Alcácer do Sal > Rio Sado > 12 de abril de 2015 > Andei a perseguir esta garça real (ou garça cinzenta) (Ardea cinerea cinerea, nome científico em latinório), com a minha pequena máquina fotográfica... [Vd, as duas primeiras fotos acima].
Ela estava longe, do outro lado da margem do rio, e naturalmente estava irrequieta, nervosa, pouco segura, à procura de almoço... O estômago vazio não rima bem com liberdade... E ela afastava-se cada vez mais do meu ponto de observação. Eu tinha uma vantagem em relação a ela: acabara de almoçar, e o almocinho até foi bom e relativamente barato p'rós tempos que correm (no restaurante "Retiro Sadino", passe a publicidade, uma boa sugestão do meu amigo arquiteto José António Paradela, que tem obra por estes lados, e que é mais peixeiro do que carneiro, tal como eu, ou não fossemos ambos nascidos na costa atlântica, ele em Ílhavo, eu na Lourinhã)...
Todavia, a persistência não é o meu forte. Se eu fosse garça real, talvez não fosse tão longe como ela (que pode viver 25 anos, o que é uma eternidade para uma ave que, tal como a galinha, é descendente de dinossauros)... Acabei por conseguir, sem tripé, uma meia dúzia de boas fotos, de entre algumas dezenas que fui tirando, em más condições de exposição, com muita contraluz, distância e rapidez de movimentos do objeto...
E, de repente, viajei sem querer até à Guiné e ao tarrafe do meu Rio Geba.. Vá-se lá saber porquê, se o Rio Sado não é o Rio Geba, e não há aqui nada, nem sequer flamingos vermelhos, a falar-me da guerra, mesmo subliminarmente...Por que raio me veio à ideia o Geba e a guerra e os flamingos vermelhos ? Para além da garça real, a pescar, vejo apenas (e fotografo), no campanário da igreja, algumas famílias de pachorrentas cegonhas, agora desempregadas por que já não trazem os bebés de França, e que talvez por isso são "ocupas", não pagando a renda de casa ao padre... (O que não as impede de viver. comer e reproduzir-se como qualquer ser vivo, com direito a ter um lugar ao sol na mesa do banquete da vida....).
Enfim, são sinais também dos tempos, a par da desolação do rio Sado, navegável daqui até Setúbal, mas sem barcos à vista que o animem (e nos animem)... Onde está o nosso milenar e bravo povo de pescadores e marinheiros ?...
Mas deu-me prazer chegar a casa, do outro lado de outro rio (o Tejo), e selecionar esta e outras fotos, de um belo domingo passado em Alcácer do Sado (onde se come bem e é uma terra linda de morrer, como muitas outras do nosso belo e querido Portugal, mesmo em declínio) e em Grândola, "vila morena" (muito menos bonita e mas onde também se come bem)...
Em contrapartida, vim a descobrir, em Grândola (, onde acabei por não ver a exposição de desenho, escultura e fotografia de José Cutileiro, porque a biblioteca municipal está fechada ao domingo...), que foi num já longínquo ano de 1964 que o Zeca Afonso passou por aqui, pela Sociedade Musical Fraternidade Operária Grandolense (antigo Cineteatro Grandolense e antes disso hospital e igreja da misericórdia local...) e levou daqui a motivação e a inspiração para compor a sua famosa "Grândola, Vila Morena"...
Fica aqui o registo para os nossos leitores, não tão assíduos destas paragens como a cegonha e a garça real... (LG)
Grândola, 12 de abril de 2015 > Sociedade Musical Fraternidade Operária Grandolense (antigo Cineteatro Grandolense) > Cartaz de Zeca Afonso e lápide com a história do edifício que fica paralelo ao edifíicio dos antigos paços do concelho (séc. XVIII)
Fotos: © Luís Graça (2015). Todos os direitos reservados
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Nota do editor:
Último poste da série > 5 de abril de 2015 > Guiné 63/74 - P14434: Manuscrito(s) (Luís Graça) (52): A sagração da primavera
2 comentários:
Os fins de tarde, principalmente dos dias 'mornos', com o Sado em espelho, na marginal de Alcácer do Sal, são altamente repousantes e estimulantes.
E a garça é mesmo uma graça....
Quanto ao Zeca Afonso e à inspiração recebida pela actividade cultural e a dinâmica da colectividade.... fica demonstrada assim a importância do "fazer coisas", do associativismo, coisa de que também beneficiei e contribuí na modéstia das minhas possibilidades, através da participação activa em acções da Secção Cultural da União Desportiva Vilafranquense, uma "escola" de valores.
Boas fotos, já agora...
Hélder S.
Olá Grande Camarada!
Tu és bom poeta, bom prosador e agora estás-te a revelat um grande fotógrafo. Outros camaradas poderão pensar que eu ando a elogiar demasiado o "patrão". Confesso que isso é mentira . O seu a seu dono.
Sobre as cegonhas, que saúdades eu tenho do casal que visitava Brunhoso, pela primavera, para arranjar o ninho que estava no cimo do olmo maior, onde os ciganos acampavam no verão.
Depois os olmos morreram e as cegonhas não voltaram mais.
Em Zamora, que dista cerca de cem quilómetros de Brunhoso, quando atingimos o ponto mais alto, há um espectaculo digno de se ver: os ninhos de cegonhas, situados nos campanários das igrejas, em anfiteatro por toda a encosta da cidade, até ao rio Douro.
Com atenção conseguimos ver as crias e até os ovos, nos ninhos.
Parabéns também pelo texto que conforta a alma de muitos.
Um abraço
Francisco Baptista
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