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quarta-feira, 12 de novembro de 2025

Guiné 61/74 - P27413: Historiografia da presença portuguesa em África (503): A Província da Guiné Portuguesa - Boletim Oficial da Colónia da Guiné Portuguesa, 1948 (61) (Mário Beja Santos)

Mário Beja Santos, ex-Alf Mil Inf
CMDT Pel Caç Nat 52

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 7 de Maio de 2025:

Queridos amigos,
Estamos no último ano da governação de Sarmento Rodrigues, avisara à chegada que vinha por pouco tempo, havia obras para acabar e outras para começar, tinha muita pressa em ver resultados em domínios como infraestruturas, saúde, cultura, agricultura, e muito mais. Se se pedisse uma síntese do que houve de mais significativo neste período, diria que a Guiné passara a ter o formato de uma colónia e abandonava a apreciação de que era um local de Praças e Feitorias, em que o comércio era maioritariamente detido pelos estrangeiros. O nome Sarmento Rodrigues está ligado ao combate à doença do sono, às comemorações do Quinto Centenário da Descoberta da Guiné, à melhoria de ouriques para benefício da orizicultura, à construção de moradias, ao abastecimento de água, à tentativa da renovação de Bolama, a muitos novos postos sanitários, à inauguração da barragem de Picle, o Boletim Oficial passou a ter regularidade, construiu-se o Bairro de Santa Luzia, abriu-se a primeira pista do campo de aviação em Bissalanca, construíram-se faróis, aprovou-se a construção do Museu de Bissau... Isto nos meses de 1946, faltam 1947 e 1948. A Guiné estava finalmente posta no mapa e compreende-se como o ministro Marcello Caetano se sentia profundamente agradado pela escolha deste governador dinâmico e imbuído do espírito civilizador. Não é por acaso que termino a minha investigação dos século XIX e XX na governação de Sarmento Rodrigues, quem veio depois encontrava obra feita com o espírito de uma colónia-modelo.

Um abraço do
Mário



A Província da Guiné Portuguesa
Boletim Oficial da Colónia da Guiné, 1948 (61)


Mário Beja Santos

1948 é o último ano da governação de Sarmento Rodrigues, a dinâmica continua imparável. Como já se referiu, no Boletim Oficial n.º 4, de 19 de janeiro, o governador anuncia a criação de um centro comercial na praia de Varela, de modo a permitir às pessoas que pretendam passar ali uns dias de repouso se abastecerem convenientemente. Por isso o governador determina que aos comerciantes ali estabelecidos seja exigido o compromisso de manterem em depósito os géneros de mercearia necessários ao abastecimento dos frequentadores daquela praia. No Boletim n.º 7, de 16 de janeiro, é proibida a prostituição em todo o território da Guiné, atenda-se ao parágrafo inicial do diploma legislativo 1:405:
“Considerando que a dignificação da mulher tem, desde tempos recuados, acompanhado de perto o progresso da humanidade, podendo olhar-se como um índice de civilização por ser uma das suas maiores conquistas.”


No Boletim Oficial n.º 22, de 31 de maio, é determinado que o Centro de Estudos da Guiné Portuguesa proceda desde já ao inventário dos documentos e livros existentes na Colónia, cuja recolha e preservação interessa ao Arquivo. Em 1 de julho de 1948 aparecem publicados no Suplemento n.º 9 os estatutos do Clube de Futebol Os Balantas, de Mansoa, do Futebol Clube de Tombali, de Catió, e do Atlético Clube de Bissorã. No Boletim Oficial n.º 11, de 9 de julho, são publicadas as bases regulamentares do Museu da Guiné Portuguesa, incluindo Biblioteca e Arquivo Histórico. Pelo Boletim Oficial n.º 33, de 16 de agosto, fica regulamentada a missão antropológica e etnológica da Guiné.

Mas voltemos ao início do ano, há novidades no campo da saúde. Do Boletim Oficial n.º 3, de 19 de janeiro, Sarmento Rodrigues toma várias deliberações. Tinha sido despistada a dracontíase em S. Domingos pela Missão de Doença do Sono, havia que imediatamente se fazer o estudo da disseminação desta doença por toda a colónia, e os tratamentos seriam obrigatórios para todos os indivíduos atacados, impondo-se uma sensibilização do público, explicando aos indígenas os perigos da moléstia e como se contrai.

