sábado, 16 de setembro de 2017

Guiné 61/74 - P17772: Historiografia da presença portuguesa em África (88): Exposição Colonial Internacional de Paris, 1931 (1) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 22 de Agosto de 2017:

Queridos amigos,
No termo da I Guerra Mundial, as exposições coloniais internacionais ganharam uma nova dimensão: para além da mostra de produtos, desfrute das populações metropolitanas sobre os espaços ultramarinos sob o seu domínio, havia que justificar certas razões históricas para essa presença, alargavam-se as cobiças, passando por Berlim, por Roma e por Tóquio, as exposições destacavam as potencialidades das matérias-primas mas traziam elementos novos: o que se fazia pela educação, pela saúde, mostravam-se infraestruturas, civilização. Portugal estará presente nesta exposição de Paris de 1931. Extraíram-se ensinamentos.
Veremos a seguir, com a mostra da Exposição Colonial do Porto de 1934, que a ideologia era o elemento prevalecente. Henrique Galvão deu o mote para a exposição: "Portugal não é um país pequeno". Mal sabia ele que aqueles mapas da Europa onde se inseriam as parcelas do império colonial iriam reaparecer no exato momento em que ele se rebelava contra Salazar.

Um abraço do
Mário


Exposição Colonial Internacional de Paris, 1931 (1)

Beja Santos

Podemos distinguir na história das exposições coloniais dois momentos correspondentes às lógicas imperiais emergentes. Durante a segunda metade do século XIX e até à I Guerra Mundial, as exposições efetuavam-se para mostrar às populações metropolitanas as dimensões das colónias dos respetivos impérios. Foi o que aconteceu com a Exposição Universal e Colonial de Exportação Geral, que se realizou em Amesterdão em 1883, as de Londres, Paris, Lião, Berlim, Bruxelas, Nova Iorque, transformaram-se em grandes eventos de exibição de espaço tutelado e de mostra das potencialidades para o negócio. No termo da I Guerra Mundial, desfeitos alguns impérios europeus, outros ganharam realce e careceram de afirmação até porque bem cedo se deu conta que alguns estados totalitários pretendiam colónias, de Berlim, passando por Roma, até Tóquio. As exposições ganharam outro relevo. No caso francês, de que vamos falar, não se escondia a participação das tropas coloniais nos combates contras os alemães. A França queria mostrar no Hexágono e ao mundo a extensão do seu império: Somália, Madagáscar, Índias Francesas, Taiti, Nova Caledónia, Martinica, Ilha da Reunião, Guadalupe, Angkor como expoente cultural máximo da Indochina, Cochinchina, África Equatorial Francesa, África Ocidental (Marrocos, Tunísia e Argélia). A exposição Francesa concitara a presença de outras potências coloniais como a Holanda, os Estados Unidos, a Itália, o Indostão, a Dinamarca e Portugal. Aspeto curioso, a ausência da Espanha.

Vale a pena perceber o ideário que dava o pano de fundo para esta mostra de orgulho: permitir conhecer melhor a França Ultramarina, encontrar joias turísticas e “sorrisos da fortuna” (linguagem burilada para atrair colonos e investimentos). A exposição decorre sobre o alto patrocínio de um nome sonante, o Marechal Lyautey. Escolheu-se Vincennes para instalar a exposição em 110 hectares. Pensou-se em tudo: nos encargos e nas receitas, nos preços para visitantes, transportes, espaços de lazer e parque de atrações, informações, proximidade do metro.



Foi um êxito retumbante, mostrava-se a Palestina num pavilhão, era uma réplica do túmulo de Raquel, filha de Labão, a esposa preferida de Jacob, mãe dos doze fundadores das tribos judaicas. Havia jardim zoológico. Não se estranha a presença dos Estados Unidos numa Exposição Internacional Colonial em França, queria-se recordar Lafayette e o apoio dado àqueles que lutaram pela independência dos Estados Unidos.



A participação portuguesa teve a coordenação de um nome cimeiro da arquitetura, Raul Lino, desdobrava-se em quatro pavilhões. Um em estilo tardo-medievo, época em que arrancaram os descobrimentos, tinha uma torre quadrada de 36 metros de altura. O segundo pavilhão era alusivo a Afonso de Albuquerque, o fundador da presença portuguesa nas ilhas e os outros dois pavilhões eram documentais, não excluindo a sensibilização para negócios. O jornal O Comércio da Guiné, na sua edição de Abril de 1931, dedicava praticamente o número às potencialidades guineenses, com bastante texto em francês. Lia-se textualmente que nas vitrinas se encontravam expostos os artigos da produção colonial, marcando assim aos fabricantes industriais a atenção para este mercado: amendoim, milho, café, coco, óleo de palma, copra, algodão, sisal, borracha, arroz, mostrava-se um conjunto de cartas com as bacias e os recursos hídricos, as comunicações, a riqueza pecuária, agrícola e sinergética. E o jornal acrescentava: “Com as referidas amostras, a Guiné apresenta o catálogo dos tipos comerciais habitualmente exportados, sendo possível a todos aqueles que se interessarem pelo assunto encontrarem no departamento de informações as estatísticas que o poderão definir a exata situação e posição do valor desse rico mercado exportador. Como elemento subsidiário encontrar-se-á aí também uma relação nominal dos comerciantes e firmas estabelecidas nas colónia com as quais será possível entabular quaisquer negociações. O presente número deste jornal fornece igualmente uma publicidade escolhida das atividades económicas da Guiné Portuguesa. Figura também na exposição um apreciável mostruário artístico e industrial indígena, que além de constituir um ótimo elemento de estudo etnográfico, manifesta o culto aborígene de uma nota expressiva da vida psíquica e denota, através dos mil artefactos que se apresentam a aptidão curiosa destes povos de muitas raças, confiados ao carinhoso predomínio do mais velho colonizador da Europa – o povo português".

Esta exibição de orgulho, mesmo que os promotores da Exposição Colonial do Porto, de 1934, tenham refutado associações, estará presente e bem replicada na primeira grande manifestação colonial do Estado Novo. Por isso, vale a pena revisitá-la.

(Continua)
____________

Nota do editor

Último poste da série de 30 de agosto de 2017 > Guiné 61/74 - P17712: Historiografia da presença portuguesa em África (87): A partida do T/T "Mouzinho", em 18/7/1941, em plena II Guerra Mundial, com um contingente militar para reforço da guarnição de Cabo Verde... Salazar assistiu pessoalmente ao desfile e embarque das tropas expedicionárias. Despedida emocionante, no cais da Rocha Conde de Óbidos, com uma nuvem de lenços brancos a acenar...

Sem comentários: