser como comandante do Pelotão de Caçadoras NATIVAS, lá nos céus... Ou melhor, e já que o poder agora é delas (a frase é tua), não te vejo como comandante do novo Pel Caç Nat, mas como "guia", "guru", "coach", "instrutor", papel que de resto já desempenhavas na tua Fá Mandinga... 

Ainda um dia hás de escrever uma "estória cabraliana" sobre a tua tentativa, gorada por Bambadinca, de criar e formar um Pelotão de Caçadoras NATIVAS... 

Aqueles tenentes coronéis e majores que por lá nos (des)comandaram,  não percebiam nada, nem das poda nem da psico... Infelizmente, nunca chegaste a  submeter  o teu projeto inovador  ao aval do "Homem Grande" de Bissau... Ele certamente que apoiaria, com entusiasmo, a tua proposta, desde que fosse tudo "Por Mor de Uma Guiné Melhor"...

PZ  - Que Deus, Alá e os bons irãs .. e as tuas bajudas te façam boa companhia, l
á no assento etéreo onde agora repousas (**)...