Noutra portaria, recorda-se que em 4 de julho de 1947 os serviços de saúde tinham iniciado uma campanha contra a ancilostomíase na ilha de Bissau, tinha sido detetada uma infestação, havia de se continuar a agir. “Havemos de levar por diante e acabar em bem esta campanha que ficará sem par em qualquer tempo e em qualquer colónia, o que constituirá para a Guiné um justo título de honra que perdurará nos tempos. Tinham sido estabelecidos os preparativos essenciais que consistiam nos exames microscópicos em todo o território, na abertura de fossas, na aquisição dos ingredientes, na preparação dos meios de transporte. Dispomos já de parte dos ingredientes e os restantes vêm a caminho. Já temos os meios de transporte e o pessoal está preparado. Tudo está a postos. Mas esta obra vai ainda engrandecer-se com duas outras paralelas. É que, tal como se fez em Bissau, todos os indivíduos ao serem tratados contra a ancilostomíase serão vacinados contra a varíola e contra a febre amarela. Esperamos receber de uma assentada 50 mil tubos de vacina antivariólica e dispomos desde já apreciável reserva de vacina antiamarílica.”

E o governador determinava um conjunto de iniciativas envolvendo as delegacias de saúde, a abertura de fossas e que em volta de todas as povoações fossem feitas e mantidas uma capinação com derrubas dos arbustos maninhos.

No suplemento n.º 10, de 7 de julho, temos o diploma legislativo n.º 1:420, a Lei da Caça da Guiné Portuguesa. Convirá aqui registar alguns parágrafos, pois consagram claramente a visão do legislador:
“A Guiné Portuguesa, justamente afamada como uma bela região de caça, esteve durante séculos sem recolher e condensar os elementos de informação que se tornavam indispensáveis a uma perfeita avaliação dos seus valores cinegéticos.
Não creio que em África algum desporto possa superar o da caça nos seus benefícios para o homem, pois em nenhum outro melhor se aperfeiçoará esse conjunto de superiores qualidades de resistência física, de tenacidade, de apuramento dos sentidos, de arrojo – tudo isto enquadrado na selva e em contacto com a natureza.

O verdadeiro caçador em África deverá ser ainda estoico e brioso, lutador e leal, duro e generoso. Há de preferir ao veloz automóvel, ou à imprópria mochila, a marcha a pé, com travessias de lagoas ou rios, a vau ou a nado; não se temerá do Sol, nem da chuva, nem das distâncias.
Não matará os animais inofensivos com processos traiçoeiros. Bem lhe bastarão as suas armas, produto do engenho humano, para vitimar uma indefesa perdiz; deixe-lhe, ao menos, a possibilidade de empregar as suas asas e prove depois disso que é um destro atirador.
Não dizimará por prazer matar, nem quando as mortes acarretem prejuízos graves para a espécie. Assim, não há de produzir hecatombes nas plácidas manadas, sem proveito nem honra, porque isso, mais do que perícia ou arrojo, seria prova de instintos sanguinários. Um belo tiro, um belo troféu, devem satisfazer a natural ambição de um caçador que se preza. As fêmeas serão, naturalmente, poupadas.

Um caçador digno desse nome não ousará profanar esses santuários da bicharada que são as reservas, onde os animais vivem e se sentem em liberdade e revelam como os homens é que são, por vezes, as verdadeiras feras. Só quem não tenha olhos capazes de sentir a beleza daquele espetáculo poderia traiçoeiramente matar algumas dentre os milhares de aves aquáticas que confiadamente vivem junto aos homens, sem receio algum, tal como na lagoa de Cufada.”


Promulga-se a lei da caça da Guiné Portuguesa, define-se caça (consiste na procura, perseguição e apreensão de animais bravios), é-se caçador com 18 anos completos, define-se igualmente que não pode constituir objeto de caça, explana-se sobre o exercício da caça. Não haveria caça na mata do Cantanhez, na lagoa de Cufada nem na praia de Varela; classificam-se os terrenos de caça agrupados em áreas (terrenos abertos e reservas de caça). E diz-se que afixação de reservas de caça atribuição do governador da colónia, mediante informação da Comissão de Caça, ouvidos os serviços de agricultura e veterinária.

Na "morança" dos fulas forros, futa-fulas da exposição, ouvindo alguns músicos indígenas
Visitando as obras do Museu de Bissau
Durante a visita à barragem de Picle, o Comandante Sarmento Rodrigues mostra a vasta região por onde ela se estende
O Subsecretário de Estado, ladeado pelo Governador da Colónia e Perfeito Apostólico durante a visita ao Asilo de Bor
À chegada ao Sedengal, o Subsecretário de Estado senta-se num trono construído pelos cassangas
Em Sabutul, o Subsecretário de Estado assiste às lutas de felupes

Imagens retiradas do Boletim Cultural da Guiné Portuguesa, número especial comemorativo do Quinto Centenário da Descoberta da Guiné, outubro de 1947, as imagens referem-se à visita do Subsecretário de Estado das Colónias que ocorreu entre janeiro e fevereiro de 1947
Boletim Oficial de 24 de janeiro de 1949: os guineenses ficam a saber que o Capitão de Fragata Sarmento Rodrigues já não é Governador da Guiné. Aqui regressará em 1955, acompanhando o General Craveiro Lopes, será recebido triunfalmente

(continua)

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Nota do editor

Último post da série de 5 de novembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27389: Historiografia da presença portuguesa em África (502): A Província da Guiné Portuguesa - Boletim Oficial da Colónia da Guiné Portuguesa, 1947 (60) (Mário Beja Santos

Guiné 61/74 - P27412: Armamento do PAIGC (10): Pistola-metralhadora Samopal vz25, de origem checa, ou a M-25, ("Merengue", na gíria do IN, por influência cubana)




Pistola-metralhadora  M-25 ("Merengue"), de origem checa ("Samopal")


Guiné > Região de Tombali >  Ilha do Como > c. 1964 > Guerrilheiros do PAIGC, empunhando pistolas-metralhadoras M-25", cal 9 mm ("Merengue")  e PPSh", cal 7,62mm ("Pachanga", ou "costureirinha", na gíria das NT); do lado direito, distingue-se, em tronco nu,  João Bernardo  'Nino' Vieira, na ilha de Como, Frente Sul. Náo se sabe se a foto foi tirada antes, durante ou depois da Op Tridente. É mais provável  que seja do ano de 1963, pelo ar "desportivo" do grupo,  a fazer um crosse matinal, ou a posar para a fotografia, para o álbum do Amílcar Cabral ( será que o tratavam por senhor engenheiro ?)
 


1.  Através do Formulário de Contacto do Blogger, um nosso leitor pediu-nos que confirmassemos  se esta arma, cuja foto se publica acima, era usada na Guiné pelo PAIGC, no nosso tempo:

Data - sexta, 3/10/2025, 18:20

Segundo pesquisa na Net, que me deu "uma trabalheira",  a arma parece não constar das listagens habituais, trata-se de uma pistola metrelhadora Samopal, vz25.

Deixo o link da arma:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Sa_vz._23

 Sobre a arma:
  • o que me surpreendeu ao pesquisar a identificação dela foi a sua ausência das listagens consultadas na Net;
  •  no mesmo site encontra-se uma foto de 'Nino' Vieira com o seu grupo, curiosamente todos com a mesma arma, ou suas variantes

2. Comentário do editor LG:

2.1. Também sou de opinião que se trata de ums pistola-metralhadora checa, Sa vz25, "Samopal". Dispunha de  uma coronha de metal dobrável, disparava a munição 9×19mm Parabellum. Era em tudo é idêntica à Sa 23 (exceto da coronha, que era de madeira). e usando os mesmos carregadores de 24 e 40 tiros.

Gostava de ouvir a opinião do nosso especialista em armamento, o Luís Dias. Para já, recorri à minha assistente de IA / ChaGPT. Face às duas fotos que lhe mandei, não teve dúvidas em dar a sua opinião ponderada:

(..) Pela forma geral — receptor tubular curto, carregador recto montado à frente da empunhadura, coronha metálica dobrável para o lado e empunhadura/pega frontal dobrável — trata-se muito provavelmente de uma Samopal checoslovaca da família Sa vz.23 / Sa vz.25 (às vezes referido como CZ-23 / CZ-25, exportado como “Sa” ou “Samopal” nos catálogos da época).

Por que acho isto provável:

  • a posição do carregador (à frente da pega) e o aspecto geral lembram os desenhos da família vz.23/25, que foram amplamente exportados pela Checoslováquia na década de 1950–60;

  • a coronha metálica que dobra para o lado e a pega vertical rebatível são soluções técnicas presentes nesses modelos;

  • o PAIGC recebeu armamento do bloco de leste (inclu9indo a então  Checoslováquia) durante a guerra colonial, pelo que a captutra de um Sa vz.23/25 em 1964 é compatível com a proveniência e a cronologia.

Grau de certeza: provável, mas não definitivo. Existem variantes e cópias regionais/industriais e a família vz.23/25 teve pequenas diferenças entre versões de fábrica e exportação. Para confirmação absoluta, o ideal é verificar:

  • marcas e punções no receptor (normalmente código do fabricante e modelo);

  • formato exacto do carregador (capacidade e encaixe);

  • calibre estampado no cano/receptor (7,62×25 Tokarev foi comum em alguns modelos, mas havia variantes noutros calibres). (...)

(Pesquisa: LG / Assistente de IAS / ChatGPT)

(Condensação, revisão / fixaçãod e texto: LG)


2.2. Tudo indica que esta Sa vz25 seja a M-25 ("Merengue", na gíria do PAIGC, por influência cubana) que consta da relação a seguir:


Relação de material capturado  ao PAIGC  até 1964 >  (...) Pistolas-Metralhadoras: Modelo | País de oirgem

  • "M-23", cal 9 mm ("Rico") | Checoslováquia
  • "M-25", cal 9 mm ("Merengue") |  Checoslováquia
  • "PPSh", cal 7,62mm ("Pachanga", "Metra") | URSS
  •  "PPS SUDAYEF", cal 7,62mm | URSS, China
  • "THOMPSON", cal 1l,4mm ("Rico Thompson") | USA - China
  • "MP-40", cal 9mm | Alemanha Oriental
  • "SCHMEISSER" | Alemanha Oriental
  • "BERETA" | Itália
  • "UZI" | Israel 
  • "FBP" | Portugal

Fonte: Excertos de: Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 6.º Volume; Aspectos da Actividade Operacional; Tomo II; Guiné; Livro I; 1.ª Edição; Lisboa (2014), pp. 290/291 (Com a devida vénia...).

terça-feira, 11 de novembro de 2025

Guiné 61/74 - P27411: Ser solidário (291): Início do ano lectivo na escola de Sintcham Arafam, na Guiné-Bissau (Renato Brito)

1. Mensagem do nosso amigo Renato Brito, voluntário, que na Guiné-Bissau integra um projecto de construção de uma escola na aldeia de Sincha Alfa, com data de 5 de Novembro de 2025:

Boa noite Carlos Vinhal,
Espero tudo bem consigo.

O presente mail para lhe comunicar que começou o ano lectivo na escola da Guiné-Bissau.

Cumprimentos,
Renato


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Nota do editor

Último post da série de 7 de novembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27396: Ser solidário (290): Relatório de Atividades, Outono de 2025, da Missão Solidária da ONGD Afectos com Letras à Guiné-Bissau

Guiné 61/74 - P27410: Efemérides (472): Fotos da Festa do Fanado que decorreu em Tite no mês de Novembro de 1969 (Aníbal José Silva, ex-Fur Mil Vagomestre)


1. Em mensagem de 5 de Novembro de 2025, o nosso camarada Aníbal José Soares da Silva, ex-Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483 / BCAV 2867 (Nova Sintra e Tite, 1969/70), enviou-nos algumas fotos da Festa do Fanado que decorria neste mês de novembro.

Caro Carlos Vinhal
Para uma próxima publicação, em anexo envio um pequeno texto e fotografias, com relação à Festa do Fanado, que costumava ocorrer durante o mês de Novembro na Guiné-Bissau.

Um forte abraço
Aníbal Silva



FESTA DO FANADO NA GUINÉ BISSAU EM 69/70

Genéricamente, o “Fanado”é um ritual de iniciação da vida adulta, praticado por rapazes (trata-se, entre outras coisas, da circuncisão) e raparigas (em alguns casos envolvendo a prática da excisão, criminalizada na Guiné-Bissau desde 2011) e era efetuado por várias etnias, variando a idade dos intervenientes, a periodicidade com que era praticado ou a sua duração.

Com o Fanado, os jovens tomavam consciência da sua função social e da sua personalidade, passando em algumas etnias, um período na floresta ou no mato, no cumprimento de uma série de cerimónias envoltas em grande secretismo de que não deviam falar quando regressassem e assumissem o seu novo papel na sociedade.

Este assunto está amplamente divulgado em 29 Postes deste Blogue, autoria de vários Tabanqueiros.

A minha vinda a terreiro a este tema, é simplesmente para dar a conhecer e partilhar as fotografias anexas, que tirei em Tite em Novembro de 1970, não sei se no início, se no fim da festa do Fanado.

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Nota do editor

Último post da série de 6 de novembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27392: Efemérides (471): Convite do Presidente da Liga dos Combatentes, Tenente-general Joaquim Chito Rodrigues, para a cerimónia Comemorativa do 107.º Aniversário do Armistício da Grande Guerra e 51.º Aniversário do fim da Guerra do Ultramar, que se realiza no dia 18 de novembro de 2025, pelas 10h00, no Forte do Bom Sucesso, em Belém, Lisboa, durante a qual será condecorado, com a Medalha de Honra ao Mérito, grau Ouro, da Liga dos Combatentes, o nosso editor Luís Graça

Guiné 61/74 - P27409: Os 50 anos da independência de Cabo Verde (11): o 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente: Mindelo, agosto de 1935 - Parte I



Fotograma nº 1 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 > O cais do porto da Baía Grande e o casario ribeirinho, vistos do paquete a vapor "Moçambique"


Fotograma nº 2 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 > A Baía de Porto Grande (e, ao fundo, o Monte Cara). Com 4 km de diâmetro, é  formada pela cratera submarina de um antigo vulcão. A construção, ampliação e modernização do porto são já de 1962 e de 1997.E muito recentemente, em junho passado, foi inaugurado um terminal de cruzeiros, refletindo a aposta do governo de Cabo Verde no setor do turismo.
 

Fotograma nº 3 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 >  Vista panorâmica da cidade do Mindelo e do Porto  da Baía Grande.


Fotograma nº 4  > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 >  Navio a vapor "Moçambique", que tinha partido de Lisboa a 10 de agosto... Desembarque dos excursionistas, que serão depois levados em barcos a remos para terra. Os jovens que se veem fardados,  são escoteiros, ainda não havia a Mocidade Portuguesa (será criada em 1936). 



Fotograma nº 5 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 >  Barcos a remos em redor do vapor "Moçambique". Entre eles, os "tchabetas", os miúdos caçadores de moedas.


Fotograma nº 6 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de Sáo Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 >  Barcos a remos aproximam-se no "Moçambique", enquanto a "miudagem", em segundo plano, em barcos a remos  mais pequenos, preparam-se para recolher, de mergulho, as moedas lançadas pelos turistas, por diversão... Fazia parte do "pitoresco" do Mindelo... Esses miúdos eram os "tchabetas".


Fotograma nº 7 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentario de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de Sáo Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 >  Mais uma cena de "mergulhadoires de moedas", que captou a atenção do operador de imagem... Estes miúdos, que faziam parte da paisagem portuária do Mindelo,sobretudo entre os anos de 1920 e 1960, 
eram conhecidos popularmente como “mergulhadores de moedas” ou “tchabetas” em crioulo (forma derivada de "chapeta", pequena embarcação improvisada ou frágil). Mal chegava um navio com passageiros, ao porto da Baía Grande, os rapazes aproximavam-se, perigosamente, para pedir aos turistas que atirassem moedas, mergulhando depois para as apanhar: uma mistura de destreza, necessidade económica e espetáculo "exótico e pitoresco"para o forasteiro.


Fotograma nº  8 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 > O apoio ao desembarque.


Fotograma nº  9 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de!de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de Sáo Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 >  Um primeiro problema logístico: onde arranjar viaturas para tanta gente? 


Fotograma nº 10 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 > Até carrinhas de caixa aberta serviam...


Fotograma nº 11 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 >  O jovem professor Marcello Caetano, diretor cultural do Cruzeiro, discursando na câmara municipal.


Fotograma nº 12 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentario de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de Sáo Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 > Receção na Câmara Municipal: as senhoras sentadas na primeira fila, com a sua indumentária característica dos anos 30...



Fotograma nº 13 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 > Visita ao Mercado municipal


Fotograma nº 14 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 >  A miudagem disputando as moedas deitadas para o meio da rua pelos turistas do "Moçambique"... Um espectáculo degradante, aos olhos de hoje, mas que fazia parte do "folclore" de "Soncent". A ilha, do Barlavento, a segunda mais populosa do arquipélago, continua a perder hoje o concurso dos seus melhores filhos para a Praia (a capital política) e para emigração. Apesar do desenvolmento socioeconómico da ilha e do resto do arquipélago.




Fotograma nº 15 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentario de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 > Visita á "Oficina do Estado, instituição de ensino profissional"...




Fotograma nº 16 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de Sáo Vicente > Mindelo > Agosto de 1935 > O célebre quiosque da Praça Nova (hoje Praça Amílcar Cabral, e o quiosque ainda lá está, desde 1931; quanto á praça, o povo continua a chamar-lhe Praça Nova, e não Amílcar Cabral, designação toponímica imposta em 1975 pelo governo do PAIGC) ...

A morabeza estampada no rosto desta mulher. Ainda não havia a cerveja Sagres (só aparecerá em 1940), mas já havia a Estrella...nome decalcado da famosa cerveja belga Stella.


A "Estrela" tinha fábrica em Lisboa, desde o séc. XIX, tal como as marcas "Jansen" e "Portugália". Estas três pequenas cervejeiras foram integradas na Sociedade Central de Cervejas, criada em 1934. Na época o consumo "per capita" de cerveja em Portugal era de apenas... 1 litro.


Cortesia de Cinemateca Digital, documentário "I Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente", realizado em 1936 por San Payo. Disponível aqui:

http://www.cinemateca.pt/Cinemateca-Digital/Ficha.aspx?obraid=1378&type=Video


(Seleção e edição de imagens, numeração, legendagem, revisão / fixação de texto, título, negritos: LG)



1. Estas imagens, obtidas de fotogramas do filme do San Payo (Por, 1936, 91', P&B, sem som), podem ter algum valor documental, para nós, antigos combatentes. Terão seguramente para os nossos amigos e camaradas que são naturais do Mindelo ou que lá vivem ou que conhecem o Mindelo, e a quem pedimos que comentem: a Lia Medina, o Carlos Gilipe Gonçalves, o Adriano Lima, o Manuel Amante da Rosa, o Nelson Herbert...

