1. Mensagem do nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), com data de 28 de Abril de 2015:
A família junta o passado e o presente e perspectiva o futuro.
Nesta foto estão os meus pais, irmãos, a minha mulher, a minha filha e sobrinhos, para além do Caramba.
Três combateram na Guiné, um em Moçambique e o meu sobrinho prestou serviço durante o processo do referendo em Timor e mais tarde fez duas comissões no Iraque.
É a minha família mais chegada e quando estávamos todos era uma alegria.
Um abraço a todos os camaradas
Juvenal Amado
VITÓRIAS
Sentado na enorme sala de espera das consultas externas do Hospital de Leiria, olho rostos, tento adivinhar o que se passa por detrás dos semblantes mais ao menos fechados...
Na sua maioria são gente para a minha idade e como o meu avô diria, eram rapazes do meu tempo.
Mas voltando aos “fregueses” da sala de espera, ponho-me a pensar que muitos dos homens foram combatentes, jovens, fortes, e hoje estão doentes, cansados das agruras da vida, saudosos daquele tempo em que afrontavam a vida como se nada lhes pudesse provocar beliscadura. Quantos estiveram na Guiné, Angola, Moçambique? Quantas esposas quanta madrinhas de guerra? Os progenitores são na esmagadora maioria uma recordação e uma saudade.
A saúde já não é a mesma e essa é que é a verdade indiscutível.
Há pouco tempo recebi a notícia de que o Silva dos Carvalhos estava a fazer hemodiálise e quando comentava o facto com outro camarada, fiquei a saber que o “Ermesinde” também está à espera de um transplante renal, o Narciso foi operado a tumor no cérebro, o Alfredo “estufa” teve um AVC e não sai da cama nem fala, também o “sacristão” esteve muito mal e isto para não falar nos que já nos deixaram.
Através dos semblantes dos utentes na sala de espera tento adivinhar o calvário que cada um está a passar por detrás do olhar absorto.
Quantos filhos e quantos netos terão? Quantas brigas, quantas derrotas e quantas vitórias, constarão na bagagem de cada um?
Os filhos e netos serão a sua vitória da vida sobre a morte?
Há dias assisti a um diálogo num filme que encerrava uma grande lição de vida.
Uma idosa judia, sobrevivente de um campo de morte nazi que ostentava a tatuagem de um número no braço e que estava muito doente, tinha ao redor da cama sete filhos, mais de uma dezena de netos e alguns bisnetos.
O médico disse – então tem aqui a sua família?
Ela respondeu, que sim e que aquela família, era a sua vingança sobre quem tentara aniquilá-la e através dela, toda a sua descendência. A prole tão numerosa era a sua vitória sobre os sofrimentos que lhe tinham infligido.
Fiquei a remoer nas suas palavras pois elas eram um grito de vitória, não em forma de batalha ou guerra ganha, mas sim em forma de sobrevivência e de prolongamento do seu nome, quando tudo tinham feito para lho apagar.
Em Monte Real também soube que alguns camaradas não estavam na sua melhor forma, mas mesmo assim ali estavam também a celebrar outros tempos, novas e velhas amizades. Alguns levaram esposas filhos e netos. Estarmos ali, foi celebrarmos uma vitória onde só a vida e a paz podem e devem ser vencedoras.
Juvenal Amado
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Nota do editor
Último poste da série de 2 de maio de 2015 > Guiné 63/74 - P14555: Blogoterapia (267): Num Ápice, fico Anestesiado, a Mente o Obriga (Mário Vitorino Gaspar)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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1 comentário:
Caro Juvenal
As tuas palavras calaram fundo a um avô recente (48 horas) que "de repente" se revê nessas tuas reflexões "hospitalares" que reprodutoras que são das que sempre me assolaram nas longas 13, 14 e mais horas de espera e acompanhamento da minha mãe (felizmente sobreviva) no Amadora Sintra.
Não é de facto só a idade, é a forma como (será algum sindrome de novo avô) como nos "suportam" não já só os menos novos, antes todos os que o "sistema" acha um peso.
O que vale é que contrariamente ao que alguns pretendem há quem teimosamente continue a pensar e a... querer afirmativamente resistir.
Obrigado e um Abraço
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