Para já ajudam- nos a seguir a rota deste l Cruzeiro de Férias ás Colónias do Ocidente (Cabo Verde, Guiné, São Tomé e Príncipe, Angola), que ficou registado em filme, em celulolóide, e entretanto, em boa hora, digitalizado pela Cinemateca Nacional (*)

Recorde-se o contexto:

(i) a iniciativa partiu da revista "O Mundo Português", tendo juntado cerca de duas centenas de "estudantes, professores, médicos, engenheiros, advogados, artistas, escritores, industriais e comerciantes";  o financiamento do cruzeiro teve comparticipação do Estado; 

(ii) esta "revista de cultura e propaganda, arte e literatura coloniais" era dirigida por Augusto Cunha, sendo propriedade da Agência Geral das Colónias e do Secretariado da Propaganda Nacional;

(iii) foi director cultural deste cruzeiro foi o prof doutor Marcelo Caetano (1906-1980), então um jovem, com 29 anos, intelectula orgânico do stado Novo, brilhante académico, especialista em direito administrativo, doutrinador do corporativismo e entusiástico apoiante do luso-tropicalismo (será comissário da Mocidade Portuguesa em 1940 e ministro das colónias em 1944, até chegar a sucessor de Salazar, de 1968 a 1974);

(iv) o filme, de hora e meia, foi realizado pelo conceituado fotógrafo Manuel Alves San Payo (1890-1974), natural de Melgaço, política e ideologicamente próximo do regime do Estado Novo; 

(v) o documentário acabou, ingloriamente, por não passar nas salas de cinema: merece ser hoje revisto , divulgado e comentado por todos nós, nomeadamente na comemoração dos 50 anos da independência de Cabo Verde (1975) (**);

(vi) o filme tem 15 minutos dedicados à paragem em Cabo Verde, em São Vicente (Mindelo) e Santiago (Praia) (8' - 23'), um pouco mais do que a visita à Guiné (Bissau e Bolama) (23' - 37');

(vii) ainda não  existia a Mocidade Portuguesa, criada pelo Decreto-Lei n.º 26 611, de 19 de maio de 1936, em cumprimento do disposto na Base XI da Lei n.º 1941, de 19 de abril de 1936;

(viii) pelo Decreto n.º 29 453, de 17 de fevereiro de 1939, a Organização foi alargada «à Mocidade Portuguesa das colónias, de origem europeia, e à juventude indígena assimilada" (sic).

(ix) mas a ilha de São Vicente, ou melhor, o Mindelo, já era a capital cultural do arquipélago; tinha liceu, desde 1917, o único do arquipélago, o liceu Infante Dom Henrique, rebatizado Gil Eanes, em 1938; nele estudou, entre muitos outros, Amílcar Cabral; (o outro estabelecimento de ensino secundário era o seminário-liceu de Sáo Nicolau);

(x) não há, no filme (como seria de esperar, para mais com a cenura em vigor...) uma única palavras sobre as secas e as fomes ciclicas, a morbimortalidade, o desemprego, a emigração, a história atribulada da ilha de Sáo Vicente e do Mindelo

(xi) um ano antes, em 7 de junho de 1934, tinha-se dado a "revolta de Nho Ambroze", uma revolta popular espontânea contra "a miséria e a fome", decorrentes do impacto da crise eocnómica mundial e da inação do Govermo de Lisboa; o Mindelo vivia do tráfego marítimo; houve saques da Alfândega e de casas comerciais; 1 morto e vários feridos; uma revolta á medida daquela gente pacífica e sofredora;

(xi) o Nho Ambroze será deportado a seguir para Angola; é hoje um dos heróis mindelenses, "capitão Ambroze".

(Continua)
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Notas do editor LG:

(*) Vd, postes de:

7 de novembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27398: 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente (Cabo Verde, Guiné, S. Tomé e Príncipe e Angola, 10 de agosto - 4 de outubro de 1935), de que foi diretor cultural o jovem e brilhante professor Marcello Caetano - Parte V: preços só para meninos ricos ou gente da classe média-alta... Hoje daria para dar a volta ao mundo em 100 dias.

4 de novembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27386: 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente (Cabo Verde, Guiné, S. Tomé e Príncipe e Angola, 10 de agosto - 4 de outubro de 1935), de que foi diretor cultural o jovem e brilhante professor Marcello Caetano - Parte III: um documentário de hora e meia, que diz muito (até pelo que omite) sobre o que era o "ultramar português" há 90 anos

(**) Último poste da série > 30 de agosto de 2025 > Guiné 61/74 - P27166: Os 50 anos da independência de Cabo Verde (10): Secas e fomes levaram ao longo do séc. XX à morte de mais de 100 mil pessoas

segunda-feira, 10 de novembro de 2025

Guiné 61/74 - P27408: Notas de leitura (1862): "Atlas Histórico do 25 de Abril", por José Matos; Guerra e Paz, 2025 (2) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 12 de Maço de 2025:

Queridos amigos,
Entendi por bem recapitular matéria do primeiro texto e estender até aos preparativos do 25 de Abril, chegámos à madrugada e começou a reunião no Regimento da Pontinha. Confesso a grande satisfação que tive em ler este livrinho que condensa perfeitamente os principais acontecimentos dos preparativos do golpe e as causas próximas. Temos aqui o essencial sobre a revolução, os seus protagonistas, a tensão e os acontecimentos dramáticos que precedem o 25 de Abril. Fala-se na última reunião do Conselho de Ministros, que decorreu em 23 de abril, Baltazar Rebelo de Sousa fará uma declaração ao Conselho sobre a necessidade de acelerar o processo de autonomia das províncias, ouvem-se vozes reticentes, havia ministros com medo que o Exército contestasse essas iniciativas. Dá para entender como estes políticos à volta de Marcello Caetano estavam a leste do que se passava ao nível de capitães, negavam, no fundo, a realidade de que se tinha ultrapassado em tempo a possibilidade de encontrar formulações de paz e uma verdadeira negociação dos interesses nacionais.

Um abraço do
Mário



Atlas Histórico do 25 de Abril, por José Matos, um confrade que nos dá imensa companhia (2)

Mário Beja Santos

Interrompemos a súmula do livro do nosso confrade José Matos, investigador em História Militar, exatamente nos preparativos do 25 de Abril. Voltando um pouco atrás, é na reunião em Óbidos que os capitães constituíram o MOFA (Movimento de Oficiais das Forças Armadas) e votaram o nome do General Costa Gomes para encabeçar o movimento. Em 5 de dezembro realizou-se uma reunião da nova missão coordenadora, escolheu-se uma direção executiva formada pelos majores Otelo Saraiva de Carvalho e Vítor Alves, e o capitão Vasco Lourenço. Ao tempo, ocorriam movimentações de oficiais associados a Kaúlza de Arriaga, coube ao major Fabião fazer a denúncia dessas movimentações no curso de promoção a oficial superior no Instituto de Altos Estudos Militares, a intenção golpista abortou. O Governo não estava de olhos fechados com estas movimentações, sabia o que se tinha passado em Óbidos, o subsecretário de Estado do Exército, coronel Viana de Lemos, convocou Vasco Lourenço e Dinis de Almeida, a advertência estava feita, não deviam continuar a pisar terreno muito perigoso, as reuniões deviam acabar.

Em 17 de janeiro Spínola toma posse como Vice-chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, a 22 de fevereiro é publicado Portugal e o Futuro, gerou um verdadeiro terramoto político. José Matos vai agora descrever o turbilhão destes acontecimentos. Caetano chama os dois generais, a 23 de fevereiro, diz-lhes que não podia continuar a governar tendo o topo da chefia militar em discordância, eles que fossem falar com o Presidente da República, o que não aconteceu, Caetano parte para uns dias de férias, nessa altura o Movimento dos Capitães já contava com alguns oficiais da Marinha e da Força Aérea, uma comissão de que faziam parte o Tenente-coronel Costa Brás e os Majores Melo Antunes e José Maria Azevedo e o Capitão Sousa e Castro produzem o primeiro documento programático do movimento. Regressando de férias, Caetano pede uma audiência a Thomaz apresenta formalmente a demissão, o presidente não a aceita, é a vez de Caetano querer agir em contra-ataque: propõe à comissão do Ultramar na Assembleia Nacional que estude uma moção para apresentar no Parlamento de forma a legitimar a política ultramarina, fará ali um discurso em 5 de março, no mesmo dia em que decorre a reunião de Cascais, e onde Melo Antunes apresenta o documento “O Movimento, as Forças Armadas e a Nação”.
Mapa de Cascais com a rua visconde da luz n.º 45, onde se realizou a reunião de 5 de Março de 1974

É no decurso da reunião de Cascais que foram ratificados os nomes de Costa Gomes e Spínola como os chefes máximos do movimento. A seguir ao seu discurso na Assembleia, Caetano é chamado ao Presidente da República, este não percebia como é que Costa Gomes e Spínola se mantinham em funções, de regresso a São Bento, Caetano envia uma carta ao presidente a pedir novamente a demissão, novamente negada, vem então uma cerimónia em que são convocados os oficiais generais dos três Ramos das Forças Armadas para mostrar fidelidade à política prosseguida, Costa Gomes e Spínola não comparecem bem como o Almirante Tierno Bagulho, seguem-se as demissões no topo das Forças Armadas, acende-se um rastilho, a Revolta das Caldas.
O General Andrade e Silva, ministro do Exército, cumprimenta Marcello Caetano durante a cerimónia de apoio ao Governo no Palácio de São Bento (Arquivo Histórico da Assembleia da República/Coleção Miranda Castela)

José Matos descreve-nos a narrativa do insucesso, os conspiradores aprenderam com a lição, impunha-se um projeto, cabe a Otelo Saraiva de Carvalho a organização das operações que levarão ao 25 de Abril: precisava-se de um centro de comandos seguro com um bom sistema de comunicações, o que vai acontecer. E começa o capítulo da queda do regime. Líderes da esquerda, PCP e PS, vão sendo informados das movimentações, havia profundas hesitações, Álvaro Cunhal não acreditava que uma revolta militar pudesse ter sucesso, dado que as Forças Armadas eram o grande sustentáculo do regime. Realiza-se a reunião de Londres, em Dolphin Square, no mais completo sigilo, entre o cônsul português em Milão e uma delegação guineense com Vítor Saúde e Maria à frente, é proposta uma nova reunião no mês seguinte, não terá lugar.
Kissinger e Rui Patrício em Lisboa, durante uma visita que o Secretário de Estado norte-americano fez a Portugal em dezembro de 1973 (Arquivo Yale University Library)

As autoridades portuguesas procuram desesperadamente comprar novos armamentos compatíveis com os já utilizados pelo PAIGC e a FRELIMO, muitas promessas, poucas realizações, ainda se comprou o sistema antimíssil Crotale, foi revendido depois do 25 de Abril, os aviões Mirage nunca chegaram a Portugal, Kissinger prometeu uma resposta ao sistema antimíssil, também não se concretizou. A última reunião do Conselho de Ministros realizou-se a 23 de abril de 1974, facto significativo foi a abordagem de Baltazar Rebelo de Sousa que chamou à atenção para a necessidade de acelerar a autonomia das colónias.

O plano gizado por Otelo assentava na neutralização muito rápida dos departamentos de Estado, estações de radiotelevisão e aeroporto, deviam ser tomados entre a madrugada e o amanhecer, foram mobilizadas várias unidades para tomar estes pontos-chave de Lisboa. Garcia dos Santos foi o responsável pelo material de comunicações necessário para se usar na revolta militar. Otelo previra ocupar uma estação de rádio que transmitisse um sinal de código para o início das operações, optou-se pelo Rádio Clube Português. Foi contactado o locutor João Paulo Dinis que explicou a Otelo que não pertencia aos quadros do Rádio Clube, a única coisa que ele podia fazer era assegurar a transmissão do primeiro sinal nos Emissores Associados de Lisboa. A primeira senha é transmitida por João Paulo Dinis, a canção de Paulo de Carvalho “E Depois do Adeus”. A segunda senha foi emitida por Carlos Albino na Rádio Renascença, a canção do código foi “Grândola, Vila Morena” de José Afonso.

José Matos descreve o desenrolar das operações em vários pontos do país, dá-nos conta da elaboração do programa político. Ficou decidido que o golpe seria desencadeado na última semana de abril para evitar o período do 1 de Maio, Costa Gomes e fundamentalmente Spínola vão sendo informados do que se prepara. Aprovado o projeto, começou a distribuição de missões, na semana derradeira para o golpe, Otelo assegurou a neutralidade dos paraquedistas e dos fuzileiros. Como não podia deixar de ser, Otelo sabe que era na capital que estavam os principais objetos a tomar e que se podia encontrar oposição nas forças de Cavalaria 7 e de Lanceiros 2, a GNR e a PSP estariam do lado do Governo, mas só a GNR podia realmente constituir alguma ameaça, sem esquecer o problema de PIDE/DGS. O historiador mostra-nos os blindados utilizados nas operações, e assim chegamos à noite de 24 de abril, Otelo partiu para o Regimento da Pontinha, nesse dia fora enviado um programa codificado para Melo Antunes nos Açores: “Tia Aurora Parte Estados Unidos 25 03 00 Abraços. Primo António” Otelo vai encontrar-se com o Capitão António Ramos, Ajudante de Campo de Spínola, na redação do Jornal do Comércio para lhe dizer que o golpe era naquela noite. Findas estas negligências parte para a Pontinha, vão chegando outros oficias como os Tenentes-coronéis Fisher Lopes Pires, Garcia dos Santos e Comandante Vítor Crespo.

(continua)
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Notas do editor:

Vd. post da 3 de novembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27382: Notas de leitura (1858): "Atlas Histórico do 25 de Abril", por José Matos; Guerra e Paz, 2025 (1) (Mário Beja Santos)

Último post da série de 8 de novembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27399: Notas de leitura (1861): "O capelão militar na guerra colonial", de Bártolo Paiva Pereira, capelão, major ref - Parte V: "Tenho um papel na gaveta", disse-lhe o Salazar, na véspera de partir para o CTIG, como capelão-chefe, em fevereiro de 1966... Era o papel que criava a capelania militar, a meio da guerra...